Arquivo para fevereiro, 2022
De novo Plutão
Para os romanos o Deus mitológico Plutão era o comandante do submundo. Teria vindo à superfície apenas para raptar Perséfone que se tornaria sua mulher no mundo dos mortos. Plutão usava máscara que o tornava invisível e era muito temido.
Nos dias que correm o nome Plutão está associado ao pequeno corpo celeste localizado na rabeira do sistema solar. Fica tão longe que demora 248 anos para dar uma volta completa ao redor do Sol. Pequeno, frio e escuro, assim é Plutão. Aliás, de anos para cá convencionou-se desclassificá-lo como planeta, passando à condição de “Planeta Anão”.
Na astrologia Plutão é associado ao signo de escorpião. Escorpionos e escorpianas são tidos como pessoas passionais, generosas, possuindo sexto sentido afiado e espírito de detetives. Pertencem ao signo os nascidos entre 23/10 e 21/11.
Nossa curiosidade em relação ao espaço que nos cerca é grande. Com frequência discute-se a possibilidade da existência de seres extraterrestres, enfim de vida inteligente fora da Terra. Afinal, por que em meio à vastidão do universo só nesse planetinha chamado Terra teria surgido a vida? E quanto a esses misteriosos objetos que por vezes são avistados no céu, movendo-se a velocidades espantosas? Seriam naves espaciais a nos observarem?
Vez ou outra nos deparamos com notícias sobre Plutão. Hoje fala-se que o nome do planeta anão foi dado por uma menina de 11 anos de idade, Vanessa Phair. Neta de um bibliotecário aposentado de Oxford, ao saber que o então planeta era pequeno e escuro sugeriu ao avô o nome Plutão. O avô em contato com o pessoal universitário fez a sugestão chegar aos cientistas que batizaram Plutão.
Talvez o que nos atraia em Plutão, além da curiosidade científica, seja justamente o fato de ele ser pequeno, escuro e tão distante. Fica como alguém desgarrado da família de planetas que orbitam em torno do Sol, alguém inclusive rebaixado para sua condição atual de anão. Gira longamente, sem luz, gelado, inútil, existindo por força de uma decomposição de massas que gerou o sistema solar. Pequeno e último pode ser olhado como obra do acaso que, talvez, por muitopouco teria se desintegrado.
Pela distância e condições é de se imaginar que o homem nunca pisará em Plutão. Mas, o Anão continuará existindo, dando asas à nossa imaginação.
Tragédias
A forte chuva provocou verdadeira hecatombe em Petrópolis. As imagens divulgadas assemelham-se às de lugares em guerra, captadas após bombardeios. Tragédia imensa com expressivo número de mortes e desaparecidos afora grande destruição de imóveis e outros bens.
No passado recebíamos as notícias através de relatos ou pela mídia impressa. A profusão de meios de captação de imagens transfere-nos o que acontece em tempo real. As pessoas do lugar produzem vídeos impactantes e os divulgam pela internet. Assim, passamos a fazer parte quase instantânea do quadro de aflição geral que cerca os acontecimentos.
Como sempre acontece após tragédias surgem comentários, acusações etc. Em Petrópolis tem sido destacada a ocupação irregular de terrenos, a falta de planejamento urbano e mesmo a ausência de medidas que possam vir a diminuir os efeitos de possíveis deslizamentos de terra. Vai daí que a chuva inesperada e muito forte leva um morro a vir abaixo, soterrando pessoas e tudo o que encontra pela frente. Toneladas de terra passaram a cobrir corpos de mortos já identificados e de pessoas desaparecidas.
Mostra a experiência que daqui a algum tempo a tragédia de Petrópolis será gradualmente esquecida. A cidade será reconstruída, áreas de destruição renovadas e tudo parecerá em ordem porque o tempo passa, as pessoas mudam e o mundo continuará a girar como sempre. De tudo o que poderia e pode ainda ser feito certamente restará algo a fazer isso por conta de prioridades, ausência de recursos, compromissos políticos e toda a sorte de situações que envolvem a administração pública.
Entretanto, para nós ficam imagens dolorosas. Como esquecer a face da mãe de 22 anos que veio a falecer soterrada juntamente como seus dois pequenos filhos? Ela segue viva e sorridente na foto ao lado das crianças. Eles não precisariam ter suas vidas interrompidas tão precocemente acaso algo de relevância tivesse sido feito para pelo menos minorar os efeitos nocivos da grande tempestade.
Também ficam as imagens do esforço de pessoas do lugar irmanadas aos bombeiros na busca de desaparecidos e cadáveres. São imagens angustiantes aquelas nas quais vemos tantas pessoas, enxadas nas mãos, a buscar, em meio a imensa montanha de barro, possíveis sobreviventes.
Tragédias despertam atos de solidariedade e muita coragem fazendo-nos refletir sobre o fato de que afinal somos humanos e devemos aos nossos semelhantes.
Ídolos
Ídolos se tornam a partir de imagens que deles formamos. Admiramos alguém que, em sua atividade, se torna fora da curva. Pele não é ídolo por acaso. Ele foi - e ainda é - o brasileiro mais conhecido e lembrado nos cinco continentes. Quem em viagem ao exterior não ouviu, ao falar de sua origem brasileira, a identificação: Brasil, Pelé…
Diego Maradona é ídolo argentino. Incontestável. Entretanto, sua imagem vem sendo arranhada por desvios comportamentais que a comprometem. Para nós, fãs de seu futebol, é sempre triste ouvir noticiais sobre os últimos dias de vida do grande craque. Admirado em todo o mundo eis que nos contam sobre situações realmente deprimentes ocorridas inclusive nos dias que antecederam sua morte.
Fato é que que certamente preferiríamos que nossos ídolos permanecessem em sua estelar condição, sem deles virmos a saber sobre circunstâncias que denigrem suas imagens. Afinal, não se pode negar que ídolos contribuem para a emulação de nossas vidas tão comuns, por vezes insossas. Perdemo-nos na admiração que nos serve como válvula de escape frente às mazelas do dia a dia. Essa fantasia é preciosa daí o zelo que se tem em relação a ela.
Mas, o mundo é lugar no qual o bem e mal travam combate diário. Pessoas são, por natureza, contraditórias. Daí a emergência de duplas faces que tão inesperadamente se revelam. Comportamentos podem adequar-se, inesperadamente, a circunstâncias. Revela-se aí a outra face da personalidade a qual até então fora mascarada aos olhos de outrem.
Se me perguntarem sobre o melhor goleiro de futebol que vi jogar a respostas será: Gilmar. Grande Gilmar, o “goalkeeper”, o “guarda valas” das seleções de 58 e 62 que nos trouxeram a sonhada taça Jules Rimet. Que confiança tínhamos naquele goleiro que, debaixo das traves, segurava não só as estocadas dos adversários como a necessidade que aquele Brasil das décadas de 50 e 60 tinha de impor-se ao mundo.
De modo que para mim e tantos brasileiros Gilmar é ídolo. Pois é com grande tristeza que leio sobre declarações reveladoras de um Gilmar até então desconhecido, um Gilmar despachante no DOI CODI órgão repressor durante a ditadura militar. Circulava ele nos corredores do órgão, facilitando negócios e até sendo beneficiado com a posse de uma revendedora de carros. É o que se diz.
Sinceramente, não sei como reagir ante a duplicidade de características de um homem a quem sempre tive como ídolo. Vem-me à mente as histórias sobre gigantes de pés de barro que podem ser destruídos com facilidade.
Desaparecimento
Falava-se sobre pessoas desaparecidas, evitando-se a palavra “mortes”. Era assim em casa de minha avó. Fulano(a) desapareceu e ponto final. Os mais jovens referiam-se à morte dizendo que fulano(a) vestira o terno de madeira, referência óbvia ao caixão.
Bem, tanta gente tem desaparecido em função da pandemia e outras causas - assassinatos sempre em destaque - que a morte tem se apresentado com muita naturalidade. Morrer virou banal. Parece que o homem da foice está livre e solto no mundo, escolhendo ao acaso a quem levar. Vai do dia, da hora, do jeito do cidadão. A foice corta a vida de qualquer um, ninguém está livre da súbita e inesperada consumação de seu destino.
Mas, vez ou outra morre alguém que merece destaque. Na semana desaparece o Di Genio, pessoa de grande sucesso na área da educação. Foi ele o fundador do complexo educacional Objetivo e da UNIP. Homem de grande visão empresarial e realmente dedicado à educação construiu importante carreira no setor. Agora desaparece, após 82 anos de vida.
Bem, conheci o Di Genio. Ele foi meu professor no cursinho, isso nos idos de 1968. Na época, jovem ainda, cercava-se de cuidados para impactar a massa adolescente que frequentava as salas de aula do cursinho. Dele presenciei aulas, no período da tarde, nas quais nos ensinava a parte da física referente a circuitos elétricos. Posso ainda revê-lo, na memória, falando sobre resistências em série e paralelas. Mas, não se tratava de momento qualquer: era ele o dono, carro chefe do cursinho. Daí que na enorme sala, ao lado do quadro negro, mandara ele colocar um sofisticado sofá no qual se sentava nos momentos em que resolvíamos os exercícios. Tudo montado de modo a transferir a ideia de grandeza da qual nós, alunos, fazíamos parte. Estávamos juntos na missão de estudar e superar os futuros vestibulares, seguindo esquema infalível de ensino, no melhor lugar, com os melhores professores etc.
Aliás, o cursinho cercava-se de toda uma mística que sugeria sua grandeza. Quando chegávamos ao prédio, localizado na Rua Tomás Gonzaga, ali na Liberdade, encontrávamos sempre, parados à porta, dois imponentes automóveis aos quais seria impossível ignorar. Não me lembro das marcas, talvez Jaguar ou outras. Não seriam ainda sete da manhã e entrávamos no prédio imbuídos do sentimento de fazer parte de algo grandioso, talvez prodigioso a ponto de nos levar ao sucesso em nossas futuras carreiras profissionais.
Desde que o desaparecimento de Di Genio foi anunciado a mídia tem destacado sua vida e obra. Referem-se a ele não só com respeito, mas com enorme admiração. Construiu um império educacional partindo do zero e logrou deixar, atrás de si, legado consistente.
Como sempre se diz, boa viagem ao desconhecido Mestre Di Genio.