A chegada do outono
O outono chegou ontem às 14 horas e 32 minutos. Não fez barulho, não causou reviravolta no tempo, mais parecia cumprir uma determinação como bom funcionário da natureza.
Eu que sabia da chegada dele resolvi esperá-lo: bem perto da hora marcada fui à janela e mirei o horizonte, aguardando um sinal. Nada. De repente eu soube que já era outono, um outono velho e cansado, sem novidades, talvez desiludido deste mundo confuso. Quem sabe preferiria ele iniciar-se como nova estação em Marte ou outro planeta, não mais aqui.
Poucos minutos depois da chegada do outono desci e fui à padaria. A mocinha que vende pães estava em seu lugar de sempre, com aquele sorriso chocho pregado nos lábios. Puxei conversa e disse a ela:
- Já entramos no outono.
O sorriso não se alterou e ouvi por entre os lábios dela o comentário lacônico:
- É…
Voltei à casa inconformado e com vontade de gritar:
- Já é outono!
A minha decepção com a chegada do outono tem a sua razão de ser. Nascido e vivido em zona agrícola sempre soube da importância das estações do ano e datas específicas para plantio de diferentes gêneros. Ainda existem por aí – não sei – as “Folhinhas” que eram entregues aos clientes nas farmácias nas quais existiam milhares de informações úteis relacionadas às estações do ano. Elas consistiam em preciosos guias, indicando feriados, dias-santos, época de culturas de hortaliças etc. Ai do farmacêutico que não reservasse exemplares para os seus bons clientes: corria o risco de perdê-los.
O outono chegou de mansinho e esperou até a madrugada para se manifestar. Durante a noite ouvi uns ventos estranhos e tive a impressão de que chovia. Hoje de manhã, ao sair de casa, notei que as ruas estavam cheias de folhas caídas das árvores. Era, finalmente, o outono a dar o ar de sua graça.
Encontrando-me com um vizinho, o dentista, apontei as folhas no chão e disse a ele:
- Estamos no outono.
Ele me disse que sim, deu um tapinha no meu ombro e foi-se embora com ares de quem tem mais coisas a fazer.