2013 outubro at Blog Ayrton Marcondes

Arquivo para outubro, 2013

A potranca

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Segundo o Houaiss “potranca” é “mulher jovem e provocante, de corpo bonito”, isso se considerando o uso informal da palavra cujo primeiro significado é “potra de menos de dois anos”. O segundo é “égua ainda não domada”.

No universo masculino “potranca” mais que ser jovem é a mulher provocante, de corpo exuberante, a tal da gostosona. Mulher de boa altura, farta, curvas sensuais, insinuante à quem não falta pelo menos alguma beleza.

Pois encontrei hoje um amigo a quem não via há muito tempo. Sujeito boa gente, verdadeiramente amigo de seus amigos, baixa estatura - daí o apelido “Baixinho” - e rosto no qual a beleza de modo algum se ressalta. Deu-se bem na vida esse camarada de cuja história de vida consta um começo difícil e duríssima luta para alcançar a boa situação de que hoje desfruta. Também faz parte do currículo dele ter-se casado com uma “potranca”, pelo menos assim se referiria ele a ela ao tempo em que se empenhava em conquistá-la.

O casamento do Baixinho - ao qual estive presente - não chamaria a atenção não fosse pelo fato de que a mulher dele de forma alguma pudesse merecer ao menos alguma semelhança com o tipo que por aí afora se costuma identificar como “potranca”. Aconteceu a ele um tipo de ilusão que constrangia os amigos quando se punha a falar sobre a maravilhosa mulher com quem então namorava. Era sim boa moça, alta a ponto de ele se parecer mais baixo do era e só isso. Tudo teria se passado dentro da normalidade não fosse o fato do Baixinho insistir sobre as prendas da namorada, coisa que em geral acontecia após a terceira rodada de cervejas.

Também não valeria recordar esse assunto não fosse o fato do Baixinho, após finalmente ter-se casado, entregar-se a um ciúme doentio em relação à mulher. Tanto que acabou por obrigá-la a deixar o emprego dado que de forma alguma concordaria com que ela trabalhasse fora de casa. A princípio a mulher acomodou-se, cedeu às exigências do marido, Mas, a submissão cega parece não ter feito parte da natureza dela, tanto que passados um tempo abandonou o marido e voltou a viver com os pais.

Nessa época recebemos de volta o Baixinho que nos abandonara desde que se casara. Retornava ferido, choroso, reclamando da vida, sofrendo por amor. Até que mil conversas – e cervejas depois – convenceu-se que tinha que mudar o jeito dele de ser e acabou pedindo à mulher nova chance. Ela relutou, mas com o tempo cedeu e voltaram a viver juntos Entretanto, certas características pessoais infelizmente prevalecem e não muito tempo depois o Baixinho tornou ao que era.

Para não alongar a história aconteceu da “potranca” não suportar a situação e separa-se definitivamente do homem que a ela dedicava grande paixão. Mais tarde soube-se que ela casou-se com outro, teve filhos e tocou a vida para frente.

O Baixinho? Vida afora não deixou de ser o maníaco de sempre. Relacionou-se com outras mulheres, mas sempre seu lado possessivo impediu que as coisas dessem certo. Projetou-se profissionalmente, tornou-se muito conhecido e não raramente aparece na grande mídia, consultado que é como autoridade nos assuntos de sua especialidade.

Desta vez tivemos tempo para um café. Ele me perguntou sobre a minha vida e não precisei mostrar curiosidade sobre a dele para que se abrisse. Falávamos sobre coisas vagas quando, inesperadamente, ele perguntou se eu me lembrava da “potranca”. Cerca de 40 anos haviam se passado e estranhei que o Baixinho tocasse nesse assunto, de resto mais que sepultado. Foi assim, sem mais, sem menos, que o Baixinho me confessou que vida afora amara unicamente aquela mulher. Mais que isso, de modo algum se arrependia do modo como se comportara em relação a ela, porque um mulherão daqueles, uma “potranca” daquelas, não se poderia deixar solta por aí, à mercê dos ataques de tantos abutres famintos.

Histórias de terror

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Sou aficionado de histórias de terror. Quando a televisão engatinhava e lugarejos não tinham salas de cinema restava-nos apenas ler. Para minha sorte em casa havia uma biblioteca bem sortida com títulos que iam dos escritores russos aos grandes filósofos, passando por coletâneas de contos e romances. Através daqueles livros conheci a obra de escritores de histórias de terror e personagens como Drácula, Frankenstein e muitos outros. Li de cabo rabo os contos de Edgard Allan Poe, os de ETA Hoffman e muitos outros. Nasceu daí o meu medo de vampiros, lobisomens e seres da noite que, assim imaginava, seriam reais. Coisa de menino/adolescente que, com o passar dos anos, esqueceu-se do medo e ficou com a delícia das narrativas.

Os filmes de terror sempre foram para mim convite a momentos de emoção e curiosidade. Particularmente os filmes de vampiros eram os que mais me atraíam. Assisti a muitos deles, filmados em preto-e-branco, levando às telas histórias de vampiros maléficos combatidos com crucifixos, estacas de madeira, alho e luz solar. Havia sempre o perseguidor de vampiros que fazia uso dos recursos que tinha à mão e acabava sempre vencendo, embora isso acontecesse só depois de muita gente sucumbir aos enormes caninos dos seres da noite. Atores como Bela Lugosi, Christopher Lee, Vincent Price e muitos outros fizeram história no cinema interpretando seres do mal.

Hoje em dia os filmes de terror deixaram de ser interessantes e não porque as narrativas tenham caído em desuso. O que se vê é a valorização do susto com cenas repetitivas que prometem surpresas muitas vezes constrangedoras. Há sempre alguém, em geral mulher, andando dentro de uma casa escura onde seres do outro mundo a surpreendem gerando-se situações violentas. Há exceções, filmes baseados em obras como a do grande mestre do terror Stephen King. Ainda assim verifica-se abuso de recursos especiais na tentativa de criar cenas fantasmagóricas que se tornam ficcionais demais. O terror tem a sua lógica e trabalhar o enredo dentro dela sem exageros pode fazer do filme uma peça verdadeiramente aterrorizante. Ficam de lado os massacres com serras elétricas e as tais sextas-feiras à noite nos quais se misturam sustos, muito sangue, poderes excepcionais e tantas vezes a criação de personagens inverossímeis demais. Não é demais lembrar que a boa ficção exige pelo menos alguma verossimilhança em relação aos assuntos tratados.

Stephen King escreveu “O Iluminado” que o diretor Stanley Kubrick levou às telas do cinema. King não gostou do filme, dizendo que o escritor interpretado por Jack Nicholson ficou reduzido a um louco com quase nenhuma interioridade. Em todo caso não há como concordar inteiramente com King dado que o filme de Kubrick é de fato impressionante. Se você não leu o livro ou não assistiu a “O Iluminado” eis aí excelente oportunidade para desfrutar de uma excelente narrativa de terror. Claro que nãos se recomenda a quem tem muito medo daquilo que existe nas sombras…