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Coisas para não pensar
O controle absoluto do pensamento é improvável ainda que certas doutrinas relacionadas à mente acenem com essa possibilidade. Talvez monges tibetanos, budistas e seguidores de outros credos alcancem avanços nesse campo. A imagem do jovem Siddhartha, mais tarde Buda, meditando é um convite ao isolamento das coisas terrenas, ao combate aos desejos que sempre trazem dor e a uma imersão em estados superiores do espírito. Cultivar a mente, praticar o bem e evitar o mal são os ensinamentos de Buda, úteis quando o que se pretende é atingir a paz interior que conduz à felicidade.
Mas como seguir essas diretrizes no convulso mundo de nosso dia-a-dia? Que fazer com o estresse inerente a toda sorte de atividades que começam pelas cada vez mais difíceis relações entre os seres humanos?
Sobre esse assunto conversei hoje de manhã com um homem bastante estranho, o Sábio que mora no terceiro andar. Primeiramente devo dizer que a figura do Sábio não é nada exemplar. Homem de pouco mais de quarenta anos de idade, o sábio veste-se de modo insólito: usa calça jeans e tênis acompanhados de uma bata indiana bastante colorida. No meio da testa traz sempre o bindi que, diz ele, simboliza a condição de pertencer a uma casta superior. Completam o quadro os longos cabelos desgrenhados e a barba muito comprida. Aspirante de oráculo é o que ele parece.
Na opinião do Sábio o mundo moderno é contraditório, daí abrigar o choque contínuo entre forças antagônicas. Explica ele que tremendas batalhas são travadas no terreno do invisível gerando-se energias avassaladoras que afetam a vida no planeta. Deriva do grande embate entre forças opostas o estresse do cotidiano. Trata-se de um fluir contínuo de energia que se propaga pelos corpos, imantando-os. Por essa razão, passam os corpos a atrair tudo o que está perto deles, inclusive outras formas de energia, negativas, provocando depressão e estresse.
Essas coisas o Sábio me disse, por vezes olhando para cima a apontando o dedo indicador para o Cosmos, fonte primária de todas as energias circulantes que afetam o comportamento humano.
Dado serem constantes e irreversíveis os fatos apresentados pelo Sábio compreendi que vivemos num planeta onde nada ou pouco podemos fazer no sentido de evitar o afluxo permanente das energias que atravessam os nossos corpos e impactam dramaticamente as nossas atitudes. Disse isso ao Sábio que sorriu e acusou-me de falta de conhecimento. Justamente - afirmou ele – é aí que entram os ensinamentos de Buda. É preciso deixar-se iluminar, buscar a luz – acrescentou.
A partir daí o Sábio estendeu-se sobre os mistérios do budismo. A conversa já ia longe quando dei um jeito de abreviar o encontro perguntando a ele sobre alguma forma prática de reduzir o estresse. Foi quando o Sábio me falou sobre as tais coisas em que não se deve pensar, coisas que nos aborrecem e que temos que evitar. Na prática trata-se de implantar um sinal de alerta no cérebro capaz de soar toda vez que uma sequência de pensamentos nos leve a um assunto que a todo custo deve ser barrado. Segundo o Sábio, com algum esforço pode-se bloquear uma rotina de pensamentos componentes de um contexto maior ao qual chegaremos caso não se evite a progressão deles. Os exemplos são vários e ligados a aborrecimentos cotidianos como contas a pagar, doenças, declaração do Imposto de Renda, atividades de políticos, desemprego, corrupção, violência etc. Nunca pensar nisso tudo reduz dramaticamente o estresse.
De nada me adiantou protestar que não pensar em nada disso representaria não fazer parte do mundo etc. Diante da minha incredulidade o Sábio disse:
- É por você ser como é que vive tão estressado. Evite e ignore compromissos. Procure a luz, ilumine-se. Só assim encontrará a paz e a felicidade.
Posto o que entrou no elevador e recolheu-se ao seu Nirvana, localizado no terceiro andar.