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Pessoas mutiladas
Um programa de TV mostra entrevistas de soldados que lutaram no Iraque e no Afeganistão. São jovens, homens fortes, alguns sem braços, outros sem pernas, outros ainda apresentando diferentes lesões, quase todas irreversíveis.
Não há ódio no rosto dos antigos combatentes. O que se lê nas suas faces é um misto de desespero e esperança. Paira sobre eles a atmosfera de resignação à qual se agrega a busca de superação, condição essencial para entender o mundo e seguir vivendo.
A imagem desses novos-velhos soldados se confunde com a dos prédios do Word Trade Center no terrível momento em que foram derrubados. Aquele ataque bestial selou a sorte dos rapazes agora aleijados. Ao terrorista que o planejou e o governo que enviou seus rapazes para as guerras agregam-se inúmeros culpados.
Mas, não há que se falar em culpa aos rapazes que foram para a guerra. Nem mesmo crucificá-los pelos possíveis crimes que terão cometido. De nada nos valem, também, as imagens de presos torturados e inocentes chacinados de vez que nada podemos fazer por eles. Justiça? Ah, sim, a justiça.
O passado é irreversível, mas não a dor.
Talvez pior que as imagens de ação da guerra sejam essas de jovens mutilados e famílias iraquianas e afegãs vitimadas.
Mas, a vida continua. Na padaria da esquina o padeiro segue fazendo pães e o sol insiste em brilhar a cada nova manhã.
Sem piloto
Meninos, eu vi. A minha geração, que já viu muita coisa, tem todo o direito de dizer-se embasbacada com os tais aviões sem piloto, produzidos em Israel. Trata-se de aviões com sensores, capazes de voar até 15 horas, guiados por controle remoto. Para que servem? Até agora para gravar o que acontece embaixo e filmar no escuro com o uso de um sensor térmico capaz de distinguir entre seres vivos e objetos inanimados.
Para que se tenha idéia da utilidade, os EUA já possuem 6 mil aviões teleguiados que voam nos céus de países como o Iraque e o Afeganistão. Mais: a indústria aeronáutica de alguns países já se prepara para produzir as máquinas voadoras teleguiadas.
Nem é preciso dizer que logo as grandes aves de metal teleguiadas disporão de armamentos o que tornará as missões aéreas em territórios inimigos aquilo que por aqui se considera ”uma baba”. Ei, você, escute: estamos chegando às mortes por agentes impessoais, mortes programadas, processadas e realizadas por máquinas, sem culpa.
Não haverá mais Guernica, a cidade espanhola completamente arrasada, em 1937, em apenas três horas, por bombadeiros Condor, pilotados por alemães. Nem haverá Hiroshima, cidade japonesa onde um piloto norte-americano lançou uma bomba atômica, em 1945. Existirão, sim, regiões bombardeadas por máquinas.
Olho para uma reprodução do quadro Guernica, de Picasso, no qual o pintor concentrou todo o horror da destruição. Penso em qual seria a reação de Picasso, caso a morte de 1645 pessoas em Guernica tivesse sido provocada por máquinas teleguiadas. Dirão, talvez, que no fundo trata-se da mesma coisa, afinal mortes são mortes, não importa quem ou o quê as provoquem. Não sei. A frieza das máquinas, o uso de recursos tecnológicos para exterminar seres humanos a partir de assassinos impessoais porque distantes e talvez desconhecidos, incorpora à realidade de nossos dias a virtualidade dos videogames. Para mim o nome disso é horror, o que me leva ao impossível passo seguinte, o da rebelião das máquinas de voar teleguiadas que, unidas, passam a exterminar o homem em toda a Terra. Impossível?
O Rambo norte-americano
Gary Faulkner, 51 anos, é na vida real o Rambo norte-americano. Ele foi detido no Paquistão portando uma espada, uma pistola e óculos de visão noturna. Sua intenção era caçar sozinho Osama Bin Laden. A detenção de Faulkner aconteceu numa floresta próxima à fronteira do Paquistão com a província afegã do Nuristão. É o que se lê no noticiário.
A suposição de que Bin Laden viva na fronteira entre o Paquistão e o Afeganistão levou o Rambo norte-americano a agir na região. É de se imaginar se sua missão não está ligada àquele coronel dos filmes, o amigo do Rambo a quem treinou. É o coronel que sempre adverte aos cinéfilos sobre o potencial de Rambo, ex-soldado capaz de sobreviver em condições inumanas e destruir exércitos inteiros.
Infelizmente a foto de Gary Faulkner, publicada nos jornais, não sugere que ele tenha as aptidões do Rambo do cinema. É um sujeito de cabelos longos e barba grisalha, com óculos de aro fino que dá a ele jeito de intelectual ou sonhador. Não se vê o aspecto físico, mas Faulkner não parece ser do tipo musculoso, apto a aventurar-se numa floresta sozinho, ainda mais à caça de Bin Laden.
Seria muito interessante se Faulkner capturasse Bin Laden: um só homem teria sucesso onde estrategistas e militares americanos falharam redondamente. Mais que isso, a prisão de Bin Laden por Faulkner serviria para dar credibilidade aos filmes de ação cujas cenas se mostram cada vez mais inverossímeis.
Estamos no século XXI, é preciso acreditar em algo e talvez uma missão bem sucedida do Rambo real viesse a contribuir muito para isso.