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Sob o domínio da morte
Nossa familiaridade com a morte aumenta de modo preocupante. Recebemos com naturalidade notícias sobre chacinas como se não tivessem nada a ver conosco. No fundo fingimos que não nos importamos. O mecanismo de defesa se impõe até para evitar crises depressivas. Porque não há como não fugir à depressão ao encarar de frente a morte de dezenas de pessoas sacrificadas pelos motivos mais vis. Mortes e mortes, chacinas absurdas se repetem como se isso fosse coisa normal, parte de um enredo fantástico e irreal.
Mas, a vida não é um filme. Aliás, nem mesmo o mais imaginativo diretor de cinema conseguiria se aproximar da realização das cenas de horror observadas nas penitenciárias do país. Impossível reproduzir o horror do homem acuado que espera ser degolado e seu corpo desmembrado como se nada mais fosse que um boneco. No mundo dos prisioneiros os homens são tratados como bonecos expostos aos desígnios de facções criminosas que se digladiam pelo poder.
Daí que o melhor é olhar para as fotos de cenas medonhas que correm pela internet e toma-las por irreais, peças fabricadas que não pertencem à realidade em que vivemos. Aconteceu, mas não pode ter acontecido eis a questão para a qual não há solução.
As mulheres que choram do lado de fora dos presídios. Terão seus entes queridos sido poupados? Aquela cabeça que um presidiário exibe como troféu não pertencerá ela a alguém amado por outro alguém que em desespero espera?
Quanta dor. As redes televisivas transmitem as imagens da tragédia justificando-se pelo dever de informar. A mídia em todo o mundo não esconde o espanto diante das tragédias que o presidente da República classifica como “acidentes”. Organizações de direitos humanos protestam. Governos federal e estaduais negam suas parcelas de culpa. O transe do horror afugenta culpados que se escondem sob as mais variadas desculpas.
Resta-nos desligar televisores e rádios, não ler jornais e revistas. Ignorar os noticiários. Fingir que a vida é sempre bela. Mas, que ninguém se engane: é a caveira portando sua macabra foice quem agora está no comando, acima das vontades dos homens. Estamos sob o domínio da morte.