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Mundo cão
se lembre disso. Pois o mundo continua louco, ao ritmo de um gigantesco caminhão descendo ladeira abaixo, sem freio. Não se pode apagar o passado daí as raízes profundas que governam atos insanos no presente. Dá no que dá.
Finjo que não é comigo toda vez que ouço notícias sobre guerras e catástrofes. Irã, Paquistão, Iraque, Síria… Que enorme confusão, etnias que não se entendem, extremismo, terrorismo, guerras, enfim toda sorte de acontecimentos lamentáveis cujo corolário sempre é grande número de vítimas.
Ao que parece o horror não tem fim. Eis que ontem seis talibãs invadiram uma escola no Paquistão e mataram 145 pessoas, quase todas elas estudantes, menores de idade, crianças. Entraram atirando, matando ao acaso, conforme a descrição de sobreviventes. A maioria dos alunos da escola tem pais militares. Por que? Para que o exército sentisse o que é perder um ente querido, assim como acontece aos talibãs quando atacados. Vingança por combatentes mortos em ataques do exército. Punição de inocentes por vingança.
Simples assim. Um horror premeditado movendo um ataque suicida dado que os seis atacantes foram mortos. O ataque impressionou o mundo. Crime contra a humanidade - afirmou-se. Mesmo países adversários do Paquistão vieram a público para condenar o ataque terrorista.
De repente entra no vídeo a imagem da jovem paquistanesa detentora do Prêmio Nobel. Malala Yousafza condena o ataque. Ver a ela que foi atacada por desafiar o impedimento de mulheres a estudar restitui-nos parte da confiança nos seres humanos. Mas, apenas parte. Nenhuma explicação lógica, nenhuma lágrima, nada contribui para disfarçar a vergonha de reconhecer entre os nossos semelhantes a presença de indivíduos capazes de praticar tamanha atrocidade.
Dirão que os terroristas que atacaram a escola não eram nossos semelhantes. Eram sim, infelizemte, não se enganem quanto a isso.
E agora?
Me liga o Alessandro, inconformado com a situação pessoal. Aos 85 anos de idade segue absolutamente lúcido, convicto dos afazeres que não consegue realizar. Com voz pesarosa me fala da tontura que o impede até de sair à rua. Ainda assim há negócios a gerir coisa que custa muito ao Alessandro. Custa demais. Não que ele não queira fazer o que deve ser feito. Mas, falta a ele energia, movimento, mocidade.
Um homem preso a uma cadeira cujo pensamento viaja por muitos lugares. O mais próximo é a mesa do escritório, ali, bem perto, sobre a qual repousam pilhas de papéis naquela desorganização organizada que só a mente do proprietário consegue entender. Entre a cadeira onde se senta e a mesa são poucos passos, mas, não, instalou-se entre os dois pontos tão próximos um abismo de profundezas incomensuráveis. Ou uma cordilheira do porte dos Andes, talvez um pico das dimensões do Everest ou do Himalaia que precisa ser escalado para transpor o espaço e chegar à mesa.
Assim um homem grande e forte assiste ao transcorrer do inevitável, ao ingrato percurso que o separa do fim. Sabe ele que atingiu o pórtico de onde não se volta e inicia-se o trajeto das rotas irreversíveis.
Mas, como deixar tudo para trás se a cabeça não se entrega, a responsabilidade cobra e o homem vivo dentro do homem pragueja decido a continuar?
Converso com o Alessandro durante alguns minutos. Nada do que posso dizer a ele serve como consolo. Tento animá-lo, inutilmente. Em nenhum momento falamos em idade ou velhice. O Alessandro é um espírito jovem aprisionado dentro de um organismo de ancião e nada pode resolver para ele esse enigma. Não se tem como velho, não fala em velhice. Às vezes me diz que talvez amanhã acorde melhor, possa andar, sair à rua, correr atrás dos negócios.
Não sei quanto dura essa febre de curta esperança. O espaço entre a cadeira e a mesa de trabalho um dia deixará de existir na sala onde já não estará o Alessandro.
Os mortos
São eles, os mortos, que não me saem da cabeça. De tempos para cá me pego lembrando de pessoas que já morreram. Não são desconhecidos. Trata-se de gente com quem convivi, algumas delas durante muito tempo. Eu as surpreendo em plena atividade, tal como se ainda estivessem por aí. De repente, entre uma e outra coisa do meu dia-a-dia, recordo-me de imagens de outro tempo nas quais essas pessoas surgem envolvidas em acontecimentos que permearam as vidas delas. Não importa se são momentos alegres ou tristes, problemáticos ou não. O que me volta é a essência de seres do modo como foram, agindo como se a vida fosse eterna e a morte - que um dia os levou - jamais viesse a acontecer.
As pessoas do passado, mesmo já mortas, acreditam na eternidade das suas vidas. Que fique bem claro, acreditam através de mim. Elas continuam vivas na minha memória e isso confere a elas a agilidade dos encarnados, circulando por aí dentro de um mundo desfeito mas, que para elas mantém-se intacto. É assim que vejo meu pai escrevendo os seu discurso, minha mãe sempre atarefada, a parente que trocava sempre de acompanhantes, o vizinho que enlouqueceu, a tia que via assombrações, o tio que não tinha sorte, o primo que deixou-se roubar num trem perdendo a urna na qual seguiam os restos do meu avô, o irmão que fugiu com a mulher do circo, o Chico que só falava de mulher, o padre que tinha amantes, tanta gente, meu Deus!
Pois eles continuam exatamente como sempre foram, laboriosos em suas artes, muitas vezes patéticos, tantas outras sinceros, benevolentes, maldosos, calmos, irritadiços, nervosos, enfim portadores de características próprias, indissociáveis que os caracterizavam como indivíduos plenos e ativos.
Pois é nessa ligação da morte que se prossegue em vida na memória que me fio para dizer que talvez aos vivos lhes pareça que jamais deixarão de existir dado que deixam-se rastros nesse mundo, sinais que atravessam gerações e resistem. Talvez por isso carreguemos conosco essa sensação de eternidade da vida, agindo como se nenhum fim nos esperasse, travando luta sem quartel contra a passagem do tempo, enganando-nos conscientemente sem qualquer prurido. Talvez também pela mesma razão eu reveja aos que conheci no passado em plena atividade, atuando com a energia de sempre, vistosos, orgulhosos da própria força, tão convictos de suas certezas, tão sérios consigo mesmo, dando-se muitas vezes a importância desmedida que não chegaram a merecer. Talvez.
Assim se refazem mundos desfeitos e vidas terminadas continuam a acontecer. Comigo tem sucedido assim, a cada vez o mundo dos mortos me parece mais real que aquele em que vivo e o presente nada mais vai me parecendo que uma simulação do passado.
Tenho pensado que talvez eu esteja mais próximo do que imagino em me tonar um deles, membro dessa gente que sobrevive nas memórias, pessoas que surgem de repente, sem avisar, numa esquina, em qualquer lugar, intrometendo-se na realidade dos dias, sem qualquer cerimônia, mortos não convidados que insistem em nos acompanhar.
Paul
Para ser franco assimilei a música dos Beatles aos poucos, diria vagarosamente. Nos anos 60 do século passado ouvia-se aqui muita bossa nova e, também, jazz. O jazz nos chegava através dos LPs importados encontrados nas boas lojas de discos do velho centro de São Paulo. Já os Beatles tornaram-se mania da noite para o dia. De repente a banda inglesa invadia o cotidiano com sua música efervescente. E os rapazes da banda vinham para mudar os costume s com seus cabelos longos e toda a loucura de suas apresentações e comportamentos. Era um novo ritmo enlouquecedor que arrastava atrás de si milhões de jovens sequiosos por um novo modo de ser.
A minha relação inicial com os Beatles foi algo traumática. Morava eu em casa de um primo apaixonado pela banda inglesa. Ele não só passou a usar roupas apropriadas como deixou os cabelos crescerem. E ouvia os Beatles quase que o tempo todo. Lembro-me bem de quando o meu primo chegou à casa como LP “HELP”, de 1965. Aquilo foi uma loucura. As música do disco entravam na minha cabeça a ponto de sabê-las de cor. Os meus tios não suportavam tamanha pressão. Nem eu. Mas, de nada adiantava reclamar porque o meu primo se tornara um beatlemaníaco de primeira linha e, a bem dizer, se passara para o lado de lá.
Comecei a sucumbir certo dia em que, ao acaso, ouvi a música “Michelle” de autoria de Lennon&McCartney. “Michelle” fazia parte do primeiro álbum da banda o “Rubber Soul” de 1965. Depois desse dia qualquer, em 1968, comecei a prestar mais atenção à incrível genialidade dos rapazes da banda. À dupla Lennon&McCartney devem-se composições realmente fantásticas daí resultando que até hoje são ouvidas, reinterpretadas por toda sorte de músicos.
Decididamente, tornei-me fã de Paul McCartney. Entre ele e Lennon, sempre ele. Com o passar do tempo e o fim da banda Paul continuou com outros grupos, sempre compondo. Na primeira vez que ele veio ao Brasil foi uma comoção geral. O astro estava entre nós. Era um homem de carne e osso sobre um palco, imantando milhares de fãs. Uma amiga que assistiu ao show confessou-me ter chorado de emoção.
Agora Paul tem voltado com certa regularidade ao nosso país. De certa forma as visitas humanizam o mito que vai se tornando “normal”. Mas, nunca se tornará corriqueiro. O cara é simplesmente Paul McCartney e isso nunca foi, nem será pouco. De minha parte continuo na condição de fã incondicional.
Sobre o “carma”
Não conheço bem a extensão do termo “carma”. Sei que no espiritismo considera-se “carma” situação na qual um espírito enfrenta as consequências de seus atos, passando-se uma ou mais reencarnações para que se reestabeleça o equilíbrio. Entretanto, o meu entendimento não passa de certo sentido popular no qual cada pessoa traz consigo seu “carma”, ou seja, espécie de predeterminação de contas a pagar ao longo da vida. Se alguém enfrenta situações complicadas então se diz que trata-se do “carma” dele. Acreditar-se ou não em “carma” é outra história.
Hoje pensei em “carma” ao conversar com um homem que me contou ser pai de dois filhos naturais e sete adotivos. Perguntei a ele o que o levou a adotar sete filhos, número que considerei exagerado. Disse-me ele ser espírita e fazer parte de organizações de atendimento a jovens. Demais, a adoção é comum na família dele. Contou-me que uma tia teve seis filhos naturais e adotou mais oito.
Se bem me lembro a adoção feita na base da simpatia era mais ou menos comum entre famílias no passado. Em casa de minha avó viviam mocinhas adotadas. Minha tia sempre manteve um pequeno exército de crianças e mocinhas que viviam na casa dela. Na verdade não se faziam adoções formais, no papel. Em geral tratava-se de pessoas oriundas de famílias pobres, que não tinham para onde ir. Assim, trazer para morar em casa mais que tudo era um ato humanitário. Essas pessoas passavam a fazer parte do cotidiano, embora não pertencessem à família. Cresciam ali até o dia em que, por uma ou outra razão, saiam. Gente boa.
Mas, há diferenças significativas entre o mundo em que viviam as famílias do passado e o de hoje. A começar pelas moradias, em geral amplas, com dependências anexas, vastos quintais, pereiras, pessegueiros etc. Isso sem falar nas cozinhas nas quais fogões amplos serviam à produção de comidas em quantidades suficientes para atender a toda aquela gente. Como se vê, situação bem diferente da que hoje se observa na qual os imóveis têm áreas menores. Imagine-se viver com cinco crianças em apartamento pequeno.
Eis aí porque estranhei tanto que o homem com quem conversei tivesse realizado tantas adoções. Segundo ele tudo foi feito em acordo com a esposa, pessoa solícita e sempre disposta a ajudar o próximo. Segredou-me ele que dos sete adotivos apenas um se desencaminhou. Uma das filhas adotadas saiu de casa para casar-se e deu a ele dois netos. Um rapaz adotado cursa faculdade e assim por diante.
Pareceu-me falar a um interlocutor de outros tempos. Era um homem convicto de sua missão, feliz com sua vida e as decisões que tomara. A certa altura perguntei a ele se acreditava em “carma”. Ele riu. Respondeu-me que ao encarar tão grande desafio qual o de criar tantos filhos jamais pensara em estar pagando algum débito desta ou de outra vida. Era feliz a seu modo, lutando, trabalhando, levando em frente aqueles a quem se propusera a ajudar.
Com muito amor - completou.
Ameaça comunista?
Há quem fale com nostalgia sobre o regime militar iniciado em 1962. De fato o país atravessava fase convulsa. A inesperada renúncia de Jânio elevado ao poder e galvanizando as esperanças de milhões de brasileiros naufragara. O governo Jango mantinha-se, a duras penas, num país em frangalhos. No comício do dia 13, na Central do Brasil, Jango lançava bases para mudanças necessárias, mas entendidas pela oposição como de inspiração comunista. Daí para a revolta de 31 de março de 64 não foi mais que um passo. Militares tomaram o poder sem encontrar resistência, apoiados pelo governo de Lyndon Johnson. A ideia, a princípio, era, não muito tempo depois, convocar eleições e devolver o país ao sistema democrático. Não foi o que se viu. Passaram-se 20 anos de ditadura militar com abusos que até hoje nos espantam. Se do ponto de vista de desenvolvimento devem-se aos militares realizações o mesmo não se pode dizer em relação às liberdades individuais, tolhidas ao máximo após o AI-5.
Todo mundo sabe disso, mas não custa repetir. Também não custa lembra-se de que nas décadas de 60 e 70 o mundo vivia sob o impacto da Guerra Fria. A bipolarização fazia-nos reféns do alinhamento com os EUA. A dissidência de Cuba quanto ao alinhamento resultara em consequências que chegaram ao bloqueio continental determinado pelos EUA. Como se vê o comunismo era, na época, considerado como ameaça palpável daí ser temido pelas classes dominantes do país.
Agora um salto de pouco mais de 50 anos em direção à realidade atual. O fato é que, após a vitória de Dilma no segundo turno das eleições, tem recrudescido uma onda de protestos nos quais se pede o impeachment da presidente e revela-se que uma nova ameaça comunista está a rondar o país. Se compararmos o momento atual àquele em que Jango foi deposto veremos ser exagerada a hipótese de um avanço comunista. O bolivarianismo do Brasil é uma peça distante, tão distante que seria irrealizável. Entretanto, há quem se movimente para protestar o que não deixa de ser bom. Noticia-se que o presidente Obama recebeu petição assinada por mais de 140 mil pessoas no qual se apontam os perigos que rondam o Brasil. Afirma-se que as eleições não foram limpas dado que não se pode confiar em urnas eletrônicas; que os pobres votaram no governo por receio de virem a perder benefícios como o Bolsa Família; e há menções de que a solução seria a volta do regime militar. O perigo é de que o Brasil se torne uma nova Venezuela.
Assim, um povo descrente e temeroso da ameaça comunista começa a se mobilizar dado o governo estar a 11 anos nas mãos de um partido que se perdeu na corrupção, essa a conclusão final dos que rechaçam o governo da presidente reeleita.
O fato é que o mundo mudou. Vez ou outra algum intelectual avisa sobre a possibilidade de ressurgimento da bipolarização no mundo. Mas, a ameaça comunista surge como algo impossível de acontecer no Brasil de hoje. Verdade que temos de manter os olhos sempre bem abertos. Mas, não custa separar o trigo do joio como, por exemplo, podar certos exageros tal qual pretender o retorno da ditadura militar ao país. Como dizia Churchill “A democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos”.
Pacto com o demônio
Dizia-se que o Chico tinha pacto com o demônio. Lembro-me bem desse homem forte, tronco e braços musculosos, roupas quase sempre rasgadas. Durante o dia era carregador de caminhões sobre os quais lançava sacos de 60 kg. Ao anoitecer começava a tortura dele. Errava pela longa rua de terra, a cada instante voltando-se para escorraçar alguém que o acompanhava. Alguém invisível, diga-se. A essa sombra que parecia jamais deixá-lo em paz o Chico dirigia toda sorte de impropérios. Inutilmente, aliás. Mas, se era a sina dele, que fazer?
O fato é que a assombração do Chico despertava toda sorte de suposições. Contava-se que ele fora casado e matara a mulher que agora o punia, seguindo-o. Entretanto, a versão mais corrente era a de que o Chico tinha às costas o próprio diabo. Não se sabia quando, onde, nem por que, mas era certo que o Chico fizera pacto com o demônio que, mais tarde, viera para cobrá-lo. Havia quem jurasse ter ouvido da boca do Chico o nome “diabo” durante suas imprecações. O certo é que o “diabo” do Chico passou a fazer parte da pequena comunidade do lugarejo onde ele vivia. O Chico não era um só, “era dois”, ele e o seu demônio.
Quando o Chico morreu o corpo dele não passou pela igreja. Levaram-no direto ao cemitério e conta-se que nos últimos instantes chamaram o padre para a extrema unção que ele recusou urrando. Pessoas presentes aos últimos momentos do Chico dizim-se que os urros não eram do Chico, mas do demônio que finalmente entrara no seu corpo. Aliás, fora o demônio que afugentara o padre, impedindo-o de ministrar os derradeiros sacramentos.
Hoje foi preso em Mogi das Cruzes um homem que matou quatro pessoas. Atacou-as com um facão e as decapitou. Depois de preso confessou mais dois assassinatos e disse que razões dos crimes foram o pacto que fizera com o demônio e fazer parte de uma seita satânica. Segundo o criminoso sua intenção era matar 31 moradores de rua, consoante o pacto que fizera. Os moradores foram escolhidos porque não faziam parte do sistema, não pagavam impostos.
Como se vê pactos com o demônio não dão bons resultados. Na literatura existem inúmeras narrativas sobre pactos com o diabo em troca de vantagens terrenas. Mas, no final, o diabo sempre aparece para cobrar a sua parte, levando a alma de quem deve a ele para as profundezas infernais.
Você pode não acreditar na possibilidade de realização de pactos com o demônio. Em todo caso é aconselhável que deixe pra lá esse assunto. Se der na sua cabeça uma loucura dessas fuja da possibilidade. Vai que o diabo aparece e sela o pacto…
Se você tivesse conhecido o Chico nem um texto como esse arriscaria escrever.
O mistério do espaço
Assisti pela TV à entrevista de um professor especializado em cosmologia. Quatro entrevistadores perguntaram a ele sobre mistérios do Cosmos, particularmente sobre a possibilidade de vida fora da Terra.
Obviamente, tudo o que se disse durante a entrevista pertence ao território das hipóteses. Entretanto, parece haver consenso sobre o fato de que o homem não ficará preso ao planeta no qual se originou a espécie. Considera-se que a exploração do espaço que nos cerca é uma questão de tempo. É bom que se diga que esse “tempo” está atrelado à evolução da tecnologia. Não se sabe quando, mas chegará época na qual o homem disporá de meios capazes de se deslocar com velocidades incríveis. Ainda assim resta a questão das enormes distâncias avaliadas em trilhões de km quando se trata de estrelas mais próximas.
Segundo o professor não se trata de ficção a hipótese de meios de transporte mais rápidos. Lembra ele de que há pouco mais de 100 anos D. Pedro I utilizava cavalos, pouco mais tarde D. Pedro II viajou de trem e hoje temos o que temos. No tempo do Primeiro Império quem imaginaria que em futuro não muito distante existiriam aviões?
Outro assunto discutido foi sobre a possibilidade de vida fora da Terra. Citou o professor uma das luas de Saturno cuja superfície é coberta por gelo, mas sob essa camada existe água e mesmo águas quentes nas quais podem surgir microrganismos. E que dizer de Marte planeta que provavelmente será dos primeiros a serem explorados pelo homem?
O fato é que cada vez mais nosso olhar se alonga para fora do planeta. Enorme curiosidade e a necessidade de respostas a muitas indagações acerca do misterioso universo que nos cerca torna esse assunto cada vez mais frequente nas conversas. Há quem acredite na existência de civilizações avançadas, vivendo em outras partes do universo com as quais mais cedo ou mais tarde faremos contato. A existência de mundos semelhantes ao nosso e a descoberta deles é assunto apaixonante.
Está nos cinemas o filme “Interestelar” cuja trama tem alavancado muitas considerações sobre a possibilidade de um dia deixarmos o nosso planeta. Ainda não assisti ao filme, mas pretendo vê-lo dado que faço parte da massa de pessoas que querem saber um pouco mais sobre a origem da vida na Terra e as possíveis ligações entre os corpos celestes.
Velhice
Aconteceu dias atrás. Estava eu na cozinha de minha casa quando minha mulher me perguntou se eu não atenderia ao telefone. Ao que respondi perguntando: mas que telefone? Então ela me disse que o meu celular estava tocando. Juro que não ouvi. Verdade que o celular estava em cômodo distante na casa. Mas, se ela ouviu por que eu não?
Chateado fui verificar. De fato no telefone havia uma chamada identificada. Mais chateado ainda comecei a duvidar dos meus ouvidos. Logo eu que sempre tive o tal “ouvido de tuberculoso”, audição apurada da qual sempre me orgulhei? Não seria possível estar distraído a ponto de não dar importância ao chamado ocasional de um telefone?
De lá para cá passei a prestar atenção à minha capacidade auditiva. Infelizmente ela se reduziu mesmo. Não, não estou surdo pelo amor de Deus. Continuo ouvindo bem. Ouvindo bem, mas não muito bem. Pois é.
Outro dia um amigo queixou-se de algumas perdas provocadas pelo envelhecimento. Chegamos à óbvia conclusão de que por mais que lutemos contra o processo é irreversível. O que se dá é que em geral negamos a aceitar-nos com limitações físicas. É aquela história de encarar o carregamento de coisas pesadas quando a coluna já não demora a gritar.
Para mim o problema são os impulsos. Aceito que se sempre fiz alguma coisa serei capaz de prosseguir realizando-a. Em meio a algumas dessas atividades mais ousadas pode acontecer a surpresa de verificar que já não é tão possível fazer tudo o que já fui capaz.
Sempre detestei fazer exercícios. Nunca frequentei academias. Mas, adoro correr. Há alguns anos era capaz de percorrer 20 km sem me cansar. Acho que há uns cinco anos passei a correr 4 km. Agora são 2 km e olhe lá. Confesso já ter me passado pela cabeça deixar de correr e passar a simplesmente andar. Vejo pessoas idosas caminhando para fazer exercício. Tenho me recusado a entrar clube dos andarilhos. Sei que a minha recusa tem prazo de validade, mas vou me aguentando.
O que muda de verdade na velhice é o olhar. Percebo que os meus olhos não são os mesmo de antes. Agora mais comedidos parecem escolher o que vale a pena ser visto. Acho até que em certas ocasiões acabam deixando de lado coisas importantes. Esse modo de ser pode simular a outras pessoas algum descaso. No fundo trata-se de comportamento geral que não posso evitar. Dias atrás um rapaz, meu aparentado, falou-me sobre um grave problema que o atormentava. Achei o tal problema tão irrelevante e não pude evitar dizer a ele. Isso não soou bem. Vali-me na ocasião da experiência que bem ou mal adquirimos durante a vida. Parece aquela história do soldado que volta da guerra e ouve falar sobre um tiro no fim do quarteirão. Mas, só um tiro?
Em meio ao processo de envelhecimento aguardo aos próximos avanços de perdas irreversíveis. Na minha família nunca houve um caso de Alzheimer. É um consolo. Quero chegar ao fim pelo mesmo lúcido, com a cabeça funcionando corretamente. Talvez seja um om jeito para ver o fim das luzes.
O certo e o errado
De que o mundo mudou muito não restam dúvidas. A inversão de valores é tal que o errado vai passando por certo e fica-se em dúvida sobre o final das coisas. Veja-se o monumental escândalo da Petrobrás envolvendo valores de dimensões estratosféricas. Empreiteiras acusadas de pagar propinas se dizem vítimas de extorsão. Trata-se de caso no qual fica difícil apurar a verdade, sendo certo apenas que a corrupção no país atingiu níveis antes inimagináveis. Negócios escusos envolvendo cifras que alcançam mais de 10 bilhões de reais vêm à tona como se fossem transações “normais” dentro de negócios onde ou se paga propina ou não existem obras.
E há o caso do governo que minimiza a crise atual pintando a situação do país como no mínimo razoável. Entretanto, de repente se revela que os novos dirigentes da economia terão que se digladiar, em 20015, com um buraco de 100 bilhões, isso num orçamento previsto de pouco mais de um trilhão. Ninguém é capaz de apresentar olhar otimista em relação ao futuro próximo.
Do que se conclui que escândalos e corrupção são muito bem adubados, crescem com fermentos de primeira linha. E há quem venha a público para dizer que o brasileiro é assim mesmo, melhor: o ser humano é dado ao hábito da corrupção. Nesse caso eu e você seríamos corruptos de berço. E se não nos corrompemos ainda isso se deveu à falta de oportunidade. Teoria muito boa para creditar deslizes à natureza humana sobre a qual nada se pode fazer. Está no sangue e pronto. Pode?
Penso no mundo em que meu neto vai viver. Com pouco mais de dois anos de idade ele viverá, talvez, num mundo confuso no qual os valores em que acreditamos poderão estar ainda mais estremecidos. Existe quem daria tudo para duplicar o tempo de vida, outros 60 anos além dos 60 atuais. Não sei não. Lembro-me dos meus tios e tenho a impressão de que viviam num mundo mais simples, sem tanta correria, sem tanta confusão. Havia, sim, o perigo de uma guerra nuclear ao tempo da Guerra Fria, mas as notícias demoravam a chegar de modo que o medo era mais relativo. Hoje você ouve que, apesar das sanções, o Irã acabará construindo a bomba que tanto querem os iranianos. Não há dia em que não se tenha a impressão de que algo poderá explodir em algum lugar, fazendo grande número de vítimas. Você liga a TV e vê imagens de mexicanos protestando porque não se suporta mais a criminalidade no país. O México se levanta contra a chacina de 43 estudantes, mortos para não atrapalhar um evento promovido pela mulher de um prefeito.
Confesso a minha perplexidade diante disso tudo. Afinal, que mundo é este?