Juízes e julgamentos
Quando menino conheci o Ministro Nelson Hungria, notável jurista brasileiro. Era amigo de meu pai a quem visitava vez ou outra. O grande homem saia de Brasília e incluía em seu percurso de viagem a passagem pela nossa casa. Certa ocasião apareceu ele sem avisar e não encontrou meu pai. Fiquei com ele um bom par de horas e tratou-me como igual. Relatou-me viagem que fizera à Rússia e os problemas que enfrentara na então cortina de ferro.
Na época Nelson Hungria era o Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). Alto magistrado da República portava-se ele com simplicidade, nem de longe demostrando a importância que tinha.
Lembrei-me de Hungria ontem ao assistir parte da sessão do STF na qual os ministros votavam a questão de formação de quadrilha pelos envolvidos no mensalão. Hungria tinha um porte de ministro que nunca me saiu da cabeça de modo que, para mim, todo ministro deveria ser como ele. Talvez por isso eu me sinta tão decepcionado ao assistir à atuação dos ministros atuais. Muita retórica, voltas e mais voltas em seus discursos, com a proteger-se da opinião que muitas vezes só no final acabam por revelar.
Sabemos o quanto é difícil a separação de tendências pessoais do rigor e isenção exigidos no momento de interpretação das leis e aplicação de penas. Cada cabeça uma sentença diz o dito popular. Mas, a imagem de ministros entregando-se a bate-bocas talvez despropositados seguramente nos leva a pensar no quão falíveis podem ser essas pessoas que julgam destinos de cidadãos, corporações e do próprio país.
Talvez melhor seria se as sessões do STF não fossem transmitidas ao vivo. Não tomaríamos consciência sobre as disputas internas dos ministros e a confiança coletiva seria melhor preservada.
Não imagino como teriam sido as reuniões do STF ao tempo de Nelson Hungria, mas algo me diz que eram pelo menos mais cordiais.