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Sobre periquitos

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Discreto, amável, contido e de fala mansa o careca do táxi mais parecia alguém robotizado para integrar-se à máquina que dirigia. Circulava devagar, cuidadosamente. Depois que dei a ele o endereço de para onde seguiríamos, recolheu-se meditativo.

Fui eu quem interrompeu o silêncio, perguntando a ele se circulara pela região da Ponta da Praia. Respondeu-me que passou apenas perto porque o trânsito fora interrompido. A ressaca marinha de véspera fora grande, com as águas invadindo a avenida. Comentei sobre a força do fenômeno. Ondas de 2,60m de altura, ventos de 82 km. O mar derrubara a mureta da praia, atravessara a larga avenida, inundara as garagens dos prédios onde carros flutuavam. Na avenida e ruas adjacentes carros moviam-se boiando na água. E pedras enormes foram trazidas pela água até a avenida. Na manhã de hoje bombeiros trabalhavam para resolver a situação.

Foi quando passamos defronte a uma clínica veterinária que o rapaz me falou sobre seu animal de estimação:

- O meu periquito está internado aí.

-Periquito? - perguntei.

Seguiu-se o relato sobre a vida do periquito. Ele achara-o na rua. Levara-o para casa, cuidara do bichinho. Daí nascera a amizade. O periquito retribuía a ele todo o afeto e carinho. De repente parou o táxi. Sacou do bolso o celular e pôs-se a procurar foto do periquito. Quando a encontrou, passou-me o aparelho e disse comovido:

- Somos nós.

Eram ele o periquito sobre a sua cabeça, os pés assentados na área calva. Nesse momento vi o motorista de frente e surpreendi uma lágrima furtiva em seu rosto.

Perguntou-me se eu acreditava na inteligência dos animais. Para ele o periquito tinha inteligência porque o reconhecia. Toda vez que entrava em casa lá vinha o periquito, procurando-o.

Mas, por que raios o periquito fora parar numa clínica? A culpa fora do vento. Embora morasse em apartamento fora impossível conter o vento fortíssimo que entrava pelas frestas das janelas. E o periquito adoecera. Na verdade o veterinário não dera muita esperança. O caso era grave, que esperasse pelo pior, só mesmo por milagre.

Chegamos ao nosso destino. Deixei no táxi um homem sofrendo, tamanha sua paixão pelo periquito. Já em casa fui procurar detalhes sobre o pequeno psitaciforme. Descobri que o periquito - Melopsittacus undulatus – é uma ave cuja expectativa de vida, em cativeiro, é de 5 a 10 anos. Alimenta-se de sementes. Talvez o que tenha abalado a saúde do periquito tenha sido o fato de seu dono alimentá-lo com ração imprópria para a espécie. Por isso o motorista do táxi colocara a culpa no vento. A tantas me confessara que não suportaria o fato de ser o responsável pela morte do animal, caso viesse a acontecer.

Escrito por Ayrton Marcondes

22 agosto, 2016 às 9:47 pm

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