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Fatos e linhas editoriais
Imagino qual não sejam as dificuldades dos editorialistas de jornais para a escolha dos assuntos de seus escritos diários. O jornal vive do imediatismo e as notícias envelhecem muito rapidamente. A página impressa de hoje embrulha peixe amanhã, fato esse sempre citado. Talvez por isso as memórias dos leitores sigam o ritmo das notícias dado que os fatos não duram o tempo necessário para serem arquivados.
Mas, há fatos e fatos. Às vezes acontece de uma nova ocorrência despertar a memória para casos passados. Nesse caso pode-se dizer que a dinâmica do processo consiste na ligação entre passado e presente, sendo o primeiro regatado pelo segundo ao qual está ligado. Veja-se, por exemplo, a atual acusação de que o ministro Antônio Palocci multiplicou por 20 o seu patrimônio, isso no prazo de quatro anos. Esse enriquecimento, lícito ou não, trouxe à tona episódios passados da vida do ministro, episódios esses aparentemente esquecidos e agora reavivados pela nova ocorrência. Note-se que num caso assim o passado retorna com grande parte da intensidade original, contribuindo até para o pré-julgamento do fato presente. Em outras palavras, seria mais fácil encarar o enriquecimento de Palocci caso não tivesse ele sido acusado anteriormente de outros deslizes.
Há casos em que um passado desconhecido subitamente é revelado por uma nova situação. Como se sabe o diretor do FMI, Dominique Strauss-Kahn, está nos EUA, acusado de agressão sexual a uma camareira do hotel em que esteve hospedado. A perplexidade em relação a esse lamentável acontecimento é geral, ainda mais porque se reconhece o prestígio e a importância do diretor para o encaminhamento de grandes problemas econômicos envolvendo vários países. Não bastasse, entretanto, a ocorrência atual, eis que surge, contra Strauss-Kahn, a acusação de uma mulher que afirma ter sido vítima de tentativa de estrupo por parte dele, no passado. Está aberta, para o diretor do FMI, a caixinha de surpresas não se sabendo o quanto existe ainda por se revelar.
Se ficarmos apenas com os dois casos anteriormente citados poderemos ter uma vaga ideia dos problemas que envolvem a atividade dos articulistas de plantão. Sendo a verdade o que mais interessa, que assunto escolher e a linha a adotar em relação à escolha adotada?
Esse texto tem a pretensão de despertar nos leitores a curiosidade em relação às linhas editoriais dos jornais. Deixando-se de lado possíveis interesses corporativos e econômicos vale observar os diferentes modos como assuntos em voga são tratados e mesmo os artifícios utilizados para dizer e não dizer, tantas vezes sem se comprometer. Que se diga: não se trata de simples cautela, dado que alguns articulistas não se negam a ir diretamente ao ponto. O fato é que ninguém é dono da verdade e, no geral, a regra é sustentar uma linha editorial, seja ela qual for, quando respaldada por provas conclusivas. O resto é especulação e são especulativas a maior parte das linhas editoriais que lemos diariamente.