Do seio da Terra
Nesses dias em que a atenção está voltada para os embates entre as facções políticas que concorrem à presidência da República é com emoção que assistimos ao resgate dos mineiros chilenos, há mais de dois meses soterrados numa mina.
Retornar à superfície depois de passar tanto tempo numa caverna a 700 metros de profundidade representa reviver, recomeçar algo que fora temporariamente perdido. Não houve como conter a emoção quando a cápsula que foi içada por 700 metros dentro de um túnel cavado chegou à superfície e dela emergiu um homem que poderia estar morto caso não fosse estabelecido contato com a superfície ou não se conseguisse construir o túnel.
O resgate foi completado com a viagem do último mineiro à superfície e a saída dos homens que haviam descido para ajudá-los. Em particular, impressionou muito a imagem da última pessoa a deixar o local, a partir daí vazio. Enquanto os repórteres que acompanhavam a saída da cápsula da mina, pela última vez, perguntavam se a luz seria apagada – não foi – experimentou-se a curiosa sensação de despedida de um lugar que faz parte do planeta, mas parece não estar no nosso mundo.
A manhã de hoje prestou-se a todo tipo de especulações. Pergunta-se sobre o futuro dos mineiros e o impacto que terá sobre suas vidas o período de reclusão forçada. Especialistas explicam consequências de natureza psicológica e falam em readaptação. Especula-se sobre a exploração comercial do episódio, produção de filmes, livros, documentários etc. Acima disso tudo fica a lição de solidariedade, pode-se dizer de humanidade. De fato, o mundo acompanhou com emoção e muita tensão cada passo desse resgate em nenhum momento isento da possibilidade de não dar certo. Cada mineiro resgatado representava uma vitória parcial só completada e com grande alívio ao final de todo o processo.
Hoje de manhã comentaristas citavam o episódio da nave Apolo que quase milagrosamente retornou a Terra depois de apresentar defeitos no espaço. Falava-se, também, sobre o submarino russo e os marinheiros que sobreviveram a uma explosão, mas não puderam ser resgatados. Ocorrências dessa natureza, nas quais momentaneamente pessoas ficam à margem de todas as benesses da civilização, são muito impactantes. No caso dos mineiros a reclusão forçada a ambiente isolado e a uma temperatura de cerca de 40º Celsius, afastados de todo e qualquer conforto e tendo como única força o apoio entre si e a esperança, poderia ter sido desastrosa.
Os mineiros estão a salvo e agora começam a surgir as suas histórias. Transformados em heróis não se sabe ao certo o que o futuro a eles reserva. Mas, estamos todos felizes: deu certo, a humanidade fez a sua parte, a solidariedade foi o ponto alto de todo o episódio e podemos nos sentir humanos, muito humanos.