Arquivo para ‘filmes de faroste’ tag
Cuidado com as flechas
Nunca gostei dos filmes de faroeste nos quais os cowboys entram em guerra contra os índios. Nos EUA a conquista do oeste se deu com a aniquilação de tribos que viviam e dominavam a região. O homem branco trouxe suas armas e doenças e arrasou com as sociedades tribais.
Jack London foi um brilhante escritor norte-americano dotado de colossal arte para contar histórias. Pena que hoje pouca gente conheça a obra de London e já nãos seja lida. Aliás a vida de Jack London por si só é um thriller de aventuras. Analfabeto até a juventude London foi marinheiro e aprendeu tudo sobre a vida no mar e aventuras marítimas de pesca. Mais tarde percorreu as trilhas geladas do norte em busca de ouro e de valiosas peles de animais. O modo de viver dos índios, a força bruta dos cães puxando trenós na neve, a solidão das trilhas do norte onde a vida de homens e cães interligam-se na luta pela sobrevivência são magistralmente descritas nas páginas de London. Ouso dizer que ninguém contou histórias de aventuras como Jack London. Suas personagens são pessoas fortes, muitas delas dotadas de sabedoria adquirida na prática dado não terem frequentado escolas. O mundo das lutas de boxe é outro dos motivos que permitiram a London escrever interessantíssimos contos.
Falo de Jack London porque nas histórias escritas por ele pode-se sentir na própria pele o efeito das flechas atiradas por arqueiros experientes que vivem nas selvas. Um de seus contos - A Liga dos Velhos - narra a história de Imber um índio que viu sua tribo ser dizimada pela chegada do homem branco. As doenças, a bebida que corrompeu os mais jovens, as mulheres seduzidas e mesmo as raças de cães nativos enfraquecidas pelo cruzamento com as trazidas pelos brancos levaram os mais velhos da tribo a criar uma liga cuja finalidade era matar todos os brancos.
Assim, Imber partiu sozinho e, dia após dia, matava os brancos que encontrava em seu caminho. Até que percebeu que apesar de tantas mortes o número de brancos só fazia aumentar fato cujo entendimento escapava a ele. Foi assim, que cansado e velho, Imber sentou-se na calçada de uma cidadezinha, foi preso e julgado. A partir daí a narrativa do índio sobre o modo como presenciou e viu a chegada do branco torna-se comovente.
Hoje em dia não se fala mais em mortes por flechadas. A bandidagem dispõe de armas sofisticadas como fuzis capazes de disparar trinta tiros por minuto. De modo que soa como vinda do passado a notícia de um policial atingido na perna por uma flecha disparada pelo arco de um índio. Aconteceu em Brasília onde os índios se reuniam num protesto.
Imagino como essa notícia terá chegado ao exterior nessa época em que não se poupa o Brasil pelos preparativos da Copa. É bem possível que os turistas que virão para cá imaginem que chegarão a uma terra inóspita com ruas de calçamento de pedra e carroças puxadas por burros circulando para todo lado. Um retorno ao século XIX, com índios ameaçadores portando arcos e flechas. Um Brasil mais ou menos ao ritmo dos contos de Jack London, isso em pleno século XXI.