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Tempos de assédio

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Um deputado estadual de Kentucky atirou-se de uma ponte dias depois de ser acusado de assédio por uma mulher. Ela relata ter sido beijada e manuseada por ele, em 2012. O deputado, pastor de igreja evangélica, no passado dissera que Obama e esposa eram primatas. Antes de se suicidar o deputado escreveu uma carta, alegando ter vivido em depressão nos últimos 16 anos. A causa? Ora o ataque às Torres Gêmeas com o qual não se conformou e nunca pode superar.

A lista de personalidades acusadas de assédio sexual cresce. Congressistas, jornalistas, atores, diretores de cinema e outras pessoas têm seus nomes ligados a atos desse tipo cometidos no passado. Dias atrás o conhecido ator Dustin Hoffman passou a fazer parte da lista.

O caso mais rumoroso nos últimos dias diz respeito a acusações de mulheres ao presidente Donald Trump. Ele nega. Atribui aos democratas manobras para desestabilizar seu governo. Mas, as acusações são sérias. As mulheres que se dizem assediadas por ele no passado exigem investigação.

É cedo para se dizer como a história julgará Trump. Com um ano no cargo sua imagem tem sido de um sujeito incompetente para governar e, principalmente, desinformado. Usa as redes sociais para enviar mensagens e com frequência se complica. Acaba de sair-se mal por seu apoio a um candidato republicano ao senado no estado do Alabama. Malvisto pela comunidade negra do estado e também acusado de assédio o republicano foi derrotado pelo opositor democrata. Ainda que a margem de votos do vitorioso tenha sido pequena a derrota refletiu sobre o presidente.

O mundo árabe está contra Trump. O presidente reconheceu Jerusalém como capital de Israel e vai mudar a embaixada de seu país para a cidade. A decisão provocou grande revolta em todo o mundo árabe para quem Jerusalém também é sua capital. Desse modo, tornam-se ainda mais difíceis as já complicadas negociações de paz no Oriente Médio.

Fala-se muito em inteligência artificial hoje em dia. Existe a previsão de que em poucos anos os veículos circularão sem motoristas. Teme-se que se atinja o estágio em que uma máquina se torne capaz de ensinar outra máquina o que poderia representar o fim do domínio humano sobre o planeta. Não se trata de ficção científica, mas de probabilidades não descartáveis. Entretanto, essa preocupação não parece merecer tanta atenção. Teme-se que muito antes desse incrível desenvolvimento tecnológico o homem acabe por destruir o planeta onde vive. Aí está a Coreia do Norte munida de armas nucleares e ameaçando lança-las contra seus inimigos. Do outro lado fica Trump, garantindo que acabará com a Coreia do Norte caso ela tome alguma iniciativa guerreira.

O poder não se encontra em boas mãos no momento e não se pode ignorar que o perigo é iminente nesses tempos de assédio.

Formaturas

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Sonhos de futuros brilhantes enunciados em conhecidos lugares-comuns permeiam as cerimônias de formatura. São elas marcos divisórios nas vidas de formados e seus familiares. A despeito dos ritos tão conhecidos e sempre repetidos existe nessas cerimônias as certezas de marco transposto e dever cumprido.

Não por acaso os olhos de familiares se humedecem ao ver um representante de sua estirpe ser chamado a receber o diploma. Nos passos do jovem que se apresenta toda a história de dificuldades superadas, momentos que agora retornam como num filme que se passa, vertiginosamente, nas memórias. A febre da conquista não faz olvidar as agruras do trajeto. Aquela senhora que se emociona ao ver o filho receber seu diploma há de considerar suas lides financeiras e tantos outros percalços domados ao longo de anos de sua viuvez. Cada ser humano traz consigo uma história pontuada por barreiras a serem superadas.

Mas, não há como não se emocionar ao ver as crianças de 5 anos de idade que completam o ciclo de educação infantil. Já avançados no território da alfabetização eis que a eles se abre um novo mundo no ensino fundamental. Ao comemorarem o encerramento do ciclo talvez pela primeira vez experimentem a sensação da perda que fatalmente acontecerá. Eis que daqueles tão maravilhosos amigos uns tantos seguirão outros caminhos, outras escolas, etc. Inevitável que ocorram separações.

Mas, me adianto. Por agora tudo ainda é festa. Os pais que a todo instante acionam suas máquinas fotográficas, os felizes avós, toda essa gente se entrega ao orgulho e alegria do momento. Os pequenos se divertem, recebem seus diplomas, a vida é boa, muito boa aos cinco anos, quando se tem uma família e uma casa a cuidar de si.

Não seria o caso de lembrar às crianças que completam o primeiro ciclo de que o mundo que as aguarda não é complacente. Importa garantir a esses rostinhos a felicidade que neles transparece, a ilusão de que a vida é e será um mar de rosas. Até que descubram o engodo, mas, então, serão maiores e quem sabe agentes em prol de um mudo sempre melhor.

Grandes craques

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Recebi um vídeo com gols de Pelé. Coisa de tirar os óculos, limpar as lentes e ver de novo para certificar-se de que é aquilo mesmo. Nossa! O cara driblava defesas inteiras, não raro entrava no gol com bola e tudo.

Eu me considero um cara de sorte. Primeiro porque era nada mais que um bebê na Copa de 50. De modo que não passei por aquela desgraça nacional. Cresci ouvindo dos mais velhos relatos sobre o jogo no Maracanã.  Anos depois a turma ainda não se conformara com a derrota. Falava-se sobre a falha de Barbosa, a lambança de Bigode e a escalação de Chico. Flávio Costa preferira o parente ao invés de Teixeirinha.

A segunda razão de minha sorte foi ter visto grandes jogadores em atividade. Passei um mês perto da concentração da seleção brasileira que seria campeã em 62. Todo fim de tarde tinha um racha entre paulistas e cariocas. Garrincha, Didi, Vavá, Pelé, Nilton Santos, Mauro, Bellini, vi essa gente toda de perto.

Mais: vi Pelé jogar algumas vezes no Pacaembu. Vi Rivellino e tantos outros. Estava presente quando Paulo Borges fez aquele gol que deu a vitória ao Corinthians sobre o Santos após 10 anos de derrotas. E olhe que não sou corintiano.

Tudo isso para dizer que não entendo essa história de comparações entre grandes craques do futebol. Maradona foi maravilhoso, não se nega, mas igual a Pelé? Assista aos vídeos dos gols do rapaz de Três Corações. Agora só de fala em Cristiano Ronaldo e Messi. Nos últimos dez anos só tem dado os dois. E a turma os coloca como os maiores de todos os tempos. Coisa de loucos.

Nessa história toda só existe uma certeza: Pelé foi o maior. Outras comparações deixam de lado circunstâncias nada desprezíveis. Para citar uma: o futebol tem mudado. Tornou-se esporte milionário que paga milhões aos ídolos de momento. A seleção e 70, aquela imortal seleção, como se daria no futebol atual? Impossível responder embora nos pareça que jamais existirá um grupo como aquele.

Futebol é paixão. Alimenta nossas neuroses, leva-nos a atitudes que até mesmo nos surpreendem. De modo que é inútil essa interminável comparação entre grandes craques do esporte. Mas, que fazer se a mídia se nutre disso e não deixa os ídolos do passado em paz?

Escrito por Ayrton Marcondes

11 dezembro, 2017 às 1:01 pm

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Há 50 anos

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Era o dia 08 de dezembro de 1967. Naquele ano eu terminava o Curso Colegial, atual Ensino Médio, e encaminhava-me para o exame vestibular. A meta era estudar no Rio. Um mês antes fizera a minha inscrição para as provas. Então viera ao Rio no trem noturno da Central do Brasil. Esse trem passava em Taubaté à meia-noite. Viajei no banco de madeira da segunda classe porque a passagem nesse vagão era mais barata. Mas, o trem não seguia direto ao Rio: em Lorena ficava parado por quase três horas, esperando o trem de aço que vinha do Rio. Só depois da passagem do aço tínhamos a linha livre para seguir adiante. De todo modo desembarquei na manhã seguinte, na estação D. Predo II e fui providenciar a minha inscrição.

Um mês depois, na véspera do vestibular, fui, em companha de um amigo, ao CTA de São José dos Campos. Ali falamos com um sargento sobre nosso interesse em seguir para o Rio num dos aviões do Correio Aéreo nacional - CAN. O sargento nos disse que caso houvessem assentos livres poderíamos embaraçar.

O avião do CAN não era jato. Remanescente da Segunda Guerra fora adquirido pelo governo e servia ao transporte de cargas e correspondência. Não haviam assentos como em aviões usados por passageiros: de cada lado uma fileira de lugares onde quem viajava se prendia com os cintos. Certamente ali haviam se sentado soldados durante as batalhas, paraquedistas, etc.

Não demorou mais que uma hora para que chegássemos ao Rio. O barulho do motor era ensurdecedor. Desembarcaríamos no Aeroporto de Santos Dumont. Entretanto, quando nos aproximávamos do aeroporto o piloto foi avisado de que a pista estava interditada.  A ordem era a de aguardar até que a desinterdição acontecesse.

Foi nesse dia que experimentei uma das mais belas impressões visuais de toda a minha vida. Para fazer hora o avião sobrevoou, demoradamente, o Rio. Tal o encanto das belezas naturais da cidade que não havia como não se comover. Até hoje guardo lembranças de minhas primeiras impressões de estar sobre o Pão de Açúcar e o Cristo Redentor. O Rio era mesmo a “cidade maravilhosa”.

Mais tarde soubemos a razão da interdição do aeroporto. Naquela manhã o presidente Arthur da Costa e Silva e 23 membros de sua comitiva escaparam sem ferimentos de acidente com o avião presidencial no aeroporto de Santos Dumont. O “Viscount” procedente de Brasília perdeu altura e tocou bruscamente o solo do aeroporto. O impacto fez ceder o trem de pouso e o avião arrastou-se, “de barriga”, na pista. A asa direita chocou-se com o solo e um dos quatro motores pegou fogo.

São passados exatamente 50 anos desde a ocorrência desses fatos. Não fiz faculdade no Rio. Costa e Silva seguiu no governo. Um ano depois seria baixado, ainda em seu governo, o AI-5, considerado como a mais bem acabada expressão da ditadura brasileira.

Noir c´est noir

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Morreu, aos 74 anos, o roqueiro francês Johnny Hallyday. A morte do cantor repercute em toda a França que o tem como ídolo.

Entre nós Hallyday é pouco conhecido. Entretanto, impossível esquecer de sua passagem pelo país no final da década de 60. Na ocasião Hallyday alcançara o grande sucesso inicial de sua carreira com a música Noir c´est noir. Nós o víamos na telinha da tevê, em preto e branco, e logo passamos a cantarolar ao ritmo da música.

Talvez Hallyday tenha voltado outras vezes ao Brasil. Não me recordo. Entretanto, a notícia de sua morte nos devolve lembranças do tempo passado. Não se desconhecem as revoluções que tornaram a década de 60 realmente inesquecível. O maio de 68 na França balançou o mundo e as cabeças. No Brasil o golpe de 64 deu início a um dos períodos mais violentos de nossa história. Ainda hoje se fala sobre a estudantada presa em Ibiúna e a passeata dos 100 mil. Aquele Brasil incandescente não adormece nas memórias.

Difícil mesmo é reviver o que éramos na época. Afinal, enquanto rapazotes, que consciência tínhamos da dimensão dos acontecimentos que nos cercavam? A Guerra Fria dividia o mundo em dois blocos, o poder americano fazia-se sentir em nosso país. Presos à engrenagem do mercado mundial, cabendo-nos o papel de devedores e país terceiro-mundista em grande atraso não nos restavam muitas opções. João Goulart caiu porque seria inadmissível qualquer governo de ideário socialista no quintal dos americanos. Mas, isso já é outra história.

Johnny Hallyday estabeleceu-se como ícone dentro de um país exportador de vasta cultura. Era francês. Olhava-se para Paris com reverência. Lá viviam Sartre e Simone de Beauvoir, entre tantos outros.

Mas, não se nega que, grosso modo, os franceses sempre mantiveram singular noção de superioridade. Lembro-me de um francês no Aeroporto John Kennedy, em Nova York. Acabara de desembarcar e chegara à imigração. De modo algum o francesinho aceitava se submeter às normas imigratórias. Recusava-se a preencher a ficha de imigração, dizendo: sou francês. Era um dono do mundo…

Hoje revi Johnny Hallyday cantando Noir c´est noir. No vídeo um jovem muito claro, enlouquecendo a multidão de fãs. São imagens de um tempo passado do qual guardamos impressões nem sempre precisas. Não sei dizer se tenho saudades daquela época.

Tromba d´água

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Chove muito em algumas regiões do Brasil. No interior de Minas corpos de duas crianças são encontrados. Foram levados pela enxurrada. Há pessoas desaparecidas. Imagens de pequenas cidades, praticamente submersas, impressionam. Muita gente perdeu tudo. Uma senhora olha para os destroços do que foi sua casa e mostra desespero. Ao lado dela o marido, um idoso, mira o nada.

Não sei como você se sente em relação a fenômenos naturais imprevisíveis e que causam destruição. Imagino como possa ser a vida de quem vive na região do Caribe que, a cada ano, é assolada por furacões. A ideia de que a destruição se aproxima e será irreversível atordoa. Que fazer quando nada se pode contra a força que oprime?

Tínhamos medo de tromba d´água. Na região onde morávamos não era incomum a ocorrência desse fenômeno. De repente nuvens muito carregadas largavam milhares de litros de água no cume de um morro. A aguaceira descia encosta abaixo, ganhando velocidade, levando consigo tudo o que encontrasse pelo caminho. Árvores eram arrancadas, casas destruídas. Nas que resistiam ao impacto das águas perdas de tudo que havia em seus interiores. Um fabuloso desastre.

Talvez por isso as tempestades incomodassem tanto. Ventos de mais de 80 km horários causavam temor. O fato é que chovia demais na nossa terrinha. Nossa casa era um sobrado. As crianças dormiam na parte de cima. Pelas janelinhas de madeira chegava-nos a luz dos relâmpagos, tantos que iluminavam a madrugada. O ruído da chuva implacável a bater sobre o telhado fazia-nos temer pela tromba d´água.  Acontecera há pouco em cidade vizinha, por que não na nossa?

As mulheres cobriam os espelhos, acendiam velas, rezavam. Traziam de suas infâncias, nos inícios do século 20, crenças e hábitos que supunham agir para aplacar a ira do temporal. Queimavam-se ramos guardados desde a semana santa nos quais depositava-se a fé da proteção sobrenatural.

Felizmente haviam as novas manhãs.  Acordávamos e íamos à rua para ver o que acontecera. Em geral presenciavam-se pequenas avarias, telhas arrancadas e algum telhado, etc. Não fora desta vez que a tromba d´água nos surpreendera. Aliás, nunca aconteceria.

Predação sexual

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Os tempos são outros. Ainda assim fica difícil acostumar-se ao andamento do noticiário. Quem há poucos anos imaginaria essa verdadeira avalanche de acusações de assédio sexual, envolvendo personalidades consideradas intocáveis nos meios em que atuam?

De repente, foi aberto o registro que segurava a torrente de denúncias. Personalidades a quem nos habituamos ver nas telas de cinema passaram a relatar os percalços a que foram submetidas para subir em suas carreiras. No meio jornalístico das tevês a todo transe despontam denunciantes que provocam afastamentos de apresentadores conhecidos em todo o mundo. A tara sexual parece reger essa orquestra de predadores que até hoje manobrava nas sombras.

Mas, será tudo “verdade verdadeira”? Tudo indica que sim. Basta que alguém seja acusado para que, imediatamente, outros abusados(as) por ele(a) reúnam coragem para acrescentar suas denunciais. Tal o volume de casos de assédio que pipocam diariamente que somos obrigados a pensar sobre a real extensão da podridão humana.

Os casos mais citados envolvendo personalidades conhecidas de modo algum encobrem o que acontece no seio da população. Mulheres são e tem sido nada mais que objetos de satisfação dos desejos sexuais de seus parceiros, ocasionais ou não. Isso sem falar no abusivo número de estupros, crimes cuja frequência é assustadora.

Parece haver no universo masculino a certeza de que mulher serve para isso mesmo. Entretanto, decorridos dois milênios desde a passagem de Cristo por este mundo, não seria de se esperar a vitória dos comportamentos civilizados sobre a barbárie a que assistimos?

De todos os campos de atuação humana fica a impressão de que a civilização não deu certo. O lado animal da espécie parece recusar-se ao verniz civilizatório. Teorias propostas pelos mais destacados pensadores em todas as áreas têm sucumbido diante de uma realidade que teima em os desmentir. As vertentes de ideias, sejam de direita, centro ou esquerda, em nada contribuem para solucionar o imbróglio político que se apresenta no mundo. Guerras acontecem. Por toda parte vigora o desrespeito aos direitos humanos. Discriminações de toda ordem e radicalismos são usados contra multidões a quem não resta a menor chance de defesa. Mulheres são estupradas sob o olhar indiferente de governos ditatoriais.

Será, enfim, o apocalipse que se aproxima?

Os invisíveis

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Tem gente capaz de cortar uma das mãos para aparecer, ser notada etc. Lembro-me de um sujeito com quem trabalhei. Era especialista em chamar a atenção. Vestia-se bem, barba sempre bem-feita, cabelos no ponto. Quase desfilava. O detalhe: tinha mote para chamar a atenção. Sempre que nos encontrávamos comentava sobre a minha camisa: bela camisa, parceiro. Bela camisa a minha velha, surrada? Que nada. Era o jeito dele de chamar a atenção para a camisa que estava vestindo. Como eu já sabia, entrava no jogo: a minha é velha, bonita mesmo é a sua. Estava dada a partida. Nos instantes seguintes ele falaria sobre a loja em que comprara a camisa, a marca, o tecido, etc.

Você poderá se perguntar sobre a razão de eu aceitar o jogo desse cara com quem trabalhei. Ora, aquilo não me custava nada e o deixava de tal modo feliz que… Além do que o fulano não era lá mau sujeito. Boa prosa, convivia-se com ele, agradavelmente. Exceto pelo exibicionismo barato. O tal era desses mulherengos de contar casos. Gabava-se de conquistas e, se déssemos corda, chegava aos detalhes de suas aventuras sexuais. Mas, desconfiávamos de que, no fundo, o arrumadinho não passasse de um garganta. Morava ali no Bom Retiro, casara-se com mulher endinheirada cuja mãe o detestava. Certa vez fez festa de aniversário em sua casa e pude ver o repúdio da velha senhora pelo tipo de genro que a sorte dera a ela.

Tudo isso para dizer que minha preferência é pelos invisíveis, essa gente que prima por passar despercebida, atuando com responsabilidade sem advogar os louros de suas conquistas. Gente de verdade. Cruzei com muitos do tipo vida afora. Em certos ambientes testemunhei a luta desenvolvida por personalidades vaidosas para sobrepujar invisíveis que não faziam a menor questão de ser reconhecidos em suas atividades.

A vaidade faz parte do cerne de muita gente. Entretanto, nem sempre se aloja em pessoas que mereçam destaque. O vaidoso que tem limitações vive as agruras de engendrar planos para sobrepor-se aos semelhantes, em geral expondo-se desnecessariamente. Nesse caso a ambição de destacar-se acaba emperrando na ausência de capacidade. É carroça de bois sem os animais que a puxam.

O mundo é como é e nada pode mudar as paixões que governam os seres humanos. Conta-se sobre um cirurgião que mandou fazer um bisturi de ouro e saiu pelo mundo para entregá-lo ao melhor cirurgião que encontrasse. Depois de passar por vários países retornou àquele em que vivia. Então deu uma festa para muitos convidados e, solenemente, entregou a si mesmo o bisturi que o distinguiria como o melhor do mundo. Depois, esse homem envelheceu como acontece a todo mundo e foi sendo esquecido. Quando morreu uma única linha no obituário dos jornais foi o que restou daquela imensa prepotência e arrogância que o caracterizara em vida.

Escrito por Ayrton Marcondes

29 novembro, 2017 às 11:49 am

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O fim do mundo

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Nesta sexta-feira um asteroide de 4,4 km passará perto da Terra. Trata-se do “Florence”, descoberto em 1981. Passará a 7 milhões de quilômetros de nosso planeta, distância essa que, em termos de astronomia, é quase nada.

Um asteroide desse tamanho, caso atingisse a Terra, provocaria enorme estrago. Para que se tenha ideia, em fevereiro de 2013, um asteroide de 20 metros de diâmetro caiu perto da cidade de Chelyabisnk, na Rússia. A energia liberada na colisão foi equivalente a 500 quilotons de TNT, entre 20 e 30 vezes às primeiras bombas atômicas. Um asteroide de 40 metros de diâmetro, caso caísse numa grande cidade, provocaria milhões de mortes.

Mas, estamos falando sobre diâmetros de asteroides em metros. Quando o assunto é diâmetro em quilômetros pode-se imaginar o tamanho do estrago. Seria a catástrofe global, com aquela que há 65 milhões de anos fez desaparecer os dinossauros. A colisão fez levantar grande nuvem de poeira que impediu a chegada da luz solar ao planeta. Corpos de grande massa, viajando a velocidades entre 14000 e 72000 km/h, ao colidir com a Terra, imediatamente instalariam uma nova era glacial. Caso atingissem o oceano provocariam enormes tsunamis, vaporização de água salgada afetando a camada de ozônio. Enfim, catástrofes que tornariam a vida impossível na Terra.

Há anos o físico Stephen Hawking tem alertado sobre a finitude da vida em nosso planeta. Acredita ele que se em cinco séculos o homem não tiver a opção de viver em outros lugares que não a Terra a vida será impossível aqui. O crescimento populacional e o consumo de energia estão na base dessa previsão. Hawking também adverte sobre os perigos da inteligência artificial, invasão de alienígenas, grande guerra mundial e a engenharia genética.

Até o momento os governos não dispõem de meios para bloquear a chegada de um grande asteroide que entre nem rota de colisão com a Terra. Cientistas propõe estratégias cujos efeitos não se sabe se seriam eficazes. Um dos meios discutidos seria o lançamento de uma grande bomba nuclear que atingiria o asteroide, provocando seu esfacelamento. Ou o uso de grandes espaçonaves que batendo no asteroide acabariam por desvia-lo de sua rota.

Enfim, até o momento estamos à mercê da sorte. A Terra é um minúsculo corpúsculo celeste que gravita ao redor do Sol, estrela de pequeno porte no universo. Entretanto, eis que o homem é ser voltado para o próprio umbigo. A vida se nos apresenta plena de complexidades e governos lutam pela supremacia no planeta. Dentro de tal realidade é de se imaginar qual seria a reação dos seres humanos diante de um perigo real e iminente que viesse a colocar em risco a existência de vida na Terra.

Cuidado com o que fala

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No auge do governo Médici as pessoas eram caladas. Você estava num ônibus, em São Paulo, e não ouvia vozes. Pessoas no máximo cochichavam. Falar de ditadura, governo militar, política, comunismo, terrorismo, etc. nem pensar. Anos de chumbo, são anos de chumbo, nada a declarar.

Meu tio era um sujeito de sangue quente. Proprietário de bondade ímpar, coração de ouro, era do tipo nervoso. Desses que vão do zero ao infinito em um segundo, mas logo retornam ao bom senso. Teve vida de aventuras e muitas vezes ouvi dele as diabruras que cometeu quando jovem. Homem de outra época percorreu interiores do país, vendendo quinino para tratamento de malária. Tornou-se professor após sérios desentendimentos com a banca examinadora que viria a dar a ele a licença para ensinar. Fez parte do contingente de soldados paulistas durante a Revolução de 32 e, já velho, ainda citava o heroísmo dos rapazes do MMDC: Martins, Miragaia, Dráuzio e Camargo - retive na memória esses nomes de tanto ouvi-los de meu tio.

Falo de meu tio porque as discussões dele com minha tia eram comuns. Também comuns eram as razões do palavrório trocado entre eles. Em verdade havia uma única razão: meu tio não tinha travas na língua, dizia o que pensava. Metia a boca no governo militar. Minha tia brigava com ele, implorando para que se mantivesse calado quando fora de casa. Uma palavra errada dirigida a um desconhecido poderia gerar grandes problemas.

A ditadura ficou para trás, o regime democrático está aí com suas imperfeições. O tempo passou e agora vive-se o período do politicamente correto no qual é preciso muito cuidado com o que se fala. O perigo está no uso de expressões arraigadas na língua e que têm conotações discriminatórias. Por exemplo: a piada de que o baiano é um sujeito folgado. Dela sugiram expressões realmente negativas em relação a baianos. Todo mundo a que se refere a palavra “baianada”. Entretanto, falava-se em “baianadas” sem realmente ter em perspectiva os nossos irmãos da linda e querida Bahia. Ah, Salvador, que saudades… Entretanto, hoje em dia o melhor é não se usar mais a palavra.

O mesmo pode-se dizer em relação a expressões de cunho racial as quais, obviamente, não devem ser usadas. Entretanto, no passado o uso de tais expressões tornou-se parte integrante da linguagem comum. Devem, sim, ser banidas. Mas, não creio que todas as pessoas que eventualmente ainda cometam o deslize de utilizá-las sejam de fato racistas. Isso não quer dizer que não exista racismo no Brasil, muito pelo contrário. Mas, levará um tempo até que o modo de falar do povo seja acertado.