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A vez do Egito
Confesso que me emocionei quando vi cidadãos egípcios de mãos dadas, abraçando o Museu do Cairo para protegê-lo contra intrusos e saqueadores. Homens do povo erguiam-se em meio a desordens e arruaças para proteger um patrimônio cultural da humanidade. Pouco antes, imagens do interior do museu mostravam peças milenares destruídas, fato que tem preocupado pesquisadores e gente de cultura em todo o mundo.
De todo modo assiste-se a uma varredura de sonhos de democracia em países do norte da África. Ditaduras que persistem há décadas ameaçam ruir. O que se busca é liberdade e, até certo ponto, rompimento com o passado para que sociedades mulçumanas entrem no século XXI.
Os paralelos da crise egípcia com a onda que varreu a Europa e pôs fim à Cortina de Ferro têm sido apontados por vários analistas. Nesse sentido a crise de 1989 que culminou com a queda do Muro de Berlim é um marco a ser lembrado. Entretanto, não se consegue identificar com clareza o estopim da crise atual embora se tenha dito que informações publicadas pelo WikiLeaks tenham influído no processo.
Agora se diz, não sem certo espanto, que os jovens egípcios, mesmo tendo nascido sob a ditadura de Mubarak, sabem o que é democracia. De todo modo o futuro político do Egito é incerto e preocupa o mundo. Milhares de pessoas continuam protestando nas ruas e as forças de repressão têm feito vítimas. A internet foi cortada e a imprensa sofre represálias. Mubarak se diz disposto a se afastar do governo, mas crê que sua saída repentina mergulhará o país numa crise ainda pior. Nesse jogo de forças estão envolvidos, além do governo e do povo, o Exército – fiel da balança -, os líderes da oposição, a irmandade mulçumana e seitas radicais do islamismo. Como não poderia deixar de ser os interesses dos EUA contam, e muito, de vez que o país tem praticado a política de apoio a ditadores da região, inclusive o próprio Mubarak.
No fogo que se alastra os EUA já andam às voltas com problemas na Tunísia e o Iêmen. Não custa lembrar o bom entendimento dos EUA com as ditaduras da Arábia Saudita, Jordânia e outros países da região. De todo modo, na crise egípcia, os EUA estão numa sinuca de bico: apoiar Mubarak é fria; é preciso apostar na hipótese mais provável para a sua sucessão. O problema é que, pelo menos por agora, parece não haver hipótese mais provável. Analistas têm ensaiado possibilidades, todas elas partindo da saída de Mubarak. O que se quer no Egito são eleições livres, mas até chegar a elas há um caminho a percorrer. Num ponto todos concordam: caberá ao exército papel primordial no futuro do Egito. Caso o exército venha a se omitir estará aberto o campo para a intervenção de radicais e há quem veja a possibilidade de um governo religioso como aconteceu no Irã. Outra preocupação é com a possibilidade de esfacelamento do Estado como aconteceu ao Iraque devido à intervenção norte-americana naquele país. Não existe democracia sem instituições e há que se preservá-las no Egito se o que se quer são a própria democracia e eleições livres.
Nos primeiros dias as notícias vindas do Egito não chamaram tanto a atenção do cidadão comum. Hoje o assunto está nas ruas e preocupa a opinião. Egito, Tunísia e Iêmen presenciam levantes populares pró-democracia. Estaremos presenciando um efeito dominó que levará ao fim as grandes ditaduras africanas?