Favores
Hoje em dia, talvez pela correria do dia-a-dia, pouca gente se inclina a prestar favores. Mas, há quem nos peça isso ou aquilo, muitas vezes colocando-nos em situação nem sempre agradável.
De que o brasileiro de hoje é diferente daquele do passado não restam dúvidas. Consequência do capitalismo selvagem? Talvez. Acontece que situações que mexem com o bolso da gente acabam sendo muito difíceis de aceitar. Mas, creio ter havido tempo no qual as pessoas se sentiam mais inclinadas à ajuda ao próximo. Ao longo da minha vida, por exemplo, encontrei pessoas medularmente boas que me ajudaram em momentos difíceis.
Confesso que acho constrangedoras essas situações a que ficamos expostos ao parar o carro em faróis fechados. Existe aquele rapaz vendendo balas, a moça que faz mágicas com uma bolinha de tênis, a mãe maltrapilha que carrega uma criança no colo, o deficiente físico que se arrasta pedindo ajuda, a idosa que traz na face impresso o desespero de uma vida miserável. Todos eles suplicam por uma moeda, uma só moedinha que, no fim das contas, não nos fará nenhuma falta. E essa moeda poderá servir para comprar um pão, matar a fome de um nosso semelhante a quem a sorte não ajudou. Isso é o que se passa na nossa cabeça enquanto torcemos para que o sinal finalmente se abra e aceleremos o carro, deixando para traz aquela situação que nos constrange.
Para falar a verdade quase nunca atendo aos pedidos das pessoas que me pedem ajuda ao parar nos sinais. O meu maior problema é o receio de abrir o vidro dado que, em geral, fica-se cercado por motos e todo mundo sabe a quanta anda a violência nas nossas cidades. Por outro lado sei das campanhas que pedem aos cidadãos que não deem esse tipo de esmola e dos avisos sobre crianças exploradas por marginais que arrecadam dinheiro nas ruas. Mas fica a sensação de desconforto, a humanidade que nos impele a ajuda ao próximo.
Dias trás me aconteceu ajudar a uma mulher acompanhada de duas crianças que a seguiam segurando-a pelo vestido. Como eu não tinha trocados passei a ela uma nota de valor um pouco mais alto. Ao receber o dinheiro os olhos da mulher encheram-se de lágrimas. Depois ela se foi, levando atrás de si a prole faminta. Desde então aquele rosto, a face agradecida e comovida, não me saem da memória.