Vésperas
Amanhã à meia-noite as famílias estarão reunidas para a ceia de natal. Trata-se de momento de intimidade entre pessoas ligadas por parentesco que se sentarão à mesa para comer e beber, deixando de lado problemas, desafetos, enfim as mazelas do cotidiano.
Desconfio que, ano a ano, o natal venha perdendo parcelas de seu encanto. Nesses dias fui, como todo mundo, às compras de presentes para entes queridos e não percebi nas pessoas o entusiasmo que o natal em geral provoca. Vi pessoas na maioria das vezes fazendo o que tinham que fazer, levadas talvez pelo hábito, mas não pude encontrar os sorrisos fartos de felicidade. Culpa da crise mundial, mundo confuso demais, receio de recessão futura? Não é possível dizer, talvez os números a serem publicados depois do natal sobre o movimento do comércio nessa época possa nos dar uma ideia da influência da economia sobre o ânimo das pessoas.
O que está em andamento agora é a grande circulação de pessoas. Como acontece em todos os anos o trânsito de fim de ano está caótico e o movimento nas estradas cresce assustadoramente. Para o final do dia desta sexta-feira espera-se grande movimento nas estradas com o fluxo de veículos que abandonam as capitais com destino ao interior. Em São Paulo espera-se muito trânsito nas vias de acesso ao interior, particularmente nas que conduzem às regiões praianas.
Tudo isso traz a sensação do já visto, do já acontecido, repetição de quadros que ocorrem em todo fim de ano, daí a nostalgia ligada aos natais passados, emoções vividas e assim por diante.
O fato é que já estive em muita ceia de natal e sentei-me à mesa com pessoas diversas, algumas das quais não mais me encontrei e outras que simplesmente morreram. Onde aquela gente toda que frequentava as casa de minha avó? Onde os meus tios dos quais guardo tão boas memórias? Todos mortos, deixando na memória tantos anos terminados, com natais e festas que sobrevivem apenas nas lembranças daqueles que eram crianças e jovens naquele tempo, os poucos que restaram.
Então, se amanhã será comemorada a noite de natal, a passagem do dia 24 para o dia 25, com ceias acontecendo nas mesas do Brasil, quero dizer que não irei à Missa do Galo e confessar que desde os meus tempos de menino deixei de comparecer a essa missa. Talvez porque minha mãe tivesse envelhecido e adoecido e eu não fosse mais à igreja com ela, talvez por descaso meu, talvez por vacilações da minha fé, talvez por tudo isso e muito mais eu tenha deixado de ir à Missa do Galo.
Enfim, amanhã será a véspera do dia de natal. É possível prever como as coisas se passarão amanhã, como as pessoas se comportarão e mesmo as notícias que receberemos através da mídia sobre as comemorações do natal. Ninguém fará, entretanto, menção a natais passados, aqueles perdidos na memória, nos quais minha mãe servia à mesa o frango assado que fora criado no próprio quintal da nossa casa. Aquele natal, assim como tantos outros perdidos no passado me pertence e tem o condão de fazer reviver os meus mortos, dar a eles a brevidade de retorno à vida ainda que apenas dentro de um jato de memória.