Arquivo para dezembro, 2009
Os melhores do mundo
Lionel Messi e Marta são os melhores do mundo no futebol. Marta é unanimidade: nenhuma mulher neste vasto mundo joga bola como ela, daí receber o prêmio pela quarta vez consecutiva. Messi é grande no Barcelona, mas deixa a desejar quando veste a camisa da seleção argentina. Não se trata de opinião isolada: a maioria dos torcedores argentinos parece concordar com isso e cobra de Messi mais empenho e melhores atuações pela seleção.
Quem acompanha o futebol sabe que há jogadores de clube e jogadores de seleção. Outros atuam do mesmo modo em clubes e selecionados. A história do futebol é rica em casos de jogadores que atuam bem em clubes, mas não na seleção e vice-versa. No Brasil há casos de craques que eram reservas em seus clubes, mas titulares da seleção brasileira, pelo menos durante alguns períodos.
Ser o melhor do mundo no futebol deve ser complicado tal a cobrança gerada pela alta posição conquistada. Se por um lado o prêmio recompensa o esforço e conquista do atleta, por outro não existe nada mais efêmero que o título recebido. De fato, futebol é paixão e paixões podem fugir ao controle. Uma sequência de derrotas e um só grande erro de um ídolo podem mudar a opinião da torcida. Fica o prêmio, vai a fama ou, pelo menos, a boa fama é substituída pela ruim. Lembram-se do Roberto Baggio? O grande jogador italiano foi considerado o melhor da FIFA,em 1993. Pois até hoje a televisão mostra a imagem de Baggio errando o pênalti no jogo final da Copa do Mundo de 1994, dando o título mundial ao Brasil.
Futebol é jogo coletivo de modo que os melhores do mundo sempre devem, ainda que um pouco, aos seus companheiros de equipe. Não é como no boxe, esporte do eu sozinho cujos resultados dependem apenas do desempenho do lutador dentro dos ringues. Um campeão mundial de boxe chega ao título sozinho, excluindo-se o esforço de treinadores etc. Mas dentro do ringue é ele, só ele.
No futebol a discordância alimenta as paixões, gerando discussões nem sempre resolvidas. Ontem o jogador Cristiano Ronaldo recebeu prêmio por ter feito o mais bonito gol de 2009. O gol mais bonito tem que ser também importante: o de Cristiano Ronaldo serviu à classificação de seu time. Foi de fato um golaço, mas seguramente não o mais belo. Viram? Ai está estabelecida a divergência de opiniões. Quem duvida que reveja aquele gol do Nilmar contra o Corinthians bem no começo do Campeonato Nacional deste ano. Gol belíssimo. Ou não?
Assim é o futebol. Você se aborrece com o seu time, sofre com as derrotas, não acredita que um título tenha escapado por tão pouco. Então jura que chega disso, não vai mais acompanhar jogos, nenhuma força do mundo fará com que você ligue a televisão para assistir a jogos. Ir a estádios então…
Isso dura até que um novo campeonato começa. Você nem quer saber, mas de repente o seu time dispara na frente, desta vez vai dar e você resolve dar só uma olhadinha nuns dez minutos de um jogo para ver como os garotos estão jogando. Pronto. Isso é a mesma coisa que fumar só um cigarrinho após ter largado o vício: começa tudo de novo, os dez minutos viram noventa de alegria e sofrimento, aí está você com o coração aos saltos, olhando fixamente para a telinha, pulando, gritando, xingando, mostrando aquilo que você nunca deixou de ser: um torcedor.
Vida longa aos melhores do mundo.
Vida longa a essa maravilha que se chama futebol.
Da necessidade de Papai Noel
Ele existe, sim, não duvidem. Ainda bem, porque mais que nunca precisamos muito dele. De fato, o bom velhinho com sua barba longa, roupa vermelha e os seus ho, hoo, hooos é figura indispensável nos dias atuais.
Ele que anda por aí em seu trenó puxado por renas consegue, através de sua simples presença, gerar um clima de euforia ainda que injustificável dadas as circunstâncias do cotidiano que nos cerca.
Nessa coisa de alegria acima de qualquer coisa, Papai Noel é de fato imbatível. Nenhuma personagem criada pelo homem consegue reunir tantos predicados positivos quanto o Papai Noel. E isso não é válido apenas para as crianças: os adultos vêem no bom velhinho o lastro de magia que falta a eles no cotidiano de vidas abafadas por pressões, desencontros e dificuldades de toda ordem.
Quem duvida que saia às ruas e procure sentir o pulso da vibração popular. São pessoas correndo para todos os lados, comprando presentes, abraçando-se. Papai Noel está em seus corações.
Dirão que isso acontece todo ano, afinal natal é natal, momento de confraternização e ponto final. Não sei. Há no ano que termina algo de diferente, como se mesmo entre estranhos houvesse busca de maior solidariedade. Pode-se captar por aí um sentimento de que as pessoas precisam uma das outras, mais que antes parece necessário a elas darem-se as mãos para que uma corrente positiva de pensamentos se estabeleça.
Vocês não notaram nada disso? Estou exagerando? Acho que não. Creio que a fraternidade aumenta nos momentos em que, ainda que subliminarmente, as pessoas se dão conta de que algo maior está acontecendo e as ameaça. É aí que entra toda essa história de aquecimento global, escalada da violência e mesmo a hipótese de fim das espécies por um colapso global.
Multidões agindo em uníssono adquirem força e respeito. Pode-se, por exemplo, não ter nenhuma religião ou não acreditar em Deus. Mas não há com negar que as multidões formadas por pessoas tão díspares que se reúnem em torno da Padroeira, em Aparecida do Norte, gerem um tipo de energia desconhecida, bastante palpável naquele lugar. Acontece lá; acontece por aí por ocasião do natal.
O Natal está chegando. Recebo abraços inesperados e sorrisos com os quais não contava. Observo maior candura em olhares e as pessoas parecem cansados de brigar tanto. Há, sim, sempre alguém mais grosseiro, pronto para faltar com as gentilezas no trato. Mas, não são muitos.
O que leio nos semblantes é que as pessoas estão mais atentas ao significado do Papai Noel. Por isso, ele é indispensável ainda que não possa nos dar de presente tudo aquilo que gostaríamos, tal como homens públicos mais responsáveis, menos corrupção e violência, redução da fome e da miséria e assim por diante.
Não adianta resistir porque no fim teremos que concordar: a grande personagem do 2009 que termina é o Papai Noel. Ele é “o cara”.
- Ho, hoo ,hooo.
O religioso do jardim
Encontrei na minha caixa postal o cartão de um pedreiro, oferecendo os seus serviços. O homem se chama Zalboeno e se apresenta como especialista em vazamentos, mormente os causados por chuvas. Nesses tempos de tempestades é bom ter um endereço assim, quem sabe venha a precisar dele.
É a segunda vez que ouço falar sobre alguém chamado Zalboeno. O Zalboeno anterior não era pedreiro, mas estava no ramo: tinha-se por construtor de personalidades às quais buscava moldar utilizando princípios nada convencionais.
O primeiro Zalboeno era um religioso. Muito claro e magro, perfil ariano, não fora a batina passaria por um desses jovens militares nazistas que figuram nos filmes. Sabem aqueles mocinhos aloirados que dirigem jipes ou assessoram militares graduados nos filmes de guerra? Pois o Zalboeno a quem conheci seria o retrato de um deles, sem tirar nem por, inclusive nos detalhes do cabelo cortado à escovinha e o semblante fechado.
Mas, entre um jovem nazista e um religioso extremado existem diferenças significativas, embora não se descarte a possibilidade de que ambos possam agir de modo semelhante. No fundo trata-se de uma questão ideológica ligada aos símbolos em nome dos quais se atua: no caso do jovem nazista, Hitler, evidentemente; no religioso extremado, Deus, simplesmente.
O primeiro Zalboeno agia em nome de Deus, tendo como fundamento o texto bíblico. Creio que em poucos religiosos terão se manifestado com tanta clareza os contrastes entre o Velho e o Novo Testamento. Do Velho Testamento Zalboeno retirava o rigor de Deus sempre pronto a punições exemplares àqueles que não seguiam à risca os ditames das tábuas da lei entregues por Ele a Moisés; do Segundo Testamento Zalboeno copiava um pouco da bondade do Jesus dos evangelhos, embora demorando-se nas críticas do crucificado aos fariseus. Daí fazerem parte do discurso do primeiro Zalboeno expressões como “fariseus”, “sepulcros caiados” e outras com as quais o filho de Deus condenava o modo de ser dos homens falsos que viviam às portas dos templos de sua época.
Era com termos como já os citados que o primeiro Zalboeno se dirigia a nós, os jovens internos do colégio onde ele servia. Tratava-nos com rigor e ao menor deslize, aplicava-nos punições terríveis. Era de seu gosto particular atribuir-nos o castigo das “páginas de cópia”, isso significando copiar textos de livros. O número de páginas a serem copiadas nem sempre condizia com a infração cometida; na verdade esse número mais variava em função do humor do religioso, quando não de sua antipatia por esse ou aquele jovem. Foi assim que eu mesmo cheguei a dever a ele mais de 100 páginas de cópia, dado que as penas aplicadas às infrações cometidas eram cumulativas.
Outro aspecto da pedagogia do nosso preceptor religioso era o castigo de decorar poemas inteiros que seriam recitados diante de todos os colegas. Foi assim que me vi obrigado a decorar vários poemas, entre eles o I-Juca Pirama, de Gonçalves Dias, inteirinho! Aliás, desse longo poema trago, ainda hoje, fragmentos na memória. Acrescento que graças a esse fato muito cedo desenvolvi grande ódio a toda a forma de manifestação poética. A explicação me veio anos depois: decorávamos por obrigação, sem entender direito aquilo que repetíamos. Em todo caso, foi bom: quando passei a entender e amar poesia eu já retinha muitas delas na memória.
A máxima punição aplicada pelo grande Zalboeno consistia em raspar a cabeça dos temperamentos mais indisciplinados. Imagino a repercussão de uma coisa assim nos dias atuais quando uma simples palavra inadequada a um aluno chega aos noticiários. Mas o primeiro Zalboeno chegou a fazer isso algumas vezes, tanto que acabou sendo afastado de suas funções.
Hoje sei que o religioso a quem me refiro era um homem torturado. Pesava sobre ele uma imensa culpa pelos pecados do mundo; a retidão absoluta figurava a ele como único caminho. As normas para uma vida reta buscava ele nas páginas da bíblia, livro que deve ter lido à exaustão sem conseguir abarcar verdadeiramente o seu significado.
Quando saí do colégio, Zalboeno já não era preceptor e nem fazia parte da equipe de professores. Poucos anos depois, prestei um vestibular no Rio de Janeiro e, enquanto esperava para entrar na sala de exame, vi, através de uma grade, um homem ainda moço circulando entre os canteiros de um jardim. Ele usava batina, tinha os olhos fixos no porvir e carregava um pesado livro nas mãos. Era o primeiro Zalboeno, levando consigo a sua inseparável bíblia.
Depois desse dia, nunca mais o vi. Deixei-o ali, entre as flores, com o grande livro a ditar-lhe os passos e os pensamentos. Depois a vida prosseguiu e eu o esqueci. Até esta manhã quando encontrei na minha caixa postal o cartão de um pedreiro chamado Zalboeno e o passado me devolveu a imagem do homem religioso meditando no jardim.
O fantasma do Chile
Salvo engano parece-me que os homens públicos que se notabilizaram por atos condenáveis, quando não inaceitáveis, têm vida mais longa nas memórias, sendo citados com mais frequência. O mais marcante exemplo desse fato é, sem dúvida, Adolf Hitler, cujo nome tornou-se sinônimo de barbárie, daí sobreviver por tanto tempo não havendo perspectiva de que venha a ser esquecido.
Degraus abaixo de Hitler estão os ditadores que atuaram e atuam em períodos marcadamente violentos da vida dos povos de diversos países. Nesse sentido, o caso da América Latina é exemplar. De fato, nas décadas de 60 e 70 instalaram-se no continente sul-americano ditaduras militares que se caracterizam como regimes totalitários fechados, responsáveis por perseguições políticas e torturas. Esses regimes proliferaram sob o beneplácito dos Estados Unidos numa história que ainda não foi verdadeiramente contada.
Não deixa de ser curioso que, pelo menos aparentemente, a ditadura militar brasileira tenha legado à posteridade marcas menos impactantes que as impressas pelas ditaduras argentina e chilena. Existiu, sim, no Brasil um quadro violento de repressão, tendo as mãos do Estado de então alcançado e punido exemplarmente contestadores e dissidentes. Não ficou o Brasil isento de perseguições de fundo ideológico, encarceramentos, torturas e pessoas desaparecidas. Entretanto, talvez pela natureza do povo brasileiro, decorridos cerca de 20 anos do fim da ditadura o assunto figura como pertencente ao passado: realmente não se volta a ele a todo instante.
O mesmo não acontece em relação à Argentina e o Chile, países em que os cadáveres dos sangrentos períodos ditatoriais continuam insepultos. A Plaza de Mayo localizada defronte a Casa Rosada, em Buenos Aires, continua a receber, as “Madres de la Plaza de Mayo”; recentemente o governo da presidente Cristina Kirschner autorizou testes de DNA, visando identificar crianças que foram doadas durante o período de repressão; e os envelhecidos generais, membros de governos militares, ainda são processados e condenados.
Já o Chile continua a ser assombrado pelo fantasma do ditador Augusto Pinochet. A figura do presidente socialista Salvador Allende suicidando-se no Palácio de La Moneda, quando sob o ataque de tropas militares golpistas comandadas por Pinochet, parece ser um filme sem fim. Isso é o que se observa ainda nos dias de hoje quando as eleições presidenciais chilenas apontam para um retorno da direita ao governo.
Próximo ao palácio governamental de La Moneda, em Santiago, existe uma estátua de Salvador Allende. Ele parece estar ali para garantir que o retorno à democracia chilena, ocorrido há 20 anos, persista. Mas quem circula por Santiago hoje em dia percebe o receio popular de que isso possa não acontecer. Afinal, a direita pode vencer as eleições e quem sabe uma estátua de Augusto Pinochet apareça na cidade, dando forma em bronze ao fantasma que tanto assusta ao povo chileno.
Engolindo pregos e parafusos
Foram retirados cirurgicamente 151 objetos metálicos do estômago de um homem, em Maceió. Segundo os médicos, trata-se de um possível caso de esquizofrenia. De sua parte o comedor de pregos, parafusos, lâminas de barbear, moedas, fusíveis – além de uma tesoura e um relógio – informa que começou a comer metais há quatro meses e não sabe explicar por que o faz.
Não fica bem fazer piada com a desgraça alheia, mas é impossível resistir à pergunta: não seria este um recorde para figurar no Guiness? Afinal, são 151 objetos pesando, no total, 3 Kg. Tudo isso dentro do estômago, imaginem.
Conheci em hospital uma senhora que engolia garfos. Não me perguntem como ela conseguia fazer isso, nesse sentido fico com a explicação da minha falecida mãe sobre atos incomuns. Dizia ela:
- Os seres humanos são capazes de tudo.
A devoradora de garfos era uma mulher simples e bem humorada. Seu único problema era o hábito de ingerir o popular talher. Certa vez ela esteve internada por longo período: foi trazida de casa após ingerir um garfo; após ser operada, ingeriu outro durante o período de recuperação; outra vez operada tornou a ingerir um garfo, desta vez por falha da enfermagem que fora proibida terminantemente de permitir acesso da paciente a qualquer tipo de metal.
Não sei que lugar ocupa no universo das taras a compulsão em ingerir metais. Trata-se de casos estranhos, difíceis de explicar dentro dos padrões de normalidade esperada. Mas, coisas assim acontecem e dão azo a que possamos demonstrar toda a nossa estranheza.
Um amigo psiquiatra sempre me diz que todas as pessoas têm a sua parcela de loucura. Mas, não se preocupe – diz ele - e completa:
- A maioria é sempre de loucos mansos que não fazem mal a ninguém.
A retirada de Aécio
Aécio Neves, governador de Minas Gerais, retirou ontem a sua pré-candidatura à Presidência da República, pelo PSDB.
Os jornais de hoje falam em pressão sobre o governador de São Paulo, José Serra, para que se defina quanto à sua candidatura à Presidência. Nos bastidores - e isso não é oficial – fala-se que Serra não tem intenção de candidatar-se, preferindo a sua reeleição ao governo de São Paulo.
Não escapa a ninguém o peso da mão do atual presidente da República sobre o resultado das eleições do ano que vem. Não importa que a candidata do presidente, Dilma Roussef, seja exatamente o oposto do que se espera de uma pessoa pública. Ele de fato não passa de uma grande interrogação e sabe-se lá que postura adotará se chegar à presidência. Não há como ver em Dilma Roussef qualquer traço de estadista como, aliás, ficou demonstrado pela participação dela na atual Conferência de Copenhague. Entretanto, Dilma tem atrás de si um presidente proprietário de pasmosa popularidade, fato que pesará no resultado das futuras eleições.
Partindo-se do anteriormente exposto é de se perguntar sobre as razões das posturas atuais de Serra e Aécio. Serra é governador, sabe demais sobre os bastidores da república e tem, portanto, condições de avaliar bem as suas possibilidades. Sua pelo menos aparente relutância em candidatar-se talvez se explique por esse fato. Serra conhece bem a força da máquina federal e a forma como será e está sendo usada em favor da candidatura de Dilma.
E Aécio? Desistiu de vez? Quem acredita nisso não sabe nada daquilo que é conhecido como “mineiridade”. Aécio é gente de Tancredo, povo de São João Del Rei e isso não só basta como explica tudo.
A política brasileira é rica em casos de políticos que desistem de candidaturas ou cargos para “retornar nos braços do povo”. A imagem de Aécio falando ontem sobre a sua retirada soma-se à dos grandes políticos mineiros que enriqueceram a nossa história com sua argúcia e habilidade.
Raposa velha esse tão simpático Aécio, mais que nunca gente da estirpe de Tancredo.
Agulhas no corpo
Rituais de magia negra com sacrifícios e ações por vingança são mais comuns do que se pensa. Atos de barbárie acontecem sob o manto de seitas religiosas que apelam para rituais extremados em nome de suas esdrúxulas crenças.
Quem não se lembra do reverendo Jim Jones, pastor evangélico norte-americano que fundou a igreja “Templo do Povo”? Esse Jim Jones passou à história por reunir-se com seus fiéis na Guiana onde fundou, no meio da selva, uma cidade ao qual deu o nome de Jonestown. Nesse lugar Jones conduziu seus fanáticos seguidores ao suicídio coletivo provocado pela ingestão de suco com cianureto. Desse modo, no dia 18 de novembro de 1978, morreram em Jonestown 913 pessoas, entre elas homens, mulheres e crianças. Jones não tomou o suco: suicidou-se com um tiro.
Agora surge um caso estranho na cidade de Ibotirama, interior da Bahia. Um homem, ajudado por duas mulheres, colocou mais de 40 agulhas no corpo de uma criança de 2 anos de idade. Consta que uma das mulheres pertence a uma seita religiosa.
No momento a criança está em estado grave porque uma das agulhas perfurou o pulmão. Segundo os médicos é mais perigoso tentar retirar as agulhas do corpo do que deixá-las onde se encontram.
O confesso autor do crime é padrasto da criança e afirma tê-lo perpetrado para vingar-se da mãe dela. A repercussão do fato já atravessa as fronteiras do país: agências internacionais de noticias já divulgam o acontecimento ocorrido em Ibotirama.
Pertencem à psiquiatria as explicações sobre os móveis mentais que levam pessoas a praticarem tamanha barbárie. Trata-se de caso no qual a fronteira entre o humano e o animalesco torna-se identificável. À maldade intrínseca ao ato hediondo cometido soma-se o ritualismo demoníaco que domina espíritos exaltados e capazes de ações extremadas. A vingança confessada pelo autor do crime representa apenas a superfície do ato consumado. Atravessando-se a barreira por si só ilógica da ação perpetrada abre-se um abismo de variáveis, nem todas elas conscientes e suficientemente claras para explicar o que aconteceu.
O exercício do mal não se explica através de simples comparações com normas esperadas de conduta. O mal é complexo; as almas que a ele se dedicam mais complexas ainda.
Tiger Woods
Inferno astral não é propriedade exclusiva de gente simples e desconhecida, nem se relaciona com riqueza ou pobreza: é coisa que pode acontecer a qualquer um e a qualquer hora.
A desgraça que se abate sobre o comum dos mortais em geral não tem repercussão pública. Diferente é a situação quando o desgraçado é pessoa notória e riquíssima. A fama atrai a notícia, atrás dela até mesmo os abutres dos pasquins sensacionalistas que ficam de plantão em busca de detalhes dos acontecimentos.
A essa altura, uma pergunta: e nós, por que lemos as notícias sobre o que acontece aos famosos, por que nos atraem tanto detalhes sobre os escândalos em que eventualmente eles são envolvidos?
Eu me fiz essa pergunta ao deparar com o inferno astral pelo qual atualmente passa o jogador norte-americano de golfe, Tiger Woods. Não que eu ligue para o golfe, esporte no qual a minha incultura não consegue ver a menor emoção. Mas, nisso como em muitas outras coisas, parece que sou caso a parte: milhões de pessoas acompanham os jogos de golfe, existem filmes cujos enredos abordam a vida de golfistas e no mundo da bolinha projetada por um taco Tiger Woods é o maior.
Sendo o maior Tiger é realmente “o cara”. Atrai multidões aos jogos de que participa, faz propaganda de vários produtos, enfim é uma celebridade mercê da posição que ocupa, posição esta duramente conquistada lançando bolinhas em buracos distantes por meio de brilhantes tacadas.
Um homem assim tem em torno de si a aura de viver em situação ideal: o maior do golfe, bela família, muito dinheiro, vida de filme. Até que numa noite sai de sua casa apressado e sofre sério acidente de carro. Poucas horas depois a boataria começa a circular: Tiger brigou com a mulher, foi ferido por ela, a mulher descobriu que era traída pelo grande golfista.
O resto da história todo mundo sabe: o homem que declarava ser a família a coisa mais preciosa do mudo tinha amantes às quais pagava de 4 a 5 mil dólares por mês, pelo silêncio delas. A esposa de Tiger, ex-modelo, está se separando dele e levando com ela os filhos. Tiger? Ele acaba de declarar que está se afastando do golfe profissional por tempo indeterminado.
A quem interessa tudo isso? Por que essa desgraceira pessoal do jogador chama a nossa atenção? Que faz uma rede de televisão postar seus repórteres na frente da casa de Tiger esperando que os caminhões de uma transportadora ali estacionados recebam a mobília da mulher que está saindo de casa?
Partindo do apenas “sei lá” para uma hipótese que não passa de um belo chute, acredito que tudo se resuma às nossas complexas relações com o mito. Estrelas que sobem e estrelas cadentes chamam e chamaram a atenção dos homens em todas as épocas. Uma cabeça que se erga da multidão atrai atenções e é preciso que se explique o porquê desse fato, ainda que não satisfatoriamente.
Tiger Woods é um nome mais que midiático e distante da maioria dos brasileiros dado o esporte que ele pratica não ser de preferência nacional. Mas é estrela, é mito, faz parte do consumo visual, oral e escrito. O homem é notícia. Gente como ele não aparece de repente sendo acusado de ter mais de uma amante, pagá-las bem e ter uma vida desregrada em surdina. À imagem oficial do jogador, aquela à qual estamos habituados, não cabe a do devasso que engana a mulher. Além disso, um cara que faz o que ele faz com o taco, um sujeito capaz de tanta precisão, simplesmente não pode cometer um erro desses, dar uma tacada dessas, pelo menos em público.
Agora junte ao que está escrito acima mais algumas razões para Tiger Woods não poder estar metido nessa situação e talvez você se convença de que vamos acompanhar a história dele até o último capítulo.
Aliás, será que aparecerão na televisão os móveis da casa dele quando a ex-modelo sair definitivamente de casa com os filhos?
Deixa prá lá.
Copenhague 2009
Há dois dias do encerramento a conferência sobre o clima em Copenhague pouco se conseguiu. A agenda que previa, entre outros compromissos, a redução de gases estufa e a criação de um fundo internacional voltado para o ambiente ainda não foi cumprida e não há porque se acreditar que os acordos tão esperados sejam selados desta vez.
Para quem acompanha de longe é interessante observar a tônica dos pronunciamentos. A verdade é que a partir de temas ambientais geraram-se muitos lugares-comuns, todos eles em torno de uma coisa só: alguma coisa precisa ser feita.
Mas como, sem ofender em grande escala os interesses díspares das nações? O fato é que os poucos progressos verificados na conferência têm gerado enormes protestos. Os homens públicos estão sendo cobrados pelo clamor que vem das ruas e estão sendo pressionados a agir. Trata-se de um jogo em que ninguém quer perder, ou perder proporcionalmente em relação aos demais países.
De positivo o fato de que as questões ambientais deixaram de ser assunto de cúpulas e estudiosos. A linguagem ecológica incorporou-se definitivamente ao vocabulário e temário da população. O ambiente e a necessidade de preservá-lo não passa despercebido ao povo em geral, embora no particular não se acredite que cada um esteja fazendo a sua parte. Afinal, o exemplo vem de cima: se os governos não se comprometem e não se empenham que posso fazer eu?
Ontem peguei um táxi e o motorista puxou conversa. Assunto: ambiente. Falou-me ele sobre aas alterações climáticas, o efeito estufa, o degelo das calotas polares e o monumental iceberg que se despregou do pólo antártico e navega em direção à Austrália (ele disse Inglaterra). A sorte, disse o taxista, é que o iceberg vai se quebrar antes de chegar à orla marítima.
Era um homem simples o taxista, mas antenado com a situação do mundo em que vive. No conjunto sua visão mostrou-se trágica: para ele nunca haverá um acordo e o mundo acabará em colapso com o fim da vida no planeta.
- Não veremos o desastre - disse ele – talvez os nossos bisnetos assistam ao fim da nossa civilização.
Depois o taxista lembrou-me de que talvez as coisas possam ser resolvidas à nossa revelia, no ano de 2012, quando os planetas ficarão numa posição exata, capaz de gerar cataclismos.
Desci do táxi impressionado com a verve de um homem bastante informado sobre as questões ambientais. Quero dizer que é de pequenos acontecimentos como esse que nasce a esperança. Vozes que se somam geram ruídos ensurdecedores daí ser bem capaz de que os governantes finalmente ouçam e cumpram o papel que deles se espera.
A ministra chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, declarou em Copenhague que a preservação do ambiente é uma ameaça ao desenvolvimento sustentável. Ato falho ou não da ministra é preciso corrigir a frase para que as coisas sejam colocadas em seus devidos lugares.
Aquecimento Global
Imagino uma situação na qual a Terra tivesse oportunidade de dar a sua opinião sobre o que acontece em sua superfície. Teria ela os olhos voltados para o encontro de Copenhague?
Em primeiro lugar seria preciso saber se a Terra é suscetível a vaidades. Teria para ela alguma importância mostrar-se totalmente coberta pelas águas ou, ao invés, apresentar-se com o oceano margeando grandes porções de terra? E quanto aos seres que vivem em sua superfície? Importar-se-ia ela em registrar aos olhos do universo a existência de vida na sua superfície?
De uma coisa estamos certos: a Terra não gosta de ser agredida, reprova as transformações que a ela são impostas e reage violentamente quando atacada. Em função disso os seres que a habitam sofrem com as consequências decorrentes das agressões ambientais.
Se eu tivesse que comparar a Terra a um ser humano certamente escolheria o segundo presidente do Brasil, Marechal Floriano Peixoto, como personificação dela. Floriano passou à história como homem de ação e de poucas palavras, sendo frequentemente comparado a uma esfinge. Durante a Revolta da Armada, ocorrida no Rio de Janeiro, em 1983, o então presidente destacou-se pela sua firmeza. Quando o staff político da época mostrou-se em dúvida sobre as medidas a tomar, Floriano pronunciou uma frase famosa:
- Enquanto vocês discutem eu vou agindo.
Creio que se a Terra pudesse falar ela diria exatamente isso aos notáveis reunidos em Copenhague. Enquanto eles discutem a Terra age, infelizmente cada vez mais violentamente. Cerceados por interesses políticos e econômicos os homens que governam o mundo querem, cada um, reduzir a sua participação e muitas vezes até mesmo a responsabilidade em relação à emissão de gases estufa. Nesse ritmo talvez não se possa esperar grande coisa em termos práticos para os próximos anos.
E o Brasil? Segundo dados divulgados pelo INPE a coisa aqui tá escura. Para o nosso desespero o aquecimento global será maior no Brasil. Se a temperatura subir 1,8 graus em média no planeta, no Brasil esse aumento será de 2 graus. O Brasil terá, portanto, um aumento de temperatura 20% maior que a média global. Pior: se o desmatamento continuar a elevação da temperatura no país será de 3 graus em relação aos mesmos 1,8 graus da média global. Isso significará redução das águas, do regime de chuvas e elevação do nível dos mares além de outras inúmeras consequências.
Infelizmente a Terra não fala. Em seus bilhões de anos de existência ela deve ter aprendido que em certas circunstâncias palavras não resolvem: é preciso agir. Talvez por isso ela até admire gente de ação, como aquele Floriano que um dia andou por aí e cuidou dos interesses do Brasil.