Arquivo para junho, 2021
O matador
Cerca de duzentos homens estão envolvidos na caça de certo Lázaro cuja ocupação consiste em estuprar e matar pessoas. O Lázaro carrega nas costas um rosário de crimes. Há o caso da mulher que foi arrastada por ele até próximo a um rio e estuprada. Indigna a invasão de uma casa e a execução sumária de quatro pessoas.
Há quem associe a prática dos crimes a rituais. Não se nega que talvez o cara tenha ligação com o demônio. Discute-se se ele não seria apenas um alienado mental. Serial killer?
Fala-se que o Lázaro fez viagem de um estado a outro, percorrendo mais de 1000 Km a pé. Mas, o pior é que ele conhece mais que ninguém a região onde se esconde. Lázaro é um mateiro. Faz aparte do ambiente onde circula. Esconde-se durante o dia e caminha à noite. Prefere o leito dos rios, evitando cães farejadores.
Lázaro é um mistério. A ouvir o que dele se diz trata-se de caso de um mal encarnado. O sujeito é ruim, deve ser preso ou abatido. Espalha terror na região em que está. As famílias sentem-se inseguras. Uma delas dorme dentro do carro para evitar a surpresa de um ataque noturno.
Entretanto, existe o outro lado ao qual não se dá atenção. Não é que o Lázaro tem família? Pois. Para começar tem mulher de dois filhos. E tem mãe esse perseguido. Mãe que sofre. Ela e o marido tiveram que se mudar dadas as ameaças que sofreram. Essa mãe implora ao filho que se entregue. Ela tem o telefone grampeado para que, caso receba ligação do filho, ele possa ser localizado.
Impressiona nesse caso o número de policiais e equipamentos utilizados na caça ao assassino de muitas pessoas. O governo de Goiás se empenha na caça e uma deputada vai para a região portando arma de fogo em busca do Lázaro.
Triste, triste mesmo, é a foto da mãe do Lázaro, publicada no jornal de hoje. Nela se vê uma mulher simples, pobre e devastada. No rosto a dor dos acontecimentos incompreensíveis que cercam seu dia a dia. Pobre mulher. Ela pariu um matador.
Sobre nada
Passa que todos os copos estão de cabeça pra baixo, vazios. No estágio de pés na cabeça vale tudo, ou tudo vale. Desde mentiras a céu aberto, desmentidos, desculpas pelos erros. No território da fake news o que parece mesmo não importar são as estatísticas de óbitos, sempre crescentes. Mas, enquanto o falecido não é da família isso não surte o efeito catastrófico tão indesejado. O Marião, aquele do bar ali da esquina, perdeu a mulher e o irmão, por isso anda de cabeça baixa, abatido. Mas, veja, isso aconteceu ao Marião, azar o dele, a coisa não chegou aqui em casa. Por isso, apesar do desassossego, certa lentidão em se preocupar, imagine em protestar.
Não se sabe bem sobre o tempo que leva para se esquecer das coisas. Se perguntarmos a alguém sobre o ano da morte de Tancredo e a comoção que causou é possível que as pessoas se lembram do fato, mas não do que aconteceu ao longo daquele ano. Onde você estava e o que fazia em 1985? Detalhes?
Talvez por isso eu não tenha obtido grande coisa quando perguntei ao meu pai sobre a Gripe Espanhola de 2018. Ele tinha 15 anos naquela época e, no máximo, se lembrava de que morreu muita gente. A epidemia viera através de marinheiros num navio que aportou no Rio. Nada mais permanecera na memória de meu pai e olhe que ele era muito bom nessa coisa de se lembrar das coisas.
E daí? Daí que me pergunto o que se dirá sobre o atual período daqui, sei lá, 70 anos. Estudiosos se debruçarão em textos de mídia e documentos. Haverá quem publique livros, tentando ressuscitar os dias que correm. Mas, se para nós mesmos, os vivos do momento, faltam informações precisas sobre o que rola no mundo submerso na pandemia do coronavírus?
Terá razão a mocinha que diz ser católica e acreditar no poder da oração. A fé salvará, tirando de seu caminho o infame vírus que ceifa tantas vidas.
Será?