Sempre Canudos
Não sei se daqui a mil anos não mais e falará sobre Canudos. O fim do arraial, em 1897, permanece vivo nas memórias e vez ou outra reaparece no noticiário. Seguem por aí as muitas interpretações sobre a destruição pelo Exército das forças de Antônio Conselheiro. Os episódios finais relacionados à terceira e quarta expedições continuam entusiasmando pesquisadores e estudiosos.
Mas, este é o Brasil, pátria onde tudo acontece. No momento, a expectativa diz respeito ao julgamento do ex-presidente Lula que está para acontecer. O falatório em torno do caso é grande. Lula se vitimiza, assumindo a posição de perseguido pelas elites. Faz muito bem seu discurso, arrasta atrás de si a confiança de milhares de seguidores que acreditam no que ele diz. Daí a preocupação das autoridades com as possíveis repercussões do julgamento de Lula. Movimentos de trabalhadores ameaçam retaliações. Recomenda-se o fechamento de prédios públicos no dia. No Rio grande do Sul o governo chegou a pedir reforço do Exército o que tem sido tomada como exagero.
Mas, o que Canudos tem a ver com isso tudo? Acontece que num pronunciamento o ex-presidente afirmou que um dos juízes que vai julga-lo é bisneto do general que invadiu Canudos e matou Antônio Conselheiro. O juiz se chama Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz e na verdade é sobrinho-trineto do coronel - e não general - Tomás Thompson Flores. Thompson morreu em Canudos durante a ação do Exército no lugar. Mais: o coronel morreu em julho de 1897 e o Conselheiro só morreria em setembro do mesmo ano. Thompson Flores não poderia ter matado Antônio Conselheiro por ter falecido antes dele.
A política envolve um jogo de discursos nos quais inverdades são mais que comuns. Em busca de apoio e aprovação pública usam-se argumentos de toda sorte. Antônio Conselheiro é um ícone dado pertencer ao lado mais fraco e sua comunidade ter sido arrasada pelas forças do Estado. Ninguém enga isso. Mas, não por acaso o ex-presidente cita o Conselheiro. Agora o “neto” do “general” estará incumbido de mais um julgamento em nome das elites.