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O dia dos namorados e a Copa
Provavelmente não exista situação mais esclarecedora das diferenças entre os gostos de homens e mulheres que o período de realização da Copa do Mundo. Ninguém é louco de dizer que mulheres não gostam de futebol, mas o interesse da maioria delas está longe do dos homens. Quem discorda que acompanhe a rotina nas casas brasileiras neste fim de semana em que se realizam vários jogos pela Copa do Mundo. Agora olhem para a lente da verdade e respondam: quem são os loucos que acordaram cedo, num sábado muito frio, para assistir ao terrível embate entre as seleções da Coréia do Sul e a da Grécia?
Pois é. Mas, para dar força à argumentação, pelo amor de Deus imaginem que hoje, dia dos namorados, o Brasil tivesse um jogo contra a Argentina, pela Copa do Mundo, justamente às 21h30. Como ficaria a situação dos casais, o movimento dos restaurantes, as baladas, os encontros marcados e tudo o mais? Já pensaram em quantas relações desfeitas poderia resultar um joguinho desses, bem nesta noite, contra os hermanos?
Há quem discorde, há quem discorde. Existe a turma do deixa disso para quem o brasileiro é um tipo inventivo e ajeitaria as coisas. Mas um joguinho desses, Brasil X Argentina, justamente na noite do dia dos namorados, convenhamos que fica difícil, muito difícil.
Por essas e outras devemos muito comemorar esta noite do dia dos namorados. Rapazes, vocês estão livres de qualquer pressão, não serão obrigados a fingir que o jogo é secundário, que em nenhuma hipótese vocês dividiriam a atenção para com as pessoas amadas, ainda mais por uma besteira como um jogo de futebol. Nem precisarão estar em algum lugar com elas, olhando para todo lado atrás de uma telinha com a transmissão do jogo. Portanto, comemorem porque o mundo é bom, a justiça existe e cada coisa tem a sua hora e está em seu lugar.
E não se esqueçam de amanhã de manhã, exatamente às 8h30, de perguntar a elas - caso estejam acordadas - se não querem ficar aos seus lados assistindo ao grande jogo entre a Argélia e a Eslovênia.
Perguntem. Será uma grande demonstração de amor se elas toparem.
Loucura de amor
Acontece a você, vez ou outra, não querer saber o fim de uma história? Não será você um desses caras que acompanha novelas só pelo prazer de não assistir aos últimos capítulos?
Pois existe no mundo gente que odeia epílogos ou escolhe viver situações que nunca terminam . Conheci um homem assim: alto, magro, barba rala, circunspecto, hermético, celibatário, sempre com um terno marrom, o mesmo terno que dava a impressão de ser lavado e passado diariamente.
Para mim esse homem veio do nada e no nada se perdeu. É desses que parecem ter-se convertido em simples memória, tão etéreo que questiono se ele realmente existiu ou foi criado pela minha imaginação.
Não me perguntem o nome do homem. Dele guardei poucas cenas, estanques, que começam e terminam no ambiente de uma sala ampla cujos detalhes físicos me escapam.
De onde veio o homem? Impossível saber. Sei que entrou no meu mundo de menino como um próximo de meu pai que, de vez em quando, ia visitá-lo e me levava junto. O tal morava numa casa, na entrada da pequena cidadela em que vivíamos. Tinha ares de oriundo de civilização mais avançada, condição que conferia ele algum status de superioridade.
Desse estranho homem guardei a confissão de que amara loucamente a uma mulher e, não correspondido, castrara-se. Isso é tudo que retive do discurso metódico dele. Não me lembro de mais nada, nem sei o que aconteceu a ele depois embora me pareça que o suicídio teria sido um final razoável para a sua vida. Mas, mesmo isso não passa de mera suposição.
Foi a partir daí que fiquei sabendo que o amor pode levar pessoas a atos extremos. Talvez essa afirmação sirva de epílogo a essa história sem fim e, a seu modo, explique tudo.
Resta a figura de meu pai. Ele está sentado numa cadeira de vime, defronte o homem que fala sobre a sua castração. Nessa cena não passo de um menino que se distrai com afazeres de criança. Ainda assim, tenho tempo para anotar um sorriso que se esboça, mas não se completa, no rosto de meu pai, sorriso maroto de quem mantém intacto o órgão, sorriso algo superior de macho inteiro que se eleva sobre a arrogância intelectual do homem castrado.