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As novas histórias de medo
Meu tio-avô era um sujeito espigado e muito falante. Vinha ele das beiradas do Estado de Minas que percorreu em lombo de cavalo. Mais que cavaleiro, meu tio-avô assemelhava-se a um tropeiro.
Homens assim vivem noutra dimensão, numa região de serras, campos e matas. Eles dormem nas beiras das estradas poeirentas, isso quando não se aboletam num cômodo qualquer da casa de um fazendeiro amigo. Nesse mundo vigoram relações fortes, sejam de amizade ou ódios que jamais cessam. Em meio a encontros e desencontros existe sempre o revólver na cintura ou bem guardado num surrado embornal. Pode acontecer que a arma de fogo permaneça quieta durante muito tempo ou nunca seja usada. Entretanto, o que importa é o fato de ela estar presente, fazer parte de um leque de possibilidades dentre as quais a morte surge como variante bastante lógica.
Homens da estirpe do meu tio-avô viram de tudo e trazem consigo um tipo de sabedoria que só a experiência pode conferir. Tal sabedoria se revela através de intermináveis histórias que contam, muitas delas de arrepiar os cabelos.
Quando menino, ouvi muitos casos de medo contados pelo meu tio-avô. Tinha ele o dom do contador de histórias nato cujas inflexões de voz e ritmos de narrativas guardam a surpresa para o final, prendendo os ouvintes com idas e vindas, como se faz nas novelas de hoje. Foi assim que me inteirei, desde pequeno, a respeito do sobrenatural e fui iniciado nas agruras do gênero fantástico, sem me dar conta de que avançava num caminho sem volta.
O fato é que nunca mais abandonei as histórias de medo. Das narrativas de meu tio-avô parti para os contos fantásticos, lendo Poe, Maupassant e tantos outros. Paralelamente, vieram os filmes de horror como os estrelados por Bela Lugosi, Boris Karloff, Peter Cushing, isso para ficar só nos mais antigos.
Com tal histórico pessoal e alguma vivência no gênero sinto-me bem à vontade para reclamar das atuais tendências adotadas pelos criadores de histórias de horror. Deixando de lado os que produzem boa literatura de horror – Stephen King e Clive Baker são dois deles – o que se encontra é uma nova forma de narrativas, mais idílicas nas quais tradicionais seres do mal se dão os desfrute de parecerem bonzinhos. Creio que os livros “Lua Nova” e “Crepúsculo” com os respectivos filmes que se fizeram sobre eles ilustrem bem a nova forma de terror que, aliás, nada têm a ver com as verdadeiras histórias de medo.
Quanto aos filmes atualmente produzidos destaque-se o abuso de efeitos especiais cuja intenção é colorir as telas com sangue e conferir grandiosidade aos sustos. A rapidez com que seres humanos se transformam em lobisomens, vampiros e outros seres, o modo como lutam entre si utilizando artes marciais, tudo isso dificilmente se enquadra nas premissas que conferem qualidade ao gênero fantástico.
De meu tio-avô não se pode dizer que tivesse ilustração. As histórias que contava vinham de gerações anteriores e continham o genuíno molho dos verdadeiros contos de horror. Parece-me que esse “molho” se perdeu com o tempo, dando origem a uma nova forma de horror que, na verdade não convence. Infelizmente o horror deturpado atualmente corre solto por aí privando os não iniciados no gênero fantástico de emoções insubstituíveis.