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30 de dezembro
Um pombo voando baixo, estradas apinhadas, notícia de um afogado, mulheres fazendo comida. A geladeira que ameaça implodir, tantas as garrafas para serem tomadas num gole contínuo, único, universal.
E os fogos. Bombas de todo tipo, estopins, rojões, morteiros.
O mundo se prepara para a virada. O telefone toca, são amigos que convidam para a ceia juntos, veremos a queima de fogos na praia, depois comeremos e beberemos juntos. Ah, sim, os abraços, as felicitações, os embebedados desejos de muitas felicidades, aquela moça que olha comprido, mas não se decide porque não pode se decidir.
A atmosfera da véspera só se abala com a previsão de que talvez possa chover só um pouquinho, não na hora dos fogos, por favor. É verão. Praias lotadas, carros sem estacionamento, falta de víveres, bandidos roubando porque bandido é bandido até na véspera, também na virada.
No meio disso tudo um desejo mal expresso de solidão, de quietude, de veneração pelo ano vindouro, de agradecimento ao que termina, por que não? Afinal estamos e estaremos vivos, exceto se algo excepcional impedir que as rotinas da vida e da virada sejam alteradas.
Quero ver os fogos, desde menino luzes no céu me fascinaram. Amo os brilhos efêmeros, os grandes ruídos que cessam de repente, o encantamento que atordoa, o vazio do depois da festa, as pessoas que voltam para casa, passo a passo nas ruas, deixando a orla, retornando devagar à realidade.
Amo e detesto as comemorações impostas, as pessoas que pouco me dizem, a fraternidade de só um minuto, as lágrimas que secam depressa, os abraços que não se completam, os desejos não consumados.
Quero flores brancas e amarelas, foguetes, perfumes, esquecer-me e lembrara-me, viver, simplesmente.