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Ainda a renúncia de Jânio

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Passados 50 anos desde a renúncia de Jânio Quadros à Presidência da República, o assunto ainda incomoda. O homem da vassoura e dos bilhetinhos era proprietário de presença e carisma que os jovens de hoje simplesmente não podem imaginar. Estudar a atuação dele através de manuais de História, recorrer a pronunciamentos gravados, bisbilhotar velhos documentos, nada disso logra devolver a imagem de Jânio dentro do contexto do Brasil que o elegeu presidente e assistiu, estarrecido, à renúncia ao cargo de primeiro mandatário do país.

Não é o caso de aqui recordar as marchas e contramarchas do governo Jânio Quadros, nem mesmo o particular modo que tinha ele de fazer política e governar. Já vão longe aqueles dias de um país de terceiro-mundo e subdesenvolvido, imerso em inflação e funcionando a reboque de imposições interacionais muitas vezes maiores que as observadas hoje em dia. Foi num palco pleno de controvérsias e necessidades urgentes que Jânio teve a oportunidade de exercitar sua familiaridade incontestável com o poder e seu desapreço pela opinião. Voltado para si, ego inflado por uma inteligência arrogante e tantas vezes destrutiva, dava-se o então presidente ao luxo de atitudes insólitas que por vezes transpareciam simples provocações. De fato, Jânio era homem de outra latitude, diferente de seus próximos. Sua figura incomum, as qualidades de verdadeiro ator, o domínio das palavras, a estudada impulsividade, a teatralidade utilizada em seus discursos, as promessas de austeridade, tudo isso fez de Jânio, mais que promessa, uma esperança para os brasileiros.

Esperança que ele traiu, sem mais nem menos, num acesso de irresponsabilidade cujas causas até hoje despertam as mais variadas explicações. O que mais se lamenta no episódio da renúncia não é o ato propriamente em si, embora a ele se dirijam as maiores atenções quando se fala em Jânio Quadros. O que mais se lamenta é o que veio depois, o conjunto de acontecimentos que desaguaram no longo período ditatorial que só veio a se encerrar na década de 80 do século passado.

Meninos eu vi pessoas chorando naquele trágico 25 de agosto de 1961, o dia da renúncia. Vi pessoas andando nas ruas, cabisbaixas e silenciosas, convencidas de que uma grande hecatombe abatera-se sobre o Brasil. Ouvi as notícias desencontradas que circulavam por toda parte, algumas delas informando que talvez a renúncia fosse reversível. Dia triste e de luto aquele 25 de agosto, dia de destemperos e tristezas.

Autogolpe? Alcoolismo? Loucura pura e simples? Tentativa de se tornar ditador? Não se sabe. Hoje, decorridos 50 anos, o neto de Jânio escreve ter ouvido do avô que, ao assumir a presidência, não sabia da verdadeira situação político-financeira do país. Quanto à renúncia Jânio disse ao neto que não pensou que ela de fato viesse a se efetivar. Esperava ele um levante popular e que os militares e a elite impedissem a posse de Jango.

Foi por isso? Em se tratando de Jânio é preciso ouvir a explicação que deu ao próprio neto com reservas. Em quem passou a vida querendo ser lembrado como um mito, cercando-se de mistério e não se deu ao trabalho de explicar-se aos que nele confiaram definitivamente não se pode acreditar.

Se o assunto é Jânio Quadros, então todas as explicações são possíveis.