E chove
Presença constante a chuva não dá sinais de partida. Chove muito e pra todo lado. Céu negro, nuvens mais que carregadas e a nossa vida no meio disso tudo, regada a inundações.
Todo dia se lêem nos jornais reclamações e protestos. Culpam-se as autoridades, os cidadãos que jogam o lixo que entope os bueiros e a própria chuva porque chove demais: em três dias do mês tal choveu mais que o esperado no mês todo.
Quando menino eu tinha medo da chuva. Lugar pequeno, cecado por montanhas, propício a relâmpagos, raios e trombas d´água. Certo dia soubemos do homem que chegou em casa durante uma tempestade e morreu ao colocar a mão na cerca para abrir a porteira. Um raio caiu longe, a carga elétrica correu pelo arame e encontrou a mão do homem que caiu morto. Nunca me esqueci disso, dos raios que cortavam a escuridão da noite, do medo de que o vento arrancasse as telhas. Talvez por isso eu tenha adquirido o receio de viradas abruptas do tempo e tempestades.
Mas, tudo isso é confessional e não interessa muito. O que vale são esses morros em estado de atenção, as pessoas tão vivas enquanto as tragédias não vêm, a simulação de que tudo é como deveria ser, sem na verdade ser.
Amanhã de manhã a rotina se repetirá, as notícias correrão como se fossem comuns, saberemos de mortes e desabrigados, veremos pessoas chorando porque perderam tudo e mesmo entes queridos.
Tudo conforme esperado, culpa da chuva, danada da chuva que não se toca, não se cala nos telhados.