Arquivo para maio, 2017
O tal espelhinho
As mulheres se entreolham indignadas: como cuidar dos pequenos nesse mundo perdido? Olhe que encontrei minha filha de 9 anos visitando um site erótico. Oh…. exclamam as amigas. Uma delas se levanta e, empertigada, avisa que já notificou o marido de que vai cortar a internet em casa. A amiga a contesta: não adianta porque podem usar a internet na rua, na escola, dos amigos e assim por diante. Não demora para que se instale o consenso sobre uma época sem educação e regras. O mundo não é mais o mesmo. Imagine nos meus tempos de menina meus pais tivessem me encontrado olhando cenas eróticas: eles me matariam.
A conversa se passa na sala da casa de uma das amigas. As mulheres junto ao sofá, os maridos à distância, em torno da mesa, bebericando. Ouvem em silêncio. Vez ou outra um deles torce a cara ao ouvir alguma opinião. Outro, mais velho, apenas sorri. Paira no ar um “não se pode beber em paz” que ninguém tem coragem de dizer.
Entretanto, a tantas, um deles se levanta e segue em direção às mulheres. Entre os que ficam á mesa surge o clima de “o que ele vai fazer?”. Mas, o que se levantou aproxima-se das mulheres e fica em pé, sem dizer nada. Elas o olham com curiosidade. Segue-se aquele minuto que parece durar uma eternidade. Depois, serenamente, o tal diz:
- Quando menino de 9 anos de idade eu jogava espelhinho no chão para ver o que tinha debaixo da saia das meninas.
- Oh….
No rosto das mulheres estampada a desolação. E ele continua:
- Senhoras, a curiosidade impera. Cortem a internet, tranque-os num quarto sem TV, rádio, computador, celular, revistas, jornais e continuarão a ser o que são: humanos. E curiosos.
Uma das mulheres ameaça protestar, mas desiste.
O homem que já se afasta para a meio caminho, volta-se e completa:
- Claro que temos que cuidar e velar por eles. Censurar a internet se possível. Mas, não se esqueçam de que são crianças. Repito: curiosos, muito curiosos. Humanos. O mundo os espera.
Cronistas esportivos
Está na internet uma relação de jornalistas cujos comentários despertaram a ira de seus ouvintes. Quase todos eles comentaristas de futebol. É preciso muito cuidado com o palavreado. Dizer o que se pensa pode acabar em embrulho. Mexer com a paixão de torcedores, técnicos, jogadores, dirigentes, enfim toda a gente ligada ao esporte das multidões, nem sempre dá certo.
Hoje em dia a televisão permite ao espectador tirar suas próprias conclusões a respeito dos lances em gramado. Câmeras muito bem localizadas permitem a visualização de detalhes antes inimagináveis aos espectores. Mas, nem sempre foi assim.
Futebol no Brasil tinha somente dois modos para ser acompanhado: assistir a jogos nos estádios ou ouvir a narração das partidas pelo rádio. Nesse último caso ficava-se à mercê de narradores e comentaristas de cujas interpretações dependiam as impressões e opiniões dos torcedores.
Exemplo disso é o caso da famosa partida da seleção brasileira contra a Hungria na Copa de 1954. Na época tinha a Hungria formidável seleção na qual brilhava o meia Puskas. No jogo o Brasil foi derrotado por 4 a 2. Entretanto, narradores brasileiros atribuíram a derrota a erros do árbitro da partida um tal Mr. Ellis. Daí por diante esse Mr. Ellis passou a ser sinônimo de ladrão no país. A expressão “dar uma de Mr. Ellis” significava agir como larápio. Vale dizer que mais tarde a atuação de Mr. Ellis passou a ser entendida com menos paixão. Perdêramos na bola, embora a excelente plêiade de jogadores que enfrentaram a Hungria.
Nos anos 50 do século passado reinavam no rádio paulista locutores como Pedro Luís e Edson Leite, além de excelentes comentaristas como o famoso Mário de Morais. Um comentarista bastante polêmico era Geraldo Bretas conhecido por não ter papas na língua. A Bretas aconteceu criticar duramente o escrete de 1958 que disputaria a Copa na Suécia. Bretas não acreditava no time e deixava isso muito claro. Entretanto, aconteceu de o Brasil sagrar-se campeão do mundo na Copa em que o jovem Pelé surgiria para o mundo.
Fato é que os torcedores não perdoaram Bretas: houve um jogo no Pacaembu no qual por pouco o comentarista não foi agredido pela massa de torcedores.
Dias atrás o atual técnico do Corinthians irritou-se e meteu a boca na imprensa esportiva, em especial num jornalista que o tinha classificado como “maleável”. O fato deu pano pra mangas e ainda é comentado por aí.
Gente boa essa do rádio e TV com a qual dividimos as nossas paixões pelo esporte. Não há como deixar de ouvir narrações e comentários que nos fazem refletir sobre os jogos a que assistimos.
Vergonha de ser brasileiro
Aumenta o número de pessoas que afirmam ter vergonha de ser brasileiros. Pesquisa recente do Instituto Datafolha aponta que 34% dos entrevistados dizem ter vergonha de ser brasileiros.
Verdade que os tempos são ruins, mas ter vergonha da própria nacionalidade?
Pois é. Muita gente fala em deixar o país tamanho o descrédito reinante. São raras, raríssimas, as boas notícias. Desvios, propinas e alta criminalidade dão o tom aos dias em que vivemos. Noticiários veiculados nos meios de comunicação têm sempre o mesmo conteúdo. E, cá entre nós, apesar de sermos mais que favoráveis ao processo em andamento, dá para continuar ouvindo sobre os desdobramentos da Operação Lava-Jato? Não esgota ser informado sobre os desdobramentos da investigação da ladroagem e as negativas dos nelas envolvidos? Constata-se o crime, mas os criminosos alegam que de nada sabiam. A todo santo dia a ladainha se repete na tentativa de formatar cabeças a acreditar que tudo isso não passa de uma louca história inventada, produto de imaginação (alucinação) coletiva.
De que brasileiros nem sempre são bem-vistos no exterior não existem dúvidas. Sempre foi assim. Agora, com a imagem do país comprometida, as coisas só tendem a piorar. Ao país do futebol e carnaval acrescenta-se a nódoa da corrupção orgânica e generalizada. Ainda assim, vergonha do próprio país?
Penso que em muito contribui para o sentimento negativo o descuido com o cultivo da nacionalidade. Em outros países a história é reverenciada, personagens de destaque sempre lembrados, nas escolas, no cinema, na literatura. Aqui não se venera o passado. A corte portuguesa que aqui aportou em 1808 na maioria das vezes é achincalhada. D. João VI é retratado como um grande panaca. D. Pedro I não passa de um mulherengo; D. Pedro II um sujeito esclarecido, mas inapto para governar.
Não temos amor ao passado e muita gente pergunta se o melhor não teria sido os holandeses terem derrotado os portugueses e colonizado o Brasil. Afinal, Mauricio de Nassau revelou-se um excelente administrador no Recife, não foi? E por que não os franceses que estiveram no Rio de Janeiro?
Bobagens de parte me pergunto como andam as pessoas em relação à letra do Hino Nacional. Todo mundo sabe cantar o Hino? E aquelas cores e símbolos da nossa bandeira, todo mundo sabe o que significam? E quanto a essas datas nas quais se celebram fatos históricos?
O fato é que este é um grande país e não só no tamanho. Aos trancos e barrancos sobrevive isso a despeito dos desgovernos a que é submetido. Tão forte é que resiste às quadrilhas que se intrometem no poder e usam recursos públicos em benefício próprio. Terra boa essa na qual somos favorecidos por climas amenos e incontáveis belezas naturais.
O Brasil é muito grande para que tenhamos vergonha de nossa nacionalidade. Os 34% que dizem se envergonhar de ser brasileiros certamente passam pela anestesia provocada pelo descaso e má fé dos que têm cuidado dos destinos do país.
O Brasil precisa ser mais amado pelos brasileiros, essa a única solução para os problemas que enfrentamos.