Arquivo para dezembro, 2012
O fim do mundo vem aí
Uma amiga chilena me conta que familiares dela estão se preparando para a grande hecatombe que se abaterá sobre a Terra no próximo dia 21. Preparam-se para um novo e grande terremoto, maior que o último que causou grande destruição em terras chilenas. O mundo deve acabar, mas, caso as coisas fiquem apenas em destruição, o jeito é armazenar água e comida para os terríveis dias que se seguirão. É o que estão fazendo por lá.
Minha amiga diz que não acredita no fim do mundo, para ela o calendário maia está sendo mal interpretado. Mas garante que o alinhamento de corpos celestes gerará muita energia e, em algumas situações, as consequências poderão ser graves. Peço um exemplo e ela me diz que doentes deverão se proteger porque qualquer excesso poderá resultar em morte. No dia 21 as pessoas devem evitar confrontos, discussões e ações ousadas porque a energia se abaterá negativamente sobre elas e os resultados disso são imprevisíveis.
Há quem acredite em fenômenos que ultrapassam a nossa de compreensão tais como os poderes e efeitos decorrentes do uso da magia negra. Pais-de-santo ganham a vida no exercício diário de trabalhos realizados para melhorar ou piorar a vida de alguém. Quiromantes e outras praticantes de leituras de búzios e cartas advinham o destino daqueles que os procuram. De todo modo o fato é que algumas pessoas são mais impressionáveis que outras e jamais saberemos ao certo se tudo isso realmente existe e funciona ou se trata de pura bobagem.
Acontece que certas pessoas são sensíveis a fatos extraordinários daí sobre elas as sugestões terem efeito marcante. Em menino morei em cidadezinha de população não superior a mil almas. Naquele tempo a energia elétrica era falha, as ruas não tinham calçamento e a vida transcorria com grande simplicidade. Obviamente não dispúnhamos de acesso a canais de televisão e a internet talvez ainda fosse um sonho isolado na cabeça de uns poucos inventores. Entretanto, havia o correio, lento, mas que possibilitava a troca de informações entre pessoas. Foi através dele que um pobre homem, morador da zona rural, certo dia recebeu uma carta que transtornou a sua vida.
Era muito cedo quando o homem bateu à porta de minha casa, procurando pelo meu pai que, na ocasião, estava viajando. Ao saber da ausência de meu pai o homem estendeu-me a carta que trazia. Quando a li constatei que se tratava de uma corrente, cujo texto informava a quem a recebesse que se não enviasse dez cópias a outras pessoas algo de terrível aconteceria. Só então reparei que o homem tremia de nervoso como se a partir daquele momento uma tragédia rondasse a si e aos seus. Daí que ele me implorou pela reprodução das tais dez cópias para que fossem enviadas pelo correio a pessoas que ele conhecia.
Desnecessário dizer que nem imaginávamos o que viria a ser um xérox. Alias, nem mesmo um computador. O jeito era usar a máquina de escrever na qual, letra por letra, datilografei por dez vezes o texto da maldita corrente - havia uma exigência de que as cópias não podiam ser manuscritas.
Jamais me esqueci desse homem simples transtornado por uma corrente. De nada adiantaram minhas tentativas de dissuadi-lo da empreitada dado que correntes não passavam de grande bobagem, coisa de quem não tem o que fazer. Ao final ele me deu um dinheiro e lá se foi sorridente em direção ao correio para enviar as cartas.
Temas diários
Do que mais se fala? De futebol e corrupção. No futebol os assuntos são os jogos do Corinthians e do São Paulo a serem realizados amanhã. O Corinthians joga a primeira partida do mundial de clubes contra uma equipe egípcia. Dá para sentir no ar a febre que agita os corintianos. Dias atrás os torcedores foram se despedir do time e quase aprontam tragédia no aeroporto. As imagens publicadas sobre as ações da enfurecida torcida simulavam a passagem de vendaval com carrinhos jogados etc. Já o São Paulo joga, no Morumbi, contra o Tigre da Argentina. Trata-se da final da Taça Sul-Americana e os tricolores dão como certa a conquista.
Houve tempo em que torcíamos pelos times de nosso estado quando jogavam fora. A grande rivalidade existente entre equipes cariocas e paulistas levava-nos a pender pelos clubes locais. Hoje em dia o mundo é globalizado e cada um segue por si. Daí que amanhã corintiano torce pelo Corinthians e o restante da torcida brasileira pelo adversário do clube do Parque São Jorge. O mesmo acontece em relação ao São Paulo que, atualmente, conta com grande torcida.
Quanto à corrupção está-se na fase do ninguém aguenta mais tanta denúncia. Paira sobre o mundo político o odor fétido da podridão. Instala-se o salve-se quem puder com acusações em cima de acusações. O STF discute se parlamentares condenados na Justiça devem ter seus mandatos cassados. A classe política reage dizendo que a decisão sobre a cassação não pertence ao STF, mas ao Congresso. E muita lenha vai sendo jogada nessa fornalha que abriga os culpados que se dizem perseguidos politicamente. Além disso, está na mídia o Marcos Valério, aquele que se tornou responsável pelo Valerioduto, canal pelo qual se conduziam os dinheiros da corrupção. Pois ele vem a público para dedar o ex-presidente Lula que saberia de toda a engrenagem de corrupção que ocorria em seu governo. Mais: Valério teria dado dinheiro para pagamento de despesas pessoais de Lula. Verdade que Valério fala depois de ser condenado, isso não pode ser olvidado. Mas, há que se dizer que a bola está ruim para os lados de Lula dado que seu nome vem sendo citado demais como ligado ao que de pior aconteceu na política brasileira nos últimos tempos.
Todo mundo sabe disso que está escrito aí acima. Mas, o assunto justamente nos interessa porque permeado pela indefinição. Ganha o Corinthians? Vence o São Paulo? E o Lula, hein?
De culpados a injustiçados
A ação penal 470 continua em evidência, levando o atual presidente do STF e relator do processo a dizer que ninguém aguenta mais e já é mais que hora de seguir em frente.
Não falaria sobre isso não fosse a impossibilidade de serem ignorados os discursos de políticos condenados pelo STF justamente no processo 470. De repente os que foram julgados culpados se dizem vítimas de perseguição. Ou seja, injustiçados. Culpam a imprensa pela hedionda campanha realizada e chega-se a dizer que historiadores do futuro ficarão perplexos quando se debruçarem sobre os acontecimentos das primeiras décadas do século 21. Isso acontecerá porque eles não encontrarão na imprensa eco dos notáveis avanços sociais devidos justamente ao trabalho dos políticos ora perseguidos.
Não será necessário repetir aqui o que dizem os que se postam como injustiçados nem aquilo que se escreve sobre as falcatruas de que foram acusados e por elas condenados. Talvez não seja demais apenas lembrar que a condenação aconteceu no STF, mais alta corte do país, composta, em sua maioria, por magistrados indicados durante o governo do partido a quem pertencem os condenados. Mas, o que estarrece é a postura, o sorriso estampado de inocência dos que sobem ao cadafalso para serem punidos por crimes que não praticaram.
O problema é que novas ocorrências continuam a vir à luz, fazendo-nos crer que o governo central fechou os olhos, nos últimos anos, a favorecimentos, indicações, desvios fabulosos e toda sorte de manipulações nas quais o erário público foi utilizado em benefício de interesses pessoais.
A serem ouvidos os culpados, tudo isso não passa de campanha, julgamento político, tentativas sórdidas de manchar reputações ilibadas de pessoas a quem o país deve a maior parte dos avanços que ora se apresentam.
O que fica no ar, a pergunta que não quer calar, a pergunta inocente é: será que algum dos condenados acredita mesmo ser inocente? Se a locomotiva dos atos for a de que os fins justificam os meios talvez seja possível que a sensação de injustiça realmente exista na mente das pessoas punidas no julgamento do processo 470. Afinal, como se sabe, cada um é livre para acreditar naquilo que quiser.
Niemeyer
Oscar Niemeyer será enterrado hoje no Cemitério de São João Batista. O grande arquiteto desaparece aos 104 anos de idade e sua morte é noticiada em todo mundo. Destacam-se as obras de Niemeyer e sua arte em romper com o traçado reto, adotando a curva como de referência de suas construções.
Niemeyer viveu bastante. Ainda assim dizia que a vida não passa de um minuto de tão rápida que é. Convicto comunista acreditava no comunismo como solução para a desigualdade entre os homens. Os que o conheceram de perto o descrevem como homem simples. Gênio incontestável deixa atrás de si uma vida produtiva, tendo trabalhado até bem perto de sua morte.
De Niemeyer guardo mais a imagem do arquiteto em ascensão nos anos 50 quando se ligou a Juscelino. Do encontro entre esses dois homens nasceram a Pampulha, em Belo Horizonte, e Brasília, atual capital do país. Não sei se aos jovens de hoje é clara a transformação que o país sofreu sob a batuta de Juscelino quando presidente da República. A louca ideia de transferir a capital federal do Rio de Janeiro para uma área inculta no Planalto Central era vista como aventura de resultados improváveis. Meu pai tinha parentes que moravam no Rio e nas vezes em que nos visitaram deles ouvimos cobras e lagartos sobre o plano de Juscelino executado por Niemeyer e Lucio Costa. Mas, as obras avançaram ao ritmo da energia que Juscelino transferia aos seus comandados, sempre com Israel Pinheiro a acompanhar a espantosa obra. E Juscelino conseguiu inaugurar Brasília e transferir para lá a sede do governo ao final de seu mandato na presidência.
Com Brasília inaugurada ouvíamos dos parentes que o Rio se esvaziara. A cidade perdia a antiga efervescência, cessara o vai-e-vem dos políticos e das gentes nos ministérios. Uma prima de meu pai, funcionária de Ministério, não se conformava com a transferência para Brasília, embora os favorecimentos propostos pelo governo. Carioca da gema acabou se demitindo: não trocaria a vida na praia por um deserto de terra no Planalto Central.
Ainda hoje se discute a renúncia de Jânio Quadros, não só as causas dela, mas o que teria acontecido ao país caso ele não tivesse renunciado. Teríamos o advento da Ditadura Militar em 1964? O que alguns comentaristas afirmam é que Jânio sucumbiu ao isolamento em Brasília. De repente o grande manipulador de massas perdia seu público, tornando-se refém no Palácio do Alvorada. Por essa razão teria renunciado. Pelo isolamento.
Niemeyer relata que durante as obras da capital bebia caipirinhas juntamente com os peões. Havia igualdade e empenho de todo mundo. Depois, disse ele, a cidade ganhou vida: vieram as pessoas e tudo ficou como em outros lugares.
A morte de Niemeyer faz pensar nas gerações passam. Com ele se vai o restante de uma época, pelo menos uma grande referência dela que teimava em se manter viva. Niemeyer agora se junta a tanta gente com quem conviveu, pessoas que escreveram a boa parte da história deste pais.
Siga em paz, Niemeyer. Deixa saudades.
Inferno das tartarugas
Minha tia nunca ficou de bem com a vida. Tinha lá suas razões para reclamar da sorte madrasta que colocara a ela empecilhos demasiados ao longo da existência. De casamento desfeito e perda de filho em circunstâncias deploráveis viveu por conta de arranjos de momento, lutando sempre, mas sem conseguir avanços significativos. Quando se cansava de tudo repetia palavras que traduziam muito bem a visão que tinha deste mundo: o inferno é aqui mesmo.
Pois acredito que o inferno seja mesmo aqui tal a capacidade revelada pelos homens na prática do mal. O pior acontece quando práticas ilícitas revelam total insensibilidade em relação a seres indefesos. Esse é seguramente o caso da ação dos chamados tartarugueiros que agem na região amazônica. Como o nome está a indicar os tartarugueiros capturam e comercializam tartarugas, vendendo-as para o consumo da carne desses animais. Entretanto, não se trata apenas de capturar e vender fato que por si só coloca em risco espécies já catalogadas como em vias de extinção. O pior é submeter os pobres animais a maus tratos que causam a eles grandes sofrimentos.
Em Roraima a polícia conseguiu libertar 400 tartarugas que estavam em poder de tartarugueiros. As maiores eram deixadas de costas para baixo, situação da qual não conseguem sair quando fora da água. Nessa posição, sem água e alimentos, os órgãos internos se descolam e comprimem o pulmão, causando asfixia que pode levar à morte. As tartarugas menores foram encontradas em pequenos cercados, no meio da lama, umas sobre as outras, nas piores condições possíveis.
Para os tartarugueiros essa desgraça toda compensa financeiramente dado que uma tartaruga-da-amazônia inteira é vendida por R$ 500,00. Além do que os tartarugueiros também se apoderam dos ovos que as tartarugas colocam apenas uma vez por ano e que servem como alimento.
Assim se passam as coisas nos ermos dos longos rios da Amazônia. Tartarugueiros presos são libertados em seguida após pagarem fiança de um salário mínimo.
Pobres tartarugas.
Buenos Aires
A velha rivalidade futebolística entre brasileiros e argentinos continua igual. Os argentinos, tal e qual os brasileiros, são apaixonados por futebol. Fala-se muito bem de Messi em Buenos Aires. O craque é bom sujeito, bom caráter, paciente, atencioso. Como Maradona deveria ter sido, mas não foi – avisa um motorista de táxi.
Buenos Aires parece ter parado no tempo. A face de Evita no alto de um dos prédios parece prender o país ao passado. A impressão é a de que tudo anda para trás, o país está amarrado, não se desenvolve.
Há uma greve no metrô, mas não se trata de reivindicação salarial. O problema dos metroviários é que estão politicamente divididos. Param reclamando por mais segurança. O metrô continua igual, trens velhos e estações antigas pedindo pelo menos uma mãozinha de tinta.
Há quem diga que na Argentina sempre algo acontece. Outro motorista de táxi diz que se está tudo bem, tudo calmo, então algo está errado e o melhor é não sair para trabalhar. Existe hoje opinião geral dos argentinos sobre a difícil situação do país e a “Senhora” - assim se referem à Presidenta - está perdendo popularidade.
Para quem adora Buenos Aires - aí me incluo - as coisas não estão bem. Inflação alta, casas de câmbio trocando 1 real por 1,91 pesos. Até ai tudo bem, mas o problema é que para tudo são necessários muitos pesos. A vida está cara demais na Argentina daí que, no momento, não se veem na s ruas as hordas de brasileiros que costumam invadir Buenos Aires.
E há a violência. Explicam que o problema é devido a peruanos e colombianos que perambulam pelas ruas. Nas imediações da grande avenida que é a 9 de Julho há o perigo de ser atacado por um marginal sempre pronto a desaparecer em seguida na base da correria. Mas, não é a violência a que estamos habituados no Brasil onde a criminalidade saiu de controle. Não é que aqui presidiários fazem reuniões de até 10 horas de duração com muita gente falando ao mesmo tempo, tudo isso por telefone?
No final da década de 80 estive em Buenos Aires e vi nas ruas argentinos de nariz empinado. Brasileiros eram respeitosamente ignorados. Hoje em dia os argentinos tratam muito bem a gente tupiniquim que classificam como povo alegre, povo que fala muito, ao contrário de europeus que primam pela frieza.
De tudo resta dizer que vale muito a pena ir a Buenos Aires. A cidade mantém, a duras penas, o velho encanto com seus bares, teatros, restaurantes e ótimos vinhos e hotéis. Agora, amizade de lado, o que não se pode é deixar a AFA vencer a Copa do Mundo aqui no Brasil. Seria intolerável.