Direita e esquerda
No fundo do quintal da minha casa existiam dois canteiros, cada um deles separado do resto por uma cerquinha. O da direita era bom: o que se plantava nele crescia depressa, semente dava legume, semente dava flor, roseira enxertada dava rosa de cor diferente, misturada, bonita.
No canteiro da esquerda não valia plantar nada: semente morria sem germinar, roseira secava, flor nenhuma se abria ali. Meu pai dizia- era o tempo da ditadura – que a esquerda tinha medo de florescer porque iam cortar a cabeça dela. Minha mãe, mais prática, estudava se o problema não seriam os raios solares, a terra, a sombra do telhado, a qualidade das sementes, a água e até coisas imponderáveis.
Como o problema persistia, tomou-se uma atitude radical: a terra dos dois canteiros foi removida e trocada. A do canteiro da direita foi para o esquerdo, a do esquerdo para a direita. Depois foram plantadas, nos dois canteiros, sementes escolhidas iguais e tomaram-se cuidados semelhantes com a rega e os raios solares.
Depois de algum tempo verificou-se que o problema se mantinha. Minha mãe constatou que enquanto as plantas do canteiro da direita iam em frente, as do esquerdo nem chegavam a nascer. Meu pai viu isso e sentenciou:
- A esquerda não vai em frente nesse país.
Minha mãe, sempre prática, desistiu do canteiro da esquerda. Eu era menino e estranhei. Perguntei a ela por que tinha desistido. Ela passou a mão na minha cabeça e disse:
- Não acredite no seu pai, isso não tem a ver com política. É que não dá mesmo.
Então tinha uma moça da roça que era empregada em casa. Ela ouviu a conversa e encerrou o assunto:
- Tem pedaço de mundo que Deus esqueceu, Ele não toma mais conta. É lugar que quem comanda é o Coisa-Ruim que faz tudo do jeito dele. Esse é o problema ali da esquerda.
Ficou assim.