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Religião, futebol, comunicação, esoterismo
O Brasil não vai ganhar a Copa 2010. Quem diz isso? O oráculo. Mas, baseia-se em que o grande oráculo? Terá visto nas cartas, nos búzios, na configuração desfavorável das estrelas? E o Cruzeiro do Sul, a cruz brasileira pregada no céu, não vai ajudar em nada?
As respostas a essas e outras perguntas ficam por conta do oráculo. Do pouco que obtivemos, através de fontes privilegiadas, pode-se apenas dizer que o oráculo apoiou-se, em sua previsão, na confusão reinante na seleção brasileira e fora dela. Veja-se o caso do jogador Kaká que desabafou dizendo-se discriminado por conta de sua fé religiosa. E que dizer do pau que está comendo entre o Dunga e a Rede Globo? E o pessoal que investiu grana alta no patrocínio da seleção e agora reclama dos treinos fechados nos quais é vedado o acesso da imprensa?
Como se observa até a religião está metida na confusão. E a FIFA não está dizendo amém, daí proibir comemorações em nome de Jesus ou de quem quer que seja. Enquanto isso o Dunga faz pé firme na sua obstinada cruzada pelo silêncio e reclusão dos jogadores: o que importa é a concentração, estar vidrado no jogo, entregar-se de corpo e alma aos 90 minutos que trarão glória ao Brasil.
O que o Dunga não sabe é que existem outros meios de chamar a turma aos brios. Lembram-se? Depois da participação vexaminosa da seleção na Copa de 66 estávamos em frangalhos. O João Saldanha, jornalista e técnico da seleção durante as eliminatórias para a Copa de 70, conseguiu unir o grupo criando uma história na qual os jogadores surgiam como feras. Eram “as feras” pra cá, “as feras” pra lá. Esse mote logrou incendiar a alma nacional, de repente éramos todos, jogadores e torcida, feras, raçudos, imbatíveis. E o Brasil foi o que foi na Copa de 70.
Talvez o oráculo esteja certo e o Brasil não venha a ser campeão. Quem pode com os astros se não estiverem favoráveis? Mas de uma coisa estejam todos certos: se o hexacampeonato mundial não vier, a decepção não será grande. Isso fica patente quando se observa o envolvimento do povo por ocasião dos jogos da seleção. Há, sim, grande interesse, mas nada parecido com aqueles 90 milhões em ação. Aquela febre de fanatismo que a televisão mostra depois das vitórias não está tão difundida assim. Então, não há como negar: o fato é que Dunga e seus pupilos não empolgam. Pode até ser que dependendo dos resultados dos próximos jogos a situação mude e todo o país passe a vibrar com a seleção. Mas não sei não, talvez só o oráculo tenha resposta para isso, ele que é tão bom em fazer previsões.
Abaixo as vuvuzelas
Imagino o que seja atravessar boa parte o mundo para assistir aos jogos da Copa do Mundo sob o ininterrupto ruído das vuvuzelas. A coisa é brava. Aquele som de fundo, constante, que se ouve durante a transmissão dos jogos pela televisão já é irritante. Ao vivo, então, como será?
Um amigo me responde: não queira saber. O que me deixa perplexo é o fato de um camarada pagar ingresso caro para ver um jogo e passar todo o tempo soprando uma vuvuzela. Vá lá que seja gostoso uma vuvuzelada ou outra; mas, o tempo todo? E o jogo?
Noticiou-se que a FIFA está decidindo sobre a proibição das vuvuzelas. São muitas as reclamações e existem os direitos daqueles que não querem ser atormentados com tanto barulho. Entretanto, o mal está feito: o novo instrumento existe e corre-se o risco de que seu uso se espalhe pelo mundo.
Aqui perto de casa tem um palmeirense proprietário de uma corneta. Cada vez que acontecia um gol do Palmeiras, ele saía à janela e nos agraciava com um solo longo e profundo. Depois o Palmeiras foi caindo, gols rareando e o torcedor decidiu vingar-se de todo mundo, cornetando até nos gols dos adversários. Foi o jeito que ele escolheu para protestar, há que se entender uma alma palmeirense ferida.
Mas, a coisa não parou por aí. O fato é que esse meu vizinho, torcedor do “Verdão”, tomou gosto pela sua corneta e passou a tocá-la toda vez que acontece um gol, em qualquer jogo. Ele não perde oportunidades para soprar o seu malvado instrumento cujo som entra nas nossas casas em tom de desafio do tipo “eu posso, ninguém me impede”.
É assim que agora, durante a Copa, estamos sendo duplamente prendados com o som das vuvuzelas e o da corneta do palmeirense, simultâneos.
Segundo meu amigo a minha bronca com as vuvuzelas está ligada à minha pregressa irritação com a corneta do meu vizinho. Não sei não, pode até ser. Na verdade eu gostaria que este texto pudesse ser acompanhado do som da corneta que agora pouco soou aqui, ao lado da minha casa. Tenho certeza de que, então, você entenderia melhor o que estou dizendo.
Finalmente, rogo a atenção das autoridades brasileiras para que mandem vigiar aeroportos, portos e as nossas fronteiras no sentido de impedir a entrada de vuvuzelas no país. Que sejam criadas leis terríveis e aplicadas penas máximas aos empresários que produzirem vuvuzelas em território nacional. A vuvuzela é uma praga que se espalha, daí a obrigação do governo em impedir a sua disseminação. Além disso, já temos cornetas comuns, para que vuvuzelas?
Espero que me ouçam antes que todos fiquem surdos de tanto ouvir o barulho provocado pelas tais vuvuzelas.
Muito obrigado pela atenção.
Os melhores do mundo
Lionel Messi e Marta são os melhores do mundo no futebol. Marta é unanimidade: nenhuma mulher neste vasto mundo joga bola como ela, daí receber o prêmio pela quarta vez consecutiva. Messi é grande no Barcelona, mas deixa a desejar quando veste a camisa da seleção argentina. Não se trata de opinião isolada: a maioria dos torcedores argentinos parece concordar com isso e cobra de Messi mais empenho e melhores atuações pela seleção.
Quem acompanha o futebol sabe que há jogadores de clube e jogadores de seleção. Outros atuam do mesmo modo em clubes e selecionados. A história do futebol é rica em casos de jogadores que atuam bem em clubes, mas não na seleção e vice-versa. No Brasil há casos de craques que eram reservas em seus clubes, mas titulares da seleção brasileira, pelo menos durante alguns períodos.
Ser o melhor do mundo no futebol deve ser complicado tal a cobrança gerada pela alta posição conquistada. Se por um lado o prêmio recompensa o esforço e conquista do atleta, por outro não existe nada mais efêmero que o título recebido. De fato, futebol é paixão e paixões podem fugir ao controle. Uma sequência de derrotas e um só grande erro de um ídolo podem mudar a opinião da torcida. Fica o prêmio, vai a fama ou, pelo menos, a boa fama é substituída pela ruim. Lembram-se do Roberto Baggio? O grande jogador italiano foi considerado o melhor da FIFA,em 1993. Pois até hoje a televisão mostra a imagem de Baggio errando o pênalti no jogo final da Copa do Mundo de 1994, dando o título mundial ao Brasil.
Futebol é jogo coletivo de modo que os melhores do mundo sempre devem, ainda que um pouco, aos seus companheiros de equipe. Não é como no boxe, esporte do eu sozinho cujos resultados dependem apenas do desempenho do lutador dentro dos ringues. Um campeão mundial de boxe chega ao título sozinho, excluindo-se o esforço de treinadores etc. Mas dentro do ringue é ele, só ele.
No futebol a discordância alimenta as paixões, gerando discussões nem sempre resolvidas. Ontem o jogador Cristiano Ronaldo recebeu prêmio por ter feito o mais bonito gol de 2009. O gol mais bonito tem que ser também importante: o de Cristiano Ronaldo serviu à classificação de seu time. Foi de fato um golaço, mas seguramente não o mais belo. Viram? Ai está estabelecida a divergência de opiniões. Quem duvida que reveja aquele gol do Nilmar contra o Corinthians bem no começo do Campeonato Nacional deste ano. Gol belíssimo. Ou não?
Assim é o futebol. Você se aborrece com o seu time, sofre com as derrotas, não acredita que um título tenha escapado por tão pouco. Então jura que chega disso, não vai mais acompanhar jogos, nenhuma força do mundo fará com que você ligue a televisão para assistir a jogos. Ir a estádios então…
Isso dura até que um novo campeonato começa. Você nem quer saber, mas de repente o seu time dispara na frente, desta vez vai dar e você resolve dar só uma olhadinha nuns dez minutos de um jogo para ver como os garotos estão jogando. Pronto. Isso é a mesma coisa que fumar só um cigarrinho após ter largado o vício: começa tudo de novo, os dez minutos viram noventa de alegria e sofrimento, aí está você com o coração aos saltos, olhando fixamente para a telinha, pulando, gritando, xingando, mostrando aquilo que você nunca deixou de ser: um torcedor.
Vida longa aos melhores do mundo.
Vida longa a essa maravilha que se chama futebol.
Ao meu tio Edésio - notícias sobre o futebol
Escrevo para dar noticias sobre o seu esporte favorito: o futebol.
Em primeiro lugar vou falar sobre o seu time do coração, o São Paulo, que o senhor em momento inspirado apelidou de “Colosso”. Pois o Colosso vai mais ou menos bem, obrigado. Depois de ganhar pela sexta vez o Campeonato Brasileiro, o Colosso se acomodou e deu para perder competições. Foi assim com o Campeonato Paulista e a Taça Libertadores da América. Agora o Colosso está na disputa do Campeonato Brasileiro, mas com tantos altos e baixos que o melhor é não acreditar muito que ele possa vir a ser campeão.
Na verdade, tio, o futebol mudou muito de uns anos para cá. Cada vez mais um grande negócio, o futebol de hoje globalizou-se no pior sentido do termo: os bons jogadores atuam fora de seus países e só se reúnem para jogar pelas seleções nacionais. Posso garantir que o senhor acharia realmente incrível o fato de a Seleção Brasileira entrar em campo, hoje em dia, sem nenhum jogador atuando no Brasil. Pois isso acontece muitas vezes dado que os jogadores estão mais para caixeiros-viajantes de sua arte que atletas de futebol.
Tudo muito diferente, tio, dos bons tempos em que sabíamos as escalações dos times e quem jogava nessa ou naquela posição. E olhe que isso tem afetado até mesmo o amor à camisa: acredite o senhor que, na última Copa do Mundo, o Brasil foi desclassificado e os jogadores saíram de campo como se tivessem participado de um jogo de várzea, alguns muito sorridentes. Atrás deles um país inteiro torcendo e sofrendo. Tio, eu não me envergonho de confessar: quando vi aquilo me senti um grande idiota por ter torcido pelo Brasil. Pode uma coisa dessas?
Mas, voltemos ao Colosso. O grande clube está envolvido com a realização da Copa do Mundo de 2014 que acontecerá aqui no Brasil. O senhor deve se lembrar bem do Morumbi, o campo sagrado dos tricolores. Lembra-se, também, da dureza que foi o período de construção do estádio durante o qual o senhor e outros tricolores fanáticos sofreram muito porque o Colosso não tinha dinheiro para montar um bom time. Anos e anos de luta e sofrimento da torcida resultaram na posse de um grande estádio, orgulho da cidade de São Paulo e palco de jogos memoráveis. Pois agora, o Morumbi é o estádio mais cotado para a realização de jogos da futura Copa do Mundo na cidade de São Paulo.
Entretanto, meu caro tio, não é que um tal Joseph Blatter, presidente da FIFA, deu de falar mal do Morumbi, dizendo que não serve para a Copa e outras barbaridades? O mais triste é que tem muita gente de outros estados vibrando, o que é inaceitável – trata-se da velha rivalidade. A verdade é que Blatter rebaixou o estádio que tem o apoio do governo do Estado e da prefeitura da capital. Tem gente por aí falando em lobby de outros estados contra São Paulo. No final das contas o que a FIFA diz é que o estádio não tem condições de abrigar 65 mil pessoas e assim por diante. Os dirigentes do Colosso discordam, afirmando que o clube fará a sua lição de casa e atenderá às exigências da FIFA até a realização da Copa.
Aliás, tio, não custa nada contar para o senhor alguma coisa sobre a FIFA. Imagine que essa entidade negociou com “alguém” do governo - que ninguém diz quem é - a isenção total de impostos para patrocinadores, fornecedores, enfim todas as empresas ligadas à realização da Copa do Mundo. Trata-se de muito dinheiro, uma enormidade de negócios. Só que agora o pessoal da Receita Federal, que pelo jeito acaba de saber disso, está se opondo a esse absurdo. Ainda bem. Imagine o senhor que todos nós aqui damos um duro desgraçado e o governo do país nos impõe uma das mais altas taxas de impostos do mundo. Ai vem para cá essa turma toda e, na cara dura, é favorecida. Pode? O senhor não acha um absurdo?
Pois é. Mas, tio Edésio, isso não é tudo. Veja que tamanha desfaçatez baseia-se numa exigência da FIFA para a realização da Copa no Brasil, exigência essa que foi aceita por “algum negociador” que certamente não agiu sozinho. Esse(s) negociador(res) deve(m) ter até um chefe, tio, embora nisso as coisas não tenham mudado porque “neste pais” ninguém sabe de nada quando a podridão vem à tona.
O que espanta é que a FIFA, presidida pelo tal Blatter (o Havelange deles), não é um negócio pequeno, muito pelo contrário. A entidade movimenta por ano cerca de metade do PIB da Argentina, país que faz parte do G-20, o grupo de países que conversa sobre a economia do mundo. É dinheiro prá caramba que a FIFA movimenta, muito mais que o PIB anual de inúmeros países.
Diante disso tudo, a alegria que resta é a de dar a louca nos jogadores e o Colosso vencer o campeonato deste ano. Se acontecer, prometo escrever contando tudo para que o senhor comemore aí.
Tio Edésio eu raramente escrevo cartas, o senhor sabe como é isso. Mas hoje me deu vontade de enviar essas mal traçadas. O senhor nos deixou há muito tempo e o mundo em que vivemos está bem diferente daquele que o senhor conheceu. Mas, não se preocupe: continuo o mesmo cara de sempre, talvez um pouco fora de moda por acreditar em valores que têm sido esquecidos por boa parte das pessoas.
Essas são as notícias aqui da terra que eu queria passar para o senhor que, tenho certeza, continua sendo um grande apaixonado pelo futebol.
Um grande abraço e muita saudade.