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Quando tudo e nada acontece
Você olha para a cerca de cedro que separa a sua casa da rua. Você observa os buracos por onde entram os vira-latas. Eles rasgam os sacos de lixo e espalham os restos sobre a grama verde queimada pela geada. Malditos vira-latas, maldito você que não ouviu o velho. Você plantou o cedro, cada muda distante um metro da outra. O velho viu e disse: o certo é uma muda a cada meio metro, senão vai ter buraco.
São passados trinta anos desde essa tarde de plantio de mudas e velho falando sobre espaços entre elas. O velho morreu, os buracos estão aí, esperando que você morra para que os vira-latas possam entrar em paz.
Não existe lugar no mundo melhor que as pequenas cidades para que se possa constatar a brevidade da vida. Num lugarejo você conhece todo mundo, tem nas mãos o pulso de uma geração. Você convive com as pessoas que depois de um longo tempo desaparecem. Então você anda pelas ruas e encontra gente que não conhece. Nos lugarejos o vazio torna-se mais presente, impositivo. Você também sabe que não muito longe fará parte do vazio da memória de alguém, mas isso não serve de conforto.
Novos homens virão, com cercas de cedro, buracos e vira-latas passando por eles. Mas, você não verá nada disso porque terá desaparecido, suavemente, como aconteceu e acontece a todo mundo.