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O ofício de ser brasileiro

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Na música Querelas do Brasil, de Maurício Tapajós e Aldir Blanc, ouve-se o refrão: “O Brasil não conhece o Brasil”. Em outro contexto Tom Jobim afirma enfaticamente: “O Brasil não é para principiantes”.

Difícil, muito difícil, entender o Brasil. Para começar, somos um povo em eterna busca de identidade. Não será demais afirmar que, durante sua formação, a intelectualidade brasileira obrigatoriamente entra em contato com os chamados intérpretes do Brasil: Joaquim Nabuco, Oliveira Lima, Euclides da Cunha, Oliveira Viana, Gilberto Freyre, Sergio Buarque de Holanda, Paulo Prado, Caio Prado Junior e alguns outros cujos trabalhos são igualmente importantes. Aos intérpretes devem-se estudos que muito contribuem para o esclarecimento da identidade nacional, ou seja, dos laços simbólicos e culturais que nos unem e que nos fazem brasileiros.

Um amigo vivendo no exterior me escreve e afirma que se pensa melhor sobre o Brasil quando se está longe dele. Segundo ele, viagens ao exterior e contatos com outros povos despertam comparações e suscitam questionamentos sobre a individualidade brasileira. Esse amigo diz isso e quer saber sobre acontecimentos recentes. Aconteceu mesmo ou é papo de mídia? - pergunta ele.
Pois aconteceu, respondo. Explico que o Brasil é mesmo um país difícil de explicar daí, talvez, a ocorrência de acontecimentos que fogem ao padrão esperado e têm um jeitão muito nosso. Caro amigo, aconteceu, sim, que o presidente da República disse na cara do primeiro-ministro da Inglaterra que a atual crise mundial é culpa dos brancos de olhos azuis e que não conhece nenhum banqueiro negro; aconteceu que a dona da Daslu foi condenada a 94 anos de prisão e considerada perigosa para a sociedade, daí sua prisão imediata mesmo com sentença em primeira instância; aconteceu, também, que o ex-ministro da Justiça aceitou ser advogado de uma grande empreiteira acusada de fraudes pela Polícia Federal; aconteceu que, em Diadema, em meio a residências, uma empresa armazenava quantidade enorme de produtos químicos que proporcionaram incêndio com efeitos pirotécnicos superiores às dos filmes americanos; e por aí afora. E lembre-se meu caro amigo, acrescentei terminando: tudo isso ocorrido na última semana porque o Brasil é pródigo em acontecimentos, aqui com freqüência a realidade e o absurdo se renovam com invejável rapidez, daí a nossa incrível tolerância que se constitui num dos traços inconfundíveis da identidade brasileira.

Ser brasileiro é ofício complicado. Já entender o Brasil é tarefa capaz de enlouquecer qualquer um. Quem duvida que leia jornais diariamente, detendo-se nos articulistas: obrigados a interpretar o cotidiano vêem-se eles num vai-e-vem de fatos pretéritos e atuais ligados por contingências nem sempre lógicas mas que, juntas, compõem um retrato muito nítido do país em que vivemos, ainda que não possamos compreendê-lo integralmente.

Escrito por Ayrton Marcondes

30 março, 2009 às 4:01 pm

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Postado em Cotidiano



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