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Velhice
Tema recorrente, todo mudo fala, mas dos outros. A “minha” é sempre intocável. Por que? Ora porque não me acho velho. Tá bom, não tão velho assim. Será que aquela mocinha bonita na sala de espera do dentista reparou em mim?
Posso estar errado, mas acho que a velhice dos atores é mais difícil. Não estou na pele deles, não os conheço, mas deve ser meio complicado um cara que já foi muito bonito ver-se agora no espelho, acabadão, observando sinais de antiga beleza serem progressivamente apagados.
O tempo passa e a turma do oba-oba não perdoa. Você vê na internet aquela coisa de mau gosto que é colocarem duas fotos da mesma pessoa, uma quando jovem a outra na velhice. A atriz de corpo escultural, a gostosa que fez a alegria da moçada no passado, transformou-se no que se transformou. Perdeu o viço, engordou, envelheceu, é a vida. E daí? A quem importa? Todos nós chegaremos lá um dia, repita-se: é a vida.
Que dizer dos atores envelhecidos que vão sendo esquecidos, desaparecem misteriosamente das telinhas e, vez ou outra, vêm a público reclamar do abandono? O cara trabalha durante 30 anos numa organização televisiva e, de repente, vence o contrato que não é renovado. Por que? Ninguém diz claramente, mas todo mundo sabe, inclusive ele.
Quem está para sair da raia é o David Letterman, seguidor do ídolo Johnny Carlson. O Letterman faz por mais de 30 anos o Late Show no qual conta piadas e entrevista personalidades de várias áreas. Ele é o tal, mas agora vai se aposentar. Diz-se cansado e reconhece que já não pode fazer o que fazem seus competidores, gente mais nova. A certa altura declara que a TV exige faces mais novas e por aí vai.
O diabo é saber quando parar. E existe o agravante de “poder” parar. Acontece em toda parte a tristeza da dificuldade de sobrevivência quando a velhice chega. Lembram-se das irmãs Linda e Dirce Batista, cantoras e rainhas do rádio? Mais recentemente a Norma Benguel[A1] ?
Pois é, né?
In-justiça
Na delegacia o preso passa mal. Em pouco os policiais percebem que o preso na verdade tem fome. Passa mal porque não come há três dias.
A história do preso é simples. Eletricista de profissão, largou o emprego para cuidar da mulher acidentada. Um ano depois a mulher mora com a família e o preso com o filho pequeno. Desde então não conseguiu empregar-se. Vivem, ele o filho, em extrema penúria - é o que o preso conta aos policiais.
O preso está na delegacia porque tentou roubar carne de um supermercado. A situação dele comove os policiais que fazem vaquinha para pagar a fiança. Depois levam-no para casa onde constatam a falta de tudo: na geladeira só uma garrafa com água; inexistem artigos para higiene pessoal tais como sabonete, pasta de dente, escova…
Os policiais fazem a segunda vaquinha e levam o preso ao supermercado para que ele faça compras. O preso, agora livre, não acredita no milagre. O caso chega à mídia e comove o país.
Para a Justiça o eletricista cometeu crime cuja pena prevista é a de 1 a 4 anos de prisão. Para os homens trata-se de um pobre coitado levado ao crime pelo desespero. A fome geriu os seus atos.
Não há como ficar indiferente a um caso desses. Sabemos que a fome persiste no país e muita gente não tem acesso aos mínimos recursos. O discurso sobre a necessidade de igualdade social não passa de um discurso.
O eletricista que roubou carne trouxe-me de volta um rapazinho que trabalhava na mesma empresa que eu. Naquela época eu ganhara algum peso e precisava me cuidar. Daí que no momento do lanche comecei a tirar o miolo do pão para ficar só com a casca. Quando viu isso o rapazinho me olhou apreensivo e disse:
- Não faz isso não, senhor, não jogue pão no lixo.
Era ele o mais velho da irmandade de seis. Gente pobre, paupérrima como vim a saber depois. Passavam fome. Inaceitável para ele um naco de comida jogado no lixo.
Nunca me esqueci do rapazinho a quem nunca mais vi.
Futebol: crise de talentos?
Apaixonados pelo futebol, pergunto: afinal, o que está acontecendo? Teria sido nada mais que resultado natural a humilhante derrota do escrete brasileiro arrasado naquele inesquecível 7 X 1 diante da Alemanha?
Quem viu o jogo entre o Barcelona e o Bayern constatou que em cada posição, isso nos dois times, atuava um craque. Tudo bem que o mortal ataque do Barcelona seja formado por um uruguaio, um argentino e um brasileiro. Tudo bem que os times que se enfrentavam fossem verdadeiras seleções com alguns craques importados. Mas… Que futebol! Jogo jogado, como diria o falecido Oswaldo Brandão. Jogo para encher os olhos, embate entre profissionais da mais alta estirpe.
Enquanto isso, em terras brasílicas, seguem campeonatos sem nenhuma expressão. Nosso adversários no exterior já nos olham como coisa do passado. Dizem que a Alemanha parou de fazer gols porque seus jogadores se penalizaram diante da glória perdida do futebol brasileiro.
Há poucos anos o Santos enfrentou o Barcelona na disputa pelo Mundial de Clubes e foi humilhado. Nem mesmo os nossos vizinhos sobre os quais tínhamos preponderância já não nos respeitam. Times do Paraguai, da Venezuela e outros países de menor relevância no cenário esportivo mundial jogam contra os nossos clubes de igual para igual, isso quando não vencem.
Não sou corintiano, mas deu pena ver o glorioso Corinthians sucumbir diante do inexpressivo Guarani do Paraguai. Mas não seria para os nacionais esbanjarem categoria e aniquilarem seus adversários?
Apaixonados pelo futebol, dolorosamente confesso meu temor de que nessas terras brasílicas já não se produzam craques como no passado. Apontam por aí falhas como desorganização, falta dinheiro, clubes endividados senão falidos etc. O futebol precisaria de reformulação, estatutos novo, comando etc. Mas, cá entre nós, e os craques? O último jogador de exceção que realmente merece ser considerado assim é o Neymar. Cadê os Garrinchas, os Zitos, os Gersons, os Rivelinos etc. Isso sem falar no Pelé porque igual a esse nunca mais.
Não se trata de saudosismo. É possível que muitos meninos que seriam futuros craques estejam perdidos por aí. Se for assim é hora de observar, promover, ajudar, selecionar.
O futebol é a paixão nacional pela qual sofremos muito. Nascemos com alma de torcedores e só mortos - talvez - nos livraremos dessa sina. Portanto, mãos à obra, é preciso ir às raízes do problema sob pena de estarmos fadados ao fracasso.
O mundo muda
Nos dias atuais quase nada nos impressiona. Habituados à avalanche de notícias que nos persegue, recebemos com alguma naturalidade mesmo informações sobre catástrofes. Hoje, por exemplo, noticia-se a ocorrência de novo terremoto no Nepal. Terremoto forte, acima de 7 graus na escala Richter. Consta que até agora quase 50 pessoas morreram em consequência do terremoto. O fato é que passamos meio ao largo dessa desgraça. O Nepal é longe, do outro lado do mundo, já que nada podemos fazer… Claro que dói, não se passa impassivelmente pelo sofrimento de um povo à mercê de movimentos subterrâneos que roubam vidas e destroem tudo.
Mas, nem só abalos sísmicos mudam o mundo. Eis aí que o governo dos EUA acaba cedendo às pressões em relação à pesquisa de petróleo no Ártico. A Shell é autorizada a perfurar o gelo. Os ambientalistas se revoltam, há o risco de derramamento de óleo no oceano. Daqui a pouco a paisagem ártica sofrerá mudanças inevitáveis. Mundo mudando.
Abalos sísmicos, vulcões em atividade, destruição permanente do ambiente. Convivemos com isso tudo, mais preocupados com problemas pessoais, afinal de contas vive-se tempo de murici, aquele em que cada um cuida de si.
Entretanto, nessa história de mundo mudando há acontecimentos que ferem a nossa confiança no planeta. O terremoto no Nepal é um deles, embora terremotos vez ou outra aconteçam e o mundo siga em frente. O pior é quando algo interfere na consistência de ícones considerados inabaláveis, nos quais depositamos inteira confiança. Convenhamos que o Himalaia é ícone do mundo, grandioso, irremovível, forte. No dia em que o Himalaia mudar…
Pois aconteceu de o Himalaia encolher. Consequência ao terremoto do Nepal foi a redução de 1 metro de altura do Himalaia. Pasmem: a maior cordilheira do mundo na qual fica o Everest, mais alto pico do mundo, encolheu. O indestrutível Himalaia, o indestrutível Everest que desde pequenos aprendemos com orgulho ser o mais alto ponto da Terra.
Pois é, o mundo muda. Amigos, não há como não temer pela nossa segurança quando a portentosa cordilheira do Himalaia sucumbe à violência de um terremoto. O fato faz-nos pensar na Pangeia, o grande continente da era Paleozoica, que existiu de 200 a 540 milhões de anos atrás e fragmentou-se dando origem aos atuais continentes.
O mundo muda. A Terra onde vivemos muda.
Menino na mala
E lá vai a moça de 19 anos, caminhando lentamente, puxando a mala de rodinhas. Que dia é esse? Ora, não importa. O que vale é seguir, melhor dizendo: atravessar.
Mas, entre a moça de 19 anos e o outro lado, há um homem e seu scanner. Ao se aproximar dele a moça retarda ainda mais o passo. Quer parecer natural, passar e pronto.
O problema é o scanner, dispositivo que devassa interiores, intrometendo-se em espaços de bem guardados segredos.
A mala devassada pelo scanner mostra na tela imagem estranha que simula um corpo. A mala é aberta e do meio das roupas surge um menino de 8 anos que, ao ver a luz, exclama:
- Eu sou o Abu.
Abu vinha do Marrocos e tentava entrar na Espanha pela cidade de Ceuta. Não cumpriu seu caminho. A moça colocou-se à dispoição da justiça. O pai de Abu foi preso.
Não se divulgaram informações sobre o desespero dos envolvidos.
Mamãe
Ela ali, ao meu lado, diante do famoso neurologista que nos fazia a gentileza de atendê-la. O caso é que o neuro era pai de um meu quase amigo a quem eu pedira o favor de falar a ele sobre a doença de minha mãe. Mas, o neuro estava em férias e foi só pela insistência do filho que apareceu no consultório.
Obviamente, não havia dinheiro para pagar o favor que ficou mesmo como gentileza, humanidade. E minha mãe lá, quieta, a boca torta, repuxada, consequência de mais um dos AVCs que sofrera. Falava com alguma dificuldade, sabe como é quando a parte motora não responde na velocidade certa as ordens enviadas pelo cérebro.
Daquele fim de tarde ficou o momento em que o neuro fez perguntas à minha mãe e, respostas dadas, ele me disse: como é inteligente essa mulher, poucas veze tenho visto inteligências desse porte.
Ela era assim, inteligente, obstinada, guerreira, severa, sofrida. A formação primária não a impedia de ler jornais e revistas, além dos noticiários do rádio, porque naquele tempo o que se tinha em casa era só o rádio. E havia aquele senso de família dela, senso que justificava até trazer para viver na nossa casa minha tia e os filhos dela que não tinham para onde ir, aliás coisa que contribuía para puro desespero de meu pai.
Minha mãe tinha atração natural pela cultura que a ela faltava. De todo modo insistia na educação dos filhos que a todo custo deveriam virar gente formada. Assim, aos seis anos eu já sabia ler e escrever um pouco, tanto que ela me levou ao grupo escolar para ver se a diretora não me matricularia direto no segundo ano, porque o primeiro eu já fizera em casa. Não foi possível e ela acabou se conformando.
Como disse, minha mãe era severa. Nos tempos atuais as crianças gozam do benefício de não poderem apanhar, mesmo dos pais. Em criança sobrevivi a belas surras, algumas delas pelas mãos de minha mãe, outras recebidas no grupo. As pancadas faziam parte do “endireitamento” das crianças que se tornariam educadas e bons cidadãos. Não se falava na tal pedagogia do medo hoje tão execrada.
Eu poderia ficar aqui, enchendo páginas de lembranças sobre a minha mãe que tanto lutou para que eu viesse a ser aquilo que ela sonhara. Certamente estou longe de atender ao nível dos sonhos dela, mas posso dizer que, afinal, não devo tê-la decepcionado muito. Então deixo-me levar por esse turbilhão de coisas vividas que me passam pela cabeça e pondero sobre como a vida passa depressa e a paisagem humana que nos cerca muda sem que nem sempre nos demos conta disso.
Acontece todo ano, no mês de maio, quando se celebra o dia das mães. Então minha mãe se ergue de sua tumba e se torna onipresente no meu pensamento. Mais hora, menos hora, eis-nos nas nossas conversas, como a do dia em que fomos à consulta com o neuro.
Impossível esquecer minha mãe, impossível ignorar o que ela foi e o tanto que fez por mim. Nessas horas que me separam do domingo das mães bate uma saudade danada daquela mulher que me amava tanto.
Funeral chinês
Cada povo segue ritual próprio segundo os costumes da região que habita. Quando criança assisti a funerais de imigrantes japoneses vindos para o Brasil antes da Segunda Guerra. Os japoneses hortifrutigranjeiros viviam numa colônia na qual mantinham os hábitos de suas regiões de origem. Não sei se é assim no Japão, mas os japoneses da colônia a que me refiro tinham por tradição colocar sobre a terra que cobria o caixão grandes quantidade de alimentos. O ritual incluía cantos e a comida deixada no cemitério. Consta que os alimentos serviriam ao morto durante a longa travessia ao outro mundo.
Os norte-americanos costumam se reunir para uns comes e bebes após o enterro de um membro da família. Comparecem amigos, conhecidos, vizinhos, enfim pessoas que de algum modo relacionavam-se com o morto. O costume parece estranho a quem, como os brasileiros, recolhem-se às suas casas, chorosos pela perda de entes queridos.
Agora noticia-se que o Ministério da Cultura da China resolveu interferir nos funerais realizados em certas partes do país. Acontece que nesses funerais realizam-se performances de stripteases, alguns deles até envolvendo cobras. Mês passado circularam fotos nas quais uma stripper tirava o sutiã na frente de crianças que participavam de um funeral. Diante de casos como esse o Ministério decidiu acionar a polícia para coibir tais práticas. Pessoas têm sido presas sob acusação de espetáculos pornográficos.
É de se imaginar a cena de um caixão no qual repousa o morto em torno do qual exibem-se mulheres nuas realizando suas performances. Devem os chineses ter lá as suas razões para permitir práticas dessa natureza. Sinceramente, não consigo imaginar uma ligação consistente entre funerais e strip-teases. Segundo uma agência chinesa “trata-se de uma armadilha da vida moderna em que vaidades e esnobismo superam tradições”.
Como dizia o poeta: “mundo, mundo, vasto mundo”.
Como nos filmes
A existência de seres extraterrestres é mistério que desafia gerações. A probabilidade de que exista vida fora da Terra é reforçada pela pergunta: por que nesse imenso universo só aqui teria surgido a vida? A partir daí geram-se hipóteses entre as quais a da possibilidade de vida em outra dimensão, diferente da nossa.
O fato é que muita gente espera que dia desses sejamos surpreendidos pela chegada de alienígenas. Se serão bons ou maus, amigos ou não, se movidos pela vontade de colonização do planeta, se guerreiros ou pacíficos, disso tudo não se faz a menor idéia. O que se imagina é que sejam dotados de tecnologias muito avançadas tanto que suas naves seriam capazes de viagens incríveis que permitiriam a chegada deles ao nosso planeta.
Também é fato que se acredita no empenho dos governos em esconder provas sobre alienígenas. Os alienígenas teriam existência mais que comprovada sendo de propriedade dos governos provas cabais desse fato. Naves alienígenas acidentadas teriam caído na Terra e seus ocupantes fotografados. Caso famoso é o Roswell no qual uma nave teria caído no Novo México/EUA em julho de 1947. Segundo se ralata na ocasião o governo dos EUA teria recolhido alguns dos nossos visitantes.
Em recente encontro de ufólogos mostraram-se fotos de alinígenas recolhidos pelos EUA naquela ocasião. Trata-se de slides cuja autenticidade é comprovada. Os alienígenas das fotos são seres pequenos e de aspecto humanóide. Chama a atenção o fato de serem muitos semelhantes aos alienígenas apresentados nos filmes de ficção. Interessante como os criadores de obras ficcionais teriam imaginado seres extraterrestres como de fato seriam…
Não sei se você acredita ou não na existência de alienígenas. Mas, que caso existam estão demorando demais para dar as caras no nosso mundo sobre isso não existe nenhuma dúvida.
As circunstâncias
Só o amor
Tomavam drinques e cantarolavam a música “Deslizes” do Fagner. Adoravam e repetiam a frase “só o amor que por encanto aconteceu”. Riam-se, olhando-se nos olhos, felizes.
Belo casal, os dois com trinta e poucos anos de idade. Filhos não ousaram ter, dizendo que só irresponsáveis colocam filhos num mundo como esse. Ela arquiteta já com renome pelas obras realizadas. Ele administrador de futuro, trabalhando em grande empresa.
O estranho é que traiam um ao outro. Amavam-se, mas traiam. Os amigos perguntavam-se: seria possível que um não soubesse da traição do outro? Existiria acordo? Mas, se se amavam tanto, por que?
Há quem garanta que mesmo o amor verdadeiro pode não ser suficiente. Nesse caso não foi mesmo. A história desse casal terminou ontem com a notícia de que ambos foram encontrados mortos no apartamento onde viviam. Suspeita-se que tenham se suicidado. Há quem diga que ele era louco por ela e a teria matado para depois se matar. Na boca de cada pessoa uma hipótese regada de incredulidade.
Na verdade pouco importam as razões. Perderam os amigos com a ausência. Perderam os bares a beleza do casal magnífico que brilhava em suas mesas. Perdeu o mundo que pareceu mais frio e tristonho que nos outros dias.
Amavam-se tanto!