Ao Grande Oceano
Estás plenamente azul e absoluto em tua grandeza nesta manhã de sábado. Talvez por concessão deixa-nos embevecidos com a suavidade das pequenas ondas tingidas de prata que arremetes a terra.
Não é esta ocasião para demonstração da tua força, tu bem o sabes. Resolvestes isso talvez na madrugada: combinastes com o Sol as magnitudes do brilho que ele emprestaria às tuas águas, juntos fizeram esta manhã de incomparável beleza.
De onde vens? Em que latitudes correram as tuas águas? Que costas e arrecifes banharam elas que agora falsamente depõem armas e força aos meus pés?
Grande oceano, não me enganas com a tua simpatia e beleza; sei eu do teu poder. Conheço de longe a tua ira, as vagas imensas que alevantas, tragando tudo à tua frente, até mesmo as grandes embarcações. Conheço a tua história ainda antes do tempo em que concordastes em dividir teu espaço com a terra, deixando emergir os continentes. Conheço o teu poder de revolta, o perigo de que decidas de novo governar o planeta cobrindo os continentes com as tuas águas.
Grande oceano, confessa teus crimes. Dize-nos o que desejamos saber, restitui-nos os afogados de todas as épocas, os desaparecidos nas tuas profundezas, os que buscamos sem encontrar porque perdidos na tua imensidão.
Grande oceano: famílias choram os seus acidentados, celebram-se missas pelos ausentes; não brinques com a dor, revela-nos teu segredo, devolve a terra os corpos que a ela pertencem.