2018 novembro at Blog Ayrton Marcondes

Arquivo para novembro, 2018

Delatores

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A delação premiada tem sido utilizada por muita gente. Quando o cerco se fecha sobre alguém e torna a essa pessoa praticamente impossível safar-se das denúncias que sobre ela pesam, delatar é o caminho. Pela deleção alcança-se minorar anos de condenação e, mesmo, conseguir cumprir pena em prisão domiciliar.

A operação Lava-Jato colocou atrás das grades pessoas acima de qualquer suspeita. As delações abriram caminho para a elucidação de crimes de natureza econômica sobre os quais agora pesa a força da lei. Os brasileiros têm assistido a impressionantes relatos sobre corrupção, com desvios de montantes fabulosos de dinheiro. Há que se concordar que, por mais que o delator venha a ser beneficiado, sem a sua confissão as investigações não prosseguiriam.

Entretanto, há que se pensar na figura do delator. Afinal quem é ele? Que tipo de pessoa se propõe a entregar seus comparsas, visando a obtenção da própria liberdade?

Existem aqueles que talvez prefiram a morte a tornarem-se delatores. Sobre uns poucos envolvidos nos casos de corrupção sabe-se que eles se mantêm em silêncio e, talvez, nunca virão a abrir a boca. Fidelidade ideológica? Enquanto isso outros lutam para que suas deleções sejam aceitas.

O ex-ministro Antônio Palocci, homem forte durante o governo Lula, deixa a prisão e passa a cumprir sua pena em prisão domiciliar. Para conseguir essa mudança Palocci serviu-se da delação premiada, incriminando membros de seu partido, inclusive o ex-presidente agora recluso.

Por detrás de fatos como esse fica a pergunta sobre a convicção política do homem que delata. O certo é que em momentos passados o cidadão, que hora entrega seus pares, foi membro atuante dos atos corruptos que agora expõe. Quando da realização desses atos teria a personagem em questão alguma postura crítica em relação ao que se estava fazendo?

Não será simples, aliás até mesmo impossível, penetrar na alma de um homem que hoje delata. Difícil acreditar que o faça por arrependimento ou em prol do bem comum. O que se diz é que se trata, nada mais, de enredo construído para salvar a própria pele.

Mas, os cadáveres ainda estão frescos e só num futuro distante talvez possamos vir a ter alguma luz sobre esses tenebrosos dias.

Livros e discos

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Ainda tenho muitos Lps (long-plays) comprados quando nem mesmo existiam os CDs. As novas gerações não conheceram o mundo sem internet e celulares. Bons discos eram adquiridos nas casas do ramo, para os paulistas localizadas no centro de São Paulo. Levavam-se as preciosidades musicais para casa onde picapes Garrad as aguardavam. Nem de longe os equipamentos sonoros se aproximavam, em qualidade, dos que hoje dispomos. Existiam, sim, bons e raros equipamentos, mas muito caros. De modo que os ouvidos se habituavam ao som dos equipamentos disponíveis.

No tocante a livros sempre dispusemos de bons escritores no país. Ao contrário do que hoje se observa, verdadeira plêiade de grandes autores estavam vivos e produzindo. Poetas de primeira linha, romancistas e críticos publicavam suas obras. Além do que se contavam com boas traduções de grandes autores de outras línguas.

Ler é e sempre foi importante. Através da leitura adquire-se cultura e aprimora-se a formação humana. Nas casas de meus familiares sempre encontrei bons livros. De modo que acabei herdando o hábito de manter livros por perto. Com o passar dos anos fui montando uma pequena, mas selecionada, biblioteca. Muitos desses livros estão comigo até hoje. Infelizmente, nas andanças da vida a muitos deles perdi.

Tudo isso para confessar que, de tempos para cá, fui deixando de lado as obras impressas em papel. O diabo foi um amigo certo dia aparecer em casa com um livro eletrônico. A primeira coisa que fiz foi dizer a ele que de modo algum, jamais, trocaria um livro por uma engenhoca daquelas. Onde o prazer de ter o livro em mãos, anotar com o lápis, etc.?

Entretanto, aconteceu de vir a receber, de presente, um kindle. Olhe que resisti a ele, bravamente. Até que um dia… O caso é que se podem baixar pela internet obras de interesse e armazená-las na memória da engenhoca. De repente, anda-se por aí de posse de uma pequena biblioteca eletrônica a qual pode ser consultada a qualquer momento. E o kindle tem lá suas propriedades como as de permitir escolher o tipo e tamanho de fontes, fazer anotações, consultas a dicionários, marcações etc.

Já faz algum tempo que olho para os meus livros, tratando-os como companheiros a quem não frequento. Há pouco comecei a reler “o Homem sem qualidades” do Robert Mussil. No kindle… E dizer que a mesma obra repousa, em capa dura e papel, na minha estante…

Comecei falando sobre discos. Depois dos Lps vieram os CDs. Mantenho comigo grande número de CDs de jazz, música clássica e popular. Mas, também os CDs passaram ao segundo plano. De tempos para cá foi impossível não aderir ao Spotify. Milhares de gravações estão disponíveis no sistema pelo qual pode-se ouvir qualquer tipo de música e continuamente.

A conclusão é a de que se tornou impossível resistir aos avanços da tecnologia. Não se podendo adivinhar o futuro não dá para imaginar sobre o que nos espera em termos de mudanças no modo de vida e disponibilidade de artefatos eletrônicos. A inteligência artificial tem avançado e robôs quase humanos deverão circular por aí em tempo não muito distante.

Por enquanto a vida humana continua a ter duração limitada, raramente as pessoas ultrapassando os 100 anos de idade. Mas, também isso pode mudar. Quem viver nas próximas décadas certamente verá e desfrutará de recursos hoje inimagináveis.

A missão do padre Calleri

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Há 50 anos, no dia 26de novembro de 1968, o jornal “Folha de São Paulo” noticiava sobre a chegada a Manaus do mateiro Álvaro Paulo da Silva. O mateiro era o único sobrevivente da expedição do padre João Calleri na Amazônia. Essa expedição fora organizada em função da construção da rodovia Br174 - Manaus- Boa Vista - em cujo trajeto se localizavam os índios waimirins-atroaris.

Calleri partiu de Manaus com a missão de fazer contatos amistosos com os atroaris. O grupo era formado por onze pessoas, nove homens e duas mulheres. A princípio as relações com os índios foram amistosas. Entretanto, segundo o relato do único sobrevivente, o padre Calleri teria agido com teimosia e rudeza, despertando a ira dos índios que acabaram por massacrá-los. Álvaro abandonara a expedição um dia antes do massacre e salvara-se por verdadeiro milagre em meio à floresta.

Em 1998 o padre Silvano Sabatini publicou o livro ”Massacre” no qual aborda o malogro da missão Calleri. Segundo Sabatini, Calleri foi ao encontro dos índios consciente de que tinha 50% de possibilidades de retornar vivo. Calleri entendia que, caso não fosse, os índios viriam a ser totalmente exterminados quando da construção da estrada. Mas, Sabatini concluiu que, na verdade, Calleri e seu grupo não foram vitimados somente pelos índios. Comandados por um mateiro, brancos e índios atacaram e mataram os membros da expedição. A ação teria sido orquestrada pelo pastor americano Claude Lewitt.

Entretanto, a morte de Calleri serviu como pretexto para que os waimirins-atroaris viessem a ser quase exterminados. De 3000 índios em 1968 a população foi reduzida a 332 em 1983.

O episódio de 1968 remete-nos ao momento atual no qual empresários, índios e parlamentares se mobilizam para uma nova fase de conflitos em torno da exploração de terras indígenas. O presidente eleito, Jair Bolsonaro, sugeriu que os índios usem suas reservas para obter royalties de hidrelétricas e de outros projetos.

Casos de invasão e desmatamentos ilegais em áreas indígenas acontecem com regularidade. Há três anos, no Maranhão, índios gamelas foram atacados por homens munidos de armas e facões. Na ocasião treze indígenas foram feridos. De todo modo conflitos acontecem em torno da demarcação de áreas indígenas. Interesses diversos estão na base de uma situação ainda longe de que venha a ser resolvida.

Tempos de ódio

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É assustadora a maratona de notícias sobre atitudes odientas que diariamente recebemos. Maratona, sim, porque parece mais haver uma competição de tanta brutalidade gerada por toda sorte de ódios. Nesta semana, por exemplo, houve o caso de uma avó que vivia na companhia de seu neto. O rapaz saíra e deixara velhinha sozinha. Eis que um ladrão entrou pelo telhado e deparou-se com a mulher. Ato contínuo, matou-a a pauladas. O detalhe é que a velha senhora tinha 102 anos de idade. Que tipo de ódio levará alguém à barbárie de tão grande monta? De que infernos terá saído espírito tão maligno, capaz de tamanha atrocidade?

Aconteceu ainda nesta semana: um homem matou sua ex-mulher e a filha de poucos anos. Ato contínuo matou-se. Então? Paixões extremadas justificariam atitudes de tal envergadura?

O assunto segurança pública predomina sobre outros nos dias de hoje. Vivemos assustados, horrorizados. Crimes sem sentido repetem-se a toda hora. Semana passada um médico japonês foi fuzilado por um rapaz de 18 anos de idade. O médico retornava de uma pizzaria e, ao estacionar o carro, foi surpreendido por dois rapazes. Não teve tempo de soltar o cinto de segurança. Baleado, morreu. Do assassino, já identificado, sabe-se que desde os 11 anos rouba carros. Com várias passagens pela polícia o rapaz tornou-se perigoso criminoso. Segue por aí.

Nos programas televisivos exibidos no período da tarde sucedem-se narrativas de crimes, alguns deles macabros. Ao expectador os relatos podem soar incompreensíveis. Atitudes animalescas desafiam a ordem natural das coisas. Embasbacado o cidadão teme sair à rua.

Atravessamos a era do medo que, esperamos, venha a ter um fim. Sem garantias e à mercê do imprevisível nada mais nos resta que seguir em frente. Expondo-nos. Torcendo. Acreditando contar com a sorte.

Vida e morte

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Durante turbulências aéreas ocorre aos passageiros ponderar sobre a fragilidade da vida. Fica-se à mercê da aeronave que estremece, mas avança, felizmente. Cada pessoa terá um caso a relatar em relação a essas situações. Quanto a mim houve ocasião em que vi de perto a possibilidade do fim. Voávamos em calmaria quando, de repente, um solavanco e a queda da aeronave por uns bons metros. Gritos, desespero, lágrimas. Nada mais que um grande susto, que depressa se desfez.

Parece-me pior a claustrofobia. Há um conto de Edgar A. Poe chamado “Enterrado Vivo”. Poe esmera-se na descrição de um homem que acorda preso dentro de um túmulo. O grande escritor nos conduz com mestria à situação final. Começa por relatar casos e casos de sepulturas abertas nas quais foram encontrados cadáveres em posições diferentes das que foram enterrados…

Há quem não suporte nem mesmo o transporte em elevadores. Ambientes fechados são insuportáveis para muita gente. Então, o que dizer sobre quem embarca em submarinos? Permanecer dentro de um navio preparado para submersão completa durante longos períodos… Filmes sobre submarinos atacados durante guerras são assustadores. A impotência do homem à mercê das contingências que escapam a seu controle é terrível. Não há para onde fugir. A vida se decide entre troca de torpedos. Nada mais.

Os argentinos enfrentam momento de grande comoção. Decorrido exatamente um ano do desparecimento do submarino Ara San Juan eis que acaba de ser localizado a uma profundidade de 900 m. Fotografias indicam que o submarino implodiu. Com autonomia para profundidades de no máximo 300 m o navio não suportou a pressão da água. A bordo viajavam 44 tripulantes, 43 homens e uma mulher.

O desfecho do caso do submarino argentino, como não poderia deixar de ser, suscitou interrogações quanto à morte dos tripulantes. Teriam sofrido? Como teriam sido os momentos de horror ao saberem-se perdidos? No momento da implosão a morte teria sido instantânea?

Especialistas garantem que a morte dos tripulantes se deu em segundos. Tão depressa que não a teriam sentido. Mas, para as famílias enlutadas nenhuma explicação será suficiente para aplacar a dor. Seus entes queridos jazem nas profundezas marítimas e parecem não existir meios para resgatar seus restos.

Familiares exigem a devolução dos seus para enterrá-los dignamente. Um pai afirma que se enviaram seu filho para lá que o tragam de volta. A dor não tem remédio.

OVNIS

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Uma senhora garante que em Ilhabela, no fundo do mar, existe uma colônia de extraterrestres. Semana passada circulou um vídeo no qual se mostravam manchas no céu, confundidas com naves espaciais.

Um médico, já falecido, liderava um grupo de adeptos à existência de extraterrestres. Não seria o caso de negar a ele a existência. O ponto que mais chamava a atenção era a certeza de que somos observados por seres de outras galáxias, isso o tempo todo. O médico não só tinha certeza disso como apresentava uma série de fatos comprovantes. Segundo se diz por aí os governos, mormente o norte-americano, teria em seu poder cadáveres de extraterrestres que, ainda hoje, são objeto de pesquisas.

Trata-se de assunto nebuloso. Conheço pessoas muito confiáveis que juram ter visto naves espaciais em situações inesperadas. Há relatos não só de luzes estranhas, mas, também, de visões de objetos voadores que se locomovem em grande velocidade.

Até hoje não recebemos a visita de nenhum povo habitante de outro planeta. Nada confirmado. O cientista Stephen Hawking, recentemente falecido, advertia sobre o perigo de enviar mensagens ao espaço dando conta da vida em nosso planeta. Tais mensagens poderiam ser recebidas por povos nada pacíficos que poderiam invadir a Terra e colocar fim à espécie humana.

Verdade ou não o tema é instigante. Há pouco luzes estranhas foram verificadas no espaço, na região norte do Chile. De seis aeronaves em voo comercial na região surgiram relatos sobre não só a presença das luzes como da velocidade em que movimentavam. No Brasil há o relato de um comandante da Vasp que presenciou estranha luz que acompanhou o Boeing que ele pilotava no trajeto entre Fortaleza e o Rio. Esse fato ocorreu em 1982, durante a madrugada, e muitos dos passageiros o presenciaram.

Há quem considere que a chegada de alienígenas não passe de apenas questão de tempo. Difícil acreditar que na imensa vastidão do universo somente a Terra tenha sido premiada com a existência de vida. Se os futuros visitantes serão pacíficos ou belicosos impossível saber. A depender do cinema não se deve esperar muito dessa turma vinda do espaço. Nos filmes os alienígenas têm sempre a intenção de dominar a Terra. Há casos em que para certos visitantes do espaço o homem não passa de alimento rico em proteínas…

A ver.

Roy Hargrove

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Então. A minha última visita a New York aconteceu em 2001, uma semana antes do ataque ao World Trade Center. Aliás, depois disso, não mais retornei aos EUA. Às vezes chego a sentir uma coceirinha de viajar para lá. Que tal uma ida a New Orleans para uma sapateada naquelas ruas onde o jazz corre solto?

Muita gente vai aos EUA e por motivos diferentes. Há quem viaje exclusivamente para fazer compras. Nesse sentido, o mercado norte-americano é sempre invejável. Quanto a mim a razão principal de visitar o grande país do norte sempre foi prioritária: o jazz.

Os clubes de jazz de New York são mesmo os melhores do mundo. Para mim o Village Vanguard e o Birdland são fantásticos. Aliás, tive o privilégio de ainda ver em ação grandes nomes do jazz, a maioria deles hoje desaparecidos, infelizmente. E não foi só em New York e outras cidades americanas. No primeiro festival de jazz realizado em São Paulo, em 1978, recebemos a visita e participação da nata do jazz naquela época. O festival aconteceu no Anhembi, em São Paulo.

Pudemos ouvir, ao vivo, Dizzy Gillespie, Zoot Simms, Benny Carter, Ray Brown, Chick Corea, Ahmad Jamal, Jimmy Rowles, Milt Jackson, Roy Eldridge e tantos outros. A nata do jazz viera a São Paulo e estava ao nosso alcance. Grandes nomes da música norte-americana circulavam pelo Anhembi naquela grande festa do jazz realizada no Brasil.

Mas, ao Roy Hargrove. Creio ter sido em 2001 que o vi, liderando um quarteto, no palco do Village Vanguard. Naquela noite o acaso nos proporcionou inesperado encontro. Estávamos, eu e minha mulher, posicionados para assistir Hargrove quando, ao nosso lado, acomodou-se justamente Barry White. O famoso cantor e músico, extremante gentil, de imediato mandou servir-nos uma dose de whisky. Inesquecível o tratamento carinhoso de Barry à mocinha que nos serviu na ocasião. Extasiada diante da presença do ídolo, ele a recebeu com levas toques de seus dedos nas pontas dos seios dela…

Daquela noite guardo o som puro do trompete de Hargrove. Descoberto por Winston Marsalis, Hargrove destacou-se no mundo do jazz, tendo tocado com grandes nomes desse gênero musical tais como Herbie Hancock e Joshua Redman.

Hargrove faleceu aos 49 anos de idade, vitimado por parada cardíaca após complicações de uma doença renal. Deixa-nos gravações nas quais se mantém vivo o seu talento.