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É o que temos para hoje
O “Fora Temer” continua em ação. O Senado Federal deu mostras de que a presidenta afastada não terá chances de voltar ao poder. Aliás, ela e seu partido batem cabeças. Dilma prepara-se para publicar em carta seu testamento político. Preocupa-se com sua biografia. Fala-se em outra carta pedindo novas eleições. O PT teme que ela ataque o partido ao qual já atribuiu culpa pelo caixa 2 de campanha. O mar não está pra peixe para os petistas acusados por todos os lados e clamando por inocência de seus pares.
“Fora Temer”? Bem, Temer é o que temos para hoje. Goste-se ou não. Não se acredita que Dilma, caso volte ao poder, possa gerir o país. A presidenta afastada caiu em descrédito para grande parcela da população. Por suas características pessoais ficou de mal com os congressistas que se recusam a apoiá-la. Tem, sim, seus seguidores, cada vez em menor número.
Então: “Fora Temer”? Se pudéssemos passar borracha em tudo, apagar tudo, desligar as memórias e vir-nos diante de um quadro novo, com pessoas novas: que maravilha. Mas, só temos o Temer que, aliás, foi eleito juntamente com a Dilma. Se ele sair a solução ocorrerá por vias indiretas e sabe-se lá no que vai dar.
São admiráveis essas pessoas, os contrários e os favoráveis ao retorno da presidenta. Golpe e democracia são, a todo instante, palavras arroladas em intermináveis embates de opinião. Acusações e defesas se alternam em acaloradas discussões.
Mas, o que não se pode negar é que, devagarinho, o país parece começar a voltar aos trilhos. Nada resolvido, mas respira-se, é verdade que ainda com dificuldades. O sufoco de políticos enfrentando-se e o país paralisado refluiu. É preciso trabalhar.
Então, o “Fora Temer”…
A sessão “Mortes”
De poucos anos para cá não deixo de ler a sessão “Mortes” dos jornais. Os obituários passaram a me interessar e me pergunto sobre a razão. Fulano de tal tinha tantos e tantos anos e será enterrado em tal cemitério. Em alguns jornais publicam-se informações sobre a trajetória de vida de algum dos falecidos. Nasceu em tal cidade, imigrou ou não para o Brasil, fazia isso ou aquilo, tinha bons amigos, empenhava-se em tal atividade, deixou viúva e filhos. Pequenas histórias sobre a vida de pessoas em geral desconhecidas que no fundo funcionam como sinal para os vivos: um dia tudo acaba.
Percebo que o que mais interessa nos obituários é a duração da vida. Quantos anos esteve entre nós aquela senhora desaparecida ontem? Estamos morrendo mais tarde como dizem os que alertam sobre o envelhecimento da população? Estarei entre os que partem mais cedo ou terei, ainda, pela frente uns aninhos?
É certa intolerância em relação ao embarque no barco de Caronte o que me move a buscar notícias sobre a morte. Não tenho a menor ideia sobre a vida das pessoas que desertaram do planeta. Mas eles me atraem, talvez pela parceria de condição. Vivemos como se a vida jamais tivesse fim. Conheci doentes terminais que, no leito de morte, clamavam pelo destino de seus negócios. O vínculo da vida é forte, muito forte. Num jogo sem saída, no qual ou se vive ou se morre, não resta lugar para ilusões. É viver ou morrer.
Muito raramente topo num obituário com o nome de alguém que posso ter conhecido. Nesses anos descobri em obituários de jornais dois nomes de pessoas a quem de fato conheci, uma delas meu colega de bancos de faculdade. Mas, de que teria morrido ele? Tinha a minha idade, levara-o a doença? Um acidente? Vítima de um crime? De que morrera aquele colega de tantos anos com quem eu perdera o contato e de repente o reencontrava num anúncio para a missa de sétimo dia?
Através de outros amigos vim a saber que o colega tivera vida profícua, destacando-se em seu âmbito profissional. Entretanto, o mesmo não ocorrera em sua vida particular. Circunstâncias desconhecidas agravaram seu estado psíquico, levando-o ao suicídio. Entretanto, não soubera como dar fim à vida, sobrevivendo à tentativa e ficando em estado vegetativo. Permaneceu assim durante alguns meses até sua morte vir publicada no jornal.
Houve tempo em que pensei na morte. Se acordava de madrugada sempre me entregava à suposição sobre o tempo que me restava de vida, a possível circunstância da minha morte e o sofrimento. Lembrava-me de meu pai morrera quase que instantaneamente enquanto minha mãe sofrera durante alguns anos até o seu óbito.
Hoje em dia a morte não mais me preocupa. Não tenho medo de morrer. O fim da vida parece-me algo natural e nem mesmo vejo razões para preparara-me para o fim. Acontecerá, sei lá quando, e ponto final.
Então, por que a atração pelos obituários? Não sei. Pergunto-me sobre o meu possível interesse caso houvesse nos jornais a sessão “nascimentos”. Lembro-me de que, no passado, alguns órgãos de imprensa publicavam notas sobre a vinda ao mundo da criança tal, filha do ilustre casal tal etc. Mas, teria eu interesse sobre esse assunto?
No fim das contas é a proximidade da morte que começa a governar nossos passos cada vez mais claudicantes. Não é bom racionalizar o assunto, exagerar sobre o inevitável. Mas, não deixa de ser estranha a sensação de que nos aproximamos cada vez amis do fim, que tudo que somos a acreditamos ficará encerrado sob uma lápide. Ou num cantinho de jornal.
Perigo iminente
Era um negro alto e muito forte. Trazido por policiais ao PS -pronto-socorro - apresentava cortes num dos braços. Sangrava bastante. Os policiais fizeram-no deitar-se na maca da sala de atendimento. Eram cinco. Um deles ficava à distância, com a mão sobre o revólver preso à cintura. Os demais posicionaram-se, dois de cada lado. Segurança.
O médico estranhou. Chamou um dos policiais de lado e perguntou sobre a razão de tanto aparato. Ouviu que não sabia com quem estaria tratando. O bandido fora preso durante um assalto. Era chefe de gang, muito procurado. Perigosíssimo.
Acostumado ao inesperado o médico não se abalou. Eram quatro da manhã, o sono pesava. Aproximou-se do homem sobre a maca, limpou o ferimento do braço e preparou-se para a anestesia local. No momento em que ia enviar a agulha no braço, o bandido se retraiu. Alterando a fisionomia, estamparam-se em sua face sinais de receio. Ao que bradou:
- Injeção não tomo de jeito nenhum.
Em vão o médico explicou que se tratava de anestesiar o braço. Anestesia local sem o que a dor pela sutura seria insuportável. O bandido sacudia a cabeça: não, não e não.
A essa altura um dos policiais, temendo uma reação mais forte, perguntou ao homem se o médico poderia costurá-lo sem anestesia. Ao que ele respondeu de pronto, mandando seguir em frente.
Foi assim. O corte era profundo de modo que foram necessários muitos pontos internos. A cada passagem da agulha de sutura o homem da maca se contraia, sempre quieto. Em vão o médico tentou explicar que cada passada da agulha de sutura corresponderia à picada para a anestesia.
Terminado o atendimento o bandido sentou-se para ser levado. O médico tirava as luvas quando ouviu de seu estranho paciente a confissão de que, na verdade, morria de medo de injeções. Desde criança. Aliás.
Em pé o bandido mais parecia um gigante. Saiu cercado pelos cinco policiais. Na porta voltou-se e disse ao médico que acaso precisasse dele estaria à disposição. Agradecia ao favor.
Era um bandido famoso, como se disse procurado pela polícia. Sabe-se lá o que o levara o crime. Mas, debaixo daquela armadura que tanto impressionava, vivia um menino. Um menino que tinha medo de injeções.
Foi Freud quem nos alertou sobre a falsa suposição de que nós, adultos, somos donos dos nossos narizes. Há sempre uma criança intrometendo-se em nossos atos e decisões.
Praga no futebol
Não adianta somos um povo apaixonado pelo futebol. Aliás, perdidamente apaixonado, justificando-se a tal história da pátria de chuteiras.
Não me lembro da Copa de 54. O Brasil perdeu para fortíssima Hungria de Puskas e voltou para casa. Creio que o primeiro jogo de seleção de que me recordo – tinha então 6 anos de idade - foi o do Brasil com a Inglaterra, em 1956. O jogo foi transmitido pelo rádio e meu irmão ouviu a narração. Foi o tal jogo em que o “velhinho” Stanley Mathews, de 40 anos, fez o diabo com o Nilton santos, lateral esquerdo do escrete que, mais tarde, ficaria conhecido como a “Enciclopédia do Futebol Brasileiro”. O Brasil perdeu por 4 a 2, jogando no estádio de Wembley completamente lotado. O técnico era Flávio Costa, o mesmo do vexame de 50 no Maracanã.
Depois disso vieram as glórias. Campeão em 58 e 62, tricampeão em 70 e por aí foi até o pentacampeonato. Então os deuses parecem ter se cansado de nosso futebol. Participações medianas em copas, excetuando-se as competições de 82 e 86 que perdemos, mas seriam nossas.
O fato é de alguns anos a este a coisa toda assumiu ares de maldição. Os deuses parecem não só ter-nos virado a face como amaldiçoado. Uma grande praga, enorme, talvez tenha siso mesmo lançada sobre o futebol brasileiro que, da noite para o dia, parece estremecer diante de seus antigos fregueses. Na Copa de 2014 realizada no país estampou-se ao mundo a maior vergonha da história de nosso futebol, maior até que a derrota para o Uruguai, no Maracanã, em 50. A seleção da Alemanha humilhou aos nacionais, simplesmente irreconhecíveis, sob o placar de 7 a 1. Poucas vezes se verificou maior silêncio em nossas ruas. O país entrou em transe que demorou a passar.
Mas, praga é praga. Quando pega atinge todos os níveis. Agora ela pesa sobre a seleção olímpica do Brasil que desencanta ao não conseguir vencer seleções de países sem qualquer tradição futebolística. Ontem, diante do Iraque, deu-se mais um passo nessa sequência de tristes apresentações. Empatar por zero a zero com o Iraque, cá entre nós, é o fim do mundo.
Mas se temos bons jogadores, se temos tradição, por que isso aconteceu? Meus caros, a culpa só pode ser dos deuses. De algum modo a glória de nosso futebol deve tê-los incomodado. Talvez por colocá-los em segundo plano, encobrindo-lhes o natural brilho.
A solução? Bem, feiticeiros não faltam no país. Quem sabe um trabalho realizado nos terreiros, de norte a sul, resolva o problema. É hora de convocar pais-de-santo que, em esforço conjunto, poderão reverter a atual situação.
Você não acredita nisso? Então vá se preparando. A seleção principal corre risco de não se classificar nas eliminatórias para a próxima copa. E a olímpica está, nesse momento, correndo ladeira abaixo. Talvez, um grande esforço geral, muita mandinga, ajude a convencer os deuses que ficaram de mal com o nosso futebol. Porque esperar pelas pernas de nossos jogadores e suas chuteiras…
Independence Day Ressurgência
Filmes de aventura e ficção científica distraem. Talvez por isso eu seja aficionado do gênero. Americanos adoram grandes produções nas quais, em geral, as cidades daquele país são destruídas. Lembram-se do filme 2012? Cidades inteiras desapareciam em minutos sob a força da invasão de águas oceânicas. Enquanto isso acontecia os heróis do filme fugiam a bordo de um pequeno avião pilotado por amadores. No fim os continentes são cobertos pelas águas, mas novas terras emergem. Aos sobreviventes resta a missão de repovoar o mundo.
Independence Day Ressurgência é continuação do primeiro filme que trata do mesmo tema. Mais uma vez a Terra é invadida pelos mesmos alienígenas que, como ficamos sabendo, dedicam-se a destruir planetas e civilizações. Como não poderia deixar de ser os estragos em nosso planeta são enormes. Edifícios desabando, cidades inteiramente destruídas e o homem acuado diante de uma tecnologia agressiva para a qual não dispõe de equipamentos à altura. Verdade que a tecnologia dos humanos também evoluiu. Viagens à Lua se tornaram corriqueiras a bordo de naves dotadas de grande propulsão.
Tudo isso se passa dentro de um cenário riquíssimo no qual atuam ótimos atores, entre eles os heróis do primeiro filme da agora série. Mas, o filme não engrena. Falta a ele emoção. Os alienígenas são previsíveis. O modo como são atacados é o mesmo que o visto na versão anterior, inclusive a estratégia que no primeiro filme destruiu a nave mãe inimiga. Diga-se que o filme não chega a ser ruim. Mas, transfere a impressão de coisa já vista o que o torna algo cansativo.
Entretanto, o filme desperta no espectador a curiosidade em saber como seria de fato um contato com alienígenas, caso viesse realmente a acontecer. Como seria o dia em que, ao abrirmos a janela do quarto, déssemos com uma enorme nave alienígena sobre nossas cabeças? Nos filmes quase sempre os alienígenas são maus e querem nos destruir. As razões são desde extrair recursos naturais de que necessitam e até mesmo usarem humanos que capturam como fonte de alimentos. Mas, como seria, de fato, este possível e tão esperado contato?
Existem investimentos em telescópios cada vez mais avançados, capazes de varrer regiões distantes do universo. A todo custo procura-se vida por aí afora dado não ser razoável imaginar-se que em toda essa imensidão que nos cerca só a Terra tenha sido bafejada com a existência de seres vivos. Se existem alienígenas ou não, talvez, ao futuro pertence a resposta.
Caso existam que venham. Mas, que sejam gente de paz.
A má sorte
A má sorte sempre impressiona. Mas, ela existe mesmo? Parece que sim. Tem gente que não dá sorte. Se numa seleção para um emprego restarem apenas dois candidatos o azarado sabe que não será ele o contratado.
Sempre me lembro de um parente que andava na contramão da sorte. Tudo acontecia com ele, até embarcar num trem no qual viajava um bandido, muito parecido com ele, e ser preso no lugar do bandido. No começo o parente reclamava da má sorte. Depois, habituou-se a ela. No fim da vida conseguia rir se seu azar. Muitas vezes sentávamos à mesa da cozinha e ele, comendo bananas, desfiava seu rosário de provações. Como aquela de sua participação no exame do CADES para conseguir a licença de professor. A prova se compunha de duas fases, a escrita e a oral. Fora bem na escrita. Na oral os candidatos eram arguidos por um dos quatro professores da banca - três homens e uma mulher. A torcida era para não cair com a mulher, conhecida por raramente aprovar alguém. Na vez do parente? Ora, não deu outra: foi inquirido pela mulher.
Como seria de se esperar o resultado não foi bom. Numa pergunta a professora disse que a resposta estava errada. O parente discordou. Daí para o bate-boca e a reprovação… Mas, o parente era um sujeito que estudava muito. Na quinta tentativa conseguiu a licença. E olhe que ele dominava o assunto das provas.
Noticia-se hoje o falecimento do ex-piloto de Fórmula-1, o neozelandês Chris Amon. Foi ele um dos melhores pilotos na década de 60 e início da de 70. Entretanto, ficou conhecido pela má sorte. Esteve 11 vezes no pódio, mas nunca conseguiu vencer. Depois da F1 conseguiu vencer as 24 horas de Le Mans. Mas, ao que se diz, a má sorte sempre o impedia conseguir vitórias.
Existem pessoas bafejadas com incríveis golpes de sorte, dessas inesperadamente agraciadas com prêmios ou situações de relevo. E há os azarados. Há quem não acredite nisso. Há quem diga que sorte e azar dependem do modo de ser das pessoas. Mas, aí entramos no território das coisas inexplicáveis.
O Rio é uma festa
De repente a política deu baixa no noticiário. Aquele clima de furor incontido foi substituído por uma calmaria mais ou menos controlada. Exaustos que estávamos, respiramos. A saída de cena de Dilma e Cunha arejou um pouco o país. Lula, agora réu, vocifera. Diz-se perseguido. Tentam impedi-lo de ser o próximo presidente. O homem vaidoso resiste à queda de sua popularidade. Mas, é fera e com fera não se brinca.
Enfim, pode-se assistir aos noticiários sem grandes sobressaltos. A correria na Câmara Federal devagar vai cedendo lugar a comportamentos mais contidos. E o país, ainda no sufoco, começa a dar ares de que pode superar a crise. Investidores estrangeiros já não olham o país com tanto desdém. A fábula do golpismo perde força até mesmo entre seus partidários. Ainda se está longe de qualquer solução. O desastre econômico continua em pauta, mas parece haver luz no fim do túnel. A presidente afastada continua negando tudo. Sobre o caixa 2 de sua campanha diz desconhecê-lo, atribuindo responsabilidade a seu partido.
Então, por falta de maiores emoções, o país se volta para os jogos olímpicos. Não se fala noutra coisa. Delegações estrangeiras chegam ao Rio, cidade efervescente. Um vasto sorriso estampa-se na face dos cariocas imersos no sonho olímpico.
O bom da vida é que a falha acaba se esgotando. A incrível capacidade de superação do ser humano é mesmo providencial. Passa-se da tristeza à alegria ao tempo de um clique. O esporte faz amigos. Resta saber se passada a euforia as coisas seguirão ao mesmo ritmo.
Mas, o negócio é nem pensar. Deixar para lá a crise, o medo, as preocupações. Orgulhar-se de quem, afinal, somos. Deixar os olhos se deliciarem na paisagem carioca. Torcer pelos nossos atletas.
O Rio é uma festa.
Aos jogos!
As Olimpíadas vêm aí. Bom ou ruim para o país? Sabe-se lá. Escaldados já somos. A Copa do Mundo deixou-nos feridas ainda não cicatrizadas. O gigantismo da realização da Copa em várias partes do país deu no que deu. Grandes estádios construídos em cidades que não oferecem demanda de público. Afora a gastança. Não sei se já fecharam as contas. Com o rombo da Petrobrás em primeiro plano talvez tenham deixado para lá as gastanças da Copa.
Agora os jogos do Rio. Delegações chegam à Vila Olímpica e trombeteiam aos quatro ventos sobre as obras inacabadas. O preconceito contra o Brasil e os brasileiros reacende-se. País do futebol, do samba, das mulatas, onde já se viu realizarem-se jogos mundiais aqui? Só poderia dar nisso. A mídia estrangeira delicia-se. Quanto pior melhor porque há sede de notícias sobre um pais onde nada é confiável. Quanto preconceito.
Mas, o Rio é lindo. Não há beleza no mundo que se compare. Mais: o Rio apaixona. Não há má vontade que não sucumba ao delírio de cores e beleza paisagística. Daí que passados alguns dias, vazamentos e problemas elétricos resolvidos, entra-se no aguardo da realização dos jogos. E vai dar certo, talvez para frustração da zumbizada que torce contra.
A tocha Olímpica adiantou-se a tudo isso, percorrendo o país com a galhardia de seus carregadores. Simbólica ela anuncia o congraçamento entre povos das mais variadas etnias. Nas Olímpiadas os homens deixam de lado suas diferenças. O que vale é o esporte, a competição esportiva. Isso é muito num mundo que corre desorganizadamente. Atos terroristas, crises financeiras e violência desmedida que o digam.
Espera-se que o Brasil se saia bem nos jogos, afinal o país sedia a competição. Infelizmente, nossos atletas de várias modalidades ficam aquém de outros treinados em países com melhor infraestrutura esportiva. Em nossas escolas públicas faltam quadras onde se revelariam atletas promissores. Há quem treine no estrangeiro. Mas, torceremos muito pelos nosssos.
A vitória de um brasileiro sempre emociona. O inesquecível Ademar Ferreira da Silva ainda hoje é lembrado como ídolo do país. Quem não se emocionou ao ver Joaquim Cruz dar aquela arrancada, ultrapassando seus concorrentes, na prova de atletismo em que conquistou o ouro?
O Brasil é o Brasil do jeito que o conhecemos. Não há como não nos apaixonarmos por esse país de dimensões continentais, terra onde nascemos.
As Olimpíadas no Brasil serão um sucesso, que ninguém duvide disso.
Aos jogos!
Aos olhos do mundo
É no que dá o gigantismo das realizações. Para ficar nas duas últimas veja-se a grandeza da Copa do Mundo e o início das Olimpíadas em breve. Macro eventos que exigem dinheiro, inteligência e muito preparo.
Assim, o Brasil fica exposto aos olhos do mundo. Olhos sarcásticos, aliás. No meio da fogueira é possível se identificar o clima do “só podia dar nisso”. E os jogos nem começaram. Entretanto, as tais obras inacabadas da cidade olímpica deram o que falar. A delegação australiana encontrou nas instalações vazamentos, problemas elétricos etc. A chefe da delegação não perdoou: meteu a boca. Pronto. Repercussão mundial. Como se afirmou no Jornal Nacional: pegou mal lá fora. Também de mau gosto a piada do prefeito do Rio que sugeriu colocar cangurus na entrada das instalações olímpicas para agradar aos australianos. O prefeito do Rio é desses caras dotados de simpatia exagerada, isso para não dizer forçada.
Em programa de TV jornalista questionaram o ministro da Defesa sobre a segurança no Rio durante os jogos. Foram presos 12 brasileiros que teriam se organizado para um atentado terrorista. Sobre isso há opiniões divergentes. Autoridades os declararam amadores. Mas foram presos como não poderia deixar de ser. Afinal, a recente escalada do terrorismo na Europa e a presença de delegações estrangeiras tornam o Rio palco no qual tudo pode vir a acontecer.
Durante a entrevista o ministro garantiu que todas as medidas possíveis e necessárias foram e estão sendo tomadas na área de segurança. E não só em relação à possibilidade de terrorismo dada a necessidade de controlar a grande criminalidade observada rotineiramente na cidade. De modo que a polícia estará atenta aos morros, favelas etc. Disso entendeu uma jornalista que, talvez, tais medidas afastassem dos jogos pessoas menos favorecidas. Seriam, portanto, discriminadas. Obviamente, o ministro negou que isso fosse acontecer, embora ressaltando a natural exclusão devida a fatores econômicos.
A possibilidade de exclusão dos mais pobres fez lembrar fato acontecido no Congresso Pan-americano de 1908, realizado no Rio. A cidade fora remodelada por obra do engenheiro Pereira Passos. Grandes avenidas e prédios foram construídos naquilo que ficou conhecido como bota-abaixo. O Rio civilizava-se, no dizer de um cronista da época. Imitava-se Paris. O Congresso era a oportunidade de mostrar a nova face do país e dos brasileiros ao mundo. Entretanto, e inesperadamente, a comitiva formada por estrangeiros e brasileiros que brindavam na Avenida Central foi surpreendida pela passagem de uma carroça com os índios que a todo custo quisera-se esconder. Era, segundo o cronista da época, a nossa vergonha exposta ao estrangeiro.
Inegavelmente o país quer mostrar-se capaz ao mundo que nos olha com desconfiança. Resta-nos torcer para que as Olimpíadas transcorram dentro da normalidade e sem imprevistos. Também não custa lembrar de que o Brasil é maior que tudo isso, daí que se danem os que não perdem oportunidades de criticar o país.
Pernóstico?
Leandro Karnal nunca lerá esse blog de modo que posso falar mal dele à vontade. Mas, não é essa a ideia. Ora, falar mal… Quem penso que sou para andar por aí falando mal dos outros. Ainda mais de um professor universitário cujo talento é mais que reconhecido. Mas, vamos lá.
Eu nunca ouvira falar de Leandro Karnal até a semana passada quando ele apareceu no programa “Roda Viva” da TV Cultura. Confesso que minha primeira reação foi a de mudar de canal. Mas, me contive. Quem era aquele sujeito de fala algo monocórdica, alinhado, engravatado, que se dispunha a falar sobre qualquer assunto, mostrando uma erudição bastante incomum? De que túmulo se levantara aquela alma que me remetia a outros tempos nos quais a cultura fazia parte de conversações à mesa de jantar? O homem citava Platão, Sartre, a Bíblia, Shakespeare e tudo o mais com a naturalidade de irmão conhecedor. Nada escapava ao universo de seus conhecimentos os quais expunha com clareza didática. Mas, repito, de onde saíra esse “antigo” que se perdera em demoradas pesquisas sobre o mundo passado e integrara-se ao presente da velocidade das informações, plasmando tudo numa conversa não despida de orgulho e, talvez, algum pedantismo?
Em seguida eis que Karnal aparece na TV Globo News, sendo entrevistado por Roberto D’Avila. Mas, quase que não era uma entrevista. D’Avila mal tinha tempo para intrometer-se no discurso do professor, tal sua eloquência e facilidade de falar sobre o que quer que fosse. Mais uma vez o entrevistado colocava à disposição dos ouvintes sua fantástica memória, fazendo questão de frisar que memória não deve ser confundida com inteligência. Memória é colecionamento de dados, inteligência é o modo como esses dados são relacionados, disse.
A verdade é que Leandro Karnal incomoda e positivamente. Proprietário de um discurso incomum, orgulhoso de si e sem negar a vaidade por ser intelectual, conhece os limites da intelectualidade a ponto de afirmar que o mundo precisa cada vez mais de intelectuais. Entretanto, seria uma temeridade caso fosse governado ou comandado por eles.
Mas, seria Karnal um pernóstico? Bem, nele se identificam o orgulho, a extremada confiança, o uso de expressões incomuns, enfim algumas características de pernósticos. Mas, que fazer quando se é um intelectual e se dispõe de inteligência e conhecimentos que o levaram ao lugar onde atualmente está?
Leandro Karnal começa neste domingo sua atividade como colunista de jornal. No primeiro artigo fala sobre si e as variantes que enfrentou para aceitar o convite de trabalho. A ver como seguirá no novo ofício.
Mas, que se diga, Leandro Karnal surge na mídia num momento de grave escassez cultural em nosso país. Seja benvindo a esse mundo de imagens e sons no qual a intimidade é exposta e devassada, irremediavelmente.