A parte que cabe ao Nilo at Blog Ayrton Marcondes

A parte que cabe ao Nilo

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Um frenesi de vitória da democracia corre solto por aí desde que o ditador Mubarak finalmente renunciou no Egito. As agências internacionais de notícias trabalham em ritmo febril espalhando pelo mundo detalhes sobre a boa nova. Nas ruas do Cairo todo um povo comemora o fato inédito de dezoito dias de protesto terem sido suficientes para acabar com uma ditadura que durou trinta anos.

Quieto e expectante só o Rio Nilo que corta a cidade do Cairo. Águas que já viram de tudo, certamente não hão de se impressionar com um ditador que cai e outro que, de repente, pode subir. A democracia? Ela é frágil, lenta e depende de muitos consensos.  É a esperada, a que há de vir, mas não tem data para chegar. Tem ela as suas manias, o seu requinte. A democracia é como uma dama, vestida do branco mais alvo, que gosta de mesa pronta e convivas que a respeitem. Por isso, paira sobre o Egito a indefinição que leva tantos escribas, mundo afora, a todo tipo de considerações. Qual será, a partir de agora o futuro do Egito?

Talvez só o Nilo saiba, ele que já viu tanta coisa. Em Êxodo se contam os prodígios da mão de Deus sobre o Egito. Sete pragas abatem-se sobre o país porque o faraó se recusa a permitir a saída do povo de Deus. Numa delas, rãs sobem das águas e infestam todo o território. Noutra as águas do grande rio transformam-se em sangue; morrem todos os peixes e a água torna-se infecta.

Sempre o Nilo.

Mas, não há como se esconder a simpatia em relação a um acontecimento que muda o rumo das coisas e responde aos anseios de um povo. A respiração do mito da liberdade é algo que enche os pulmões, renova o fôlego e esperanças de um futuro melhor.

Desde criança aprendi a ligar a noção de Egito ao rio Nilo. Fosse eu egípcio a primeira coisa que faria era pedir ao grande rio que fizesse uso de sua força e magnitude para acalmar os ânimos e conduzir o Egito nos dias difíceis que se seguirão. Afinal, um rio que já mandou rãs até para o palácio do faraó e teve as águas transformadas em sangue deve ser capaz de influir em alguma coisa.



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