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Moraes e Fonseca

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Em meio a tantas mortes diárias há quem ouse morrer de causas não ligada ao Covid-19. Nesta semana duas baixas importantes no setor cultura brasileira.

A primeira delas do músico e cantor Moraes Moreira, encontrado morto em sua casa. Sobre o talento de Moraes e sua importância para cultura popular do país desnecessário falar dado o conhecimento público sobre a carreira do grande baiano. Entretanto, sobre Moraes cabe-me curiosa lembrança de cunho pessoal.

Nos anos 70 do século passado morava eu em São Paulo e tinha por hábito comparecer ao Teatro Municipal em ocasiões que minha atividade permitia dado que também trabalhava à noite. Nessas andanças tive a oportunidade de assistir à apresentação do grande pianista norte-americano George Sharing, do saxofonista Gerry Mullingan e do cantor Billy Eckstine, entre outros. De Eckstine gravei na memória o poder de sua voz demonstrado ao final do espetáculo quando surpreendeu o grande público presente ao cantar sem o uso do microfone.

Pois numa dessas ocasiões eis que foi anunciada a presença de um grupo com nova proposta musical do qual um dos participantes era Moraes Moreira. Confesso que não consegui assistir o espetáculo até o final. Já de começo com pequeno público fomos surpreendidos com músicas que combinavam desde frevo a jazz, mas executadas com auxílio de equipamentos poderosos. Era uma dança de muitos watts que acabavam ferindo os tímpanos. A impressão era a de que aquilo tudo melhor ficaria ao ar livre ou num ambiente bem maior que o do Municipal. Assistíamos, sem saber, ao parto dos trios elétricos dos quais Moraes foi o criador.

O desertor do dia foi o escritor Rubem Fonseca levado por mal súbito aos 94 anos de idade. Fonseca marcou uma geração com seus contos e romances. Seu livro “Feliz Ano Novo”, coletânea de contos, fez furor na década de 70. Naqueles anos tinha eu um colega de trabalho que, certa ocasião, apareceu com o livro, dizendo o sentencioso “você precisa ler”.

Li o livro de Rubem Fonseca numa única noite. Eram histórias terríveis, narradas com frieza de doer os ossos. Fonseca conhecia a maldade por dentro e sabia como demonstrá-la através de narrativas bem acabadas. Não me recordo se num dos contos desse livro está história do ladrão que invade uma casa pouco depois de seu proprietário ter saído para o trabalho. Ao entrar no quarto encontra a bela mulher que dorme. Ele a estupra, relatando o aparecimento da humidade na vagina e o silêncio daquela que nada pode fazer. Horrível o modo como narra, a escolha exata das palavras, a transmissão do ato em toda a sua força animal.

“Feliz Ano Novo” foi proibido pelo governo militar que então comandava o país. O livro tornou-se, assim, um best-seller. Daí o gesto do colega e grande amigo que me passou o livro proibido com recomendações de cuidados e rápida devolução. Havia uma lista de espera.

No momento em que a cultura brasileira tem sofrido muitos ataques os desparecimentos de Moraes Moreira e Rubem Fonseca nos alertam para necessidade de mantermos viva a inteligência e a própria cultura do país.

Durante a reclusão

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Ouço relatos de que as crianças estão nervosas. Trancadas em apartamentos com outros familiares falta a elas espaço e liberdade. Os pais não sabem o que fazer. Também eles confinados, muitos em home office, preocupam-se com a redução de seus rendimentos e a segurança das famílias.

O covid-19 emparedou a humanidade. Trata-se de adversário perigoso que vai fazendo número crescente de mortos mundo afora. Muito se fala sobre esse vírus em torno do qual se debruçam especialistas de grandes centros de pesquisa. A todo transe se buscam vacina e medicamentos que possam debelar o mal. Mas, o progresso é lento. Também surgem aqueles que se aproveitam da ocasião para lançar as tais possibilidades de curas milagrosas.

Seguem no país as divergências entre o presidente e o ministro da saúde que está a um passo de ser demitido. Quando acontecer o terreno estará livre para o decreto de fim do confinamento. A opinião dos especialistas é que tal medida resultará em desastre com agravamento da epidemia.

Nós, simples mortais, olhamos pelas janelas. Se há saudades do mundo em que vivíamos até a pouco, por outro lado a parada obrigatória nos leva a repensar sobre a vida que levamos. Repensar sobre o que somos e o sentido da vida. A rotina diária a que estamos habituados é estafante a ponto de nos esquecermos de nós. Atuamos como peças integrantes de um sistema no qual cabe-nos realizar aquilo que se espera de nós. É o papel condicionado pela sociedade da qual, queiramos ou não, fazemos parte.

Dias trás passei pela orla da praia e vi, de longe, o mar. Ondas pequenas chegavam à areia, trazendo mensagens cifradas. O azul do mar na manhã de sol era extasiante, emprestando força como a dizer que tudo pode ser superado. Mas, havia enorme tristeza naquilo tudo. O acesso ao calçadão e à areia fora bloqueado no sentido de evitar aglomeração e proximidade entre as pessoas. Era uma paisagem linda à qual faltava a presença da vida humana, daí incompleta.

O homem está diante de grande adversidade. Cabem inteligência e método para superá-la.

Ao vivo

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Não adianta reclamar: meus vizinhos são doidos pelo tal sertanejo universitário. Moramos, lado a lado, há 20 anos e nunca tive razões para me queixar deles. Gente boa e atarefada. Agora, porém, os vizinhos estão reclusos como de resto toda gente. Eis que da noite para o dia o apartamento deles se torna caixa de ressonância. As sessões começam cerca de 11 da manhã e duram até a madrugada seguinte. E não é só para ouvir o sertanejo: os vizinhos cantam junto, aliás cantam bem alto.

Não que eu tenha algo contra o sertanejo e afins. Na verdade, tenho um traumazinho trazido da minha infância. Defronte a casa onde morávamos um japonês tinha um bar no qual, aos domingos, cantores de moda de viola se reuniam. As sessões começavam após o fim da missa das dez da manhã. Naquele tempo as pessoas vinham das roças para a missa, gente fervorosa que era. Era o dia de descanso de pessoas que davam duro nas plantações, cumprindo tarefas difíceis. Uma tarefa compreende a realização de trabalho numa área de 0,33 hectares. Não é mole.

Pois bem. Terminada missa as pessoas circulavam na rua de chão de terra, aproveitando para compras de mantimentos que serviriam para a semana. Hábito curioso era o de membros de algumas famílias sentarem-se, formado uma roda. Nessa roda passavam, de pessoa para pessoa, uma panela grande e uma colher. Era o almoço comunitário no qual cada um retirava da panela uma boa colherada, passava depois ao membro do lado e aguardada que a panela completasse o ciclo, retornando até ele.

Era assim. Mas, a essa altura as duplas caipiras já haviam se organizado no bar do japonês. E começava a cantoria que durava até o anoitecer. Cantores com violões e uns goles da boa pinga bastavam para alegria geral.

Assim, as tardes de domingo na nossa casa eram um verdadeiro inferno. As duplas eram animadas e muita gente ficava na rua, defronte o bar, para ouvi-los. Quanto a nós não existia em nossa casa um único cômodo no qual não chegasse o som das modas de viola…

Comecei falando sobre a barulheira dos meus vizinhos e me perdi em lembranças dos meus tempos de rapazote. A bem da verdade não há como não ter saudades daquela estranha reunião musical que tanto nos incomodava. Aquele mundo das gentes que vinham da roça aos domingos foi sucateado pelo tal desenvolvimento. O mundo mudou. Mudou tanto que agora fica sem saber bem o que fazer diante da pandemia provocada por um vírus que veio da China.

Confinados

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A certa altura da vida tem-se a impressão de que já se viu de tudo. Então nada mais nos surpreenderia. Mas, a vida é marota e proprietária de formidável arsenal de surpresas. Nesse contexto surge um vírus que nos impõe reclusão em nossas casas para evitar possíveis contágios.

Lugar comum repetir que o mundo parou. A toda hora se lê: “o dia em que a Terra parou”. Mas, é isso mesmo. Mundo afora tudo parado. Paris, Nova York, Londres, São Paulo, as grandes cidades exibem suas ruas desertas. As pessoas se recolhem. Noticiários só tem um assunto: a pandemia. Contabilizam-se novos casos e óbitos. A situação na Itália e na Espanha é desesperadora. A China, onde surgiu o vírus, vai se recuperando. Aqui está-se em fase de expansão da epidemia.

Em meio a tudo isso os homens e seus inadiáveis interesses pessoais. Em nosso país o Presidente e o Ministro da Saúde trocam farpas. O presidente defende o “isolamento vertical” que atinge pessoas com mais de 60 anos. Para o ministro trata-se de isolamento total.

Enquanto isso a natureza aproveita para se recuperar. A poluição do ar melhora na medida em que se reduzem-se atividades e transportes - já é possível ver-se o céu estrelado…. No ártico as baleias azuis reaparecem. Em Veneza a poluição das águas diminui e eis que surgem golfinhos na cidade. Golfinhos em Veneza… Em praias do nordeste, vazias, as tartarugas aproveitam para se reproduzir. A natureza se vinga, com exuberância, do homem que a destrói.

Mas, há medo. As pessoas se recolhem, temerosas. Famílias confinadas enfrentam a realidade da convivência forçada. Cresce, vagarosamente, o sentimento da solidão. É o apelo da vida social que deixa de existir.

Situação como essa nos leva a pensar sobre como seria se estivéssemos ameaçados por algo contra o que nada poderíamos fazer. Os sempre citados meteoros gigantes que poderiam colidir com a Terra são exemplo de situação incontornável. Queira-se ou não o Covid-19 encurrala a humanidade e faz-nos refletir sobre o nosso destino. A vida é breve. Mais curta ainda pode ser caso sejamos infectados por um vírus que vai fazendo milhares de vítimas em todo o mundo.

Há muito sobre o que se pensar.

Escrito por Ayrton Marcondes

7 abril, 2020 às 12:22 pm

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Vingança de Plutão

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A pandemia provocada pelo coronavírus avança. A cada dia mais pessoas são contaminadas e cresce o número de óbitos em todo o mundo. Para impedir a progressão da pandemia foi dado o toque de recolher: ninguém deve sair às ruas, comércio fechado, empresas paradas, férias coletivas, escolas sem aulas etc. Imagens de cidades do mundo mostram recolhimento. A ordem é ficar em casa. No Brasil trava-se batalha entre o presidente da República e governadores de estados que ordenaram a paralisação geral. Na contramão do mundo o presidente prega o retorno às atividades, isso para evitar a recessão econômica. Contra ele se erguem sanitaristas, inclusive a própria Organização Mundial de Saúde.

Por outro lado, correm por aí as mais diferentes hipóteses para explicar o aparecimento do vírus, algumas interessantes. Uma delas é a que propõe ser o vírus consequência do uso da tecnologia 5G pelos chineses. O uso do 5G teria proporcionado o aparecimento do vírus e a doença cujos primeiros casos ocorreram em território chinês.

Mais interessante é a hipótese de que o povo de Plutão teria enviado o vírus para a Terra. Essa hipótese corre por aí e tem muito adeptos. Não há que se negar alguma lógica nessa hipótese. Como se sabe o povo de Plutão, de tempos para cá, tem sólidas razões para estar muito revoltado com os terráqueos. Hão se lembrar da grande humilhação infligida ao povo de Plutão quando da decisão de destituir aquele corpo cósmico da categoria de planeta. Foi rebaixado à triste condição de planeta-anão. No passado o sistema solar contava com nove planetas, agora só oito com a exclusão de Plutão. Nas escolas da Terra as crianças aprendem sobre oito planetas com total desprezo a Plutão que não passa de um anão.

Como se vê o povo de Plutão, humilhado como foi pelo rebaixamento, tem, sim, forte razão para alimentar ódio em relação aos terráqueos. Daí seus mais eminentes cientistas terem preparado esse terrível vírus que ora paralisa o mundo e tanto sofrimento tem causado por aqui.

Novas hipóteses aparecerão, tenho certeza. De minha parte creio estar resolvida a origem do coronavírus: trata-se de vingança de Plutão…

Medo e insegurança

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A percepção do perigo gera o medo. Pandemia declarada, medidas restritivas instauradas, as pessoas têm a liberdade de ir e vir restringida. As aglomerações estão proibidas. Fronteiras fechadas, viagens canceladas. Restaurantes, bares, casas noturnas, shows, cinemas, competições esportivas, tudo, tudo mesmo, suspenso por prazo indeterminado. Ambiente severo, marcado por medo e insegurança, caldo de cultura para crises depressivas.

De repente o mundo vai parando. Nas ruas pouco trânsito. Quase ninguém circula na cidade deserta. Cidades litorâneas fecham praias, hotéis são impedidos de receber turistas, chega-se a propor o fechamento de estradas. Escolas sem aulas, famílias em casa. A situação simula novelas fantásticas nas quais o surrealismo surge como fato acontecido.

As notícias chegam através de jornais. televisão ou pelo rádio. Não há outro assunto que não a pandemia e suas consequências. Bolsas de valores de todo o mundo despencam. O dólar atinge patamares nunca observados. A crise mundial assusta. O comércio fecha. Fábricas de veículos param a produção e dão férias coletivas. Fala-se em demissões em massa de trabalhadores. O mundo desanda.

No varejo das relações vigora o medo da transmissão da doença. A pessoa com quem se encontra, estará ela infectada e em situação de transmitir o vírus? Devo entrar no elevador com alguém que não conheço? O álcool gel deve ser usado a todo transe? As crianças não correm risco? Os idosos…

Medo e insegurança. Com tudo parado os trabalhadores se veem acuados pela crise. Não se fala abertamente, mas como a economia informal é grande muita gente vai enfrentar a fome. Pessoas que se sustentam de pequenos negócios simplesmente não têm para onde recorrer. Essas pessoas não ficarão em casa. Recomendações para evitar contaminação talvez não surtam efeito quando o assunto é falta de tudo, mormente de alimentos. Um colaborador que trabalha na empresa me contou sobre seu conhecido, proprietário de um mercadinho no centro da cidade. Segundo me disse o colaborador o proprietário foi avisado por fregueses, para que fechasse o estabelecimento porque em poucos dias correria o risco de saques. Quando a fome falar mais alto sabe-se lá o que poderá acontecer. Alarmismo? Quem sabe…

Depressão

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Um amigo está confinado a alguns aposentos de sua casa. Meses antes foi internado em hospital com diagnóstico de doença pulmonar. Em alta, voltou à rotina diária. Agora está sob a ameaça da pandemia causada pelo coronavírus. Acaba de ser orientado pelos médicos para não se expor a nenhuma possibilidade de contágio.

Em conversa telefônica o amigo me diz que se sente deprimido. Isolado da família e recluso por conta da doença as horas demoram a passar. A situação figura-se insolúvel por tempo indeterminado. Na despedida fiquei à disposição dele para qualquer necessidade de contato.

Pelé dá entrevista à CNN e nega que esteja deprimido. Tempos atrás o filho do Rei afirmou que o pai se deprimira face aos problemas relacionados à mobilidade. Na entrevista Pelé negou a depressão e disse que, entretanto, preferiria ter comparecido sem ajuda do andador.

Jornalista conhecida que comanda programa televisivo de entrevistas declara voltar aos telejornais para afastar a depressão.

Muita gente anda por aí com sintomas de depressão sem se dar conta disso. Dores pelo corpo, irritabilidade, falta de sono ou dormir em excesso, sentimento de culpa, desânimo, falta de energia e outros sintomas despertam o alerta em relação à possibilidade de crises depressivas. A depressão se caracteriza quando os sintomas se arrastam por algum tempo.

Quando o assunto é depressão inevitável não trazer à memória o caso de um rapaz que atravessou ciclo depressivo com final infeliz. Casado, teve a infelicidade de descobrir-se traído pela mulher a quem amava profundamente. A descoberta tornou-o infeliz e depressivo. De nada valeram tentativas de fazê-lo recuperar o equilíbrio perdido dado que não suportava a ideia de a amada viver com outro. Eis que se suicidou. Andava pelos trinta e poucos anos, jornalista promissor e acabou metendo uma bala na cabeça.

No olho do furacão

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A Lua é um ponto do espaço frequentado pelos seres humanos. Habitado, o satélite também serve como ponto de conexão para outras viagens especiais. Pode-se ir à Lua com alguma facilidade dada a existência de naves que diariamente fazem o percurso, levando e trazendo passageiros. Estamos no mundo do filme “Ad Astra” no qual o ator Brad Pitt faz o papel de um astronauta em missão para encontra seu pai, também astronauta, desparecido há mais de 20 anos.

Estivéssemos no futuro - e as viagens espaciais fossem realidade - teríamos opções de sair da Terra, temporariamente ou não, fugindo de problemas como o da pandemia provocada pelo coronavírus. Mas, como isso ainda é impossível, o jeito é seguir as recomendações das autoridades sanitárias e proteger-se.

Na iminência da explosão de grande número de casos no país chamam a atenção os alertas para os grupos de risco, destacando-se idosos e pessoas doentes. Em particular aos idosos a situação se desenha como a presença de uma espada sobre as cabeças. Pessoas mais velhas correm mais perigo se infectadas devido ao sistema imunitário mais fraco em decorrência da idade. Esse fato, alardeado de mil maneiras, repetitivamente, torna-se assustador como não poderia deixar de ser. Em consequência instala-se certa crise de confiança nas possibilidades de sobrevivência entre as pessoas mais velhas.

O fato é que, a essa altura, aproximamo-nos do olho do furacão. A despeito de todos os pronunciamentos e previsões o número de casos começa aumentar. Daí esse olhar preocupado que se estampa nas face de muita gente, mormente na dos idosos. Na portaria do prédio ouvi de uma senhora a pergunta sobre se sobreviveríamos a mais essa ameaça. Ao que outra senhora lembrou de que já passamos por tantas, e dobramos bem, que não será desta vez que seremos pegos.

Os próximos dias serão tensos com o agravamento da crise que se inicia. O presidente da República ignora ameaças e aparece em público mesmo estando em período de observação. Nos estados governadores apressam-se na adoção de medidas rumo à paralização. Nos próximos dias, com a escalada da epidemia, a paralisação total talvez venha a ser inevitável.

Resta-nos acompanhar a marcha dos acontecimentos.

A epidemia

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Não se fala em outra coisa que não a epidemia pelo coronavírus. É o assunto do momento, em toda as rodas. Em bares, restaurantes, festas, reuniões familiares, enfim todo lugar onde mais de uma pessoa esteja próxima. Ao que parece que se está diante de uma hecatombe do tamanho de que houvéssemos recebido a notícia de que um fenômeno atmosférico houvesse alterado a trajetória da Lua, agora em rota de colisão com o nosso planeta. Enfim, há medo. Medo de que com tantas reiterações sobre cuidados para evitar a disseminação do vírus talvez exista algo muito grande de que não fomos informados. Isso é o que se diz, a boca pequena, diante do reduzido número de casos da doença no país - até agora, é bom que se diga.

As autoridades fazem a sua parte. Estabelecem normas, suspendem aulas em escolas, impedem manifestações nas ruas, qualquer reunião acima de 500 pessoas está proibida. O Estado se previne: se a coisa desandar, se de repente o número de casos explodir poderá se dizer: as medidas de prevenção foram tomadas corretamente.

Entretanto, grande parte da população parece fazer ouvidos moucos a tudo isso. Nas ruas não se respira o clima de uma ameaça real sobre as cabeças. O número de infectados até agora parece não impressionar. Daí que numa volta de carro pela cidade o que se vê é a absoluta normalidade esperada para uma noite quente de sábado. Bares e restaurantes lotados, trânsito lento nas avenidas, muita gente transitando nas calçadas.

Esse ambiente de calmaria, contrastante com tantos alertas sobre o perigo da expansão da epidemia, me faz pensar num conto de Edgar Allan Poe chamado “A máscara da morte rubra”. No Conto Poe narra sobre uma festa à fantasia num castelo enquanto fora dele graça grande epidemia de peste. Aos convivas, naturalmente, nada faz lembrar a grande desgraça que ocorre fora das paredes do castelo. É quando um estranho convidado se apresenta. Ele é a própria peste que se espalha entre os convivas.

Não será esse o caso do que deverá acontecer aqui nos próximos dias. Nenhuma peste invadirá nossas casas, nem seremos contaminados por um vírus que poderá provocar a morte de tanta gente. Mas, as autoridades insistem. Isso nos leva a pensar que talvez tenham eles conhecimento de dados que não divulgam, mas que de fato representam grande perigo iminente.

Será?

Pandemia e idosos

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De repente o mundo começa a parar. O pânico se espalha. Um novo vírus ameaça a humanidade e os homens se desesperam ante a iminência de serem infectados. Na Itália tudo está fechado. Aqui os casos avançam, mas ainda não se justificam grandes paralizações.

Para quem tem mais de sessenta e cinco anos o perigo é maior. A capacidade de resistência do organismo dos idosos pode não fazer frente ao ataque viral. Daí que para quem está nesta faixa as coisas não se pareçam tão tranquilas.

Tenho a impressão de que por mais que alguém se prepare durante toda a sua vida para a velhice ela sempre chegará como pacote fechado e duro de engolir. Não se trata apenas das marcas do envelhecimento sobre o aspecto externo. Há muito além disso. Em alguns casos chega-se à dificuldade em aceitar as limitações da nova condição. O corpo que já não responde facilmente a movimentes antes executados com tanta facilidade é apenas um dos tormentos que se agravam paulatinamente. Tormento ao qual se acrescentam as necessidades de doses diárias de certos medicamentos - ingerem-se pelo menos alguns comprimidos por dia quando não muitos em casos de doenças estabelecidas. E inúmeras coisas mais.

Mas, a velhice também traz certa mudança no modo de ver as coisas. Verdade que muitos chegam a ela enrijecidos, senão revoltados. Entretanto, um novo olhar não é incomum. Um pouco mais de paciência diante dos descaminhos das gentes e do mundo pode surgir. Há certa compreensão de que erros fazem parte da rotina dos seres humanos e devem, na medida do possível, serem tolerados.

Um amigo idoso me diz que aguarda pelo coronavírus sem grande preocupação, pelo menos por enquanto. Lembra ele que, afinal, o número de casos no país não é grande, mormente se lembrarmos que aqui vivem cerca de 240 milhões de pessoas. Afirma que a gripe espanhola de 1918 matou 100 milhões de pessoas no mundo, 35 mil delas no Brasil. Estamos muito longe disso. Completa, repetindo o que dizem as autoridades médicas: nas próximas três semanas saberemos se a pandemia de fato atingirá muita gente.

Digo ao amigo que, entretanto, alguns especialistas estão esperando pelo pior. O que me devolve aos anos 70 do século passado. Naquela ocasião uma epidemia de casos de cólera atingira a Itália. Temia-se a chegada do Vibrio colerae, bactéria causadora da doença, ao país. Em reunião, a portas fechadas, um corpo clínico de infectologistas estimava perto de 1 milhão de mortes caso a doença atingisse a cidade de São Paulo. Tal número baseava-se na precariedade das condições sanitárias da periferia da cidade, desassistida de sistemas de água e esgoto. Recorde-se que a cólera é adquirida por ingestão de alimentos e água contaminada pelas fezes ou vômitos de pessoas doentes. Mas, felizmente, a temida bactéria não apareceu por aqui e não houve a epidemia.

Não é o caso do coronavírus que já desembarcou no país. O que se pode fazer é seguir à risca as orientações de visam impedir a propagação do vírus. E torcer para que a doença não se espalhe.