Arquivo para junho, 2012
Andanças
Se você não gosta de pensar na morte não leia esse texto.
Dias atrás fui ao enterro de um amigo e confesso que o ritual do processo não me fez bem. O falecido era meu conhecido há mais de 20 anos e foi levado dessa vida mais por ser turrão que por outra coisa. Teve ele um câncer como qual veio a se preocupar tarde demais. Tinha um sangramento intestinal e passou cerca de um ano sem buscar diagnóstico para o seu mal. E mesmo depois de saber que se tratava de câncer demorou-se para iniciar o tratamento porque se desentendeu com o alcance o plano médico que pagara vida afora.
O meu amigo foi enterrado num desses cemitérios verticais, no andar mais alto. Eu o vi no último instante antes de fecharem o caixão e o introduzirem naquele lóculo de onde nunca mais se sai. E vê-lo ali, finalmente terminado, apartado do mundo, extinto, sem mais poder contar-me aquelas fabulosas aventuras que pautavam o modo de ser algo insólito dele, provocou-me um apressado sentimento de que a vida enfim acaba e a minha também um dia terminará.
Sai do cemitério pensando não propriamente sobre o fim, mas a respeito das circunstâncias do final, tal como essa coisa toda que envolve o destino do corpo. Talvez tenha raciocinado sobre isso porque nas últimas horas os familiares do meu amigo viram-se compungidos a decidir sobre onde o corpo dele seria enterrado dado que ele não se preocupara com o assunto. Era mesmo o meu amigo um tipo desses que se acredita imune à morte, ainda mais tendo ele 50 anos de idade e, segundo sua perspectiva, muita vida a correr pela frente.
Acresça-se a isso o fato de que, sinceramente, não gostei daquele tipo de cemitério no qual se condena o morto a passar a eternidade em condomínio, prédio com andares e tudo o mais. Esse não gostar justifica-se: morei em cidades menores na maior parte do tempo e me habituei aos tradicionais enterros nos túmulos com caixões cobertos por terra. Do que se depreende que para mim nem pensar no modernismo das cremações e cinzas atiradas ao mar, etc.
Meu pai viveu num lugarejo em montanha e sempre dizia não querer ser enterrado no cemitério local situado num morro íngreme. Dizia ele não querer passar a eternidade em pé, naquele morro, daí que quando morreu atendemos ao pedido dele enterrando-o numa cidade próxima, em solo sem declividade. Está lá ele, na horizontal, com minha mãe e irmãos, morando na eternidade que pediu. Era o mínimo que podíamos fazer por ele.
Mas, o que acabou me ocorrendo foi o quão difícil seria para mim a escolha do lugar para vir a ser enterrado. O fato é que acabei levando vida meio itinerante, nessas andanças tendo morado em várias cidades e, no fundo, sem me apegar a elas. Creio ter sido sempre um estrangeiro nos lugares em que vivi daí não me apetecer curtir a minha eternidade dentro de um caixão em nenhum deles.
Já no carro e de volta ao meu trabalho, senti-me desconsolado. Pareceu-me estranho que tivesse passado a minha vida até então sem criar vínculos emocionais definitivos com as cidades em que morei. Depois pensei no fato de que, afinal, que importância isso teria já que estaria mesmo morto daí diferença nenhuma fazer o lugar onde se é enterrado. Mas, não sei não…
Também pensei no apocalipse e na vinda de Jesus ao mundo no momento da ressureição dos corpos. Imaginei o meu amigo abrindo a portinhola de vidro do seu jazigo e descendo as escadas do prédio para comparecer ao juízo final. Fui capaz de imaginar muita coisa, mas não cheguei a nenhuma conclusão quanto ao meu futuro após estar morto.
A Copa de 1962
Eu era adolescente em 1962, cursando o Ginásio que hoje é chamado de Ensino Fundamental II. O Brasil não era nem de longe esse país emergente que hoje conhecemos. No ano anterior, 1961, o presidente Jânio Quadros surpreendera o país renunciando ao poder. Eu me lembro de estar em São Paulo logo após a renúncia de Jânio. Pairava um silêncio mortal nas ruas e o aspecto das pessoas traia desilusão. Vi, na esquina da Alameda Nothman, ao lado do Colégio Coração de Jesus, populares aglomerados numa banca de jornal, lendo as notícias. Ninguém dizia nada, houve quem saísse dali com lágrimas na face. Jânio era esperança, mostrara-se uma fraude e, agora, após a Campanha da Legalidade promovida por Leonel Brizola, Jango estava no poder.
Em 62 no Brasil vigorava no país o regime parlamentarista e um dos primeiros-ministros a chefiar o governo foi o Brochado da Rocha, cujo nome dava o que falar. No plano mundial a Guerra Fria seguia seu itinerário com a constante disputa entre os EUA e a União Soviética. No início do ano houve o episódio da Baia dos Porcos, em Cuba, que quase deflagrou uma guerra mundial que tanto se temia pelo lançamento de mísseis de longa distância. Veio daí o bloqueio continental imposto a Cuba que até hoje perdura. Os EUA mandavam no mundo mais que hoje e impuseram a expulsão de Cuba na Conferência de Punta del Este. A América Latina fez o que era lhe possível na época: curvou-se às ordens do gigante do norte.
De 1962 ficou-me o som de Stella by Starlight cantada pela voz rouca de Ray Charles. Lembro-me de que meu pai não gostava de Ray Charles porque para ele era incompreensível justamente aquela voz rouquenha num cantor. Demais. por aqui a Bossa Nova estava em alta e 62 foi o ano em que os nossos rapazes se apresentaram no Carnagie Hall, em Nova York, grande marco para a internacionalização da música brasileira. Por aqui ouvíamos também grandes intérpretes em plena atividade como Cauby Peixoto, Moreira da Silva, Nelson Gonçalves e tantos outros.
Mas, o ano de 1962 ficou mesmo na memória pela conquista do bicampeonato mundial pela seleção brasileira. Tínhamos um time invejável que perdeu Pelé na segunda partida por contundir-se, mas Garrincha brilhou e o Brasil foi campeão.
Ontem, 17 de junho, comemorou-se o cinquentenário da vitória do Brasil sobre a Tchecoslováquia, partida final da Copa de 62. As emissoras e TV e sites da internet estão mostrando cenas da conquista brasileira nos gramados do Chile. O que é impossível transmitir é a emoção que nós, os que acompanhamos os jogos pelo rádio na época, experimentamos a cada gol do Brasil. Éramos um país confuso, imerso em disputas terríveis e endividado para o qual o futuro não passava de terrível incógnita. Habituados à condição de terceiro-mundistas e sem peso no concerto das nações nada havia que nos projetasse diante do mundo. Foi nesse contexto que as chuteiras fizeram a diferença daí a colossal festa de recepção aos jogadores da seleção quando voltaram do Chile.
Eram outros tempos, outro o modo de encarar os acontecimentos, mas nas memórias ficou gravado o registro daquele grito imenso, enorme, que nos fez sentir superiores dentro da inferioridade que nos era atribuída diante do mundo. Apagava-se de vez o descalabro da perda da Copa de 50 em pleno Maracanã e passávamos a acreditar mais em nós mesmos. O futebol, a Bossa Nova e a nossa invejável capacidade de recuperação davam-nos força para seguir adiante, embora nem desconfiássemos do que estava por vir naquele 31 de março de 1964 que viria a mudar a nossa história.
Criogenia
Já faz tempo que não ouvia falar sobre congelamento de corpos para que um dia venham a ser ressuscitados, caso a ciência avance a ponto de reverter causas de mortes. Há dez anos o assunto esteve em pauta dado o congelamento do corpo de famoso jogador norte-americano.
Agora o assunto retorna devido a disputa entre os filhos de um engenheiro da FAB que faleceu aos 82 anos de idade. O pedido dele é que seu corpo seja congelado e uma de suas filhas já pagou US$ 28 mil para empresa americana encarregada do procedimento. Isso sem falar nas despesas com funerária para manter o corpo em condições. Ocorre que duas outras filhas do engenheiro querem simplesmente enterrar o pai e a questão está por se resolver.
No fundo o que está em jogo é a possibilidade de reverter a morte, tema por demais complexo. Existem casos estranhos como o desse menino que se levantou do caixão e pediu água. O fato ocorreu dias atrás e o menino foi levado ao hospital, mas morreu por estar desidratado. Obviamente o menino não estava morto quando o velaram da primeira vez, mas há quem fale em ressuscitação.
É de se pensar na vontade de viver que leva pessoas a optarem pela criogenia. Um idoso de 82 anos, vitimado por um AVC, certamente atingiu o limite da vida a partir do qual continuar neste mundo seria esforço desnecessário. Entretanto, a vontade de viver e a fé no progresso da ciência estimulam pessoas a se decidirem pela criogenia.
Em todo caso a questão do retorno após a morte é instigante. Histórias de terror exploram o tema e causam calafrios em leitores e espectadores. Clássico do gênero é o conto “A Pata do Macaco” do escritor W. W. Jacobs. A trama gira em torno da possibilidade de se fazer três pedidos à pata de um macaco trazida por um marinheiro.
Os aficionados por histórias de terror poderão encontrar “A pata do Macaco” em sites da internet, bastando digitar o nome do conto em ferramentas de busca. Quanto à criogenia só o futuro poderá nos dizer se existe ou não a possibilidade de fazer reviver pessoas mortas.
Na senda do crime
Divulgado o laudo necroscópico sobre a morte do japonês executivo da Yoki. No laudo consta que a morte se deu por “choque traumático (traumatismo craniano) associado a asfixia respiratória por sangue aspirado devido a decapitação”. Em razão disso a polícia suspeita que o japonês tenha sido decapitado quando ainda agonizava após ter recebido um tiro dado por sua mulher.
O novo dado contrasta com a versão dada pela mulher que confessou ter atirado no marido e esperado algumas horas para esquartejar o corpo dele. O caso também vem sendo apimentado com revelações sobre o tempo em que a mulher do executivo da Yoki atuava como garota de programa. Na internet há fotos tiradas de um site no qual Elise, a mulher, aparece seminua e avisa ser carinhosa a seus possíveis fregueses.
O esquartejamento do japonês continua dando o que falar, mas as práticas criminosas não param, passando pelos arrastões praticados por bandidos em restaurantes e condomínios na cidade de São Paulo. E como se não bastasse tanto horror surge a notícia de que duas meninas de 13 anos de idade matar, outra, colega de infância de 12 anos de idade, a facadas. O crime aconteceu em Belo Horizonte e dele consta um terrível adendo: após o assassinato as criminosas arrancaram o coração e cortaram um dedo da vítima, levando-os consigo para suas casas. As duas meninas têm envolvimento com uma quadrilha de traficantes de drogas e confessaram o crime que cometeram sem nenhuma emoção ou arrependimento, na verdade rindo. Segundo elas as partes do corpo eram para ser mostradas às mães delas como prova de que estariam sendo ameaçadas por criminosos, daí terem sido obrigadas a matar um deles.
Meu amigo, você liga a televisão e fica sabendo que uma idosa de 96 anos foi morta por bandido que invadiu a casa dela e remexeu tudo com a intenção de roubar. E daria para ficar aqui escrevendo sobre a ocorrência de crimes e mais crimes, mas o horror que tudo isso causa, o medo de que um dia nós mesmos possamos ser as vítimas e a permanente sensação de insegurança me convidam a pensar noutra coisa e deixar pra lá qualquer conclusão para esse texto que, aliás, fala por si mesmo.
Waterloo
A Europa empalidece diante de uma monumental crise econômica. O auxílio de 100 bilhões de euros aos bancos espanhóis não logra restabelecer a confiança nos mercados. Há receio de que a crise na Espanha acabe por chegar à Itália. Enquanto isso os gregos preparam-se para ir às urnas para decidirem se vão ou não continuar na zona do euro.
A crise estende-se e seus tentáculos afetam economias de países distantes. A China se ressente, no Brasil entra em cena o “pibinho” que atesta a redução no crescimento do país. O governo toma medidas para manter o consumo, há redução de IPI de alguns produtos, as os discursos ufanistas de tempos atrás vão sendo deixados de lado. Não se sabe no que tudo isso vai dar e a solução da crise europeia parece muito distante.
Alheio a tudo isso um esqueleto reaparece em Waterloo, 200 anos depois da batalha em que Napoleão Bonaparte foi derrotado e desterrado para viver seus últimos dias na Ilha de Santa Helena. Encontrado por arqueólogos na região de Waterloo, Bélgica, o esqueleto estava deitado de costas, tendo presa na região do pulmão esquerdo o projétil que o matou no dia 18 de junho de 1815.
Napoleão foi derrotado em Waterloo pelas tropas comandadas pelo britânico Duque de Wellington - um exército aliado formado por ingleses, prussianos, belgas e holandeses. Do lado francês combateram 72 mil homens, do lado aliado 68 mil homens, isso sem contar os 45 mil prussianos que chegaram ao meio da batalha.
Antes da batalha de Waterloo Napoleão já havia sido derrotado e fora exilado na Ilha de Elba. Nesse período os países reuniram-se me Viena para redesenhar o mapa da Europa. Foi quando Napoleão reapareceu com seu governo de 100 dias terminado com a derrota em Waterloo.
O esqueleto do soldado leva-nos a um recuo de 200 anos na história e nos faz lembrar de que, afinal, os problemas daquela época foram superados. O esqueleto parece ser testemunho de que situações aparentemente insolúveis tendem ao equilíbrio com o passar do tempo. A Europa vive hoje uma terrível batalha que, segundo analistas, não terminará sem exigir grandes sacrifícios e adoção de políticas não apenas calcadas na noção de austeridade. Mas, como em 1815, de um modo ou de outro, as coisas se rearranjarão. No momento é impossível prever no que tudo isso vai dar, mas o mundo preocupa-se e torce pelo fim da crise europeia.
Cambistas
Leio que ingressos em mãos de cambistas para o jogo entre Santos e Corinthians podem ser vendidos até por R$ 600,00. Não estranho a notícia porque recentemente fui a um jogo no Morumbi e presenciei a atividade paralela de venda de ingressos.
História boa é a contada desde o começo. O começo da aventura de ir aos estádios significa entrar na luta por um lugar onde estacionar o carro. Na rua estão os guardadores que não se contentam com pouco. Mas, o diabo são os estacionamentos improvisados nos quais a taxa é de R$ 50,00. Desembolsada essa quantia o torcedor segue para as bilheterias. Como cheguei pouco antes do começo do jogo procurei as filas para compra de ingressos. Não era de minha intenção sentar-me nas arquibancadas superiores porque temia que chovesse. Por essa razão quis comprar um lugar na região das cadeiras cobertas, mas fui avisado de que as bilheterias já não dispunham de ingressos para esses setores. O jeito, portanto, seria comprar dos cambistas que andavam de um lado para outro, gritando e oferecendo ingressos a preços no mínimo 50% superiores ao impresso nos bilhetes.
Jogo para começar, tinha ido até lá, comprei de um cambista. Entretanto, ao chegar ao setor reparei no grande número de cadeiras vazias que assim permaneceram até o fim do jogo. Confesso que não entendi nada. Afinal, se existiam tantos lugares vazios porque não estavam mais sendo vendidos nas bilheterias? A resposta poderia ser a de que os cambistas tivessem comprado todos os ingressos, mas isso seria absurdo porque não se tratava de jogo para o qual se esperasse público muito grande. De fato, naquela noite o público foi de pouco mais de 20 mil pessoas, sendo a capacidade do estádio em torno de 60 mil.
Bem, valeu a pena, vi o jogo de um lugar bem situado só que fui obrigado a pagar muito mais do que pagaria caso tivesse conseguido o ingresso nas bilheterias.
O mesmo pode-se dizer sobre as compras de ingressos para espetáculos através da internet. Nesse caso existe a chamada taxa de conveniência que agrega 20% a amais ao valor do ingresso comprado. Note-se que nesses 20% não está incluída a entrega dos ingressos aos compradores. Recentemente um amigo me contou sobre o valor superior em 20% ao preço de ingressos comprados pela internet para uma sessão de cinema. A explicação é a de que comodidade custa caro e a justificativa de que ninguém é obrigado a utilizar os serviços, podendo adquirir os ingressos diretamente nas bilheterias.
Mas, aproximam-se grandes eventos esportivos que ocorrerão no país, entre eles a realização da Copa do Mundo em 2014. A ver como serão tratados os torcedores que certamente estarão muito interessados em assistir aos jogos.
Dia dos namorados
Encontro o meu vizinho na garagem e o ajudo a entrar no elevador. É um rapaz de cerca de 30 anos idade e traz um vaso de orquídeas e uma sacola de presente para a mulher. Daqui a pouco será iniciada a noite dos namorados na qual os casais se amarão e presentearão.
Confesso que em emocionei ao ver esse rapaz pleno de força e felicidade, chegando a casa para dar à mulher que ama os presentes que escolheu. Então me pareceu que a vida é uma continuidade que jamais termina porque elos de costumes unem pessoas e fazem a história das gerações. O ser humano tantas vezes desumano e violento é, na verdade, um ser criado para o amor do qual eventualmente afasta premido pelas injunções da vida.
Conversamos, eu e ele, até chegarmos ao nosso andar. Pude vê-lo no momento em que abriu a porta e foi recebido com um largo sorriso pela moça que é a mulher dele. Nesse momento todas as notícias ruins, os desastres da vida, as guerras, as mutilações, as perseguições e todo o mal me pareceram pequenos, muito pequenos. Reinava ali, entre aquele casal, um símbolo de fraternidade e amor que a tudo resiste e nos faz humanos, ainda que por breves instantes.
O julgamento do mensalão vem aí
Difícil de acreditar, mas o julgamento do mensalão será iniciado no primeiro dia de agosto. Não custa lembrar que a data não é promissora porque agosto é considerado azarado dada a ocorrência no mês de fatos terríveis a começar pelo suicídio do presidente Getúlio Vargas em 1954, a renúncia do presidente Jânio Quadros em 1961 e a morte em acidente do presidente Juscelino Kubistchek em 1976. Isso sem falar no lançamento, em 1945, pelos EUA, da bomba atômica sobre Hiroshima e na renúncia do presidente norte-americano Richard Nixon, em 1974. Tudo isso e muito mais em agosto. Pode?
Mas, o caso é que passados sete anos desde que o país foi sacudido por verdadeiro tsunami de denúncias, enfim o STF se diz em condições de julgar os atores daquela enorme confusão que ainda hoje nos deixa perplexos. E o STF fará isso porque caso não o faça muitos crimes estarão em breve prescritos e os próprios ministros se dizem preocupados com o julgamento da opinião pública sobre o Judiciário brasileiro.
Nada contra o STF e seus ministros, gente de proa do Poder Judiciário. Mas, a bem da verdade, é mesmo difícil de acreditar que finalmente os envolvidos naquela grande tramoia na qual se sobressaem a formação de quadrilha e a movimentação de fortunas em dinheiro venham a ser punidos. Até porque este nosso Brasil é o país onde reina a impunidade por mais que esse fato seja negado. Contribui para a afirmação anterior o próprio atraso no julgamento do mensalão, afinal os cidadãos do país foram agredidos, semanas a fio, por um rosário de denúncias que escancarou aos quatro ventos o alto nível de corrupção que envolvia até o primeiro escalão da República. Interessante que até hoje o então presidente da República negue as acusações e as atribua a um movimento espúrio da oposição que tentaria afastá-lo do poder. Mas, isso são águas passadas, aliás, tudo isso é passado e a ver como digladiarão a partir de agosto grandes eminências jurídicas do país durante os embates entre defesas e acusações sobre crimes tristemente públicos.
O que não desce pela garganta é a desfaçatez disso tudo. Não dá para engolir que todo aquele transe envolvendo as denúncias sobre o mensalão tenha ficado em espera durante tanto tempo para só agora vir a ser julgado. E isso porque dois ministros do STF estão para se aposentar, o risco de prescrição dos crimes aproxima-se, sem falar nos interesses envolvidos pelos quais não se quer o julgamento em ano eleitoral.
Todo mundo está careca de saber sobre tudo o que está escrito acima. Nenhuma novidade. Entretanto, agora que finalmente o caso será julgado espera-se que os verdadeiros responsáveis pelo episódio que sufocou a nação sejam punidos. Afinal, acreditamos que existam culpados porque, caso contrário, tudo aquilo que se viu e ouviu não terá passado de invenção com o intuito de denegrir a classe política do país.
A ver como se comportará o STF a partir de agosto. Estranho o fato de que agora quem estará na berlinda é a Justiça do país.
O esquartejamento
Há muito tempo um crime não chama tanto a atenção pública como esse em que um japonês foi morto e depois esquartejado pela própria mulher. As circunstâncias da ação estão sendo esclarecidas aos poucos, mas a confissão da mulher levou a polícia a dar o caso como encerrado sob o ponto de vista interrogativo. Confessou ela que após discutir com o marido - que teria uma amante - matou-o com um tiro na cabeça. Depois esperou dez horas e, após utilizar coagulantes, esquartejou-o sendo que, mais tarde, livrou-se das partes carregando-as em malas e jogando-as na região de Cotia. As malas foram compradas por ela num shopping-center com a finalidade de serem utilizadas para carregar as partes do corpo.
O japonês assassinado era herdeiro da empresa Yoki recentemente vendida por quase 2 bilhões de reais a um grupo norte-americano. O casal vivia num apartamento de 500 m2 e tinha uma filha de dois anos de idade.
Passados poucos dias desde que a notícia sobre o crime foi divulgada não se fala noutra coisa. Programas policiais no rádio e na televisão comentam a frieza da mulher e a ocorrência de crime tão hediondo. Na internet há um vídeo no qual se mostra o casal no elevador com a filha, depois o marido saindo para comprar uma pizza e finalmente a mulher entrando no elevador com as malas. Divulga-se também que a mulher foi parada numa blitz pela polícia justamente no momento em que carregava no carro as malas com as partes do corpo do marido.
Tenho ouvido muitas opiniões sobre o caso do esquartejamento do japonês. As pessoas admitem que a mulher tivesse raiva imensa do marido, mas se perguntam porque ela simplesmente não se separou dele já que eram imensamente ricos. De todo modo paira nas conversas um clima de estupefação diante de ato que beira o inacreditável. Como uma mulher, sozinha, foi capaz de praticar crime tão terrível? Como teve sangue frio para deixar o corpo do marido esfriar e depois gastar quatro horas para esquartejá-lo, como confessou?
O esquartejamento do japonês da Yoki é um crime incomum que nos incomoda porque desafia os limites daquilo que consideramos humano. Há algo de sombrio na face fria da mulher que o cometeu, mas ao observá-la, nem de longe poderíamos supor que fosse capaz de tanto. Essa mulher cometeu algo que desafia a lógica com que pensamos e fez-nos desconfiar dos limites da fronteira que nos separa do universo animalesco. Talvez por isso o caso perdure e as pessoas falem tanto sobre esse crime que certamente será lembrando por muito tempo, sempre citado por sua hediondez e aspectos terríveis de execução.
Mulheres virgens
Está na Revista Playboy deste mês a notícia de que a atleta norte-americana Lolo Jones , é virgem e pretende ficar assim até se casar. Segundo afirma a virgindade é um presente que pretende dar ao futuro marido quando vier a se casar. No momento a atleta de 29 anos de idade está solteira e prepara-se para as Olimpíadas de Londres. Diz ela que é mais difícil manter a virgindade do que treinar para a próxima competição mundial para qual é apontada como nome forte para conseguir o ouro na prova de 100 metros com barreiras.
Lolo Jones aponta como razão para manter a virgindade o desejo de vir a ter uma família sólida, diferente d o lar conturbado de seus pais. Conta, também, sobre sua infância difícil, na qual chegou a roubar comida congelada em supermercados para matar a fome.
Lolo Jones me fez voltar ao tempo em que cursava a faculdade. Então tínhamos uma professora assistente de uma das matérias, uma loira encorpada que estava longe de ser bonita, mas de aspecto agradável. Mulher muito séria auxiliava-nos em experiências no laboratório e, por vezes, substituía a professor titular da matéria em aulas teóricas.
Passamos um ano inteiro convivendo com ela sem que tenha ocorrido entre nós nada mais que as relações formais e habituais de professores e alunos. Isso durou até que organizamos um churrasco de despedida ao final do ano letivo para o qual ela foi convidada e compareceu. Muito na dela, como sempre, a professora manteve-se discreta até que, de repente sentou-se a uma mesa em que eu estava com amigos e começamos a conversar. Não sei dizer as razões pelas quais a partir daí ela transformou-se, creio que tenha bebido um pouco, coisa que talvez não fosse de seu hábito, mas que de todo modo soltou-lhe a língua. O fato é que papo vai, papo vem, declarou-se ela, enfaticamente, solteira e virgem aos 29 anos de idade. Entretanto, avisou-nos de que sua intenção era a de manter-se assim até completar os 30 anos, coisa que viria a ocorrer dentro de alguns meses. Caso até a data de seu próximo aniversário não tivesse se ligado a algum homem com a intenção se casar estava decidida a mandar a virgindade às favas com o primeiro que aparecesse.
Corria o início da década de 1970 e vivíamos numa época de silêncio imposta pelo regime militar que governava o país. Éramos, então, rapazes novos, em início de curso superior e não habituados a ouvir confissões daquele teor, ainda mais de alguém que fora nossa professora naquele ano.
Essa história estaria terminada com o fim esperado de uma despedida para sempre ao fim da churrascada se, alguns anos depois, eu não tivesse me encontrado com um colega que também estivera sentado à mesma mesa, comigo, por ocasião da confissão da professora. Encontrei-o numa estação do metrô e, conversa vai, conversa vem, contou-me ele que se casara justamente com a professora. Tive enorme vontade de perguntar a ele se, por acaso, aquela estranha conversa na mesa do churrasco influíra na escolha dele para a parceira de toda a vida. Mas, não tive coragem. Depois que nos despedimos raciocinei que ele se casara com a professora anos depois de ela completar os 30 anos de idade. Teria ela mantido a virgindade ou cumprira a promessa de perdê-la com o primeiro que aparecesse após o seu trigésimo aniversário?
Perguntas inúteis, sem respostas possíveis, mas que despertam a curiosidade sobre o modo inesperado de ser das pessoas e as armadilhas que a vida nos prepara.