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O Sabor da Vida
O instigante título “O Sabor da Vida” foi escolhido pelo escritor Gilberto de Mello Kujawski para enfeixar em livro uma coletânea de ensaios realmente saborosos. O livro é datado de 1999 razão pela qual, vez ou outra, conduz o leitor a reflexões sobre acontecimentos circunstanciais daquele ano. Mas, isso pouco importa porque o que pulsa nos ensaios de Kujawski é uma revisita à inteligência, expressa em considerações sobre temas variados e sempre interessantes.
No ensaio que abre a coletânea, cujo título é “Ensaio sobre o Ensaio”, Kujawski diz a que vem sua escrita. Definindo o ensaio e distinguindo-o de outras formas de literatura, o autor nos recorda de que a tradição ensaística, tão comum no país até a década de 60, praticamente deixou de existir, abatido que foi pela especialização intelectual e científica. Explica-nos Kujawski que o ensaio sintoniza-se com a livre expansão da inteligência e nutre-se de ideias gerais as quais, por natureza, distanciam-se de especializações e engajamentos doutrinários.
É a partir dessas premissas que Kujawski desenvolve sua ensaística, focando temas hoje infelizmente relegados a segundo plano, dada a condução apressada e literalmente engajada da crítica que tem sido praticada no país. O que se observa em cada página é a mestria do autor a dividir com o leitor o sabor do texto que se insinua em considerações que nos convidam à reflexão sobre temas propostos e sempre abordados com grande lucidez.
Pode-se dizer que há um pouco de tudo em “O Sabor da Vida”. Há ensaios em que Kujawski se detém para esclarecer temas com frequência confundidos como a fundamental diferença entre erudição e cultura; outros trazem de volta ao leitor personalidades como Miguel de Unamuno, Fernando Pessoa e Sartre, destacando-se nessas leituras o vasto conhecimento do autor sobre filosofia e literatura; há o impressionante ensaio “A vida das imagens” no qual o autor recorre a Roland Barthes e Emile Zola para projetar luzes poéticas sobre o significado e função da fotografia; ao lado de incursões sobre o sempre atual maio de 68 figuram textos de cunho político, destacando-se a globalização e o poder supranacional; noutro ensaio a definição de intelectual é estampada, enfatizando-se ao algum ridículo da condição as benesses da inteligência e do talento.
Como um grande rio cujas águas são engrossadas por afluentes poderosos, os ensaios de Kujawski encorpam-se para desaguar num último que justamente é o que nos fala sobre o sabor da vida. Nele o leitor encontra-se com um final feliz no qual o autor serve-se dos sentidos do paladar e olfato para relacionar o interesse pela boa mesa, a sensibilidade enfim, com o encanto da vida e a intimidade com o saber. A esse ponto não esconde Kujawski o seu amor pelas pequenas coisas que contribuem para dar sentido à vida, fatores que aguçam os sentidos e conduzem o homem à plenitude da condição de ser pensante.
Essas considerações, ligeiras demais para retratar obra de conteúdo variado, interessante e profundo, visam convidar os leitores ao livro de Kujawski. Vale dizer que, infelizmente, o movimento editorial brasileiro é pouco atento a obras desse gênero, daí a pouca divulgação de trabalhos como este de Kujawski. É pena. “O sabor da Vida” não é apenas um livro que se lê com prazer: suas páginas são um convite ao exercício da inteligência, têm caráter informativo e, em muitos momentos, mostram-se didáticas ao trazer à tona conceitos com frequência confundidos.
Obra para ser lida e refletida, assim é “O sabor da Vida”.