Cotidiano at Blog Ayrton Marcondes

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O petróleo é nosso

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Monteiro Lobato (1882-1948) é conhecido pelas personagens do “Sítio do Pica-Pau amarelo” divulgadas por seus livros e programas de televisão. Entretanto, Lobato foi homem de várias facetas entre as quais destaca-se sua luta pela descoberta de petróleo no Brasil.

Em 1927 o então presidente da República, Washington Luís, enviou Lobato aos EUA para exercer a função de adido comercial. Naquele país Lobato acompanhou as atividades industriais e avanços tecnológicos convencendo-se de que o progresso local resultava de investimentos em petróleo, ferro e transportes.

De volta ao Brasil Lobato fundou a primeira empresa petrolífera do país da qual conseguiu vender em quatro dias 50% das ações. Seguiram-se anos de lutas, envolvendo a pesquisa de gás e petróleo, não havendo colaboração do governo e mesmo sabotagens e intervenções de órgãos governamentais por motivos banais. Lobato chegou a ser preso, condenado a seis meses de prisão, dos quais cumpriu três por ser indultado pelo presidente Getúlio Vargas. Depois disso desistiu da pesquisa do petróleo que passou a ser feita pelo governo.

A longa batalha de Monteiro Lobato no sentido de que o Brasil não fosse escravizado pelo petróleo estrangeiro vem à memória nesse momento em que o “ouro negro” tem valores em baixa no mercado internacional e a Petrobrás enfrenta crise sem precedentes. Ontem a presidência e a diretoria da Petrobrás finalmente deixou o comando da petroleira fato que resultou em súbita alta das ações no mercado. Espera-se em curtíssimo prazo a nomeação de novo(a) presidente e diretores que contem com a confiança pública e do mercado. Terão essas pessoas a função de verificar o rombo realizado na empresa através de atividades corruptas, estancando toda forma de desvios e favorecimentos daqui para a afrente.

Enquanto as coisas estão nesse pé, a população segue estarrecida pela enormidade dos desvios já avaliados em 88 bilhões pela própria Petrobrás com a ressalva de que pode ser mais que isso. A cada dia vem à luz novidades sobre o grande escândalo dado que os envolvidos, tentando safar-se de suas culpas, optam pela delação premiada. O mais terrível é que as confissões dos membros dessa trupe de saqueadores se confirmam, permitindo prever que novas e estarrecedoras revelações surjam nos próximos dias.

O que se espera é que a Justiça cumpra a parte dela, levando ao banco dos réus todos os envolvidos, inclusive os membros da classe política que se fazem valer de suas imunidades. É o que se exige sob o risco de que, caso a impunidade prevaleça, os riscos de desordem social se transformem em realidade.

Traições

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Nos EUA o puritanismo não deixa barato traições conjugais. Bill Clinton pagou caro a aventura com a estagiária Monica Lewinski. Presidente em exercício no país Clinton se viu na situação de reconhecer a traição, publicamente, quase sendo apeado do governo. A cena dele ao lado da mulher Hillary, logo depois do fato consumado, é inesquecível: o homem mais poderoso do mundo dobrado por uma aventurazinha.

Aqui no Brasil as traições conjugais são vistas com mais brandura. Presidentes tiveram casos extraconjugais e ninguém pediu a cabeça deles. Juscelino e Tancredo são casos conhecidos de traição às mulheres deles. Na França François Mitterand, presidente do país, manteve segunda família que só veio a público por participar do enterro dele: estavam no cemitério as duas mulheres e os filhos de cada lado. Pai Mitterand. Há pouco descobriu-se que o atual presidente francês, Hollande, saia de moto do palácio para encontrar-se com a amante. Nem por isso a crise conjugal do presidente serviu de pretexto para que se falasse em seu afastamento do poder.

Essas casos me vêm à memória no momento em que um amigo me conta sobre parente dele. O tal, casado e com filhos, manteve outra mulher com a qual teve dois filhos sem que a “titular” jamais imaginasse a traição. Aos 50 anos de idade o tal deu de viver atormentado com a mentira. Dias atrás sentiu-se mal e foi levado a um hospital para avaliação médica. Com medo de morrer, não querendo passar desta para a outra com a mentira, contou sobre “a outra e os filhos dela” à mulher.

Como termina? Pense e proponha um final para essa história. Se quiser saber no que deu, leia a seguir.

Ora, a mulher do tal ficou muito chateada, mas acabou aceitando ao saber que a relação com a outra durara seis anos, mas terminara a muito tempo. A partir daí comportaram-se como casal civilizado: em jantar de família os filhos da outra foram apresentados, os irmãos de ambos os lados se conheceram e a vida continua, não sei dizer se exatamente feliz.

Buraco sem fundo

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Deus é brasileiro, não duvide, mas o mundo é grande e talvez Ele ande cansado de acompanhar tudo o que acontece com o país. Tanto que não tem chamado às falas seu subordinado, São Pedro, que anda meio distraído na sua função de controlar o regime de chuvas. Que Ele me perdoe mas, também, não tem reparado nos homens e seus estranhos feitos, alguns deles intoleráveis.

E, assim, la nave va. E vai descontrolada, desavisada, navegando em águas revoltas, confiante na sorte tantas vezes madrasta, ignorando o perigo de uma enorme catástrofe porque, afinal, esse não é o destino do Brasil cujo futuro grandioso foi escrito no início dos tempos. Naquela tábua onde se escreveu o começo e o fim do mundo estaria escrito que depois dos hum mil e quinhentos anos DC seria descoberto um grande país que um dia seria a maior potência do mundo, com rios de mel e tal abundância que todos que nele viveriam seriam felizes, eternamente felizes.

De modo que a turbulência atual nada mais é que passageira. A dívida interna de R$3 trilhões, o descalabro na Petrobrás, a inflação, a diminuição da arrecadação federal, a desaceleração da economia, o sufoco da indústria, a corrupção, o aumento dos juros, os apagões e até a falta de água nada mais são que acidentes de percurso porque a grande nave chamada Brasil é indestrutível.

Enquanto isso a cada dia as notícias pioram. O buraco sem fundo da corrupção da Petrodrás a cada dia mais se aprofunda a ponto de ser impossível saber-se o montante do desvio, agora orçado em mais de 80 bilhões, mas pode ser mais, muito mais.

Nós, os brasileiros? Ora, naturalmente estamos com medo. Viajando em noite de tempestade num barco ao sabor da ira marítima, como queriam que estivéssemos?

O diabo nessa história é navegarmos numa nave sem comando, sujeita às decisões de momento, em geral tomadas até sem muito sentido.

Feliz 2015.

Fatalidades

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Elas acontecem. Inesperadamente.  O cidadão está dirigindo seu carro numa rua da capital. Chove torrencialmente. Trovões, raios, ventania. Tanto vento que uma enorme árvore cai sobre o carro e mata o motorista. Ele estava dentro do carro, dirigindo, naquela rua, passando sob a árvore no exato instante em que ela caiu. A árvore estava ali, firme, altaneira há décadas. Despencou naquele dia. Ele morreu. Fatalidade.

Estar no lugar errado, na hora errada, parece ser o código de startup das fatalidades. Há sempre o ingrediente do inesperado. Vidas são ceifadas assim, misteriosamente. Fatalidades são mais que acidentes: trata-se de acidentes que parecem programados com algo a mais, como se um diretor montasse cuidadosamente a cena para filmá-la no exato instante da ocorrência.

Fatalidades impressionam, chamam a atenção.  Na Baixada Santista existe a ponte do Mar Pequeno que consiste de dois conjuntos de pistas para o vai-e-vem dos carros. Entre os dois conjuntos, protegidos por guard rails há um vão sob o qual está o mar. Ontem duas motocicletas se chocaram na ponte. Um dos motociclistas foi jogado de sua moto e eu corpo lançado justamente no vão entre os conjuntos de pistas. Caindo no mar o motociclista desapareceu e até agora seu corpo não foi localizado. Houve um acidente acompanhado de fatalidade.

De meu tempos de menino me lembro de uma jardineira que circulava pelas estradas de terra entre cidadezinhas do interior. Certo dia estava na jardineira um rapaz, trabalhador da roça, para quem a viagem figurava-se como excursão de reconhecimento de um mundo distante. Tão distraído ia, metendo a cabeça para fora da janela a fim de observar tudo, que não reparou num poste de rua. Assim, a cabeça colidiu com o poste sendo quase toda arrancada do corpo. Aconteceu defronte à minha casa. Alguém começou a gritar: fatalidade.

Cheguei a ver o corpo do rapaz sem cabeça, cena que me aterrorizou durante muito tempo. Fragmentos do cérebro dele espalhavam-se na rua causando péssima impressão.

Havia um poste no caminho da alegria do rapaz.

Ninguém está a salvo de fatalidades.

As máscaras

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De repente me pergunto sobre o intuito de quem usa máscaras de carnaval. Além do aspecto lúdico em si, será que o folião que decide sair à rua com máscara reproduzindo a face de alguém identifica-se com a tal pessoa, admira-a ou simplesmente quer tirar sarro dela?

Não tenho resposta para isso, embora prefira acreditar que a razão penda mais para o lado da avacalhação. Então pergunto: fosse você folião que gosta de máscaras, usaria uma da Graça Foster ou a do Nestor Cerveró?

Se acha a pergunta estranha é porque talvez não saiba que foliões estão pedindo e fábricas produzindo máscaras de gente relacionada à Petrobrás e ao escândalo que ronda a petroleira.  A coisa chega ao ponto de que por falta de tempo não serão produzidas as máscaras do Cerveró. As da Graça Foster estão em andamento.

Já usei fantasias e máscaras. Sai à rua em bloco com máscara para não ser reconhecido. A máscara confere a quem a usa liberdades extras. Rapaz mexe como mocinhas de quem a timidez o impediria de se aproximar. Segredos e convites inconfessáveis podem ser ditos ao pé do ouvido pelo autor escondido atrás da máscara. O Juliano aproximou-se da futura mulher dele num baile de carnaval, dançando com ela na noite de terça-feira gorda sem jamais mostrar o rosto. Na quarta-feira foi procura-la, apresentando-se e deu no que deu. Anos depois ela me confidenciaria que jamais dissera a ele que o reconhecera desde o primeiro minuto…

Não quero me aprofundar no assunto, mas vale lembrar de que hoje em dia máscaras tem sido usadas para o mal, a ponto de serem proibidas em manifestações. Radicais surgem em meio a passeatas reivindicatórias e, protegidos por máscaras, depredam, arrebentam com o que encontram pela frente.

Mas, caro amigo, máscaras são artefatos eternamente ligados ao carnaval. Pena que nesses tempos violentos os blocos que saiam às ruas nas cidades desse imenso Brasil estejam rareando. Assim o carnaval vai perdendo sua mística e toda a mágica da folia é comprometida.

Ficam na memória os velhos carnavais como aquele em que meu primo conseguiu uma “Rodouro” que deu o que falar. Mas, éramos jovens, os tempos eram outros e o carnaval uma grande festa para a qual nos preparávamos meses antes.

Então pense e responda: você usaria a máscara da Graça Foster ou uma do Nestor Cerveró?

Extermínio

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Nunca fui visitar Auschwitz nem pretendo fazê-lo. Entrar num lugar onde 1,6 mi de pessoas foram assassinadas brutalmente é coisa para além das minhas forças. Crematórios, câmaras de gás, alojamentos… A mote paira em Auschwitz, assim me descreveu o lugar um amigo que lá esteve. Contou-me que de tal forma se impressionou que, durante alguns dias, enfrentou dificuldades para conciliar o sono.

Não se pode relegar ao esquecimento um lugar onde o homem se revelou capaz de tamanhas atrocidades. A memória de Auschwitz deve ser mantida para que nunca mais o que lá se passou se repita, mas…

No dia de ontem completaram-se 70 anos desde o dia em que tropas soviéticas libertaram Auschwitz. Na mídia sobreviventes da chacina nazista relataram os horrores praticados e o milagre de terem sobrevivido. São eles hoje pessoas idosas, muitas delas únicos sobreviventes de famílias inteiras dizimadas. Trazem consigo uma dor incontornável. Fizeram vida depois da guerra, emigraram, casaram-se, tiveram filhos e pode-se dizer que a seu modo foram felizes. Certamente não lograram cicatrizar completamente a ferida que trouxeram da guerra.

Nos meus tempo de menino, anos cinquenta, ouvia dizer que “alemão é gente ruim”.  Certa ocasião mudou-se para casa próxima à nossa um alemão. No começo eu tinha medo daquele homem alto e claro, sempre sério. Mas, era um sujeito boníssimo. Tornei-me amigo do filho dele de quem ainda hoje me recordo com muita saudade.

O nazismo foi o que foi, não há como saber a quantidade do que se escreveu sobre Hitler e sua política de extermínio. Para nós que vivemos na América do Sul no fim das contas tudo parece não passar de história, nada mais que isso. Meu pai vez ou outra lembrava que gente como eu tinha muita sorte por ter nascido depois da guerra. Para meu pai a Guerra Fria não era lá muita coisa diante do passado horrível dos embates na Europa.

Mas, Auschwitz de modo algum pode ser encarado como simplesmente um detalhe da Segunda Guerra. Quem duvida que se arrisque a digitar “Google imagens” a palavra “Auschwitz”. Verá a tela do computador se encher de imagens retratando cenas horríveis nas quais corpos humanos são empilhados em valas comuns e por aí afora. E fotos de militares nazistas conversando, sorridentes, aparentemente desligados da chacina ao seu redor.

Não cheguei a ver todas as fotografias. Parei no meio. Aquilo não é fantasia, não é montagem. Aquilo é o horror em seu estado mais puro. Horror realizado por seres humanos bestializados contra seres humanos.

interestelar

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Confesso que logo após assistir ao filme não resisti à tentação de saber o que a turma tinha achado da produção do diretor Christopher Nolan. Afinal o homem era o respinsável pela trilogia Batman e aventurara-se naqule estranho “A Origem” que punha a gente para pensar aum bocado. E agora vinha esse “Interestelar” com toda pompa de grande produção, duas horas e cinquenta de duração, atores como Matthew McConaughey, Anne Hathaway, Michael Caine e Matt Demon. Diretor e atores pra ninguém botar defeito, superprodução etc e tal.

Bem não vi nenhuma crítica realmente elogiosa, nem aqui, nem nos EUA. Aquela coisa, o filme é bom etc, mas… Esse “mas” se refere ao excesso de diálogos, à necessidade de explicar os fenômenos físicos relacionados à física quântica, à questão da passagem do tempo, à gravidade e à abertura do buraco negro que permitiria encurtar o tempo de viagens espaciais transportando o homem a regiões longínquas do universo, distantes milhares de anos- luz do nosso planeta.

Creio que interessar-se mai ou menos pelo filme - não me refiro a simplesmente gostar ou não - dependerá muito do interesse do espectador pela situação atual de nosso planeta e do que está para acontecer num futuro não muito distante. No filme a Terra agoniza. Esgotado pela ação do homem e sucumbindo à ação de pragas o planeta tem seus dias contados, fim evidenciado pela carestia e nuvens de poeIra que tudo encobrem. Nesse planeta arrasado só uma solução se apresenta como recurso para a continuidade da espécie: sair do planeta, transportar os terráqueos a um planeta similar que ofereça condIções para a continuidade da vida como a conhecemos.

É nessa missão - a de encontrar uma nova morada - que o capitão Cooper (Mattheu) se aventura. O enredo do filme consiste nessa louca aventura por espaços  desconhecidos em busca de um mundo que possa abrIgar a espécie humana antes da grande catástrofe que colocará fim a ela.

Realmente há excesso de diálogos e explicações que visam dar ao espectador a medida exata do que se passa na tela. Infelizmente tais explicações são necessárias de vez que não se espera que espectadores comuns estejam famíliarizados com as linguagens da física e da alta tecnologia. Entretanto, não se pode dizer que isso diminua o valor do filme que na verdade propõe uma séria discussão a respeito do destino do homem. De fato o planeta vem dando sinais de cansaço diante dos abusos praticados pelo homem e hoje em dia fala-se muito sobre a necessidade de exploração do espaço como via de acesso para formação de colônias humanas Nesse sentido não há como negar a atualidade do filme que se insere em questão, queira-se ou não, em aberto.

De modo que se de um lado tem-se seres humanos imersos em suas disputas nas quais não faltam mesquinharias, se ainda perduram valores como o amor e a proteção dos filhos, por outro há a necessidades superior de salvar o homem e dar continuidade à espécie. O filme de Nolan aventura-se nesse difícil caldo de contradições e sai-se muito bem ao permitir que a inteligência humana se sobreponha às dificuldades.

“Interestelar” é um bom filme que prende o espectador porque o que está em jogo na tela éo o futuro do homem e seu destino.

A culpa é do piloto

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Conheço gente que não entra em avião nem que a vaca tussa. Dias atrás, durante entrevista, conhecida atriz declarou seu pavor em relação a viagens aéreas. Relatou fixar os pés no chão das aeronaves porque só assim se sente segura. Enfim, impede que o avião despenque do céu segurando-o com os pés.

Tenho um amigo que se casou recentemente e a noiva queria porque queria conhecer o Chile na lua de mel. O problema é que ele era inimigo jurado de aviões nos quais não viajaria de jeito nenhum. Acabou cedendo. Cruzou os Andes sem sufoco, adorou o Chile e agora já fala em outras viagens.

Quando entramos num avião raramente pensamos sobre a possibilidade de ocorrências de problemas técnicos ou falhas do piloto. Pilotos são pessoas sem face, desconhecidas, nas quais confiamos totalmente. Eles têm nas mãos o poder de conduzir vivas inúmeras pessoas, entregando-as perfeitas em seus destinos de viagem. Para isso contam com treinamento, aprendizado, capacidades pessoal, bom senso etc. Devem ser capazes de escolher a medida correta em situações de emergência e mesmo realizar manobras que incluem até aterrisagens forçadas. Quando um avião atravessa regiões de grande turbulência é no piloto que depositamos a nossa confiança.

Acaba de ser divulgada notícia na qual se atribui ao piloto a responsabilidade sobre o acidente aéreo que vitimou o então candidato à presidência Eduardo Campos. Como se sabe o avião em que o candidato viajava caiu em Santos minutos depois de abortar a aterrisagem. O que se divulga é que o piloto teria perdido a orientação espacial, tanto que mergulhou no solo em alta velocidade. Corrobora essa tese o fato de não se terem encontrado sinais de problemas mecânicos no avião que estaria em perfeitas condições.

Divulgada a notícia vieram protestos, a começar pelo testemunho quanto ao treinamento e experiência do piloto. Essa discussão vai longe, infelizmente não se podendo devolver à vida a juventude política de Eduardo Campos.

No fim de dezembro caiu no mar um avião da Air Asia provocando a morte de 162 pessoas. Resgatadas partes do avião das águas marinhas noticia-se que no momento do acidente o avião voava em velocidade excessiva, daí ter parado e caído. Falha do piloto, portanto.

Como sempre acontece o erro dá mais notícia e chama mais atenção que os acertos. Aliás são milhares de acertos que se repetem a cada dia em voos muito bem sucedidos nas rotas aéreas de todo o planeta.

Quanto a mim, por mais que tenha viajado em aviões, ainda tenho receio deles. Dizer que faço as viagens totalmente tranquilo seria exagero. Tranquilidade mesmo só quando a nave está parada no solo e é dado o sinal, autorizando-se o desembarque.

Tiro no peito

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Não creio que pena de morte funcione no sentido de coibir crimes. Criminosos não deixariam de cometer crimes apenas pelo medo de serem pegos e condenados à morte. Discutível, não? Não me lembro em que país o roubo é punido decepando-se a mão do ladrão. Nem por isso deixam de existir os ladrões e roubos seguem acontecendo.

Execuções sempre impressionam. Há o longo período em que o condenado vegeta no corredor da morte. Datas de execução marcadas, adiamentos, recursos jurídicos e até mudanças de data nos últimos instantes fazem parte de um sistema do qual se ocupam a mídia e o interesse da população. A decretação do fim da vida e o ato de encerrá-la leva-nos a ponderar sobre até onde vai o poder dos homens que decidem o destino reservado a uma pessoa.

Semana passada foi fuzilado na Indonésia um brasileiro, o primeiro da nacionalidade a ser condenado e executado. O fato de ele ser brasileiro obviamente atraiu a atenção do país e provocou ações do governo no sentido de interceder pela suspensão da execução. A própria presidente da República chegou a falar com o presidente da Indonésia pedindo a ele a suspensão da execução. Infelizmente as ações diplomáticas não deram o resultado esperado.

Talvez porque o condenado fosse brasileiro pudemos acompanhar passo-a-passo todo o encadeamento de fatos que cercaram a execução. Ficamos sabendo, por exemplo, sobre o desespero do condenado que até a véspera não acreditava que viria a ser executado. Falou-se sobre o medo, o choro e o desespero dos últimos momentos. Nos jornais publicaram-se esquemas nos quais eram detalhadas as fases da execução, chegando-se ao momento em que o condenado, amarrado a um poste, seria submetido a um grupo de homens armados dos quais apenas três teriam em suas armas projéteis capazes de matar.

Os policiais da Indonésia seguiram à risca o ritual programado. O brasileiro foi fuzilado no dia e hora previstos e faleceu com um tiro em seu peito. Impossível imaginar o que terá se passado na cabeça desse homem em seus últimos instantes. O terror de saber-se à mercê de um pelotão de fuzilamento, a irreversibilidade de sua condição e o mergulho no desconhecido terão impactado sua mente e, talvez, num único segundo, o levado a raciocinar sobre a extensão de seu crime.

Um tiro no peito. A dor súbita e a morte. Punição rigorosa e de eficácia discutível.

Liberdade de consciência

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Saiu o novo número do Charlie Hebdo, o primeiro após o ataque terrorista à redação que resultou na morte de oito jornalistas. Na capa da edição uma charge do profeta Maomé que, como esperado, despertou reações furiosas no mundo islâmico. Pessoas morreram em protestos e ameaças de novos atos terroristas surgiram.

Aos enterros dos cartunistas mortos no atentado compareceram inúmeros simpatizantes, havendo comoção. Num deles discursou um cartunista do Charlie, homenageando o colega morto. Era um homem moreno que lia seu discurso e balançava o tórax continuamente.  Emocionado, despedia-se do amigo, transmitindo aos presentes toda a extensão de sua dor.

Consta que o cartunista do discurso foi o autor da nova capa do Charlie que tantas reações negativas despertou entre os islâmicos. Não pude deixar de pensar sobre o que se passaria na consciência desse homem porque, direito de liberdade de expressão à parte, o fato é que seu novo desenho irremediavelmente alavancará atentados e mortes. Não se trata aqui de se discutir entre o certo e o errado, liberdade de expressão e censura, etc. O que se pergunta é: você, sujeito isolado, sentado à mesa de trabalho, sentir-se-ia bem desenhando algo cujas consequências trágicas seriam mais que previsíveis? Desenharia o profeta logo depois de um ato tão terrível, alimentado ainda mais ódios e despertando reações que colocarão em risco a segurança de seus próprios compatriotas?

Tenho lido que não será meia dúzia de radicais enlouquecidos que conseguirão calar aqueles que fazem uso do inalienável direito de livre expressão. Mas, sinceramente, não sei o que se passaria em minha consciência caso fosse o cartunista responsável pela capa do recente número do Charlie Hebdo.