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Aposentados
Não via o Juarez há não sei quantos anos. Apareceu de repente, sem avisar, bem de seu jeito de ser. Socialista de carteirinha hoje em dia tem suas paixões políticas amenizadas, fruto da idade, talvez. O tempo ameniza arroubos. Certa manhã acorda-se e compreende-se que já passou a hora de sacar a espada para desafiar o mundo.
Conversamos longamente. O Juarez tem emprego público e conta nos dedos o tempo que falta para a aposentadoria. Espera chegar a recebê-la, mas teme as maldades anunciadas pelo governo. O Estado brasileiro está quebrado, as contas não fecham. Pior para os aposentados.
Em 1986, um ano depois do retorno de governos democráticos, frequentei reuniões de um pessoal de esquerda. Na verdade, andava meio perdido naquela época e um amigo sempre me convidava às reuniões a pretexto de preencher o tempo. Os encontros aconteciam uma vez em cada mês num restaurante. O problema era ter que assinar uma lista de presença na qual figuravam esquerdistas conhecidos. Menos de um ano nos separava do regime ditatorial com suas prisões e torturas em quem pensava diferente do código vigente. Eu temia por uma reviravolta com os militares de novo no poder. Então, fazer parte de uma lista daquelas…
Certa ocasião fez palestra num desses encontros conhecido economista, mais tarde ministro de governo federal. Chegara ele há pouco da Europa onde participara de reuniões sobre sistemas previdenciários. Explicou-nos que o sistema em uso no país resultaria em falência. Na exposição do economista não faltaram dados, gráficos e projeções sobre um futuro alarmante. Ficava claro que o Estado chegaria à situação em que hoje nos encontramos.
Disse isso ao Juarez. Conclui afirmando que chegou-se ao estado atual por descaso de governos que não peitaram de frente um problema que se agrava ao longo dos anos. Enfim, restaram as maldades.
O Juarez ouviu a minha arenga e disse que, entretanto, se sentia injustiçado. Lembrou-me de que só os de baixo pagam a conta no país. Algumas categorias têm mantido seus privilégios. Mais: muita gente recebe valores acima do teto previsto em lei. Que se apliquem as tais maldades, mas para todo mundo - completou.
Nos últimos tempos muita gente tem corrido ai INSS para acertar as aposentadorias, antes que a legislação venha a ser mudada. O corre-corre se justifica: não se confia nos homens públicos, os desvios de somas astronômicas de dinheiro prosseguem e categorias com privilégios permanecem intocáveis.
Se governos tivessem agido em prol do interesse comum… Mas isso já é outra história.