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Os 500 anos de João Calvino
Assisti a uma missa de sétimo dia e fiquei impressionado com os rumos da celebração. Vieram-me imagens do barroco de Minas Gerais e a perseverança da antiga liturgia no interior daquele Estado. Quem duvida que vá a São João Del Rei e assista a missas na Igreja do Carmo ou na de São Francisco de Assis. Terá a impressão de que nada mudou, falta o latim, mas tudo se realiza em acordo com os velhos cerimoniais. Muito diferente de hoje quando a necessidade de atrair fiéis ou não perdê-los aproximou as cerimônias católicas dos rituais de outras igrejas e religiões.
Voltei para casa pensando na contra-reforma católica que nos rendeu a exuberância das igrejas de Minas. Representou ela a reação à reforma protestante de Martinho Lutero (1483-1546). Lutero cobrava mais moralidade dentro do cristianismo. Rebelava-se contra a venda de indulgências para a construção da Basílica de São Pedro – elas serviriam para livrar os fiéis das penas do purgatório. Para ele a Igreja Católica corrompera-se e passara a manipular o problema do pecado. O papa vendia bênçãos, instituía favorecimentos para oferecer o perdão. Vendendo-se indulgências subornava-se Deus. Em outras palavras: a salvação poderia ser adquirida. Lutero propunha que a natureza pecaminosa do homem só pode ser redimida pela fé e não pela compra do perdão.
De Lutero a João Calvino (1509-1564). Calvino acreditava que a humanidade se perdera pelo pecado original, daí todos os humanos merecerem a condenação. Mais que isso: Deus predestinara ao pecado alguns homens enquanto outros foram destinados por Ele à salvação. De nada valeriam em termos de salvação, portanto, os esforços para o bem, as boas obras etc: Deus determinara antes o destino de cada um e ponto final. Eram sinais do favor de Deus aos seus eleitos uma vida materialmente próspera, com preponderância do trabalho e sem ostentações materiais. Calvino recomendava austeridade. O seu elogio ao trabalho e à economia foram, segundo o sociólogo Max Weber, as razões da simpatia da burguesia européia pelo calvinismo.
Agora estão sendo comemorados 500 anos do nascimento do reformador francês. E o calvinismo sobrevive justamente pelas suas recomendações ao trabalho e à economia. Isso é o se lê no jornal espanhol “El País” em sua edição de 18 de julho. Segundo o jornal, o primeiro-ministro da Holanda, Jan Peter Balkenende, calvinista, como também seu ministro das Finanças, o social-democrata Wouter Bos, e o ministro da Família e da Juventude, André Rouvoet -, o triunvirato que hoje governa em coalizão – apelaram para a austeridade como meio de resolver a crise econômica mundial.
O apelo do primeiro-ministro foi feito na homenagem aos 500 anos de Calvino. Segundo o político holandês a atual crise mundial é moral, foi provocada por fatores como a ganância e a preocupação com o dinheiro. Comportamentos distantes, portanto da recomendação calvinista de utilizar a liberdade individual em prol do bem-estar comum, deixando de lado as ostentações materiais.
Como se vê o calvinismo sobrevive 500 anos depois embora não diretamente ligado à religião, mas à necessidade de atitudes que se revertam em favor da humanidade. Isso quer dizer que a palavra chave para a solução dos muitos problemas que temos presenciado é austeridade.