Arquivo para setembro, 2013
Mortes por atacado
Você não acha estranho o modo nos acomodamos a essa verdadeira enxurrada de péssimas notícias sobre mortes por atacado que diariamente aparecem na mídia? Não sei se acontece com você, mas confesso que leio com a reserva dedicada a acontecimentos distantes as notícias sobre a morte de muitas pessoas. Obviamente, não escapo ao horror que as tragédias provocam. Mas, são tantas e de tal modo se repetem que dolorosamente se passam por “naturais”. É como as matanças fizessem parte do modo de ser das pessoas no mundo e nada pudesse ser feito para impedi-las. Aí, sem mais, sem menos, você acorda de madrugada e começa a pensar no enorme sofrimento causado por tanta barbárie e se pergunta sobre o seu papel na sociedade em que vive.
Ontem mesmo foram enterradas seis pessoas atropeladas que foram por um carro que se desgovernou durante a disputa de um racha em plena rua. Na semana noticiaram-se mortes de famílias, uma delas por vazamento de gás. Mas, essas são calamidades de menor porte. No Quênia, terroristas invadiram um shopping e mataram mais de 70 pessoas. Nos EUA um antigo marinheiro entrou armado num prédio da marinha e fuzilou quem encontrou pela frente, totalizando-se treze mortos. Na Síria segue uma guerra civil entre o governo e revoltosos que já contabilizou a perda demais de 100 mil vítimas. No Egito as coisas andam péssimas e muita gente tem sido morta no embate dos militares atualmente no governo e seus opositores. Hoje, domingo, num ataque de homens armados a uma universidade na Nigéria foram mortos pelo menos 50 alunos. Na mesma Nigéria um ataque e extremistas a um vilarejo resultou em 150 mortes, isso na última quarta-feira. E daí por diante.
Extremistas, terroristas, assassinos de aluguel, bandidos, homicidas, suicidas, parricidas, revoltosos… Morre gente por toda parte desse mundo, mortes por atacado, diárias, expondo os piores aspectos da natureza humana. E nós assistimos a essa carnificina torcendo, rezando, implorando, para que o acaso nos poupe e aos nossos filhos que andam por aí, trabalhando, viajando, correndo atrás das necessidades impostas pelas atividades deles.
Imagino o que tenham sido as comemorações quando da divulgação do fim da Segunda Guerra Mundial. O mundo se cansara de tantas atrocidades, tantas mortes inúteis, perdas irreparáveis de entes queridos. Talvez se imaginasse, naquela ocasião, que a humanidade tivesse aprendido a lição e, daí por diante, os homens passariam a se comportar de modo diferente. Não foi o que se viu ou aconteceu. Assim, embora nunca se deva perder a esperança de que um dia o mundo seja melhor, a verdade que presenciamos é crua demais para que acreditemos na paz entre os seres humanos. Aliás, bem ao contrário, porque o que se observa é uma Babel onde se torna cada vez mais difícil o entendimento entre as pessoas. È dentro desse contexto de cada um por si que as coisas progridem, infelizmente.
Cães e gatos
Há quem prefira cães, outros idolatram gatos. Gente que diz gostar dos dois em geral esconde a preferência. Mal comparando parece coisa do tipo mãe que jura gostar igualmente de todos os filhos e faz de tudo para disfarçar sua maior queda por um deles.
Prefiro o mundo dos gatos. Tive vários, hoje não tenho nenhum. Gato dá trabalho, mas é bicho amoroso, chegado ao dono nas pernas do qual se enrosca para agradar. Acusam gatos de abandonar o barco quando as coisas vão mal com a família. Aconteceu comigo numa época em que as coisas teimaram em não dar certo e tive que mudar de cidade. Dias antes da mudança o gato sumiu. Na época minha casa ficava num lugar isolado dentro de um condomínio fechado. Na véspera da mudança fiz de tudo para achar o gato que levaria comigo. De nada valeram os meus esforços, o gato sumiu e pronto. Fui embora sem ele, olhando para trás para ver se o danado não aparecia na última hora.
Um mês depois recebi telefonema de um amigo que morava nas redondezas. Dizia ele que o meu gato aparecia no começo da noite defronte a casa onde morei e miava alto, choroso. Evidentemente me procurava. Eu gostava do gato. Daí que me despachei em viagem de quase 300 km só para ir buscar o bichano. Não deu em nada. Por duas noites vigiei perto da casa fechada e nada do gato aparecer. Nunca mais o vi.
Não me dou muito bem com cães, mas tive alguns deles. No tempo em que morei na casa isolada comprei um filhote de capa-preta que em pouco tempo transformou-se num cachorrão. Não era lá dos mais obedientes, mas entre nós existiu amizade profunda. Naquela época eu gostava de correr, ao entardecer ,nas alamedas vazias do condomínio. O cão me seguia nessas corridas. Certa ocasião cheguei a casa já de noite e, junto ao portão, fui surpreendido pelo acendimento simultâneo de faróis de alguns carros. Antes que eu pudesse entender o que se passava um policial acercou-se com uma arma na mão, apontada para mim. O cão virou uma fera. Meteu-se entre mim e o policial, rosnando alto e foi difícil aquietá-lo. Fiquei sabendo que a polícia fora chamada numa casa do condomínio onde há pouco ocorrera um assalto. Explicado que nada acontecera comigo a polícia se foi e ficamos, eu e o cão, no escuro, debaixo de um enorme céu estrelado.
Conheço pessoas que têm adoração por cães, outras que amam gatos. Há gente que faz por animais coisas que nem passariam pela cabeça delas em relação a seres humanos. Um cão mancando na calçada é capaz de mexer com corações que ignorariam um ser humano em condições precárias.
Por isso mesmo o amor, seja pelos seres humanos ou por animais, é um mistério. Também misteriosas as preferências. Existem no nosso íntimo sentimentos inatos que não dominamos capazes de se manifestar de formas imprevisíveis. Talvez por isso, mesmo passados tantos anos, eu ainda sinta saudades do meu desparecido gato e daquele cão que se mostrou amigo na pior hora, arriscando-se para me defender.
Narradores esportivos
Assisti à entrevista do locutor Luciano do Valle transmitida pelo canal pago ESPN. De Luciano pode-se dizer que foi incorporado pelos torcedores ao imaginário do esporte. Tem ele em sua longa carreira o mérito de ter iniciado a transmissão de vários gêneros de esporte no país, contribuindo para que caíssem no gosto do público. O vôlei deve muito a Luciano cuja perspicácia foi decisiva para a divulgação de grandes nomes desse esporte, iniciando-se, assim, uma tradição de grandes seleções brasileiras que perdura até hoje.
Na entrevista Luciano referiu-se a grandes nomes do rádio e da televisão, fazendo-nos recordar narradores, comentaristas e repórteres que marcaram época no país. Pedro Luís, Mário de Moraes, Fiori Giglioti, Darcy Ribeiro, Juarez Soares e muitos outros foram citados. Quem ficava com os ouvidos grudados no rádio por ocasião das transmissões de jogos de futebol, certamente ainda hoje é capaz de recordar, mentalmente, o timbre da voz de cada um desses excelentes jornalistas que alimentaram as nossas paixões pelo esporte.
A entrevista de Luciano levou-me a recordar um tempo em que a televisão era ainda incipiente e o rádio pontificava como meio exclusivo de divulgação do esporte. Lembro-me bem dos comentários de meus familiares que volta e meia se referiam ao famoso jogo do São Paulo contra o Milan, realizado na Itália e transmitido pela Rádio Pan-Americana - atual Jovem Pan. Nesse jogo de 1951 o locutor Geraldo José de Almeida narrou o verdadeiro massacre sofrido pelo São Paulo, irremediavelmente derrotado pelo Milan com auxílio do árbitro que favorecia a equipe italiana. A terrível derrota do São Paulo que entristeceu e enfureceu seus torcedores na verdade não aconteceu: tratava-se de uma armação realizada em torno de um jogo que não aconteceu, piada inventada para comemorar o dia primeiro de abril que é o dia da mentira.
Cheguei a ouvir transmissões realizadas pelo sempre fantástico Ari Barroso que, além de enorme maestro e criador musical, deu-se ao desfrute de narrar futebol. Jamais me esquecerei do estilo irreverente de Ari que durante uma transmissão de jogo pela TV disse em relação a um jogador que cometera uma falta e seguira com a bola: “ele desossou um ali”. Tal a perfeição do comentário em relação à jogada que se vira na TV que um meu tio pôs-se a gargalhar, divertindo-se muito.
A Copa de 58 ouvi pelo rádio. Num dos jogos do Brasil estava eu febril de modo que pedi que trouxessem o rádio da sala para o quarto onde estava acamado. Os jogos de 58 são inesquecíveis dado que Pedro Luís transformava o dial do rádio num campo de futebol, orientando os ouvintes quanto ao lugar do campo onde os lances estavam ocorrendo.
De Luciano do Valle guardei a transmissão da Copa de 82 na qual o Brasil perdeu o fatídico jogo para a Itália. Os três gols de Paolo Rossi nunca saíram da cabeça dos brasileiros que vivenciaram aquela tragédia. Na entrevista Luciano revelou que o então técnico Telê Santana não quis segurar o empate que garantiria a classificação brasileira: queria vencer a Itália e não fez a necessária substituição de Cerezo por Batista. Era hora de segurar o jogo, Telê optou por atacar. Esse jogo dói até hoje porque a seleção de 82 talvez tenha sido uma das maiores coleções de craques que o Brasil já revelou.
O futebol - assim como o esporte em geral - é parte integrante do cotidiano e nos permite por alguns momentos deixar de lado agruras do dia-a-dia. Talvez por isso tenhamos tanta estima pela gente do rádio e da TV ligada ao esporte, a ponto de os considerarmos como pessoas muito próximas cujas opiniões ouvimos com muita atenção. No mundo esportivo Luciano do Valle tem sido um ícone e exemplo para as novas gerações de locutores e comentaristas pela seriedade de seu trabalho e compromisso com seus ouvintes.
Quem sabe, sabe
Meu amigo dá gosto ouvir a opinião de tanta gente sobre a decisão do STF em relação ao mensalão. Trata-se de assunto para preencher páginas e páginas de texto até mesmo com citações e notas de rodapé. Todo mundo mete a sua colher, ora aprovando o voto do ministro Celso Mello, ora execrando o STF pela decisão que se considera favorável à impunidade.
Para que se tenha ideia só nos últimos dois dias publicaram-se textos com considerações opostas sobre o julgamento do mensalão. Um ex-ministro do STF considerou absurda a aceitação dos embargos infringentes porque representam a continuidade a perder de vista do julgamento. Outro grande jurista veio a público para dizer que José Dirceu foi condenado sem provas. E por aí vai.
Enquanto isso o mundo segue adiante, como sempre com acontecimentos que desafiam a lógica comum. No Quênia extremistas invadem um shopping e matam, gratuitamente, mais de 60 pessoas. Entram atirando nas pessoas que encontram pela frente e matam homens, mulheres e crianças. Simples assim. Como se as vidas nada valessem. Em meio aos mortos um grande poeta queniano cuja morte é chorada em seu país e repercute no exterior.
Nos EUA um antigo marinheiro invade instalações da Marinha, fortemente armado, e executa 13 pessoas até ser morto. Fica-se sabendo que o atirador não andava bem da cabeça e a mãe dele vem a público pedir perdão pela dor causada às famílias que perderam parentes.
O mundo gira e Lusitana roda. Tudo se passa depressa demais e o dia de amanhã promete novos horrores fazendo-nos esquecer dos acontecidos nos dias anteriores. Assim, também acontecerá como mensalão. Logo, bem logo , outro escândalo virá à luz e, pouco a pouco, o mensalão será esquecido, isso para sorte dos condenados. Não é que hoje mesmo um marqueteiro do futuro candidato à presidência pelo PSDB declarou que o mensalão não terá reflexos sobre as próximas eleições? Pois é, como é boa a natureza humana capaz de apagar depressa as memórias de tudo aquilo que nos causa tédio e horror.
O enterro do Bentley
Acontecia no Egito quando os faraós enterravam os seus bens mais valiosos para tê-los e volta depois de mortos. Estava para aconter em São Paulo quando o milionário Chiquinho Scarpa decidiu enterrar o seu carro mais valioso - um Bentley de R$ 1,5 milhão - seguindo a rotina dos faraós.
Notícia divulgada, grande estardalhaço. Num país onde as desigualdades parecem não ter remédio e a pobreza talvez seja invencível um cara muito rico dá-se ao luxo de enterrar um carro valiosíssimo para seu deleite pessoal. E faz isso com pompa e circunstância: manda abrir um buraco enorme em seu jardim e posta o “morto” perto dele. A foto do milionário junto ao Bentley e do buraco é divulgada. A mídia reproduz sem crítica a excentricidade do homem rico e prepara-se para documentar o enterro. Tudo parece correr dentro de um cronograma pré-definido e bem executado, afinal enterro é enterro. Talvez se esperasse um momento agudo de despedida do milionário em relação ao carro que tanto amava, quem sabe cena lacrimosa de adeus entre velhos companheiros de tantas.
Eis que chega o dia do enterro. Imprensa presente, helicóptero sobrevoando o lugar para cobertura ao vivo do estranho fato. No último minuto o empresário manda parar o enterro do Bentley e declara que tudo não passou de uma armação: na verdade o que se pretendeu foi chamar a atenção para a necessidade da doação de órgãos que ao ser enterrados e não servem de ajuda pra ninguém. Fica-se sabendo que tudo não passou de uma criação de uma agência de propaganda encarregada da campanha em favor da dação de órgãos. Bom motivo, tudo esclarecido, sanidade preservada, repórteres enfiando a viola no saco e produtores comemorando o sucesso da campanha.
Há quem cobre a imprensa pela falta de filtro na divulgação de notícias, deixando-se enganar tão ingenuamente. Leve-se em conta que Chiquinho é dado a excentricidades, mas…. O que não se fala é sobre a facilidade com que se produzem notícias. Culpa talvez da velocidade do mundo e necessidade de informar.
Disputa-se uma corrida entre meios de informação onde cada um busca a primazia de informar primeiro, senão, pelo menos de não ficar de fora de algo sobre o que todo mundo falará e divulgará.
Mundo estranho esse no qual situações paradoxais simulam normalidades e a crítica parece cada vez menos necessária.
Lição de Direito
Pois é, o ministro Celso Mello gastou mais de duas horas para declarar o seu voto de aceitação dos embargos infringentes. Agora será realizado novo julgamento e há a possibilidade de que a cúpula condenada anteriormente se beneficie com redução de penas.
Estado democrático, respeito ás liberdades individuais, direito de defesa, lição de Direito dada pelo ministro. Os comentários giram em torno desses temas, havendo muita, muita gente que não se conforme com a não prisão dos condenados. Em pauta o fato de que gente importante que pode pagar os serviços dos melhores advogados do país consegue se livrar da prisão. O que se diz é que no final de tudo o que se verá é a velha pizza em que se transformam as coisas no Brasil. Estranha-se, ainda, que o grupo técnico do mensalão não se beneficie enquanto o núcleo político se regozija pelas novas perspectivas dentro de um julgamento até então dado por acabado.
No geral a mídia se mostra cautelosa. Ninguém se atreve a sugerir ato errado do ministro em seu voto calcado nas letras da lei. Mas, como temos cabeça para funções que não se limitam a usar chapéus e bonés vale pensar um pouco e perguntar se os altos ministros, todos eles, conseguem separar bem as suas inclinações ideológicas e políticas do que está escrito na lei. Será mesmo que ao votar sobre a condenação ou não de dado político pertencente a tal partido o juiz em nenhum momento se deixe levar por um mínimo de simpatia pelo acusado ou suas ideias e passado político?
Por isso mesmo vale dizer como é bom não ser juiz, não ter que decidir sobre os destinos dos outros, ainda mais tendo às costas os olhos inquisitivos de todo o país.
Quando rapaz estive uns tempos em casa de um tio, na época juiz de direito. Era homem sério, estudioso que pautava pela imparcialidade em seus julgamentos. Muitas vezes o vi, noite adentro, curvado sobre seus processos, analisando, pensando. Certa madrugada veio ele ao meu quarto e me acordou. Precisava conversar um pouco. Falou-me sobre uma decisão a tomar em um caso para o qual tinha que formular sentença. Não me lembro do caso, nem da decisão dele. Ficou-me na memória apenas a imagem de um homem torturado pelo exercício de sua função, escravo do dever, ciente das consequências da decisão que deveria tomar ainda antes do amanhecer.
Decisão complicada
O ministro Celso Mello pode dizer que não se sente pressionado ao votar sobre a aceitação dos embargos infringentes no caso do mensalão. Ao que parece para ele tudo não passa de uma decisão apoiada nas letras do Direito, portanto nada a ver com emoção, sentimentos etc.
Pois eu não queria estar na pele do ministro na tarde de hoje. Se realmente a opinião pública não importa e a decisão sobre o sim e o não é apenas técnica ainda assim vale lembrar-se de que não se está a julgar a movimentação de coisas inanimadas, mas sim de crimes cometidos sobre os quais o país aguarda a decisão da suprema corte do país.
Está escrito nos jornais que na verdade hoje o que está sendo julgado é o próprio Supremo. Também já se publicou que amigos sugerem ao ministro Joaquim Barbosa o afastamento do Supremo em caso de aceitação de continuidade do julgamento do mensalão.
Que se diga: não se aguenta mais essa interminável história que mais se parece à procura da saída de um labirinto sem fim. Também que se diga que ao povo transparece que tantos direitos à defesa parecem ser prerrogativas garantidas à gente mais graúda, mais poderosa.
Acho que a essa altura muita gente está se perguntando o que faria se estivesse na pele do ministro Celso Mello. Confesso que teria dificuldade em ser membro da mais alta corte do país e tornar a julgar algo já julgado e decidido. A declaração de que aceitar os embargos não significa que as penas venham a ser reduzidas não convence. A corte de hoje não é a de ontem, novos membros chegaram a ela, demonstrando não estarem em acordo com o que foi anteriormente sentenciado.
Mas, será que um brasileirinho escolhido ao acaso no meio do povo, acusado de algum desvio de verba pública, será que esse brasileirinho contaria com tanta atenção e direitos de interpor recursos?
A ver como se comportará o STF nesse dia em que - se diz por aí - os ministros arriscam as suas credibilidades em relação aos brasileiros sem face que de longe os observam com tanta atenção e respeito.
Mars One
Como se sabe “Mars One” é um projeto de colonização de Marte. A ideia é a de urbanizar e povoar o planeta vermelho. O projeto requer a utilização de alguns bilhões de dólares e a participação de voluntários dispostos a enfrentar o deserto marciano onde a temperatura ambiente é de - 67º C. A viagem da Terra até Marte demora quase um ano dada a enorme distância que nos separa do cobiçado planeta.
Infelizmente, as narrativas de colocam Marte como lugar onde existe uma civilização avançada não passam de ficção. Também são ficcionais as narrativas de ataques de marcianos a Terra. Aqueles seres descarnados que se vê nos filmes, representando marcianos, na verdade não existem. Daí que é de se perguntar por que raios um terráqueo se dispõe a passar o restante de seus dias no planeta desabitado. Sim, você não leu errado, trata-se mesmo do restante de seus dias porque a viagem para Marte é só de ida. Não existem linhas aéreas com pacotes de ida e volta mais reservas de hotéis para Marte.
No entanto, até agora 200 mil pessoas já se inscreveram como voluntárias. Por razões diferentes esses terráqueos não querem mais continuar aqui se arriscando na tremenda aventura de colonização de Marte. Note-se que a primeira leva de terráqueos será formada por apenas quatro pessoas. Não se sabe ao certo se, no futuro, serão possíveis viagens com mais passageiros fator necessário para que o povoamento de Marte se faça com mais rapidez.
Quando penso na vida em Marte me vem à memória certos filmes nos quais a população humana vive em cidades protegidas por enormes campanulas de onde não podem sair dado não só o rigor do meio externo como a falta de oxigênio. Nesses filmes em geral os habitantes usam uniformes iguais e há sempre um governo ditatorial que comanda tudo o que acontece. Não se sabe como se passarão no futuro as coisas em Marte, mas caso o projeto vingue e uma população se forme não será demais imaginar que talvez um dia a turma de lá decida conquistar a Terra. Eis aí um belo roteiro para filme sobre a invasão da Terra por marcianos descendentes de terráqueos.
O fato é que se torna difícil levar a sério essa história toda. Mas, há que se investigarem as razões pelas quais tanta gente deseja cair fora de nosso belo planetinha. Tá certo que as coisas por aqui andam mal paradas, os homens não se entendem, guerras acontecem, há desigualdade, fome, violência, corrupção etc. Ainda assim, a boa e velha Terra continua sendo um belo lugar para se viver, além do que os nossos organismos são adaptados para as condições oferecidas pelo planeta.
Imagino um sujeito entrando numa nave para uma viagem só de ida, sabendo que nunca mais pisará na Terra. Do nosso ponto de vista trata-se de outra forma de morte - nova, aliás. O fato de alguém continuar vivo fora do planeta tendo-se despedido para sempre daqui soa no mínimo estranho. Mas, a ciência é uma caixa de surpresas e quem sabe coisas que hoje nos parecem absurdas possam se tornar rotineiras num futuro distante. Caso isso venha a acontecer os primeiros exploradores de Marte passarão a fazer parte da história daquele planeta.
Para encerrar cito a turma que considera fato a Terra ter sido colonizada por marginais que foram expulsos de um planeta distante onde viviam. Degredados e lançados aqui eles deram início à civilização que conhecemos. Assim as imperfeições que fazem parte de nossa natureza seriam mais ou menos explicadas pela genética ruim de nossos ancestrais. Há quem acredite nisso e a vida é interessante justamente porque somos capazes de imaginar e acreditar em muita coisa.
Os comedores
No jargão popular “comedor” é o cara que atrai muitas mulheres e consuma com elas o ato sexual. Um amigo a quem não vejo há anos foi, na sua juventude, um irresistível comedor. Havia nela algo indefinido - não necessariamente beleza - que atraia mulheres. Talvez fosse um desses casos de seres humanos que possuem parentesco com insetos que atraem fêmeas através da produção de hormônios que produzem. Pois o meu amigo era desses seres imprevisíveis aos quais, sem mais, nem menos, surgem situações totalmente inesperadas que terminam na cama. Para ele a prática do sexo era uma espécie de compromisso com as mulheres, não se furtando a socorrer - segundo dizia - mesmo aquelas menos favorecidas que não atraiam a atenção de ninguém. Essa “ajuda” a solitárias, às feias, á portadoras de algum defeito físico fazia parte do credo de humanidade do meu amigo o qual, de quebra, se esmerava no cumprimento de sua missão neste mundo.
Não me permito falar sobre os estranhos casos de meu amigo por respeito à privacidade dele. Acrescento que só o acaso permitiu que alguns desses casos chegassem ao meu conhecimento dado que o amigo jamais se permitiu qualquer revelação ou comentário sobre as suas aventuras.
Falo sobre o meu amigo porque me lembrei de Warren Beatty, ator, diretor e produtor de cinema norte-americano. Beatty, nascido em 1937, é uma dos expoentes máximos do cinema norte-americano, tendo produzido e atuado em filmes memoráveis como Bonnie and Clyde. Pois na biografia autorizada de Beatty, publicada em 2010, revela-se que ele levou para a cama 12.775 mulheres. Repare-se que ele foi virgem até os 20 anos de idade e que desse número de suas conquistas não constam as transas rápidas realizadas em camarotes, durante o dia, abraços, amassos, beijos etc.
Verdadeiro ou não o caso do ator norte-americano dá o que pensar. Não se discute o fato de ser ele um homem extremamente atraente ao que se acrescenta a celebridade conferida pela sua atuação cinematográfica. O fato é que Beatty desmente os tais 12.775, por exagerado. Mas, quem tem fama deita na cama, diz o ditado. Aliás, eis aí um caso no qual esse ditado se aplica e muitíssimo bem.
As leis
Em andamento o interminável julgamento do mensalão. Quando se pensava que os réus condenados pelo STF finalmente iriam para a prisão eis que surgem os tais embargos infringentes cuja aceitação pelos ministros resultará na revisão das penas anteriormente aplicadas.
Não está em jogo a verdade, mas a opinião de cada um sobre ela. As leis podem ser comparadas a uma peneira dentro da qual é impossível reter-se água. Por mais que se vedem as saídas resta sempre um orifício pelo qual tudo vaza e o trabalho de contensão precisa ser recomeçado.
Engajados que estamos em meio ao noticiário - ao qual não faltam isenção e paixão - sobre esse caso fica difícil ter opinião sobre o que há de certo e errado nessa história. Talvez pelo fato de termos reiterada desconfiança quanto à retidão das pessoas envolvidas queiramos colocar um fim no julgamento com a punição dos reais culpados. Por isso, correm os ministros do STF sério risco em relação às suas credibilidades diante da opinião pública. A revisão das condenações figurará como correção de erros, inevitavelmente. Erros praticados por ministros da mais alta corte do país são difíceis de engolir e nos levam a pensar sobre a validade das leis e a segurança das decisões tomadas em nome dela.
Hoje se decide no STF se os embargos infringentes serão ou não aceitos. Até esta hora o placar é de quatro contra dois pela aceitação. Existem fortes possibilidades de que os embargos sejam aceitos pela maioria dos ministros, contrariando a opinião geral sobre o fim do julgamento. Esse fato - caso aconteça - leva-nos a pensar que, no fim das contas, tudo não terá passado de um exercício de retórica entre ministros. Entretanto, não restam dúvidas de que contribuirá para a desconfiança da aplicação das leis aos poderosos, mais que isso confirmará as certezas que se têm sobre a impunidade no país.