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Cigarros
Gosto de contar como larguei dos cigarros. Pra começar cigarro é um tipo de casamento que se faz sem pensar e, depois, dá no que dá. Bem, fui fumante inveterado. Aliás, corrigindo: sou fumante, mas não fumo.
Hoje em dia as campanhas contrárias ao fumo e as proibições quanto aos lugares onde se pode dar uma tragada têm contribuído para a redução do número de fumantes. Não era assim anos atrás. Todo mundo fumava e em qualquer lugar, até dentro de aviões. Certa vez vim dos EUA num voo, sentado no meio de dois fumantes…. Já deixara de fumar na época daí o sufoco a que fui submetido em meio à fumaceira. Até que pedi aos dois americanos que me fizessem a gentileza de se alternarem no acendimento de cigarros. Foram corteses, entenderam o meu drama, e passaram ao um de cada vez.
Mas, fumava-se muito. Não havia como terminar um café sem logo acender um cigarrinho. Fui atendido por médico, dentro de seu consultório, com o cigarro dele aceso no cinzeiro. Nos tempos de faculdade o cigarro era companheiro de toda hora. Qualquer intervalo servia para se fumar o cigarrinho que a garganta pedia com urgência. Olhe que fumávamos dos mais baratos, sabem como é a vida e a dureza da estudantada. Aquelas marcas de sem filtro, tipo Mistura Fina, Saratoga e outros eram muito populares.
Foi assim que cheguei aos três maços por dia. Até que comecei a não me sentir bem. Então um médico me avisou de que eu entrara na perigosa rota dos problemas cardíacos e pulmonares. Demorei para incorporar a ideia. Até o dia em que, depois dos três maços, fui a uma festa que avançou a madrugada e consumi o quarto maço.
Na manhã seguinte, logo que abri os olhos, bati a mão no criado ao lado da cama, procurando o maço. Peguei um Malboro e coloquei o danado na boca. Ardeu. Os lábios estavam queimados. Nesse momento tive uma iluminação: só fumaria após o almoço. Depois de almoçar adiei o meu projeto: só fumaria ao anoitecer.
Quando a noite surgiu saí, fui à padaria e comprei um pacote cujos maços distribui em vários cômodos de minha casa. Não sabia ainda, mas estava declarando guerra ao cigarro. Era preciso tê-lo frente a frente, desfiando-me. Se não tivesse cigarros em casa, ficaria desesperado. Mas, com eles ao alcance da mão a história tornara-se mesmo guerra.
Foi assim. No terceiro dia levei um susto e reagi dando um murro no vidro de um armário. Entendi que nicotina e cocaína são próximos em matéria de vício. Mão sangrando jurei que não fumaria mais. Desde então são passados mais de vinte anos.
Certa vez presenciei um homem de idade num leito hospitalar, respirando com dificuldade dentro de uma tenda de oxigênio. Fumante inveterado dera-se mal. Ao me ver fez sinal para que me aproximasse dele. Então pediu-me um cigarro. Queria o último, ciente de que iria morrer o que acabou acontecendo dois dias depois.
Meu pai fumava muito. Pressão alta, problemas cardíacos e pulmonares faziam-no sofrer. Num fim-de-semana em que fui visita-lo avisou-me de que, naquela manhã, decidira parar de fumar. Fumara desde os tempos de moleque, tinha 74 anos de idade e justamente agora se decidira a abandonar o maldito. Decisão tardia, morreu dois dias depois.
Fumantes em geral tentam largar o cigarro com recaídas. Considero-me fumante que não fuma porque sei que se fumar um cigarro agora, só um, torno ao vício.
Na moda o cigarro eletrônico que, supõe-se, não cause tantos danos à saúde. Mas, infelizmente, não se trata de produto inócuo. Os cigarros eletrônicos contêm substâncias cancerígenas e aditivos cujos efeitos não são bem conhecidos. De fato, são menos perniciosos que os cigarros comuns, mas perigosos. Além do que surgem como entrave às campanhas contra o tabagismo, levando jovens a fumá-los sob o pretexto de serem totalmente inócuos.