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O homem-bomba

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Há um poema sobre o homem que acorda de manhã do dia em que vai morrer. Não me lembro de quem o escreveu e vez ou outra tento encontrá-lo. Para o homem que vai morrer escapa a possibilidade do fim da vida naquele dia de modo que ele segue normalmente sua rotina diária.

A rotina diária! Escovar os dentes, fazer a barba, um banho, pentear os cabelos, sentar-se para o apressado café da manhã porque lá fora o mundo o espera. Nada indica que, entretanto, cada coisa está sendo feita pela última vez. Nenhuma suspeita de que em cada gesto há uma desinteressada despedida, talvez o beijo na face da mulher que o acompanha à porta já não tenha o mesmo calor.

As circunstâncias da morte não importam. O homem da foice escolherá o momento, quem sabe no trajeto de casa até o serviço, talvez um acidente, pode mesmo acontecer por meio de uma traição do coração. Mas, não o seu, não? Não este coração que bate aí no seu peito, rítmico, organizado, trabalhando duro nas 24 horas do dia para mantê-lo vivo.

Em algum momento algo acontecerá e você será pego de surpresa, talvez nem mesmo tenha tempo para entender o que se passa. Dona Januária, vizinha da casa de minha mãe nos meus tempos de menino, dizia que entre este e o outro mundo existe uma corda que deve ser agarrada com força para facilitar a travessia. É fechar os olhos aqui e abri-los na mesma hora no outro lado, ensinava Dona Januária. Mas há que se agarrar bem à corda…

Mas, que dizer daqueles que escolhem o dia e a hora de morrer? Para esses a vida parece valer menos que a morte ou o último instante nada mais é que o início da travessia. Para onde foge o suicida? Mais simples saber-se sobre a razão da fuga porque àquele que se mata talvez pouco importe saber se existe algo depois da vida.

Entretanto, não há como compreender esse homem que se levanta de manhã para morrer por meio da explosão de bombas amarradas ao seu corpo. Esse homem que toma o café em sua última manhã no mundo e sai para uma missão sem retorno! Ele fará as bombas explodirem num lugar combinado, causando destruição e muitas mortes de pessoas ao acaso escolhidas. Será uma missão? Ou nada mais que a fé nascida de uma crença transcendental na qual tudo parece previsto, inclusive este último momento no qual as bombas são detonadas, estraçalhando em mil pedaços o corpo do homem ao qual estavam presas.

Um soldado do esquadrão antibombas aproxima-se de um homem amarrado cujo tórax está coberto por um colete com bombas.  Por algum motivo a explosão falhou e cabe ao soldado desativar os explosivos. Ele se aproxima do homem e corta os fios, eliminando o perigo.

É uma manhã como outra qualquer no Afeganistão. O homem-bomba é jovem e seus olhos nos miram estranhamente. Em pouco será levado para um campo de prisioneiros e sabe-se lá o que o futuro a ele reservará.

O homem-bomba falhou em sua missão. Dele ficou-nos essa foto de um ser humano trafegando perigosamente pela zona limítrofe, traído pelo olhar medroso dos que viram a morte de muito perto, mas escaparam milagrosamente sabe-se lá por qual razão.

Entretanto, talvez o homem-bomba que não morreu não tenha sido voluntário, mas forçado a se sacrificar. Hoje se divulga o caso de uma menina de 10 ou 11 anos forçada pelo Taleban a cometer um atentado suicida.  Consta que ela foi forçada pelo irmão a colocar o colete suicida para que explodisse em frente a um posto policial. Entretanto, no trajeto até o local onde ocorreria a explosão havia um rio que deveria ser atravessado. A menina não se julgou capaz da travessia, abortando o plano. Ao chegar a casa apanhou do pai por não ter completado a missão. Então fugiu e entregou-se à polícia. Vivinha da Silva.