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Homens em ação
Nada contra a turma hoje em atividade, mas houve tempo não distante no qual líamos nos jornais crônicas de Rubem Braga, poemas de Drummond, Bandeira e muitos outros. Escritores de primeira linha estavam não só vivos como ativos. Lembro-me de segundas-feiras nas quais, ao chegar ao serviço, não havia outro assunto que não o texto de alguém publicado num caderno literário do jornal de domingo. Como aquele poema de Borges sobre o qual falamos por dias seguidos tal o impacto causado em nós, leitores interessados.
O perigo de escrever coisas assim é o de sermos tomados por pedantes. Sim pedantes, gente que gosta de mostrar conhecimento, posicionar-se, apresentar-se aos desconhecidos expondo, logo de cara, seus importantes currículos. Estudei aqui, ali, graduei-me em, pós-graduação na, mestrado, doutorado, professor convidado na conceituada… Afora a citação de autores, obras, frases e tudo o que indica formação cultural elevada, enfim abrir a caixa de ferramentas para desde logo informar ao parceiro de que não está a falar com qualquer um.
Mas, mesmo esse tipo, muitas vezes até agradável, anda sumido. A boa e sólida leitura está desamparada, o massacre de tanta informação escraviza e banaliza e frutifica-se na geração do “conhecimento por alto”, da turma dos resumos, da atração pelos títulos não seguidos da interação com as matérias. E que não se culpe a internet pela desorganização de ideias, nem o mundo mal-ajambrado em que vivemos no qual rareiam oportunidades para destaque de espíritos lúcidos e criativos.
Paul Klee nos deixou o terrível quadro no qual um anjo segue em direção ao futuro, mas com a cabeça voltada para trás. Ele vê no passado um acúmulo de escombros a substituir o que, tão pressurosamente, classificamos como história. Walter Benjamin escreveu chamar-se progresso à aventura desse anjo que tem atrás de si, e à frente, escombros.
Ao progresso! Eis aí esse novo século, o 21, que já avança ao esgotamento de seus primeiros vinte anos e cujo final a maioria dos vivos de hoje não conhecerá. Trafegamos nessa trilha com o conhecimento acumulado no passado e tem-se a impressão de que tudo o que se sabe mostra-se insuficiente para colocar o mundo nos eixos e garantir a vida em paz aos seres humanos.
Talvez pela contradição entre os saberes e a precariedade de seus usos, talvez pela raridade de espíritos e expressões culturais inspiradoras, tenhamos esse homem que se senta à minha frente a se põe a falar sobre expoentes desaparecidos da literatura francesa os quais, assim se percebe, conhece apenas de nome.