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Dia das Bruxas

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As ligações dos humanos com o “outro lado” são complicadas. A eterna pergunta, sem resposta, sobre o que existirá depois da morte encerra múltiplas interpretações. Afinal, a partir do momento final o que me espera do lado de lá se é que ele de fato existe?

O mundo mudou demais nos últimos 50 anos. As crianças que hoje vivem em apartamentos nas cidades, tendo à mão artefatos eletrônicos e aparelhos de televisão a cores, não podem imaginar o que era a vida no passado. Pequenas localidades, luz elétrica nem sempre presente, casas antigas e, vez ou outra, algum contador de causos narrando histórias arrepiantes. Juntos tais ingredientes fermentavam o medo.

Quando criança tive muito medo de almas do outro mundo, de vampiros e lobisomens etc.  Bastava algum conhecido morrer para, imediatamente, passar a fazer parte do contingente de fantasmas que vagavam pelos escuros das casas, podendo aparecer a qualquer momento a uma pobre criança. Existia uma cultura do medo, fomentada pela crença de que nem todos os que morriam subiam direto ao céu para prestar contas pelos seus pecados. Almas penadas erravam pelo mundo, algumas delas entregando-se, prazerosamente, ao ofício de assustar crianças.

Como quase toda gente nascida no pós-guerra sempre tive pé atrás com a cultura norte-americana embora confesse ter sido precocemente seduzido pelo jazz. Não chegava ao excesso de acreditar que os irmãos do Norte botavam ingredientes subversivos na Coca-Cola para tornar-nos favoráveis aos EUA em sua ferrenha disputa com os russos durante a Guerra Fria. Mas, dada a dominação econômica e cultural dos EUA sobre o bloco americano foi-me impossível não ter certo preconceito contra as tais “coisas de americanos”. Entre elas, o “Dia das Bruxas” ou “Hellowenn”, por que não?  Aquela história de festas, fantasias, travessuras, lanternas de abóboras, fogueiras, adivinhações etc. eram, de fato, bem coisa de americanos. Daí que nunca acreditei que a mania viesse a pegar no Brasil onde vigoram outras tradições e costumes. Mas, eis que aconteceu. Hoje em dia crianças em idade escolar comemoram o “Dia da Bruxas”, incorporando hábitos americanos. Fantasias, mascaras e tudo que se relaciona a bruxarias fazem parte de festas escolares e, mesmo, reuniões de adultos que se fantasiam para a ocasião.

Eis que, de repente, me vi vencido pela tal festa. Além da diversão em si que dela faz parte há que se elogiar a descaracterização do medo. Faces lúgubres, fantasias espectrais e outros adornos do mesmo tipo “normalizam-se”. Que mal há nesse contato precoce com monstros e fantasmas que de fato não passam de fantasias para festa? Bem melhor que ter-se 13 anos de idade e estar, 50 anos atrás, num lugarejo, tendo nas mãos o conto “A máscara da morte rubra” de Edgard Allan Poe. A morte rubra comparece a uma festa à fantasia num palácio e passa a atacar os festivos convivas. Horror, puro horror, horror de dar medo de apagar a luz do quarto na hora de dormir.

Aliás, nos últimos tempos tenho feito as pazes com a morte, talvez porque ela de fato esteja no meu encalço. Fui ao México e me apaixonei pelas Katrinas, aquelas caveirinhas. É impressionante a cultura daquele povo em relação à morte. O dia dos mortos é comemorado com grande festa. Enfeites, fantasias, esqueletos, ceias em cemitérios, caveirinhas com açúcar etc. A festa, também chamada de “Carnaval dos Mortos”  se baseia na lenda de que, nos dias 1 e 2 de novembro, os mortos têm permissão para vir à Terra, visitar seus entes queridos. Daí preparem-se comidas de que os mortos gostavam e enfeitar as casas para recebê-los.

Com tudo isso pode-se dizer que o medo do sobrenatural anda em baixa.

Rumo ao Ross 128 b

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A população humana cresce de ano a ano, as reservas naturais do planeta podem se esgotar. Acordos climáticos nem sempre são cumpridos. Os EUA de Trump recusam-se a participar de acordos que restrinjam sua atividade industrial. O mundo corre perigo.

Pelas razões acima muito se fala sobre a possibilidade de imigração humana para planetas cujas condições climáticas e atmosféricas sejam semelhantes às da Terra. Atmosfera nas quais existam oxigênio, gás carbônico e metano são favoráveis ao desenvolvimento da vida e, potencialmente, aptas para receberem formas de vida tais como as conhecemos.

Eis que um novo planeta é descoberto, supondo-se que reúne condições para a existência de vida. Trata-se do Ross 128 b cujo tamanho é cerca de 1,5 vezes o da Terra e orbita em torno de uma estrela anã a uma distância 20 vexes menor que a existente entre a Terra e o Sol.  Entretanto, pelo tamanho menor da estrela anã o 128 recebe um pouco mais de radiação que a que nos chega do nosso Sol. Daí supor-se que a temperatura do planeta recém-descoberto seja semelhante à que temos na Terra. Se as previsões forem corretas é possível a existência de água no 128 b.

O Ross 128 b dista 11 anos-luz da Terra. Não é uma distância desprezível, embora em termos de universo possa se considerar o planeta como muito próximo. Para que se tenha ideia o ano-luz é a unidade que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano, à velocidade de 300 mil km/s. Essa unidade é utilizada para medir distâncias no sistema solar e entre partes do universo. A Lua, por exemplo, dista apenas 1 segundo-luz da Terra. Já o Sol está a oito-minutos luz de nosso planeta. A distância da Terra à Lua é de 384.403 km. Comparando: 1 ano-luz corresponde a 9.461.000.000.000 km, dai é só multiplicar esse número por 11 para se saber a distância entre a Terra e o Ross 128 b.

Ou seja: distância intransponível pelo menos através dos meios de locomoção de que dispomos. De modo que o melhor é se pensar em soluções caseiras para os nossos problemas de sobrevivência em nosso planeta. É nosso dever deixar para as gerações futuras um mundo no qual possam viver em segurança e dispondo de boas condições de sobrevivência. Tal legado vê-se ameaçado nos dias atuais pelo uso abusivo dos recursos naturais, intervenções nos ecossistemas e ameaças nucleares. Dentro de tal contexto esperam-se atitudes lúcidas dos governantes com a adoção de políticas de respeito ao ambiente. Disso depende a continuidade do homem na Terra.

João Gilberto

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Não sei se é correto dizer que João Gilberto não é amor à primeira vista. Pelo menos foi assim comigo. Como todo mundo ouvi no rádio “Chega de saudade”, pela primeira vez, em 1958. Longe de mim ter percebido a famosa nova batida de João ao violão. Lembro-me apenas de um cantor que me pareceu desafinado e num tom de voz ao qual ainda não me acostumara. Até então vivíamos sob os acordes do samba-canção sob as vozes poderosas de Orlando Silva, Ângela Maria, Cauby Peixoto, Dalva de Oliveira e tantos outros.

Aliás, 58 foi ano de muitas surpresas, para nós destacando-se a conquista da Copa do Mundo na Suécia na qual Pelé revelara-se para o mundo. Lembro-me bem de encontro casual, na rua, com o Lico no qual ele justamente se referiu a João Gilberto, dizendo: aquilo não é música.

João eliminara o vibrato e fazia-se acompanhar ao violão com acordes diferentes que permitiam alongar ou reduzir o tempo da voz. Utilizava dois microfones, um para a voz, outro para o violão o que era novidade. Assim, não só estabelecia o novo ritmo da bossa nova como, depois, recriaria antigos sucessos da música brasileira.

Do cantor que se apresentava em boates chiques do Rio nos anos 50 Gilberto converte-se num ícone da música mundial. De início apresentando-se no Brasil, logo iniciaria a carreira mundial, apresentando-se em várias partes do mundo, inclusive nos EUA onde sempre foi reverenciado. Desde o começo João Gilberto influenciou grandes nomes do jazz e até hoje esse gênero musical deve a ele importantes inovações rítmicas. O lançamento do disco “Chega de Saudade” ao lado do saxofonista Stan Getz tornou-se divisor de águas no mundo musical. Isso sem falar nos novos cantores e músicos que a partir daí surgiram em nosso país, tais como Caetano Velloso, Gilberto Gil, Ellis Regina e tantos outros. Ao lado de João Gilberto também florescia a carreira do maestro Tom Jobim que, a parir dos acordes propostos por João, criaria standards da bossa nova.

Apresentando-se nas mais sofisticadas salas do mundo e diante de plateias exigentes, sendo agraciado com prêmios e reconhecimentos, seguramente nenhum outro artista brasileiro terá alcançado projeção mundial equivalente à de João Gilberto. De modo que para seus fãs soa constrangedora a notícia de que o grande artista, aos 86 anos, encontra-se em situação financeira delicada e, talvez, incapacitado para gerir seus negócios. Publica-se que a filha de João acaba de conseguir na Justiça a interdição do pai para gestão pessoal, patrimonial e financeira. Declara-se, assim, o artista incapacitado para atos da vida civil.

A velhice é período de complexa transição para os seres humanos. Para nós, a quem João Gilberto conquistou a aura de imortal, entristece-nos a revelação de sua atual condição. Embora verdadeiro o fato de que a velhice e a própria morte chegam para todos existem casos nos quais somos levados a pedir alguma consideração do destino em relação a alguns mortais. Seria esse o caso em relação a João Gilberto. Mas, como se disse, a regra vale para todos, ninguém escapa.

O politicamente correto

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Não sei se as chamadas “piadas de português” já passaram ao rol das discriminações. Se acontecer será uma pena porque algumas delas são ótimas. Consta que em Portugal existe o revide dada a existência de grande rol de piadas sobre brasileiros.

O afastamento de William Waack pela Rede Globo reacende a discussão sobre o racismo. O jornalista experimentado e de grandes méritos foi flagrado num vídeo de conteúdo racista divulgado na internet.  Fosse em épocas distantes não se daria tão grande importância ao assunto. Mas, nesses tempos de politicamente correto será difícil, senão impossível, ao jornalista livrar-se da situação em que se encontra.

Há, também, o caso da atriz que gravou comercial, anunciando o lançamento de papel higiênico preto. O entendimento do teor racista do comercial gerou protestos e provocou as desculpas da empresa fabricante e da atriz.

Não é possível se negar a existência de preconceito racial no país. Por mais que se tente camuflar em nome da tal cordialidade dos brasileiros o fato é que preconceito e discriminação existem em grande escala. O diabo é que certos modos de falar incorporados aos discursos comuns do dia a dia passaram a ganhar peso maior nos dias atuais. Certas brincadeiras antes tidas como “normais” tornaram-se inaceitáveis.

Nos meus tempos de estudante, em São Paulo, certa vez aconteceu-me caso interessante. Estava eu num ônibus quando, de repente, o motorista parou num ponto, levantou-se e veio na minha direção. Era um negro alto que se dirigiu a mim, tratando-me pelo meu nome. Bem, era o Eleutério, Eu conhecera o Eleutério, irmão do Policarpo, em meus tempos de menino. O avô dos dois trabalhara para o meu avô, o Policarpo fora ajudante do meu pai. Depois a família deles se mudara para são Paulo e perdemos contato. De modo que foi grande a minha alegria de reencontrar o Eleutério e ter notícias da mãe dele que já se habituara à cidade grande e gozava de boa saúde. O detalhe é que na ocasião em que reencontrei o Eleutério, no momento em que ele se aproximava de mim, uma senhora sentada a meu lado recomendou: cuidado, é preto…

Para algumas pessoas o preconceito racial é uma barreira intransponível. Hitler exterminou 6 milhões de judeus em nome da necessidade de limpeza étnica. As fotografias de corpos amontoados em campos de concentração causam-nos mal-estar e nos levam a ponderar sobre os limites da maldade humana.

Leio que um rabino de 93 anos, homem que passou por cinco campos de concentração durante a guerra, não acredita na bondade humana. Para ele o homem é um ser naturalmente mau, capaz de selvagerias. Entende-se a opinião de pessoa que enfrentou tão grandes martírios e sobreviveu. Mas, não se pode generalizar. Demais o homem é um ser ambíguo. O verniz da civilização pode desaparecer diante de circunstâncias desfavoráveis. Em todo caso é preciso sempre repetir que racismo, intolerância, segregação racial e discriminação são inaceitáveis. Talvez por isso se torne cada vez mais difícil aceitarem-se manifestações de  teor discriminatório como no caso do jornalista da Globo.

Estupros

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Aberta a caixinha de surpresas com a denúncia de estupros por famoso e poderoso produtor da indústria do cinema norte-americana eis que reputações até hoje consideradas ilibadas veem-se manchadas por séries de acusações que contra elas se avolumam. Identifica-se o modus operandi que alicerça o ritmo das denúncias de estupro: depois que uma das vítimas vem a público dizendo ter sido estuprada por alguém outras se encorajam e, também, se identificam. Não deixa de ser impressionante, por exemplo, como de poucos dias para cá se somam vítimas agredidas sexualmente pelo ator Kevin Spacey . Trata-se em geral de pessoas que sofreram assédio por parte do ator quando ainda rapazes. Tantas são as vítimas que não resta a Spacey senão desculpar-se e dizer que procura tratamento para o seu terrível comportamento.

A indústria do cinema prontamente reage às acusações, punindo de modo exemplar os infratores do código moral. Kevin Spacey, ganhador do Oscar, está sendo severamente punido. O encerramento da série “House of Cards” por ele estrelada e o apagamento das cenas em que aparece num filme a ser em breve lançado são ações punitivas numa carreira que pode ser considerada encerrada.

Mas, novos casos aparecem no mundo do cinema onde o poder de alavancar ou destruir carreiras de atrizes serve como moeda de troca de favores sexuais. Hoje o conhecido comediante Louis C. K. foi acusado de se masturbar diante de mulheres. Em reportagem publicada pelo New York Times cinco mulheres acusaram o comediante do mesmo ato.

A verdade é que assédios e práticas de sexo não consensual fazem parte do dia-a-dia, havendo ou não uso de situações hierárquicas nas quais algumas pessoas, na maioria das vezes mulheres, acabam cedendo a pressões para não serem prejudicas em suas carreiras e empregos. No passado soube do caso de funcionária de um banco que viu=se ameaçada de ser demitida pelo seu superior caso não cedesse aos seus avanços de natureza sexual.

As manchetes abaixo fazem parte do noticiário publicado hoje no site G1 da Globo:

“Funcionária de prefeitura acusa secretário de assédio e é demitida”.

“Jovem estuprada denuncia pai e é rejeitada pela família”.

“Guia de turismo é investigado por abuso e assédio a três mulheres”.

“Portia de Rossi relata assédio de Steve Segall em teste para filme”.

“Ator Corey Haimm acusa Charley Sheen de pedofillia”

“Mais uma mulher acusa ator de “Gossip Girl” de estupro”.

Como se observa infelizmente estupro é o tema recorrente na mídia. Na TV um comentarista sugere que, na verdade, isso sempre aconteceu. Ocorre que, atualmente, a proliferação de meios de comunicação tem incrementado a exposição de estupradores, pedófilos e toda sorte de criminosos sexuais. Daí o triste noticiário que presenciamos cujo fim não se tem expectativa de que venha em breve a acontecer.

Violência incontrolável

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O Ministro da Justiça declara haver corrupção no comando da polícia do Rio de Janeiro. A notícia nos deixaria estupefatos não fosse a interminável onda de corrupção e violência que atravessamos. A se comprovarem as declarações do Ministro fica-se à mercê de conluios entre policiais e traficantes. O homem comum não terá mais a quem apelar. Como confiar num sistema de segurança corrompido até mesmo na alta hierarquia da polícia, caso exista? O problema é que quem fez as afirmações não é qualquer um: trata-se do Ministro da Justiça.

No Texas um homem entra numa igreja e fuzila os fiéis durante cerimônia religiosa. Mata 26 pessoas e fere outras tantas. Depois foge, bate o carro e aparece morto. Não se sabe, ainda, se terá cometido suicídio. O celerado servira a força aérea do país e tinha 26 anos.

Dias antes, em New York, um terrorista, dirigindo um caminhão, invade uma pista de ciclismo, mata oito pessoas e fere algumas. Cinco dos mortos eram argentinos que estavam na cidade para comemorar os 30 anos de formados em universidade. Ferido e preso pela polícia o terrorista, de origem muçulmana, identifica-se como simpatizante do Estado Islâmico.

Há menos de um mês um atirador executou 50 pessoas que assistiam a um show de música em Las Vegas. Atirando, indiscriminadamente, contra a multidão o assassino suicidou-se antes da chegada da polícia ao quarto de hotel de onde ele perpetrou seu hediondo crime.

Em Goiânia um aluno da oitava série entra na sala-de-aula de mata dois de seus colegas, ferindo outros. Alega sofrer bullying, nisso a razão de sua ação. Os pais do atirador, dois policiais, nãos sabem o que fazer. As famílias dos adolescentes mortos em crise.

Enquanto isso a guerra diária na Favela da Rocinha segue adiante, fazendo mortos em combates com traficantes. Policiais morrem em enfrentamentos com traficantes. Semana passada um comandante da polícia foi assassinado pelos bandidos. Ontem um policial à paisana foi executado por um bandido.

Em 2016, 60 mil pessoas foram assassinadas no Brasil, número que ultrapassa o número de mortes verificados em guerras que acontecem no mundo.

Semana passada uma jovem combinou, através de uma rede social, carona com um desconhecido para viagem até o Triângulo Mineiro. Não sabia ela que o tal era um bandido fichado cuja intenção era a de matá-la e roubá-la. O corpo da jovem foi encontrado com cabeça dentro da água. O assassino foi preso e narrou friamente à polícia como arquitetou e executou o crime.

Seguiria, interminavelmente, relacionando crimes e mais crimes que a toda hora são noticiados. Tanta violência nos leva a perguntar sobre o que terá acontecido com a natureza do ser humano. Desigualdade social, assassinatos em nome da fé e outras razões serão suficientes para explicar tamanho descalabro?

Afinal, o mundo tem volta?

Mulher brasileira

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Quando minha filha voltou da Espanha perguntei a ela se gostara daquele país. Respondeu-me: exceto pelo fato de lá brasileira ser sinônimo de puta, adorei Madri.

Na época noticiava-se que brasileiras eram levadas à Europa com propostas de trabalho falsas e, uma vez no continente, obrigadas a se prostituir. Minha filha, viajante ocasional, certamente topara com essa situação durante sua estadia em Madri.

Mulher bonita sempre desperta o bloco dos garanhões. Samuel Wainer relata em suas memórias caso acontecido em Moscou. Na época o conhecido proprietário da “Última Hora” era casado com a modelo Danuza Leão. Numa recepção um oficial solicitou licença para dançar com Danuza e, claro, que problema haveria. Wainer só começou a se incomodar quando percebeu a presença do vigésimo candidato a uma volta no salão com sua mulher. Olhe que a fila ainda era grande. Hora de ir embora.

Aconteceu numa praia famosa do Ceará, de cujo nome não me lembro. Lugar maravilhoso no qual havia uma barraca bastante agradável e muito bem instalada. Sentamo-nos, eu e minha mulher, para uns goles e os camarões de sempre. Demorei a perceber um americano em mesa não tão próxima, mas que não tirava os olhos de minha mulher. Tudo bem, olhar não mata. Mas cansa. Vinte minutos depois cansa ainda mais - e muito.

Mas, o pior foi quando o cidadão do hemisfério norte simplesmente se levantou, máquina fotográfica em punho, veio até a mesa onde estávamos e pôs-se a fotografar a minha mulher. Assim. Na maior.

Depois o gringo retornou ao lugar dele como se nada tivesse acontecido. Eu? Bem. E agora? Conheço gente que teria partido pra cima e arrebentado o cara ali mesmo. Mas, brigar? Sair no braço com aquele gringo desaforado? Demais, o tal era grande.

Confesso que fiquei mordido e, pior, aquilo não poderia ficar no pé em que estava. Tem hora em que a gente se vê obrigado a ser homem sob pena de trair a macheza. O que fiz? Apenas me levantei, fui até a mesa do gringo, peguei a máquina fotográfica, abri e arranquei o filme. Sim, na ocasião ainda não chegáramos à fotografia digital.

Desenrolei o filme e o joguei sobre a mesa, danificado. O gringo? Ora, era como não se fosse com ele. Mal me olhava. Assistiu a tudo sem gesto, nem palavra. Uma estátua. Não reagiu.

De novo com minha mulher ela me disse que não me supusera tão corajoso. Eu? Bem, contou pontos.

Quando saímos tive a impressão de que o desgraçado ainda olhava a minha mulher. Não tive certeza disso.

Fazer o quê?

Escrito por Ayrton Marcondes

30 outubro, 2017 às 2:05 pm

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O caso Kennedy

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Donald Trump acaba de liberar parte dos documentos secretos relacionados ao assassinato de John Kennedy, em Dallas. Kennedy foi assassinado em 22 de novembro de 1963 durante desfile em carro aberto pela cidade. Ainda hoje as imagens do acontecimento impressionam. O presidente, bastante jovial, seguia ao lado de sua esposa no banco de trás do carro. Há fotos dele instantes antes de ser atingido e já caído sobre a esposa após o projétil atingir sua cabeça. Impressiona a súbita morte do homem mais poderoso do mundo, desparecido de um segundo para outro.

Eram os tempos da Guerra Fria. Pairava sobre nós a ameaça de um embate nuclear que colocaria fim ao mundo em que vivíamos. A cortina de ferro e os EUA não se entendiam. Lembro-me da devastadora repercussão da notícia do assassinato de Kenedy. Parecia-nos impossível que um homem como aquele estivesse simplesmente morto.

A partir do instante em que Kennedy morreu começaram as especulações. Teriam sido os russos? Fidel Castro teria alguma participação? Ou sulistas norte-americanos movidos por interesses regionais seriam os responsáveis pelo atentado? Grupo terrorista?

Prenderam Lee Oswald, o assassino.  Entretanto, Oswald foi assassinado em seguida por Jack Ruby, proprietário de um bar em Dallas. Depois disso especulações. Milhares de páginas foram escritas sobre o caso sem que tenha se chegado a conclusão definitiva.

Um ano depois a Comissão Warren publicou relatório no qual não se destacaram novidades. Daí o interesse pelos documentos agora liberados dada a possibilidade de trazerem à luz novidades sobre o assunto.

John Kennedy sobrevive nas memórias pela empatia pessoal, cargo que ocupou e, principalmente, pelo conjunto de fatos que cercaram seu assassinato. A posse de Johnson, a presença de Jackeline, o funeral em Washington e a comoção mundial tornaram aquele novembro de 1963 inesquecível.

Dias atrás ouvi uma fala num filme na qual a personagem dizia: o período em que vivi em breve será esquecido. De fato, somos nada mais que seres passageiros nesse mundo, presos às circunstâncias de momento que nos cercam. Entretanto, vale ponderar sobre o fato de que a trajetória de John Kennedy provavelmente sobreviverá por algumas gerações futuras. De tal modo sua passagem por aqui foi tão emblemática que dificilmente será relegada ao esquecimento.

Traição

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Vez ou outra relembro o caso do Aurélio e me ponho a cismar sobre o que teria acontecido a ele. Nos anos sessenta do século passado o Aurélio enamorou-se de bela moça. Apaixonado pediu-a em noivado e, depois, em casamento. Casaram-se na igreja e no cartório. Núpcias realizadas, partiram em viagem de lua de mel.

Passados alguns dias eis que retorna o Aurélio, desacompanhado da mulher que ficara na casa de seus pais em cidade próxima. Entretanto, eis que o tempo passa e nada da mulher. Como se sabe a curiosidade do povo não perdoa a ninguém. Falatório em andamento o Aurélio não tem como manter o silêncio. Acaba confessando que descobrira a mulher não ser virgem, condição sem a qual não poderia ele seguir adiante com ela.

Aurélio nunca mais se casou, nem consta de ter-se ligado a qualquer mulher depois. Assumiu o papel do homem reservado e triste que o destino a ele impusera. Anos depois morreu nessa condição.

Aconteceu há algum tempo ter-me encontrado com um amigo, parente do Aurélio. Conversa vai, conversa vem, retomamos o estranho caso. Eu disse que sempre estranhei a separação do Aurélio, ainda mais de mulher tão bonita e vistosa. Seria possível que ele exigisse virgindade de uma moça naquele final da década de sessenta quando as mulheres alçavam bandeiras de liberdade?

Ouvi de meu amigo hipótese que jamais supusera. Chamava-me ele a atenção para o modo de ser do Aurélio, tipo quietão que, até enamorar-se, jamais tivera relacionamento com qualquer mulher. Aliás, nem antes, nem depois de ter-se casado e separado. Pelo que não seria absurdo se supor que “talvez o problema fosse dele”. Ou seja: o Aurélio poderia ser uma dessas pessoas para quem o sexo inexiste. Aliás, rematou o amigo, a moça com quem ele se casara jamais disse uma só palavra sobre o que teria a eles acontecido na tal viagem de lua de mel. Mais tarde ela se casara e tivera filhos, agora pessoas adultas.

Para o Aurélio a noiva o traíra. Será?

Hoje se publica um caso acontecido em Portugal. Um juiz amenizou a sentença dada a um marido condenado por maus tratos à esposa. A essa conclusão chegou o juiz por considerar inaceitável o fato da esposa ter traído o marido. O adultério cometido pela mulher resultou na minimização da sentença do agressor.

A sentença do juiz veio a público e tem despertado reações na internet. Em seu acórdão o juiz entende que “a sociedade sempre condenou e condena fortemente (e são as mulheres honestas as primeiras a estigmatizar as adúlteras) e por isso vê com alguma compreensão a violência exercida pelo homem traído, vexado e humilhado pela mulher. Foi a deslealdade e a imoralidade sexual da assistente que fez o arguido X cair em profunda depressão e foi nesse estado depressivo e toldado pela revolta que praticou o ato de agressão”

Que se saiba não houve agressão do Aurélio à mulher que acusou de não se virgem. De todo modo os envolvidos já estão mortos embora tenham nos deixado em aberto o curioso caso de sua malfadada união.

A guerra dos macacos

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No filme “Planeta dos macacos - A Guerra” vemo-nos em situação interessante. O acaso de um erro de manipulação genética tornou os macacos inteligentes. Diante da impossibilidade de convivência pacífica entre homens e macacos acontece a guerra. Um coronel comanda um grupo de soldados que aprisiona macacos e os submete à fome e sede. César, líder dos macacos, é preso e torturado. A luta encarniçada parece não ter solução, nem fim.

Somos induzidos a aceitar que aos humanos não resta outra possibilidade que não a de eliminar os macacos. Constrange-nos a maldade dos homens que tratam os animais inteligentes como nada mais que coisas. O mundo pertence ao homem e a civilização humana ameaçada deve ser salva custe o que custar.

Eis aí um conflito a exigir do espectador que tome partido. Afinal, somos favoráveis aos homens ou aos macacos? Questão difícil, mas que, do modo como nos é colocada, fácil de resolver: a torcida é pela vitória dos macacos.

Pesa nessa decisão o cansaço pela conhecida maldade humana. No filme o homem é o predador, o macaco a vítima. O coração pende para o lado dos humilhados e torturados. O macaco se revolta, mas deixa transparecer que, no fundo, quer o bem. E dá no que dá, assunto para quem assistir a película e se decidir.

A imagem de Charlton Heston, andando numa praia deserta e dando com a Estátua da Liberdade destruída está gravada em nossas memórias. O primeiro “Planeta dos Macacos” dava-nos conta do fim da civilização humana e da supremacia dos macacos. O problema persiste nos filmes do gênero mesmo passadas décadas da realização do primeiro.

Mas, afinal, seríamos mesmo contra a nossa espécie caso fôssemos levados às condições extremas propostas no filme? Não creio. Talvez por isso a supremacia dos macacos não nos encante, por mais que tomemos o partido deles no escuro das salas dos cinemas.