Filhos de rico
Há ocasiões em que o Brasil se parece a certos filhos de rico, aqueles caras que herdam uma fortuna sem ter a menor idéia de como foi gerada ou que não se preocupam se ela será ou não dilapidada.
Conheci um rapaz que herdou um banco. Não era dos grandes, mas era banco, negócio que veio do avô para o pai e do pai para as mãos dele. Filho único, o rapaz gastou dinheiro a rodo, interferiu nas decisões do conselho, atrapalhou muito e irresponsavelmente: o banco acabou falindo.
Outro que conheci pertencia à terceira geração de negócios rendosos consolidados em duas fábricas atuando em vários ramos. Esse chorava pelo que não chegou a ele: o pai herdara o império e passara a vida a bordo de navios luxuosos. Foi assim que acionistas tomaram conta dos negócios e acabaram embolsando a maior parte do dinheiro por ocasião da venda das fábricas.
E o que tem a ver o Brasil com essas histórias de famílias que se encrencaram? Pois olhe que o país vive atualmente perigosa euforia de novos ricos. Grandes escândalos de corrupção envolvendo somas fantásticas de dinheiro, a crescente cultura do desperdício e aí vêm as eleições que prometem desfalques nada pequenos aos cofres públicos. Mas há progressos: o governo emprestou dinheiro FMI, de devedores internacionais passamos a credores, estamos caminhando na direção do G8, parabéns.
Entretanto, é preciso lembrar um pouco da história dessa recente prosperidade. O Plano Real está fazendo 15 anos, o que significa que não muito longe dos dias atuais vivia-se uma catastrófica crise inflacionária. Quem não se lembra dos absurdos índices inflacionários, das enormes desvalorizações do dinheiro mês a mês, da insegurança da população, das prateleiras vazias dos supermercados, dos preços reajustados nas madrugadas, da corrosão dos salários, da perda da noção de valores, do dinheiro que fazia dinheiro da noite para o dia em aplicações que enriqueciam ainda mais os ricos e deixavam os pobres cada vez mais miseráveis?
15 anos não representam tanto tempo assim e não são suficientes para apagar das memórias as altas temperaturas da crise permanente instaurada no país por tantos anos.
O Plano Real devolveu ao Brasil a dignidade de um sistema no qual a população enfim pode confiar. Graças a ele o país tem crescido e registra uma estabilidade que muitos querem definitiva. Não se trata da maioridade econômica, os desníveis sociais estão longe de ser resolvidos, mas vai-se indo. Então é hora de lembrar aos homens que governam o país a história do progresso e do dinheiro que eles têm em mãos para que não atuem como certos filhos de rico, os que jogam com fortunas tantas vezes conquistadas com o suor e sofrimento de tanta gente.