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Contra a malária
Meu tio, a quem conheci já velho, foi homem de vida agitada. Tinha ele um rosário de aventuras, todas marcadas pelo seu temperamento reconhecidamente intempestivo. De uma delas eu soube, certa noite, enquanto nos sentamos ao redor da mesa da cozinha e ele comia, uma após outra, meia-dúzia de bananas nanica.
Falou-me meu tio, naquela ocasião, sobre o terror provocado pela malária nas populações do interior. Note-se que meu tio sempre esteve ligado à área médica. Ele estudou medicina, no Rio de Janeiro, mas não chegou a concluir o curso: a quebra da Bolsa em 1929 teve reflexos sobre os negócios do café e meu tio teve que sair do Rio onde vivia com os proventos enviados pelo pai, fazendeiro de café no interior paulista que sucumbiu à crise. Sem dinheiro, meu tio mudou-se para Pindamonhangaba onde se formou na antiga Escola de Farmácia daquela cidade.
Meu tio me contou que durante pelo menos um ano viajou ele pelo interior, passando por cidades pequenas e ameaçadas pela malária, vendendo doses de quinino, o remédio de eleição no tratamento daquela doença. Refería-se ele, provavelmente, à década de 1940, época em que os chamados viajantes carregavam consigo os produtos que vendiam dado ainda inexistirem de forma mais ampla os serviços de entrega. É de se imaginar o horror das populações diante da possibilidade de adquirir doença gravíssima em lugares de raros ou mesmo inexistentes recursos médicos.
Nunca estive em áreas malarígenas, mas vi de perto várias pessoas com sintomas da doença, destacando-se os acessos febris dentro de intervalos de tempo determinados. Como se sabe, a malária ou impaludismo é doença causada por protozoários do gênero Plasmodium e transmitida pela picada de fêmeas infectadas de insetos do gênero Anopheles. No organismo humano os protozoários passam por um ciclo em que se dividem dentro das hemácias provocando o arrebentamento destas. Isso acontece a cada 48 ou 72 horas, de acordo com a espécie de Plamodium que tiver infectado o doente. As crises febris acontecem justamente nos momentos do ciclo em que as hemácias se arrebentam: o paciente treme muito, tem sensação de frio intenso, sudorese e a temperatura corporal atinge 40º C.
É importante destacar que a malária não é uma doença do passado. Sua estimativa é de 300 milhões de novos casos e 1 milhão de mortes por ano em todo o mundo. No Brasil a área endêmica situa-se na região amazônica. A maioria dos casos acontece na área rural embora existam casos (cerca de 15%) nas áreas urbanas.
Um mal tão grande e disseminado no mundo exige cuidados e pesquisas, sendo preocupação constante dos órgãos de saúde pública. Notícia recentemente publicada nos dá conta da descoberta de um modo de bloquear o faro do Anopheles. Isso é muito importante dado que o inseto fareja as suas vítimas fazendo uso de suas antenas. O bloqueio do faro do inseto é um grande passo para a produção de um repelente específico. Com isso o inseto não mais reconheceria o cheiro das pessoas e deixaria de picá-las.
De todo modo eis aí uma nova esperança que aliada às conhecidas medidas utilizadas para a erradicação do inseto e aos clássicos tratamentos para a malária, talvez façam reduzir o espantoso número de casos da doença em todo o mundo.