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Morumbi na berlinda: basta!
São-paulinos e são-paulinas uni-vos: é hora de defender o Morumbi das aviltantes críticas que diariamente recebe da FIFA e interessados em deslocar o jogo de abertura da Copa 2014 de São Paulo.
Internamente isso já está virando uma nova Revolução de 1932: todo mundo contra São Paulo, encabeçados pela CBF. Deixando de lado as paixões, o fato é que a FIFA exige a execução de um projeto de mais de R$ 632 mi. Todo esse dinheiro saindo das costas do tricolor, com alguns apoios já garantidos. Concordem que é muita grana para um clube particular que, entre outras glórias, é proprietário do maior estádio de futebol do Estado. Daí que o São Paulo se dispõe a encarar um projeto de R$ 250 mi, anteriormente aprovado pela FIFA. É quando o Comitê Organizador da Copa vem a público para dizer que o Estado mais rico do país corre o risco e ficar sem nenhum jogo da Copa 14.
Olhem não se trata de nacionalismo barato, nem de amor exagerado ao Estado de São Paulo, muito menos de simples paixão tricolor. Afinal, quem são esses caras que entram na casa dos outros dando ordens, ditando regras e ameaçando? Fora com eles.
Nessa história de realização de Copa do Mundo o que assusta é a premissa de que a FIFA está fazendo um grande favor ao país por deixá-lo sediar a Copa. É bem isso, não se enganem. Vá lá que a FIFA tem que zelar pela qualidade da competição, pela organização, segurança e tudo o mais, afinal a Copa é um evento mundial assistido por quase todos os terráqueos. Entretanto, isso não dá direito a excessos, regras absolutas e esse ar europeu de superioridade, justamente sobre a nação tricolor e o Morumbi.
E que se calem esses traidores do Estado que querem, a todo custo, um estadiozinho em Pirituba pela balela de R$ 1 bi de custo, isso quando exsitem outras prioridades para o emprego do dinheiro público.
Que me perdoem se não sou bom de contas, mas se para fazer um estádio novo o custo é de R$1 bi, uma reforma de R$ 632 mi representa quase um desmanche do Morumbi. Do que se conclui que com mais uns R$ 300 mi o negócio seria derrubar o Morumbi e fazer um estádio novo, lá mesmo. Absurdo, absurdo!
São-paulinos e são-paulinas é hora de dizer aos diretores do tricolor que mandem esse negócio de Copa às favas. Amamos futebol, adoramos Copa do Mundo, mas em primeiro lugar estão os interesses tricolores.
Assim seja!
Pobre Zimbábue
No que o Brasil faz 2X0 contra o Zimbábue os meninos da escola explodem de alegria. Não importa que seja jogo treino e o adversário o nunca temível Zimbábue. O que vale é bola na rede e o grito profundo: Goooool… Brasillllll!
Ao lado do campo Dunga, com cara de gente sadia, bate palmas e sorri um de seus escassos sorrisos. O locutor da TV desmancha-se, afinal é a seleção.
Ninguém olha para as arquibancadas onde estão os naturais de Zimbábue, país governado pelo ditador Robert Mugabe. A vida por lá não é fácil: campeia a pobreza demonstrada por todos os indicadores econômicos.
Não se nega que a presença da seleção brasileira sirva para trazer alegria ao sofrido povo do Zimabábue. Mas, que me perdoem os torcedores brasileiros, vou torcer para que o Zimabábue esboce pelo menos uma reação no segundo tempo, proporcionando alegria ainda maior à sua torcida.
Isso pode ser chamado de falsa solidariedade com a África ou, se quiserem, sentimento de culpa pela pobreza dos outros. Mas, não importa: o que vale é ver a turma de Zimbábue feliz, ainda que só por um instante.
Do que mais se fala
De futebol; e de política. A coisa é tanta que, momentaneamente, o assunto mulher caiu para o terceiro lugar. Verdade que “mulher” está em terceiro, mas pegando rebarba em futebol que hoje ocupa o primeiro lugar. É que entre umas e outras “mulher” sempre aparece no discurso dos homens. Não é?
Pois está todo mundo correndo atrás de comparações entre as estratégias adotadas pelo técnico da Argentina – Maradona – e o do Brasil – o inimitável Dunga. Enquanto Maradona declara que, nas folgas, os seus jogadores poderão praticar sexo, beber vinho e comer churrasco, Dunga se sai com uma das suas. Assim falou Dunga:
- Nem todo mundo gosta de sexo, nem todo mundo gosta de tomar vinho ou de sorvete.
Ele disse isso se referindo ao que os jogadores da seleção brasileira poderão fazer nas suas folgas. Notem que se trata de uma declaração e tanto porque nos leva a supor que alguns dos valorosos craques da seleção nacional talvez sejam extraterrestres. Não que não seja possível a existência de gente que não aprecie sexo, vinho e outras boas coisas da vida. Convenhamos, porém, que esses rapazes estão, como se diz, na força do homem. Daí…
A colunista Barbara Gancia ataca o assunto na “Folha de São Paulo” de hoje e declara que vai torcer pela Argentina, seleção muito mais glamorosa. Não se pode concordar com extremismo de tal porte: torcer pelos arqui-rivais hermanos é simplesmente demais. Mas concordo que a cada dia vai ficando difícil torcer pela seleção brasileira. A verdade é que não está em formação a tal “corrente pra frente” e Dunga surge à frente da seleção como aqueles monges radicais de certos filmes que correm o risco de levar seus seguidores a um grande desastre.
Não vou torcer pelo Brasil, pela primeira vez na minha vida. Conservo bem vivas na memória as imagens de descaso da seleção de 2006 que mais parecia ilhada nas presunções pessoais dos jogadores, naquela época assemelhando-se a mercenários contratados, a peso de ouro, para uma missão que absolutamente não interessava a eles. Pois a isso se soma, agora, a “Era Dunga” que, cá entre nós, é demais para qualquer um.
Bem, torcer pela Argentina nem pensar. Em assim sendo escolhi uma seleção que me pareceu simpática e cuja vitória se revestiria de grande importância para o seu país: a seleção da África do Sul. Cheguei a essa conclusão após assistir ao filme “Invictus” dirigido pelo Clint Eastwood. Em “Invictus” Eastwood recompõe o período inicial do governo de Nelson Mandela na África do Sul. Recém saído do regime de apartheid - e estando muito vivo do ódio inter-racial - tinha Mandela a difícil missão de unir o seu povo. A saída encontrada pelo então presidente foi justamente a união do país através do rúgbi, esporte nacional da África do Sul. Grande filme, grande diretor, excelentes atuações de atores destacando-se Morgan Freeman no papel de Nelson Mandela.
Foi a partir de “Invictus” que escolhi a África do Sul como a minha seleção na Copa. Continuo firme na minha decisão de não mais torcer pelo Brasil. Entretanto, confesso que tenho receio de alguma recaída. Como ficarei quando a seleção entrar em campo? Será que naquela hora suprema, hora entre tantas nas quais nas nossas cabeças se passam os filmes das participações do Brasil em todas as Copas, as grande vitórias, as derrotas que tanto nos abalaram, será que naquela maldita e bendita hora conseguirei ficar indiferente?
Quem sabe, não?
Que nada. Avante África do Sul!
A Trilogia Dunga
Já vimos “A Identidade Dunga” manifesta em entrevistas – algumas infelizmente lamentáveis - e atitudes. No momento assistimos ao segundo filme da série cujo título é “A Supremacia Dunga”. O roteiro não foge ao esperado: do alto comando do técnico da seleção brasileira emanam decisões como a da reclusão dos atletas, entrevistas apenas com porta-vozes ensaiados, restrições ao acesso do público e imprensa, enfim tudo o que é preciso a quem se prepara para enfrentar uma guerra.
Estamos diante de um curioso caso de retrocesso. À divulgada anarquia que cercou a passagem da seleção na Copa de 2006, parte-se para a linha dura da qual participam principalmente eleitos obedientes. Agora a prioridade nem sempre anda de braços com o talento: dá-se preferência aos mais aplicados. É o imperativo do funcionalismo público no futebol com premiação dos mais cumpridores.
Tudo isso indica que sociólogos e afins precisam trabalhar mais a realidade do país. Um novo painel de atitudes começa a vigorar em vários setores, destacando-se a política e o futebol. Novas regras são ditadas à luz do dia, muitas vezes contrapondo-se a leis. O presidente da República insurge-se contra as leis eleitorais e é seguidamente advertido sem que isso tenha maior repercussão. O técnico da seleção propõe normas arcaicas e parece não importar a ele a desaprovação da imensa torcida brasileira.
Sobre o país de Lula e Dunga pairam novas e desconcertantes luzes. Será assim aquilo a que chamamos de futuro? Deixando de lado a política, a ver o que sucederá no futebol. A Copa está aí e a sorte de Dunga foi lançada. Sem cintura como é o técnico cobrará empenho e vitória, ciente de que deixou para trás o talento de novos jogadores em ascensão, talvez porque falte a eles alguma evangelização.
Copa iniciada será hora do fim da trilogia com o filme “Ultimato Dunga”. O enredo? Ah, só no decorrer da Copa saberemos.
Pobre imensa torcida apaixonada pelo futebol! Mas não duvideis, ó incautos: de repente até pode dar certo porque o país atravessa maré de boa e parece ter força para resistir a tudo.
A fala de Dunga
Em meados dos anos 70, vigorando a ditadura, fui a Belo Horizonte para assistir ao jogo final do Campeonato Brasileiro entre o Atlético-MG e o São Paulo. No avião cruzei com radialistas, repórteres esportivos e homens de televisão: todos eles previam uma vitória fácil do Atlético, mais time, melhor campanha e assim por diante. De fato o Atlético tinha uma equipe invejável na qual despontavam jogadores como Toninho Cerezo e Reinaldo.
Foi a primeira vez que tive oportunidade de presenciar a trepidação de quase toda uma cidade em torno de um jogo de futebol. Belo Horizonte era quase toda ela alvinegra. Bandeiras e camisas do Atlético estavam por toda parte e não se falava noutra coisa que não o jogo do dia seguinte. Vitória certa, festa preparada, os atleticanos deliciavam-se com antecedência, saboreando um título que, supunham, jamais lhes escaparia.
Na noite que antecedeu o jogo fui jantar com amigos mineiros, gente boa e torcedores fanáticos do Atlético. No restaurante realizava-se verdadeira festa com vozerio muito alto, às vezes entrecortado pela vibração coletiva aos gritos de “Atléticooooo”. Foi durante esse jantar que ouvi de um dos amigos, engenheiro na época trabalhando numa estatal, um comentário ao qual preferi silenciar. Falando de si mesmo e suas realizações o amigo emitiu a seguinte opinião sobre o governo e o país de então:
- Veja bem, sou favorável a esse governo que aí está. Antes dos militares o Brasil era uma bagunça. Eu estudei e me formei durante esse governo e consegui emprego numa estatal. Eu me sinto devedor ao governo que me proporcionou essas oportunidades. É o melhor governo que poderíamos ter.
Sem negar realizações dos governos militares, na época estávamos sob a vigência da ditadura. Os tais “anos de chumbo” eram peso muito grande dado o cerceamento de liberdades individuais, torturas etc. Aliás, o melhor mesmo era não tocar em assuntos de natureza política. Assim, nada disse ao amigo em relação à sua afirmação. Mas nunca me esqueci do que ele disse e vida afora julguei ter ele perdido excelente oportunidade de ficar quieto.
Lembrei-me do meu amigo e de sua fala ao ler as declarações de Dunga, o atual técnico da Seleção Brasileira. Em entrevista concedida logo após a divulgação dos nomes dos jogadores convocados para a Copa de 2010, Dunga deu-se ao desfrute de dizer coisas sobre assuntos fora de sua área de atuação. Dizendo que não poderia opinar sobre a ditadura e a escravidão justificou-se o técnico:
- Quem esteve lá, quem sofreu, esse sim pode dar opinião. Eu não posso dizer que a ditadura era boa, ou ruim (se) eu quero que volte. Só quem viveu é que pode nos dar a resposta. É a mesma coisa que eu falar sobre a época da escravidão, eu não vivi, como é que eu vou dizer, ah era ruim, era bom, não sei.
Eis aí outro caso em que uma pessoa perdeu excelente oportunidade de ficar calada. Não que se espere muito do técnico, mas…
Ah, ia me esquecendo: o jogo. A partida final foi realizada num domingo, 05/03/1978. Decidia-se o título brasileiro de 1977. No tempo normal houve o empate por 0X0. O jogo foi decidido através de cobranças de pênaltis, cabendo a vitória ao São Paulo que, na ocasião, sagrou-se campeão brasileiro.
A convocação da seleção
Aproxima-se a convocação dos jogadores brasileiros que participarão da Copa do Mundo de 2010. Como em épocas anteriores há um frenesi em torno dos nomes que sairão da cabeça do técnico Dunga. A coisa chega ao ponto de se refazerem os passos de Dunga ao longo de sua vida com o intuito de entender porque ele é do jeito que é. Ontem, um jornal de São Paulo publicou extensa matéria sobre o técnico, abarcando desde o seu nascimento em Ijuí até os dias de hoje.
Não se discute o fato de que o futebol é paixão nacional. Mais que isso, a seleção ainda retém certa fantasia de nacionalismo caboclo que chega até ser bem-vinda nesses despersonalizados tempos de globalização e dissolução de fronteiras. Nada pode unir tanto os brasileiros quanto os tais noventa minutos em que a “seleção canarinho do Brasil” entra em campo para combater antigos ranços de inferioridade que hoje, graças a Deus, estão sendo abandonados.
O fato é que a torcida brasileira ainda está doída pelo resultado da última Copa. Se os sentimentos nacionais mantiveram-se intactos o mesmo não aconteceu com a nova geração de jogadores hoje intercionalizados e quiçá desenraizados. Trata-se de pessoas que ganham muito dinheiro jogando em clubes estrangeiros, profissionais demais para o gosto popular. Por vezes eles são tão profissionais que se esquecem do verdadeiro profissionalismo, aquele ligado à representação social do esporte que praticam.
Mas, está chegando a hora da convocação. Quem serão os craques que desta vez defenderão o Brasil? Quem serão os soldados escolhidos para mais essa campanha imarcescível em que as nossas cores estarão em confronto com antigos rivais?
É aí que entra o técnico Dunga, aquele que é como é segundo se diz. Mas, o que não se pode olvidar numa hora dessas é que Dunga, mais que tudo, é técnico e sabemos que essa estirpe tem por norma não agir em acordo com aquela que pode ser considerada a opinião nacional. Quem não se lembra de Claúdio Coutinho, do Lazaroni, do Parreira e tantos outros que permaneceram surdos à opinião geral da torcida brasileira?
Pois Dunga está a um passo de escolher o seu partido: ficar entre os técnicos que ouvem ou os que não ouvem. O país clama pela presença de Ganso e Neymar na seleção, mas Dunga, talvez fazendo-se de mais importante do que já é no momento, não dá nenhum sinal de que cederá nesse sentido. Aliá, a opinião dele é que não seria justo deixar de lado os que concorreram para que o Brasil atingisse o atual estágio em que está; não seria justo ignorar o esforço dos jogadores que classificaram o Brasil.
Futebol é momento, instante de quem está jogando bem. O máximo que podemos desejar é bons sonos a Dunga, clareza nas suas interpretações, menos dureza. Quem sabe ele ouve a multidão e dessa vez o Brasil sai daqui com o time que o povo quer.
Os melhores do mundo
Lionel Messi e Marta são os melhores do mundo no futebol. Marta é unanimidade: nenhuma mulher neste vasto mundo joga bola como ela, daí receber o prêmio pela quarta vez consecutiva. Messi é grande no Barcelona, mas deixa a desejar quando veste a camisa da seleção argentina. Não se trata de opinião isolada: a maioria dos torcedores argentinos parece concordar com isso e cobra de Messi mais empenho e melhores atuações pela seleção.
Quem acompanha o futebol sabe que há jogadores de clube e jogadores de seleção. Outros atuam do mesmo modo em clubes e selecionados. A história do futebol é rica em casos de jogadores que atuam bem em clubes, mas não na seleção e vice-versa. No Brasil há casos de craques que eram reservas em seus clubes, mas titulares da seleção brasileira, pelo menos durante alguns períodos.
Ser o melhor do mundo no futebol deve ser complicado tal a cobrança gerada pela alta posição conquistada. Se por um lado o prêmio recompensa o esforço e conquista do atleta, por outro não existe nada mais efêmero que o título recebido. De fato, futebol é paixão e paixões podem fugir ao controle. Uma sequência de derrotas e um só grande erro de um ídolo podem mudar a opinião da torcida. Fica o prêmio, vai a fama ou, pelo menos, a boa fama é substituída pela ruim. Lembram-se do Roberto Baggio? O grande jogador italiano foi considerado o melhor da FIFA,em 1993. Pois até hoje a televisão mostra a imagem de Baggio errando o pênalti no jogo final da Copa do Mundo de 1994, dando o título mundial ao Brasil.
Futebol é jogo coletivo de modo que os melhores do mundo sempre devem, ainda que um pouco, aos seus companheiros de equipe. Não é como no boxe, esporte do eu sozinho cujos resultados dependem apenas do desempenho do lutador dentro dos ringues. Um campeão mundial de boxe chega ao título sozinho, excluindo-se o esforço de treinadores etc. Mas dentro do ringue é ele, só ele.
No futebol a discordância alimenta as paixões, gerando discussões nem sempre resolvidas. Ontem o jogador Cristiano Ronaldo recebeu prêmio por ter feito o mais bonito gol de 2009. O gol mais bonito tem que ser também importante: o de Cristiano Ronaldo serviu à classificação de seu time. Foi de fato um golaço, mas seguramente não o mais belo. Viram? Ai está estabelecida a divergência de opiniões. Quem duvida que reveja aquele gol do Nilmar contra o Corinthians bem no começo do Campeonato Nacional deste ano. Gol belíssimo. Ou não?
Assim é o futebol. Você se aborrece com o seu time, sofre com as derrotas, não acredita que um título tenha escapado por tão pouco. Então jura que chega disso, não vai mais acompanhar jogos, nenhuma força do mundo fará com que você ligue a televisão para assistir a jogos. Ir a estádios então…
Isso dura até que um novo campeonato começa. Você nem quer saber, mas de repente o seu time dispara na frente, desta vez vai dar e você resolve dar só uma olhadinha nuns dez minutos de um jogo para ver como os garotos estão jogando. Pronto. Isso é a mesma coisa que fumar só um cigarrinho após ter largado o vício: começa tudo de novo, os dez minutos viram noventa de alegria e sofrimento, aí está você com o coração aos saltos, olhando fixamente para a telinha, pulando, gritando, xingando, mostrando aquilo que você nunca deixou de ser: um torcedor.
Vida longa aos melhores do mundo.
Vida longa a essa maravilha que se chama futebol.
Domingo
O dia começa sob intenso calor. Na fila da padaria um homem fala sobre a explosão demográfica prevista para o litoral, devida à descoberta do pré-sal. A Petrobrás vai ocupando espaços, o governo do Estado projeta obras, o mundo junto ao mar parece encolher-se diante disso que chamam de progresso.
Alguém se anima a dizer que tudo isso é muito bom, novos empregos serão gerados na região. Um senhor, idoso e provavelmente aposentado, interfere dizendo que já viu esse filme antes, no fim as grandes corporações ganham e para o bolso do cidadão comum nada.
Não deixa de ser interessante ouvir o que dizem as pessoas na rua. O jornaleiro da esquina, um sujeito meio fechado, de uns tempos para cá deu de puxar conversa. É louco por futebol, santista roxo e não gostou muito da candidatura de última hora do Teixeira para presidente do Santos. Para ele está na hora de mudar, gastar mais dinheiro com o time que com comissão técnica. O Luxemburgo… e por aí vai.
O porteiro do prédio onde moro é corintiano até o pescoço e tem um radinho de pilha sempre ligado em programas esportivos. Ele reclama dos cariocas que sempre mandaram em tudo e ainda hoje comandam o futebol.
- Pode? – pergunta ele.
A opinião do porteiro é a de que o detestável São Paulo – ele não gosta do tricolor – está sendo vítima de uma armação carioca. Um morador, homem de mais de 70 anos, ouve o porteiro e acrescenta:
- Isso não tem jeito. Carioca manda. Não lembra da seleção de 50? O técnico era o Flávio Costa. Ele escalou para a ponta esquerda o Chico que era parente dele. Enquanto isso, aqui em São Paulo, o Teixerinha comia a bola. E o Brasil perdeu, com Zizinho e tudo.
Deixo os homens falando, esperando não encontrar ninguém no elevador. Quando a porta se abre, surge o português do quinto andar que vive às turras com a irmã dele. A razão ele me contou outro dia, pedindo segredo: ela pinta quadros, gasta um dinheirão com tintas e não vende nenhum.
Passo pelo quinto andar imaginado um apartamento cheio de quadros e uma pintora empenhada em retratar o mundo para ninguém ver. Penso que numa de suas telas estará o irmão, com sua grande barriga, dedo em riste gritando: chega de quadros.
Depois disso não sei dizer o que mais acontece. É domingo, faz muito calor, de vez em quando cai uma chuva de verão que passa depressa e as pessoas continuam andando por aí, dizendo coisas, aplaudindo, reclamando, relembrando, amando, odiando, mostrando-se simplesmente humanas.
Tango
Quase dez da noite de domingo e não se encontram táxis nas ruas de Buenos Aires porque o Boca está jogando e os condutores estão em casa vendo o jogo pela televisão. Para todo lado o que se ouve é Boca, Boca, Booocaaa. Os argentinos são apaixonados por futebol tanto quanto os brasileiros. O principal jornal esportivo, o “Olé”, ainda não perdeu a mania de dar pauladas nos brasileiros embora - fazendo justiça a eles - reconheçam a força e o valor dos adversários. Há na Argentina o respeito pela arte, daí que os grandes jogadores são considerados independentemente das suas nacionalidades.
Na porta do Café Tortoni, o mais antigo da cidade, está a fila de sempre, com pessoas esperando a vez para entrar. O Tortoni é um espaço emblemático frequentado no passado por Carlos Gardel, Luigi Pirandello, Federico García Lorca e Artur Rubinstein entre outros artistas, Os que vêm para o espetáculo de tango não precisam entrar na fila, basta apresentar o ingresso comprado com antecedência para que um rapaz os acompanhe até a sala Alfonsina Storni.
São pouco mais de dez da noite quando o maestro Jorge Rattoni entra no palco com o seu quarteto e abre a noite com um tango de Gardel. A coreografia do espetáculo difere de outros shows de tango mais estilizados e com a participação de vários dançarinos. Aqui a trupe se reduz a um casal que, de vez em quando, vem ao palco para dançar enquanto o quarteto executa um de seus números.
A temperatura musical esquenta depressa com a sucessão de tangos conhecidos, executados em estilo puro e original. Rattoni esmera-se ao piano impondo o ritmo que é seguido pelos instrumentistas do bandoneon, do baixo e do violino. Depois de três números do quarteto, finalmente aparece o “cantante”, com sua poderosa voz interpretando músicas como “Por uma cabeza”.
O grande momento do espetáculo é reservado para a execução de “Adiós Nonino” de Astor Piazzola. É quando o bandoneón cresce em sua execução trazendo ao público imagens ligadas à perda do pai que levou Piazzola a compor a música. Ao final de “Adiós Nonino” o público aplaude longamente e Rattoni agradece em nome do grupo.
O show dura pouco mais de uma hora. Quando termina fica a sensação de que deveria continuar, ainda que só um pouco mais.
No fim, Rattoni está perto do balcão, junto à entrada da sala Alfonsina. É um homem de estatura média, cabelos e barba muito brancos, que transpira bondade. Aproximo-me dele e pergunto sobre a sua formação clássica. Ele me diz que de fato a sua formação é clássica, mas que derivou para o tango, sua paixão. Falamos sobre música e ele me diz que gosta muito da brasileira. Pergunto a ele se toca em outros lugares. Ele sorri dizendo que há treze anos apresenta-se exclusivamente na sala Alfonsina do Café Tortoni. Gosta de sala pequena, intimista e rica em histórias ligadas ao tango.
A conversa termina quando um homem traz um CD para Rattoni autografar. Despedimo-nos com um abraço e sinto que levarei um pouco de tango na mala de viagem em meu retorno ao Brasil.
Findo o espetáculo, encontro a Avenida de Mayo praticamente vazia. Na porta do Tortoni há táxis esperando por fregueses. O jogo da Boca terminou e os táxis voltaram às ruas. O mundo parece normal quando passo perto do Obelisco, lembrando-me da execução de “La Cumparsita” e de meus pais dançando na sala de nossa antiga casa, eles que amavam tanto o tango, tão bonitos dançando, dançando eternamente.
Uruguai X Argentina
Cinco da tarde. Onde eu gostaria de estar agora? Ora, Montevidéu, naturalmente. Acontece que o clima que precede os grandes jogos é mágico, feito para ser vivido e bem aproveitado. Dá para sentir daqui o desespero da torcida argentina invadindo o Uruguai; do mesmo modo não é impossível respirar-se o ar de necessidade de vitória que rola entre os uruguaios.
Futebol tem disso: consegue catalisar a emoção de um povo inteiro, estabelecendo entre as pessoas um laço de unidade que nenhuma outra manifestação logra realizar. Estão, pois, os uruguaios em pé de guerra, atrás de uma classificação que, preferencialmente, desclassifique a Argentina.
Imagino o clima de agora nas ruas de Montevidéu; imagino milhares de pessoas que já se deslocam para o velho estádio Centenário, palco de tantas glórias do pequeno país do Sul; e imagino Buenos Aires, tão cosmopolita, com o orgulho de sua seleção nacional abalado pelos péssimos resultados que têm conseguido.
Quem vai ganhar? Guerra é guerra, não adianta especular. Se tivesse que apostar num bolão, não saberia que placar colocar. Mas não preciso mentir que a minha preferência pende para o lado do Uruguai. Aliás, creio que não só a minha, mas a de todo mundo por aqui de vez que, no futebol, a Argentina é a nossa maior rival.
Também não adianta mentir sobre o fato de que se a Argentina não for classificada para a próxima Copa do Mundo haverá muita alegria entre os brasileiros. E comemorações.
A hora do grande e decisivo jogo se aproxima. Que vença o melhor? Ah, sim, desde que seja a equipe que veste a camisa da Celeste Olímpica.