As revoluções
No “Houaiss“ o vocábulo revolução, em sentido político, é definido como “movimento de revolta contra um poder estabelecido, feito por um número significativo de pessoas, em que geralmente se adotam métodos mais ou menos violentos; insurreição, rebelião, sublevação”.
No Brasil a turma dos descontentes costumava descaracterizar a “Revolução de 64”, também conhecida como “A Redentora”, taxando-a de “quartelada”. Movimento incruento, realizado por militares, não seria revolucionário. O poder foi tomado, o presidente João Goulart deixou o país e o resto todo mundo sabe. Quanto a número significativo de pessoas envolvidas e métodos violentos, não há notícia de que tenham sido expressivos naquele 31 de março de 64. A violência viria algum tempo depois, de ambos os lados, e o assunto ainda hoje dá pano para manga. Países vizinhos que viveram situações semelhantes encararam mais de frente o problema envolvendo torturas, desaparecimentos e terrorismo. Por aqui se pretendeu, com a anistia, sepultar memórias e condicionar uma paz de espírito impossível. O resultado é que o assunto continua vivo. Hoje mesmo lê-se nos jornais a notícia de que um procurador militar do Rio quer examinar papel de agentes das Forças Armadas no desaparecimento de quatro militantes ao tempo da ditadura. Para o procurador esses casos não estão prescritos e não aplica, em relação a eles, a Lei de Anistia de 1979.
Cada um terá as suas lembranças sobre o período da ditadura no Brasil. Para mim vários momentos ficaram gravados e talvez mais tarde eu me proponha a recordá-los. Por ora, basta um deles relacionado ao significado do termo revolução. Naquele 31 de março eu era um aluno de primeiro grau, estudando em colégio de cidade do interior de São Paulo. Acontecido o Golpe de Estado que colocou fim ao governo democrático de Jango seguiu-se prontidão e movimentação de tropas em todo o Brasil. Na cidade em que eu estava existia – e ainda hoje – um quartel. Dele saíram soldados em direção ao Rio de Janeiro, viagem que não se completou devido ao mau estado dos veículos utilizados. De modo, que quando se entendeu irrevogável o Golpe Militar, voltaram os briosos soldados, até então estacionados na Via Dutra, ao quartel de origem.
Ora, naquela época os efeitos da Guerra Fria faziam-se sentir pesadamente no continente dada a liderança inconteste dos Estados Unidos. O receio do avanço do comunismo, a ânsia por desenvolvimento, progresso, paz política e redução da carestia contribuíram para que, num primeiro momento, o Golpe Militar fosse muito bem visto pela população. De modo que, quando os soldados voltaram, entraram na cidade triunfalmente, sendo recebidos com muito carinho e aclamados pelo povo. Voltavam como heróis e com tal carapaça desfilaram pelas ruas.
A isso assisti e testemunhei. Creio que o fato dá ideia das dificuldades de momento para a união de forças no sentido de executar uma verdadeira revolução.
Tudo isso me vem à memória no momento em que ditaduras do norte da África enfrentam movimentos de oposição. Enquanto no Egito o ditador Mubarak viu-se obrigado a renunciar, na Líbia o ditador Muammar Gaddafi declara que só deixará o governo se morto. A desordem toma conta de cidades líbias e a revolta é duramente reprimida pelo governo. Civis são bombardeados e estrangeiros encontram dificuldades para deixar o país.
Revoluções. Longas ditaduras do mundo árabe podem ruir pela força das revoluções.